Qual parte do solo contém mais matéria orgânica?

A matéria orgânica constituinte do solo é essencial para a manutenção das suas funções. As práticas agrícolas e florestais com impacto no solo devem, portanto, ser adaptadas de forma a promover a sua manutenção ou aumento. 

O solo é um recurso não renovável à escala humana. É definido como a camada superficial da crosta terrestre, sendo composto por partículas minerais, matéria orgânica, água, ar e organismos vivos (fig.1). Entre as funções por ele desempenhadas destacam-se o facto de ser habitat e reserva genética, de ser plataforma para as actividades humanas, de paisagem e património e de actuar ainda como fornecedor de matérias-primas (fig.2 e fig.3).

A matéria orgânica do solo desempenha um papel fundamental na manutenção das funções do solo, dada a sua influência na estrutura e estabilidade do solo, retenção de água, biodiversidade e como fonte de nutrientes para as plantas (fig.4). A ela também se deve o facto de o solo ser um importante sumidouro de carbono.

A gestão do solo possui grande influência no conteúdo do solo em matéria orgânica (Matéria Orgânica do Solo ou MOS). Na generalidade, técnicas de gestão do solo mais invasivas, como a gradagem, estão associadas a uma perda de solo e de matéria orgânica (fig.5).

Uma significativa porção do nosso território sofreu uma considerável degradação do solo em resultado de más práticas agrícolas conjugadas com as alterações climáticas (fig.6). De acordo com o Programa de Acção Nacional de Combate à Desertificação, trata-se de áreas de elevada risco de desertificação, com solo muito pobre em matéria orgânica, pouco produtivo e muito susceptível à desertificação.

Uma correcta gestão das técnicas de gestão agrícola e florestal com impacto no solo é essencial para a manutenção ou aumento do teor em matéria orgânica (fig.7). Duas práticas têm ganho especial atenção em Portugal no enquadramento do Programa de Desenvolvimento Rural e ou/dos programas domésticos apoiados pelo Fundo Português de Carbono: a sementeira directa, a sementeira de Pastagens Semeadas Biodiversas e o controlo de matos em áreas de montado com recurso a métodos que não implicam mobilização do solo.

O que se sabe hoje em dia sobre o efeito da sementeira directa na matéria orgânica no solo, em Portugal, deve-se grandemente ao trabalho do Professor Mário de Carvalho da Universidade de Évora. Os ensaios realizados dão conta de um aumento de 18% de MOS devido à sementeira directa, face à mobilização, e de 62% se forem também deixadas as palhas (Carvalho et al., 2012).

No que diz respeito ao impacto das Pastagens Semeadas Biodiversas, graças à rede de recolha de amostras implementada pelo INIAV, em dois projectos AGRO (Agro 72 e Agro 87) e aos estudos realizados pelo Eng. David Crespo e, posteriormente, pelos investigadores do IST, concluiu-se que este coberto vegetal poderia contribuir para triplicar o teor de MOS num período de 10 anos. De acordo com o mesmo modelo, para 10 anos, o coberto com pastagens naturais indica um sequestro médio de cerca de 2.6 tCO2.ha-1.ano-1 (na ausência de controlo por gradagem). Para um coberto com Pastagens Semeadas Biodiversas é esperado um sequestro médio de 6.5 tCO2.ha-1.ano-1 (Valada et al., 2012).

Finalmente, o efeito na MOS do abandono da gradagem na limpeza do mato em montado e a opção pelo uso de corta-matos e destroçadores foi objecto de estudos realizados pelo ICAAM e pelo IST. Os resultados mais recentes apontam para  uma diferença correspondente a um sequestro máximo de 9 tCO2.ha-1ano-1, entre solos sujeitos a gradagem e a técnicas não invasivas de gestão (Valada et al., 2012).

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Conhecimento

A matéria orgânica do solo (MOS) apresenta capacidade de modificar relações físico-químicas do solo, alterando a disponibilidade de micronutrientes, aumentando relações entre microrganismos do solo e sua fauna edáfica DHALIWAL et. al, (2019).

Sua participação no sistema produtivo vai mais além, a matéria orgânica do solo atua como agente cimentante na formação de agregados do solo, no controle da temperatura do solo, na evaporação de água  nas camadas superficiais e fertilidade do solo,  sendo parâmetro base para a recomendação da adubação nitrogenada em culturas que não realizam a fixação biológica de nitrogênio.

A matéria orgânica do solo é originária de resíduos vegetais e animais que passam por uma dinâmica de processos físico-químicos (figura 1). Essa dinâmica resulta em nutrientes que podem ser absorvidos pelas plantas além de atuar de forma benéfica na estruturação do solo.

Figura 1. Dinâmica da MOS em relação aos processos e subprocessos.

Qual parte do solo contém mais matéria orgânica?
FONTANA (2009).

Tendo em vista que o principal substrato para a formação da matéria orgânica do solo são os resíduos vegetais, a adoção de plantas de cobertura ao sistema de produção é a principal forma de agregar matéria orgânica ao solo.

Contudo, apenas o uso de plantas de cobertura não é o suficiente, é preciso determinar quais plantas usar e quando usar. Algumas plantas apresentam maior potencial de produção de massa seca e tendem a ter uma maior durabilidade da palhada no solo, como por exemplo as gramíneas. Em contrapartida, devido a uma alta relação C/N, as gramíneas tendem a liberar pouco nitrogênio oriundo dos resíduos vegetais no solo.

Já as leguminosas, tendem a liberar maiores quantidades de Nitrogênio ao solo, contudo sua palhada apresenta pouca durabilidade no solo e se manejada de forma incorreta em alguns casos pode ser totalmente degradada antes mesmo da cultura semeada posteriormente fechar a entrelinha, o que resultaria em solo desnudo, aumentando a evaporação de água no solo, temperatura e erosão superficial.

Além de garantir uma boa palhada, a boa distribuição dos resíduos vegetais é fundamental para a melhorar a uniformidade da matéria orgânica na área de cultivo. Contudo, é importante frisar que o incremento da matéria orgânica do solo é um processo demorado e pode levar anos.

Outro fator importante que deve ser levado em consideração no aumento da matéria orgânica do solo é o tipo de sistema de produção. Nos sistemas convencionais onde há incorporação da palhada residual, COSTA et. al, (2004) em avaliação de experimento conduzido durante 21 anos a fim de analisar os efeitos do plantio direto, encontrou valores 15% inferiores na adição de carbono quando comparado ao sistema de plantio direto.

O sistema de plantio direto também auxilia na diminuição da taxa de decomposição da matéria orgânica, colaborando para a maior permanência da MOS no sistema produtivo. CIOTTA et. al, (2003), avaliando a MOS e a capacidade de troca de cátions (CTC), encontrou redução de 14% na taxa de decomposição da MOS no sistema plantio direto quando comparada ao sistema de cultivo convencional.

A matéria orgânica do solo também desempenha papel fundamental na nutrição do solo, atuando na CTC  de forma que quanto maior o teor de carbono orgânico no solo (figura 2), maior a CTC do solo, e com isso maior a capacidade de adsorção de cátions. Grande parte dos cátions adsorvidos pelo solo são nutrientes que podem ser utilizados pelas plantas como por exemplo Ca2+, Mg2+ e K+. Logo, o aumento da matéria orgânica do solo pode melhorar a nutrição das plantas em virtude de uma maior disponibilidade de nutrientes adsorvidos no solo.


Veja também: CTC como atributo pedoindicador da matéria orgânica do solo.


Figura 2. Relação entre os teores de carbono orgânico (CO) e a CTC efetiva e a pH 7,0 de um Latossolo bruno. Os teores de carbono orgânico correspondem a valores médios (3 repetições) de sete camadas de solo, nos sistemas de plantio direto e preparo convencional.

Qual parte do solo contém mais matéria orgânica?
CIOTTA et. al, (2003).

Mas então, como melhorar a matéria orgânica do solo?

Primeiramente deve-se compreender algumas propriedades físicas, químicas e biológicas do solo que se está trabalhando, como porosidade, CTC, teor de argila e fauna edáfica. Deve-se enxergar a lavoura como um sistema de produção que exige planejamento a longo prazo. É importante aderir a práticas de manejo que não agridam a biologia e microbiologia do solo, tendo esses pequenos seres que à integram como parceiros na construção de um solo fértil, de boa infiltração e aeração.


Veja também: Equilíbrio dos nutrientes no solo: um dos segredos do sucesso?


É importante que se planeje a rotação de cultura da lavoura, podendo se utilizar da divisão por talhões para facilitar o manejo. Manter o solo coberto é fundamental, e a escolha por plantas de cobertura ou culturas de inverno que produzam considerável volume de palha pode auxiliar na melhoria da matéria orgânica do solo. Também é interessante rotacionar as plantas de cobertura, hora alternado entre leguminosas e gramíneas ou até mesmo utilizando de mixes de culturas para a cobertura do solo.

Aconselha-se a boa distribuição dos resíduos vegetais na colheita, e a adoção do sistema plantio direto. Em lavouras cujo sistema de plantio direto ainda não está implementado, é imprescindível que se trabalhe a fertilidade e pH do solo em profundidade antes da adoção do sistema para evitar futuros problemas. Em lavouras com declividade, a utilização de maiores volumes de palha é ainda mais importante para minimizar os danos causados pelo impacto da gota da chuva e erosão superficial, em alguns casos o uso de terraços é indispensável.

O aumento da matéria orgânica no solo não é uma tarefa fácil, demanda tempo, esforço e planejamento, mas é possível e pode trazer inúmeros benefícios ao sistema. Cabe agora avaliar seu sistema produtivo e analisar as possíveis alternativas que possibilitem o aumento da matéria orgânica no solo.

Referências:

CIOTTA et. al, Matéria orgânica e aumento da capacidade de troca de cátions em solo com argila de atividade baixa sob plantio direto. Ciência Rural, Santa Maria, v.33, n.6, p.1161-1164, 2003.

COSTA et. al, Aumento de matéria orgânica num latossolo bruno em plantio direto. Ciência Rural, Santa Maria, v.34, n.2, p.587-589, 2004.

DHALIWAL et. al, Dynamics and transformations of micronutrients in agricultural soils as influenced by organic matter build-up: A review. Environmental and Sustainability Indicators, 1-2, 2019.

FONTANA, A. Fracionamento da Matéria Orgânica e Caracterização dos Ácidos Húmicos e sua Utilização no Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Agronomia, Curso de Pós-Graduação em Agronomia e Ciência do Solo. Seropédica, RJ, abr. 2009.

Redação: Maurício Siqueira dos Santos – Eng. Agrônomo.

Qual solo tem mais matéria orgânica?

Portanto, em um solo argiloso, essa maior quantidade de cristais de argila promove a estabilização das moléculas de húmus (matéria orgânica), o que é mais difícil em um solo arenoso, com poucos cristais de argila. Por isso, há mais matéria orgânica em solos argilosos.

Qual das camadas do solo contém mais matéria orgânica?

A CAMADA MAIS SUPERFICIAL DO SOLO CONTÉM MAIS MATÉRIA ORGÂNICA, PORQUE NELA SE ACUMULAM RESTOS DE SERES VIVOS, AR E ÁGUA. AS PLANTAS FIXAM SUAS RAÍZES NO SOLO RETIRANDO ÁGUA E SUBSTÂNCIAS MINERAIS NECESSÁRIAS À SUA SOBREVIVÊNCIA.

Onde se localiza a matéria orgânica no solo?

Matéria orgânica pode ser definida como todo material (contendo carbono) vivo ou morto presente na superfície, ou incorporado ao solo, nos mais diferentes estágios de decomposição. A matéria orgânica morta, referida acima, corresponde aos restos mortais (resíduos) de quaisquer vegetais, animais e organismos do solo.

Qual o nome da parte orgânica do solo?

O húmus, responsável pela fertilidade do solo, é o nome dado a matéria orgânica de coloração escura que fica depositada nesse tipo de solo através das condições aeróbicas, ou seja quando há presença de oxigênio, por exemplo, nos animais vertebrados e invertebrados.