Qual é o papel da instituição analisada e seu ganho para o exercício democrático no Brasil?

    SISTEMA GLOBAL E DEMOCRACIA

    A democracia, o estado-nação e o sistema global* * Trabalho apresentado na Conferência "Aprofundando e Globalizando a Democracia", realizada em Yokohama, Japão, 17-22 de março de 1990.

    David Held** ** Tradução de Régis de Castro Andrade.

    Professor da Open University da Inglaterra

    Apenas ocasionalmente a democracia usufruiu o prestígio que tem hoje; sua ampla popularidade e a atração que exerce não tem mais que cem anos1 1 Agradeço os comentários feitos por Tony McGrew, Michelle Stanworth, John Thompson e Anthony Giddens a uma versão anterior deste trabalho. Tony McGrew orientou-me constantemente através da volumosa literatura sobre relações internacionais; suas críticas construtivas foram particularmente úteis. Os temas e argumentos deste artigo serão ampliados num trabalho a ser publicado brevemente, The Foundation of Democracy, Polity Press, Cambridge. . As revoluções ocorridas na Europa central e oriental no fim de 1989 e início de 1990 reforçaram um clima de celebração. A democracia liberal foi proclamada o agente do "fim da história": conflitos ideológicos, como já se disse, estariam sendo substituídos pela razão democrática2 2 Fukuyama, Francis. "The end of history? National Interest, verão 1989. . Um número cada vez maior de lutas políticas são travadas em nome da democracia, e um número cada vez maior de países são reformulados segundo moldes democráticos. Mas sob a epiderme do triunfo da democracia deparamo-nos com um aparente paradoxo: ao mesmo tempo em que o' "governo do povo" ganha novos defensores, a própria eficácia de democracia como forma nacional de organização política pode ser colocada em dúvida. As nações proclamam-se democráticas no momento mesmo em que mudanças no âmbito da ordem internacional comprometem a possibilidade de um Estado-nação democrático independente. À medida que, progressivamente, vastas áreas da atividade humana organizam-se em termos globais, aumentam as incertezas com respeito ao destino da democracia.

    No que segue eu exploro essa incerteza, concentrando-me nas relações entre a democracia e o sistema global. O trabalho começa por examinar alguns pressupostos da teoria democrática concernentes à relação entre "cidadãos" e "representantes", e analisa suas conexões com um entendimento questionável da soberania. Em seguida, ele trata do impacto de padrões cambiantes das interconexões globais nas decisões estatais. Continuando, apontam-se algumas das vias específicas pelas quais as políticas nacionais são afetadas pela interseção das forças nacionais e internacionais. Sobre esse pano de fundo, faço uma avaliação das formas cambiantes e dos limites da democracia. Embora o principal objetivo deste trabalho seja o de expor um certo número de problemas não resolvidos do pensamento democrático, ofereço, na conclusão, algumas observações construtivas sobre o novo significado da democracia no sistema global, e sobre como a teoria da democracia deve ser repensada de maneira a incorporar as redes internacionais de Estados e sociedades civis.

    PRESSUPOSTOS CORRENTES DA TEORIA DA DEMOCRACIA

    Ao longo dos séculos XIX e XX, aceitou-se, no centro da teoria da democracia liberal, um pressuposto relativo à relação "simétrica" e "congruente" entre os responsáveis pelas decisões políticas e os que, na outra ponta, "recebem" essas decisões. De fato, simetria e congruência, ao que se presume, estão presentes em dois pontos cruciais: primeiro, entre cidadãos eleitores que em princípio podem exigir dos governantes que prestem contas dos seus atos; segundo, entre o output (decisões, políticas etc.) dos que decidem e seus eleitores (ou seja, em última análise, "o povo" num dado território). Essas relações podem ser graficamente apresentadas como segue:

    Qual é o papel da instituição analisada e seu ganho para o exercício democrático no Brasil?

    No século XX, em particular, a teoria da democracia concentrou-se nos contextos organizacional e cultural dos procedimentos democráticos e nos efeitos desses contextos na operação da "regra da maioria". Do desenvolvimento da teoria do elitismo conservador nos trabalhos de Max Weber e Joseph Schumpeter à elaboração do pluralismo clássico nos escritos de Robert Dahl, ou à crítica dessas idéias nos escritos de marxistas contemporâneos, o foco da moderna teoria da democracia tem-se concentrado nas condições que promovem ou dificultam a vida democrática de uma nação3 3 Para uma avaliação crítica dessas teorias/ver o meu livro Models of Democracy, Polity Press, Cambridge, 1987, parte II. . Admite-se também, tanto na obra de teóricos quanto de críticos da moderna democracia, que "o destino de uma comunidade nacional" está, em grande medida, em suas próprias mãos, e que uma teoria satisfatória da democracia pode ser elaborada examinando-se as relações recíprocas entre "atores" e "estruturas" no Estado-nação4 4 É claro que houve exceções. Ver, por exemplo, Therborn, Goran, "The Pule of Capital and the Rise of Democracy", New Left Review, 103, maio/junho de 1977; Howard, Michael, War and the Liberal Conscience, Oxford University Press, Oxford, 1981 e Hinsley, F. H., Power and the Pursuit of Peace, Cambridge University Press, Cambridge, 1963. .

    As premissas subjacentes da teoria da democracia, em resumo tanto em sua versão liberal como na radical-são as seguintes: que as democracias podem ser tratadas essencialmente como unidades auto-suficientes; que as democracias são claramente separadas umas das outras; que as mudanças no âmbito de uma democracia podem ser explicadas em grande parte por referência às estruturas internas e à dinâmica das sociedades democráticas nacionais; e que a política democrática expressa, em última análise, a interação de forças operando no plano do Estado-nação.

    Como se sabe, nas últimas duas décadas, tanto a direita como a esquerda lançaram-se ao ataque do modelo liberal-democrático. Na visão da nova direita, a democracia liberal suscitou um enorme crescimento das burocracias públicas que congestionou o espaço da iniciativa privada e do exercício da responsabilidade individual. Esse argumento aparece em versões diferentes na literatura sobre o "governo sobrecarregado" e sobre a necessidade de "desestatizar" no Ocidente e, é claro, no Leste5 5 Ver por exemplo Brittan, S., "Can Democracy Manage an Economy?", in: The End of the Keynesian Era, ed. por Skidelsky, R., Martin Robertson, Oxford, 1977; e Nordhaus, W. D., "The Political Business Cycle", Review of Economic Studies, 42, 1975. Para uma resenha e discussão das questões envolvidas, ver o meu livro, Political Theory and the Modern State, Polity Press, Cambridge, 1989, artigos 4 e 6. . Na base de todos os argumentos da nova direita, porém, está a crença de que as relações entre os responsáveis pelas decisões e os que as "recebem" foram distorcidas pelo crescimento de grupos de pressão, lobbies específicos e instituições burocráticas de grande porte. Em seu conjunto, essas forças reduziram o potencial de "congruência" entre os que decidem e a cidadania, potencial esse que se realiza quando os governantes restringem-se aos requisitos do "Estado mínimo". Em outras palavras, a congruência pode ser aumentada se se dá maior latitude ao mercado, se se dá aos cidadãos eleitores maior espaço para que eles regulem suas próprias atividades, e se o Estado mínimo assegura um quadro estável de leis e regulamentos de molde a permitir aos indivíduos que tratem dos seus interesses sem excessiva interferência política. Vale a pena notar que alguns pensadores da nova direita insistem em que essa tese deve ser entendida em termos internacionais. Friedrich Hayek, em particular, ataca a preferência - manifestada com frequência por autores conservadores e por alguns liberais — por mercados nacionais e por Estados nacionais, argumentando que mercados não têm fronteiras nacionais6 6 Hayek, The Constitucion of Liberty Routledge and Kegan Paul, London, 1960, pp. 405-6. . Ele defende uma ordem de mercado baseada nos princípios do livre comércio e da regulamentação mínima. Para Hayek, a "congruência", em última análise, é uma característica de uma ordem internacional de mercado e de uma rede de Estados ultraliberais.

    A maior parte das críticas à democracia liberal da perspectiva da esquerda também refletia a preocupação com o aumento da congruência entre os representantes políticos e os cidadãos ordinários, através, nesse caso, da extensão dos mecanismos de responsabilidade democrática dos representantes face aos seus eleitores. A proposição segundo a qual o Estado é uma "autoridade independente" ou um "poder imparcial circunscrito", responsável perante a cidadania - proposição que está no centro da auto-imagem ou ideologia do Estado moderno7 7 Skinner, Quentin The Foundations of Modern Political Thought, Cambridge University Press, Cambridge, 1978, vol. 2, pp. 349 e ss. - seria, na visão de esquerda, fundamentalmente errada. Na opinião de pensadores como C. B. Macpherson e Carole Pateman, o Estado está inescapavelmente comprometido com a manutenção e reprodução das desigualdades da vida cotidiana, enviesando decisões em favor de interesses particulares8 8 Macpherson, C. B. The Life and Times of Liberal Democracy, Oxford University Press, Oxford, 1977; e Pateman, Carole, The Problem of Political Obligation: A Critique of Liberal Theory, 2ª. edição, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 171 e ss. . Em conseqüência, a base de sua pretensão à legitimidade e à lealdade específica dos cidadãos é questionada. Posto que o Estado não é, normalmente, nem "separado" nem "imparcial" com respeito à sociedade, tornam-se urgentes as questões da forma que deve assumir a democracia e de qual deve ser o alcance das decisões democráticas. Em várias formas de democracia participatória, em concepções republicanas da cidadania e na busca de .maior democratização do Estado e da sociedade civil, a ênfase recai na necessidade de tornar o processo político mais "responsivo" com relação a indivíduos e grupos, mais transparente e inteligível, mais aberto e mais sensível os desejos e necessidades heterogêneas do "povo"9 9 Ver por exemplo, Macpherson, C. B., The Life and Times of Liberal Democracy, cap. 5; Pateman, Carole, Participation and Democratic Theory, Cambridge University Press, Cambridge, 1970; Held, Models of Democracy, caps. 8 e 9; e Keane, John, Democracy and Civil Society, Verso, London, 1988. .

    Em resumo, os pressupostos da simetria e da congruência do modelo liberal democrático são questionados pela esquerda e pela direita mediante o argumento de que as relações que sustentam esse modelo são, em sua forma atual, insuficientemente simétricas e congruentes. Para aperfeiçoar organizações e instituições insuficientemente "responsivas", a direita propõe mais mercados e Estados mínimos; a esquerda recomenda a participação direta dos cidadãos na regulação das instituições-chave da sociedade (incluindo o local de trabalho e a comunidade local).

    SOBERANIA, POLÍTICA NACIONAL E INTERCONEXÃO GLOBAL

    Uma concepção inquestionada de soberania está no centro do debate a respeito da democracia liberal. Trata-se da soberania do Estado-nação10 10 Entre as honrosas exceções estão Laski, Harold, Studies in Law and Politics, George Allen and Unwin, London, 1932, pp. 237 é ss. ; e Figgis, John N., Churches in the Modern State, Longmans, Green and Co., Londori, 1913, pp-54-93- Ver também suas obras escolhidas (com G. D..H. Cole) in The Pluralist Theory of the State, ed. por Hirst, Paul, Routledge, London, 1989. . Presume-se que o Estado tem controle sobre seu próprio destino, sujeitando-se apenas a compromissos que deve assumir e a limites impostos pelos atores, agências e forças operando nos seus limites territoriais é evidente que a teoria da democracia dos séculos XIX e XX, tanto quanto a maioria das demais teorias sociais e políticas, geralmente consideram o mundo externo ao Estado-nação como um dado, sujeito à cláusula ceteris paribus11 11 Ver o meu Political Theory and the Modern State, artigo 8. . As visões mais influentes da mudança social e política presumem que os processos internos à sociedade estão na origem das transformações societais12 12 Dunn, John, "Responsability Without Power", no seu Interpreting Political Responsibility Polity Press, Cambridge, l990;:- e Giddens; Anthony, The Nation-State and Violence, Polity Press, Cambrige,1985. . As mudanças, presume-se, ocorrem por meio de mecanismos inerentes (built in), por assim dizer, às próprias estruturas de uma dada sociedade, os quais governam o seu desenvolvimento. O mundo putativamente "fora" do Estado-nação - a dinâmica da economia mundial, o rápido crescimento das ligações transnacionais e as grandes mudanças da natureza do direito internacional, por exemplo — é objeto de uma teorização mínima e suas implicações para a democracia não são pensadas.

    Os limites de uma teoria da política cujos termos são. referidos exclusivamente ao Estado-nação tornam-se evidentes a partir de considerações a respeito do alcance e da eficácia do princípio da "regra da maioria". A aplicação desse princípio está no centro da democracia ocidental: está na raiz das avaliações de mérito ou legitimidade das decisões políticas13 13 Ver Spitz, E., Majority Rule, Chatham House, Chatham, NJ, 1984. . Problemas a respeito dessas proposições surgem não apenas porque decisões tomadas pelos Estados-nação - ou por organizações quase-regionais ou quase-supranacionais como a Comunidade Europeia (CE), a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) ou o Banco Mundial - restringem o âmbito de decisões aberto a uma dada "maioria", mas também porque decisões de uma maioria afetam (ou afetam potencialmente) outros que não os próprios cidadãos que delas participam.

    Uma decisão contrária à localização de um aeroporto internacional próximo a uma capital por temor de afugentar os votos rurais locais, por exemplo, pode ter consequências desvantajosas para os passageiros de vôos internacionais de todo o mundo, os quais não têm, contudo, meios de se fazer representar diretamente no processo decisório14 14 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 283-4. . A decisão de construir uma usina nuclear próxima às fronteiras de um país vizinho será provavelmente tomada sem consulta aos que vivem no país ou nos países próximos. A decisão de permitir a construção de uma indústria química, ou uma indústria produtora de substâncias tóxicas ou nocivas, diretamente ou como subprodutos, pode contribuir para a produção de danos ecológicos-poluição, ameaça à camada de ozônio, aumento do "efeito estufa" - que ultrapassam as fronteiras nacionais delimitadoras da competência e responsabilidade dos que tomam decisões políticas desse tipo. Uma decisão governamental de poupar recursos mediante a suspensão de ajuda alimentar a um dado país pode estimular a súbita escalada de preços de produtos alimentares nesse país e contribuir diretamente para o agravamento da fome entre os pobres urbanos e rurais15 15 McHenry, D. F. e Bird, K. "Food bungle in Bangladesh", Foreign Policy, verão, 27, 1977; e Sobhan, R., "Politics of food and famine in Bangladesh", Economic and Political Weekly, 1º. dezembro, 1979. Uma decisão de um governo ocidental ou do leste de suspender ou aumentar a ajuda militar a uma facção política a um país distante pode influenciar decisivamente o resultado de uma guerra naquele país, ou levar a guerra a um novo patamar de violência16 16 Ver Leftwich, Adrian, Redefining Politics, Methuen, London, 1983. .

    A teoria moderna do Estado soberano supõe a idéia de uma "comunidade nacional de destino": uma comunidade que se governa a si própria e determina seu próprio futuro. Essa idéia é questionada fundamentalmente pela natureza do padrão de interconexões globais e pelas questões que devem ser enfrentadas pelo Estado moderno. As comunidades nacionais de modo algum "programam" com exclusividade as ações, decisões e políticas de seus governos e esses de modo algum simplesmente determinam o que é justo ou apropriado apenas para os seus cidadãos17 17 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, pp. 286 e ss. . Qualquer pressuposto simples da teoria da democracia de que as relações políticas são ou poderiam ser "simétricas" ou "congruentes" é inteiramente injustificado.

    Os exemplos mencionados acima da interconexão global das decisões e resultados políticos levantam questões centrais a respeito das categorias da teoria clássica da democracia e de suas variantes contemporâneas. A idéia de que o consenso legitima o governo e, de modo mais geral, o sistema estatal, era central para os liberais dos séculos XVII e XVIII, bem como para os liberal-democratas dos séculos XIX e XX. Enquanto os primeiros viam no contrato social o mecanismo original do consentimento individual, os segundos tomam as eleições como o mecanismo pelo qual o cidadão, periodicamente, confere autoridade ao governo para legislar e regular a vida econômica e social. Em versões mais radicais da democracia (entre outros, os modelos republicano e participatório) o consenso foi considerado condicional num processo que, idealmente, envolve cidadãos na criação direta das leis reguladoras da sua vida: segundo esse argumento, os cidadãos obrigam-se apenas em relação a um sistema de regras, leis e decisões que eles deram a si próprios18 18 Held, D., Models of Democracy, pp. 73-78, 254-262, 267-289. .

    Embora muitos liberais tenham evitado proclamar que, para ser "livres e iguais", os indivíduos devem ser soberanos, eles preocuparam-se, em seu trabalho, em descobrir as condições nas quais os indivíduos podem determinar e regular a estrutura da sua própria associação, e afirmaram, ao mesmo tempo, a enorme importância dessa questão. E embora diferentes tradições do pensamento liberal e democrático tenham interpretado de modo diverso as condições de possibilidade do consenso, elas concordaram na aceitação da idéia de que o "governo" é sustentado pelo consenso voluntário de pessoas livres e iguais. Para os democratas, desde o início o consenso foi o princípio indiscutível do governo legítimo19 19 Cf, Hanson, Russell L; "Democracy", in Political Innovation and Conceptual Chatige, eds. Terence Ball, James Farr and Russel L. Hanson, Cambridge University Press, Cambridge, 1989, pp. 68-69. " .

    A própria idéia de consenso, todavia, e a noção particular de que as bases relevantes do acordo voluntário são as comunidades de um território delimitado ou de um Estado, torna-se profundamente problemática tão logo a questão das interconexões nacionais, regionais e globais é levantada, e a natureza da chamada "comunidade relevante", contestada. Necessita-se o consenso de quem? Requer-se o acordo de quem? Quem deve participar justificadamente de decisões relativas à localização de um aeroporto ou de uma usina nuclear, por exemplo? Qual é a base de decisão (constituency) relevante? é a base local? Nacional? Regional? Internacional? Perante quem os responsáveis pelas decisões têm de justificar seus atos, e perante quem deveriam fazê-lo? A quem devem prestar contas, e a quem deveriam fazê-lo? O que acontece com a idéia de governo legítimo quando decisões que têm potencialmente conseqüências de vida ou morte são tomadas em unidades políticas nas quais grande número dos indivíduos afetados não tem efetiva participação democrática? O que acontece com a legitimidade quando o processo de governo, corrente ou extraordinário, gera consequências para indivíduos e cidadãos dentro e fora de um Estado-nação e quando apenas o consenso de algumas dessas pessoas é considerado pertinente na justificação das normas e das políticas? As fronteiras territoriais constituem os limites de inclusão ou exclusão dos indivíduos da participação em decisões que afetam suas vidas (não importa quão restritas essas últimas possam ser); mas ou resultados dessas decisões frequentemente estendem-se para além-fronteiras.

    As interconexões regionais e globais contestam a maneira tradicional de resolver no plano nacional questões centrais da teoria e da prática da democracia. O próprio processo de governo parece "escapar às categorias" do Estado-nação20 20 Cf. Laski, H., Studies in Law and Politics, pp. 262-275. . As implicações desse fenômeno são profundas, não só para as categorias do consenso e legitimidade, mas para todas as idéias-chave do pensamento democrático: a natureza da base político-territorial do processo político (constituency); o significado da responsabilidade das decisões políticas (accountability); a forma e alcance da participação política; e enfim, a relevância do Estado-nação como guardião dos direitos e deveres dos cidadãos no momento em que ele se vê às voltas com relações e processos nacionais e internacionais desestabilizadores.

    ESTADOS, FRONTEIRAS E POLÍTICA GLOBAL

    Seria possível objetar que não há nada de novo a respeito das interconexões globais, e que a significação dessas interconexões para a teoria da democracia é clara há muito tempo. O argumento poderia ser desenvolvido no sentido de mostrar que um denso padrão de interconexões globais começou a formar-se na fase inicial de expansão da economia mundial e de formação do Estado moderno.21 21 Ver Wallerstein, Immanuel, The Modern World-System, Academic Press, New York, 1974; e Anderson, Perry, Líneages of the Absolutist State, New Left B ooks, London, 1974. Como assinalou sucintamente um comentador, quatro séculos atrás "o comércio e a guerra já tinham começado a moldar todos os aspectos da política doméstica e o sistema internacional"22 22 Gaurevitch Peter, "The Second Image Reversed: The International Sources of Domestic Politics", International Organization, 32, 4, 1978, p. 908. . As políticas interna e internacional se entrelaçam ao longo da era moderna: a política interna sempre teve de ser compreendida sobre o pano de fundo da política internacional, e a primeira é com frequência a fonte da segunda. Tanto no caso de uma reflexão sobre a política dos reis nos séculos XVI ou XVII (sobre se o rei da França, por exemplo, deveria ser um católico ou um protestante) como no caso de tentarmos entender o padrão cambiante das rotas de comércio do leste ao oeste nos séculos XV e XVI (e de como daí resultaram mudanças da estrutura das cidades, dos contextos urbanos e do equilíbrio social) - nos dois casos o exame dos padrões de interdependência e interpenetração de fatores locais e internacionais parece inescapável23 23 Ibid, pp. 908-911. .

    Essas considerações aparecem de maneira concisa num estudo clássico da diplomacia na Europa, chamado On the Manner of Negotiating with Princes, publicado por Callieres em 1716. Ali se lê:

    "Para entender a utilização permanente da diplomacia, e a necessidade de contínuas negociações, temos de considerar os Estados de que se compõe a Europa como Estados vinculados por toda espécie de comércio necessário, de tal maneira que eles podem ser encarados como membros de uma República, seguindo-se daí que não pode haver mudanças consideráveis num deles que não afete as condições de existência, ou perturbe a paz de todos os demais. Um erro do menor dos soberanos pode introduzir o pomo da discórdia entre todas as grandes potências, pois não há Estado grande o bastante para dispensar, por desnecessárias, as relações com os Estados menores e o estabelecimento de amizades entre as diferentes partes das quais mesmo os Estados menores são compostos."24 24 Callieres, François de, On the Manner of Negotiating with Princes, trad. por A. F.Whyte, Uniyersity of Notre Dame Press, Notre Dame, 1963, p. 11.

    A interação complexa entre as forças e atores estatais e não-estatais não é um fenômeno recente: seria enganoso pensar que o pensamento político contemporâneo defronta-se com um conjunto inteiramente novo de circunstâncias25 25 Bull, Hedley, The Anarchical Society, Macmillan, London, 1977, pp. 278-80.

    De fato, os velhos teóricos da "sociedade internacional", como Grotius e Kant, tentaram entender o Estado precisamente no contexto da "sociedade de Estados"26 26 Ibid, cap. 1, e Hinsley, Power and the Pursuit of Peace, parte 1. Entre as primeiras e mais importantes obras sobre essa matéria estão Kant, I. "Idea for a Universal History with a Cosmopolitan Purpose"," 1784, e "Perpetual Peace", 1795, in Kant's Political Writings, ed. por Hans Reiss, Cambridge University Press, Cambridge; 1970. . Eles exploram as condições e requisitos para a coexistência e cooperação entre Estados, concentrando-se, em particular, na natureza e extensão das relações juridicamente reguladas. Esses pensadores forneceram um estímulo crucial ao desenvolvimento do direito internacional e à teoria política internacional. Infelizmente, porém, ao mesmo tempo em que sobreviveram no direito internacional e na teoria política internacional, elementos do seu trabalho perderam-se para a teoria do governo democrático tal como ela se desenvolveu nos séculos XIX e XX.

    Uma coisa, porém, é assinalar os elementos de continuidade na formação e estrutura do Estado e da sociedade modernos; outra coisa é supor que não há nada de novo a respeito de elementos da sua forma e dinâmica. Pois há uma diferença fundamental entre o desenvolvimento de uma rota de comércio que tem um certo impacto em cidades ou localidades rurais particulares, por um lado, e, por outro, uma ordem internacional envolvendo: a emergência de um sistema econômico global que escapa ao controle de qualquer Estado individual (mesmo que sejam Estados dominantes); a expansão de vastas redes de relações transnacionais e de comunicações sobre as quais Estados' individuais têm influência limitada; o enorme crescimento de organizações e regimes internacionais, bem como a intensificação da diplomacia multilateral e a interação transgovernamental, que pode opor contrapesos e limitar a latitude de ação dos Estados mais poderosos; o desenvolvimento de uma ordem militar global e a edificação de meios de guerra "total" como "características estáveis" do mundo contemporâneo que podem reduzir o espectro de políticas à disposição dos governos e seus cidadãos. Enquanto rotas de comércio podem ligar populações distantes em longos vínculos de causa e efeito, os desenvolvimentos modernos da ordem internacional ligam e integram povos através de redes de transação e coordenação, redefinindo a própria noção de distância.

    Com frequência, esses desenvolvimentos internacionais são considerados parte do processo de "globalização" ou, mais precisamente, da "globalização ocidental". Globalização, nesse contexto, envolve pelo menos dois fenômenos distintos. Em primeiro lugar, o termo sugere que a atividade política, econômica e social tem, cada vez mais, um alcance mundial. Em segundo lugar, ele sugere que os níveis de interação e interconexão entre os Estados e sociedades que formam a sociedade internacional têm-se intensificado27 27 McGrew, Tony, "Conceptualizing Global Politics", in Global Politics, 1 (1) (D312), The Open University, Milton Keynes, 1988, pp. 19-20. . A novidade no sistema global moderno é a intensificação crônica dos padrões de interconexão - mediados por fenômenos tais como a indústria moderna de comunicações e a nova tecnologia da informação - e a globalização em, e através de, novas dimensões de interconexão: tecnológica, organizacional, administrativa e legal, entre outras, cada uma delas caracterizada por sua lógica e dinâmica própria de mudança. O processo político, com sua dose costumeira de incerteza, contingência e indeterminação, desenvolve-se hoje contra o pano de fundo de um mundo "permeado e transcendido pelo fluxo de bens e de capital, pelo trânsito de pessoas, pelas comunicações aéreas, pelo tráfego aéreo e pelos satélites espaciais"28 28 Kegley, Charles W. e Wittkopf, Eugene R., World Politics, Macmillan, London, 1989, p. .511. .

    A significação desses desenvolvimentos do ponto de vista da forma e da estrutura da política nacional e internacional pode ainda ser examinada a partir de um argumento presente na literatura sobre globalização. Refiro-me ao que se denomina visão "transformacionista" ou "modernista", que descreve o processo através do qual a crescente interconexão global pode levar ao declínio ou crise da autonomia do Estado e à necessidade de que os Estados-nação cooperem e colaborem intensamente uns com os outros29 29 Ver Morse, Edward, Modernization and the Transformation of Internacional Relations, Free Press, New York, 1976; Mansbach, Richard, et al., The Web of Politics, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1976; Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., eds., Transnacional Relations and World Politics, Harvard Uniyersity Press, Cambridge, Mass, 1972; Rosenau, James N., The Study of Global interdependence, Francis Pinter, London, 1980; Soroos, Marvin S., Beyond Sovereignty University of South Carolina Press, Columbia, 1986. . Ao expor o argumento, eu não pretendo, de modo algum, simplesmente endossá-lo; pretendo, isso sim, esboçar questões e preocupações que, no mínimo, devem ser enfrentadas pela teoria da democracia. Por razões de brevidade, o argumento pode ser esquematicamente exposto como segue:

    1) Com o crescimento da interconexão global, o número de instrumentos políticos à disposição dos governos e a eficiência de certos instrumentos tendem a declinar marcadamente30 30 Ver Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5; e Cooper, Richard N., Economic Policy in an Interdependent World, MIT Press, Cambridge, Mass., 1986, pp. 1-22. . Desde logo, essa tendência deve-se ao desaparecimento de uma vasta gama de controles de fronteira antes utilizados para restringir os fluxos de bens e serviços, fatores de produção e tecnologia, bem como o intercâmbio cultural e de idéias31 31 Ver Morse, Edward, op. cit. . O resultado é a redução dos instrumentos políticos que permitiam ao Estado o controle de atividades realizadas dentro e fora do seu território.

    2) As opções que se oferecem aos Estados podem reduzir-se ainda mais devido à expansão de forças e interações transnacionais que reduzem e restringem a influência que os governos têm sobre a atividade dos seus cidadãos. O impacto do fluxo de capital privado através das fronteiras, por exemplo, pode ameaçar políticas governamentais antiinflacionárias, cambiais e outras.

    3) No contexto de uma ordem global altamente interconectada, muitas atividades e responsabilidades tradicionais do Estado (como a defesa, a administração da economia, as comunicações, os sistemas administrativos e legais) não podem ser realizadas ou assumidas sem o concurso da colaboração internacional. À medida que as demandas apresentadas ao poder público cresceram nos anos de pós-guerra, o Estado viu-se confrontado, cada vez mais, com problemas políticos que não podem ser resolvidos sem a cooperação de outros atores "estatais e não-estatais32 32 Ver Keohane, Robert O., After Hegemony, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1984; e McGrew, Tony, "Toward Global Politics?" in Global Polítics, 7 (30), pp. 12-20. .

    4) Em conseqüência, os Estados tiveram de aumentar o grau de integração política com outros Estados (na Comunidade Europeia, no Comecon ou na Organização dos Estados Americanos, por exemplo), e/ou aumentar as negociações, arranjos e instituições multilaterais para controlar os efeitos desestabilizadores que acompanham o desenvolvimento das interconexões (exemplos desse último ponto são o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Acordo Geral sobre Tarifas e sobre o Comércio (GATT) que, juntamente com outras agências internacionais, geraram, no pós-guerra imediato, um contexto organizacional para a administração econômica e para consultas internacionais).

    5) O resultado de todo esse processo foi um grande crescimento das instituições, organizações e regimes que constituíram a base do governo (governancé) global. (Dizer isso, é claro, não significa confundir tais desenvolvimentos com a emergência de um governo mundial integrado. Trata-se aqui de reter a diferença entre uma sociedade internacional que contém a possibilidade de cooperação política e de ordem, e um Estado supranacional que detém o monopólio dos poderes coercitivo e legislativo.) A nova política global - envolvendo, entre outras coisas, processos de tomada de decisão multiburocráticos no interior das burocracias governamentais e internacionais e entre elas; envolvendo processos políticos desencadeados por forças transnacionais e envolvendo, enfim, novas formas de integração multinacional entre Estados33 33 Kaiser, Karl, "Transnational Relations as a Threat to the Democratíc Process", in Transnational Relations and World Politics, eds. Keohane e Nye, pp. 358-360. - criou um quadro no qual e através do qual os direitos e obrigações, poderes e capacidades dos Estados foram redefinidos. As capacidades estatais foram ao mesmo tempo reduzidas e alargadas, permitindo ao Estado o cumprimento de uma série de funções que já não podem ser mantidas senão em conexão com relações e processos globais. As etapas desse argumento são descritas na figura 1 (ver na pg. seguinte).

    O que esses argumentos sugerem é que a significação dos processos atuais de decisão democrática tem de ser considerada no contexto de uma sociedade multinacional, multilógica e internacional, e no contexto de um enorme elenco de instituições já existentes ou em vias de nascer, regionais e globais, políticas econômicas e culturais, instituições essas que transcendem e mediam as fronteiras nacionais. As questões da natureza dessas organizações e entidades, da natureza de sua dinâmica política bem como da natureza da base à qual devem prestar contas (accountability) são questões urgentes. Ou, para dizer a mesma coisa com outras palavras, ao tomar o Estado-nação como um dado, e ao pensar os processos democráticos essencialmente dentro das fronteiras do Estado-nação, a teoria da democracia dos séculos XIX e XX contribuiu muito pouco para a compreensão de algumas das questões fundamentais com que se defrontam as democracias modernas e que dizem respeito ao destino da democracia no mundo moderno.

    A INTERCONEXÃO GLOBAL EM FACE DO SISTEMA DE ESTADOS

    Na perspectiva da globalização, o Estado liberal democrático é com frequência caracterizado como um Estado capturado na teia da interconexão global, permeado por forças supranacionais, intergovernamentais e transnacionais e incapaz de determinar seu próprio destino. A globalização é freqüentemente apresentada como uma força homogeneizadora, redutora da "diferença" e da capacidade dos Estados-nação de agir independentemente na articulação e busca de objetivos políticos domésticos e internacionais: o Estado-nação democrático territorial parece fadado ao declínio ou à crise34 34 Ver em particular, Morse, Edward, op. cit.; e Brown, S., New Forces, Old Forces and the Future of World Politics, Scott/Foreman, Boston, 1988. . Mesmo com a rápida expansão das conexões intergovernamentais e transnacionais, contudo, a era do Estado-nação de modo algum terminou. Ainda que o Estado-nação territorial tenha declinado, é preciso observar que esse é um processo desigual e em particular restrito ao poder e ao alcance dos Estados-nação dominantes do ocidente e do leste. A sociedade global européia alcançou seu ponto de máxima influência na virada do século XX, e a hegemonia americana caracterizou as décadas do pós-guerra. O declínio de uns e de outros não deve ser tomado como indício do declínio do sistema de Estados enquanto tal. Além disso, as mudanças recentes no Leste europeu regeneraram um aglomerado de Estados que afirmam sua independência e autonomia. Os "impérios clássicos" dos britânicos, franceses, holandeses, etc... praticamente desapareceram, e os "novos impérios" (surgidos depois da Segunda Guerra Mundial) são fortemente contestados.

    A "nacionalização" da política global é um fenômeno muito recente, e, ao que tudo indica é um processo que não terminou.35 35 cf. Modelski, George, Principies of World Politics, Free Press, New York, 1972; Herz, John H., The Nation-State and the Crisis of World Politics, McKay, New York, 1976, pp. 226-252; e Gilpin, Robert, War and Change in World Politics, Cambridge University Press, Cambridge, 1981. A importância do Estado-nação e do nacionalismo, da independência territorial e do desejo de estabelecer/retomar ou manter a "soberania" não parece ter diminuído. Algumas das crises regionais aparentemente mais renitentes não escapam à atração da soberania. O problema do Banco Ocidental; por exemplo, dificilmente pode ser equacionado sem referência à idéia de autonomia soberana36 36 Krasner, Stephen D., "Sovereignty": an Institucional Approach", Comparative Political Studies, 21, 1, 1988, p. 40. . Além disso, o "equilíbrio nuclear" ou "empate atômico" entre as superpotências criou uma situação paradoxal a que se tem denominado "indisponibilidade da força"; trata-se de uma situação em que se abrem novos espaços para a afirmação de potências e povos não-nucleares, a partir da constatação de que a opção nuclear dificilmente se oferecia às superpotências como uma opção factível e de que o custo de uma intervenção militar convencional faz desse tipo de intervenção uma colossal aposta política, militar e econômica37 37 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 234 e ss. . O Vietnã e o Afeganistão são exemplos óbvios desses riscos. Tais desenvolvimentos constituem poderosas pressões no sentido de um "mundo multipolar" e de uma ordem internacional fragmentada.

    Some-se a isso tudo o fato de que, ao invés de reforçar a idéia de um objetivo humano comum, a globalização nos campos da comunicação e da informação reforçou a importância da identidade e da diferença, estimulando portanto a "nacionalização" da política. Como notou, corretamente, um comentador,

    "a consciência de que outras nações existem, mesmo quando é 'perfeita', não apenas ajuda a remover conflitos imaginados de interesse ou de ideologia que não existem, mas revela conflitos de interesse e de ideologia que efetivamente existem"38 38 Bull, The Anarchical Society, p. 280.

    Uma conseqüência disso é a valorização, em muitos fóruns internacionais, de conceitos não-ocidentais de direitos, autoridade e legitimidade. O sentido de alguns dos conceitos centrais do sistema internacional são objeto de profundos conflitos de interpretação39 39 Ver Bozeman, Adda B., "The International Order in a Multicultural World", in The Expansion of International Society, eds. Hedley Bull e Adam Watson, Oxford University Press, Oxford, 1984. . As tentativas de criar uma "nova lei cosmopolita" regulando a cooperação e a conduta no campo das relações internacionais, inspiradas, em boa parte, na Carta das Nações Unidas, não foram, em termos gerais, bem sucedidas40 40 Ver Cassese, Antonio, "Violence, War and the Rule of Law in the International Comunity", nesse volume, e Vicent, R. J., Human Rights and International Relations, Cambridge University Press, Cambridge, 1986. Voltarei a essas questões adiante. . Embora os direitos humanos tenham sido consagrados em muitos tratados internacionais e regionais, as tentativas de efetivá-los no âmbito dos sistema global e através dele tiveram no máximo um sucesso muito limitado. O discurso dos direitos humanos hoje em dia pode refletir aspirações à consolidação de certas liberdades e direitos em todo o mundo, mas ele de forma alguma expressa um consenso a respeito da questão. Se o sistema global se caracteriza hoje por mudanças significativas, isso deve ser entendido menos como o fim da era dos Estados-nação que como um desafio à era dos "Estados hegemônicos"; um desafio, aliás, que está longe de desaparecer.

    Outro sinal claro da persistência do sistema de Estados é a resistência dos Estados em geral a submeter seus conflitos com outros Estados à arbitragem de uma "autoridade superior", seja ela a Organização das Nações Unidas, um tribunal internacional ou outra organização internacional. No centro dessa "grande recusa" está a preservação do direito dos Estados de declarar a guerra41 41 Hinsley, F. H., Sovereighty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 229-35. . O Estado moderno ainda é capaz, em princípio, de decidir sobre o aspecto mais fundamental da vida das pessoas: a questão da vida e da morte.

    Aqueles que anunciam o fim do Estado-nação presumem, com frequência, a erosão do poder do Estado em razão das pressões da globalização, e não percebem a persistente capacidade que têm os Estados de formular as orientações políticas nos planos doméstico e internacional. O grau de "autonomia" do Estado moderno em distintas condições não tem sido devidamente apreciado; em conseqüência, as bases para uma análise rigorosa e sistemática da forma e dos limites das modernas democracias são negligenciadas. Claramente, o impacto dos processos globais variam de acordo com as condições internacionais e nacionais. Mencionem-se, entre essas condições, a posição do Estado-nação no sistema internacional de divisão do trabalho, sua posição no âmbito de certos blocos de poder, sua posição com respeito ao sistema jurídico internacional e suas relações com as grandes organizações internacionais. O grau de integração dos Estados à economia mundial, por exemplo, é muito diferente; em conseqüência, em alguns países a política doméstica será fortemente influenciada pelos processos globais, enquanto em outros os fatores regionais ou nacionais serão sempre os fatores mais importantes.

    PODERES E DISJUNTIVAS

    A persistente vitalidade do Estado-nação não significa que a estrutura soberana dos Estados-nação individuais não tenha sido afetada pela interseção de forças e relações nacionais e internacionais: essa persistência sinaliza, antes, e provavelmente, padrões cambiantes de poderes e restrições. O alcance e a natureza exatos da autoridade soberana de Estados-nação individuais podem ser descritos mediante a observação de várias disjuntivas "internas" e "externas" entre, de um lado, a esfera formal da autoridade política que eles reivindicam para si e, de outro, as práticas e estruturas reais do Estado e do sistema econômico nos planos nacional, regional e global42 42 Parte do material desta seção foi adaptada do meu livro Political Theory and the Modern State, artigo 8. .

    O poder dos partidos políticos, das organizações burocráticas, das corporações e das redes de poder corporativo é uma força entre várias outras que influenciam a abrangência e o alcance das decisões que podem ser tomadas no âmbito do Estado-nação. No plano internacional, há disjuntivas entre a idéia de um Estado que em princípio é capaz de determinar seu futuro e a economia mundial, as organizações mundiais, as instituições regionais e globais, o direito internacional e as alianças militares que moldam e restringem as opções dos Estados-nação individuais. No que segue, tratarei das disjuntivas "externas"; a questão das disjuntivas "internas" envolve muitas questões que não podem ser tratadas neste trabalho43 43 Essas questões são discutidas no meu Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente. . Mesmo a enumeração das disjuntivas externas, devo dizer, é meramente ilustrativa; não é completa, nem sistemática. Pretendo apenas indicar em que medida a globalização de um certo número de dimensões centrais podem impor restrições ou limites à decisão política, e em que medida a possibilidade de uma sociedade democrática foi alterada.

    Ao avaliar o impacto das disjuntivas, importa levar em conta que a soberania é erodida apenas quando é deslocada por uma autoridade "superior" ou independente, que reduz o âmbito legítimo de decisão do Estado nacional. Por soberania entendo a autoridade política, no seio de uma comunidade, que detém o direito incontestado de definir o sistema de normas, regulamentos e políticas num dado território, e de governar de acordo com esse direito44 44 Held, Political Theory and the Modern State, p. 215. . A soberania deve ser diferenciada da "autonomia" estatal, ou seja, da capacidade real do Estado de agir independentemente na articulação e busca de objetivos políticos domésticos e internacionais45 45 Held e McGrew, " Globalization and the Advanced Industrial State", documento de pesquisa não publicado, Open University, Milton Keynes, 1989, p. 13. . Com efeito, a autonomia refere-se à capacidade do Estado-nação de agir independentemente das restrições internacionais e transnacionais, e de alcançar objetivos quando estes tenham sido fixados (pois num mundo inter-conectado, todos os instrumentos de política nacional podem ser menos eficazes). Tendo em mente essas distinções, é possível mostrar que as disjuntivas externas mapeiam uma série de processos que alteram a abrangência e a natureza das decisões que podem ser tomadas pelos governantes num dado terreno. A questão central a formular é esta: manteve-se intacta a soberania, ao passo que a autonomia do Estado reduziu-se, ou o Estado moderno perdeu em soberania? No enfrentamento dessa questão, retirarei a maior parte dos exemplos dos processos e relações próprias dos Estados europeus. É sobretudo do destino dos Estados da Europa que trato46 46 Uma comparação entre as experiências dos países europeus, e, por exemplo, dos Estados Unidos e dos países de industrialização recente seria muito ilustrativa. Mas essa comparação excederia os limites deste artigo. .

    DISJUNTIVA 1: A ECONOMIA MUNDIAL

    Há uma disjuntiva entre a autoridade formal do Estado e o sistema vigente de produção, distribuição e comércio que limita de várias maneiras o poder ou âmbito de ação das autoridades políticas nacionais47 47 Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., Power and Interdependence, Little, Brown, Boston, 1977; Gourevitch, "The second image reversed"; e Katzenstein, Peter J., ed., Between Power and Plenty: Foreign Economic Policies of: Advanced Industrial States, University of Wisconsin Press, Madison, 1978. .

    1. Dois aspectos dos processos econômicos internacionais são centrais: a internacionalização da produção e a internacionalização das operações financeiras. Esses processos são em parte organizados por companhias multinacionais em rápido crescimento. As companhias multinacionais (CMNs) planejam e implementam a sua produção, comercialização e distribuição por referência à economia mundial. Mesmo quando as CMNs têm uma clara base nacional, seu interesse está principalmente na lucratividade global, e seu país de origem pode ter pouca importância em sua estratégia de conjunto. Organizações financeiras como os bancos também se globalizam gradualmente em sua escala e orientação. Eles são capazes de acompanhar eventos em Londres, Tóquio e Nova York e de responder a eles quase instantaneamente. A nova tecnologia na área de informática aumentou radicalmente a mobilidade das unidades econômicas - moedas, estoques, ações, "futuros" e assim por diante - para organizações financeiras e comerciais de todos os tipos.

    2. Há muitas evidências de que o progresso tecnológico nas comunicações e transportes estão debilitando as fronteiras entre mercados que até há pouco eram separados - fronteiras essas que eram uma condição necessária para a realização de políticas econômicas nacionais independentes48 48 Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5. . Mercados e sociedades tornam-se mais sensíveis uns aos outros mesmo quando suas respectivas identidades são preservadas. A crise das bolsas de valores de outubro de 1987 é um óbvio exemplo disso. Reduz-se, portanto, a própria possibilidade de uma política econômica nacional. As políticas monetária e fiscal de governos nacionais individuais são frequentemente dominadas por movimentos nos mercados financeiros internacionais. Os níveis de emprego, investimento e renda num determinado país, da mesma forma, são muitas vezes subordinados a decisões das CMNs a respeito, entre outras coisas, da localização de suas unidades produtivas e administrativas49 49 Ver, por exemplo, Smith, R., "Political economy and Britain's external position", in Britain in the World, compilação do ESRC, London, 1987. .

    3. A globalização das relações econômicas alterou a possibilidade de aplicação de toda uma gama de políticas econômicas. Por exemplo: embora haja várias razões pelas quais o keynesianismo possa não funcionar hoje em dia, com certeza uma razão fundamental disso é o fato de que é muito mais difícil para os governos individuais administrar suas economias num contexto de divisão do trabalho e sistema monetário globais50 50 Cf. Giddens, Anthony, "Globalization, change and conflict", falta a referência no original, Gilpin, Robert, The Political Economy of International Relations, Princeton University Press, Princeton, 1987, pp. 345 e ss. ; Cox, Robert W., Production Power and World Order, Columbia University Press, New York, 1987, caps. 8 e 9; Ruggie, John G., "International regimes, transactions and change: embedded liberalism in the post-war economic order", International Organization, 36 (1982); Ruggie, J. G., ed., The Antonomies of Interdependence, Columbia University Press, New York, 1983; e Kolko, J., Restructing the World Economy, Pantheon, New York, 1988. . O keynesianismo funcionava bem no contexto de um sistema de "liberalismo consolidado" característico dos anos de pós-guerra; tal era o quadro operacional dos acordos econômicos, tanto - internacionais como nacionais, em todo o mundo ocidental.51 51 Ver Keohane, Robert O., "The world political economy and the crisis of embedded liberalism", in Order and Conflict in Contemporary Capitalism, ed. Goldthorpe,J.H. Oxford University Press," Oxford, 1984. Mas com o colapso do "consenso liberal" do pós-guerra, na esteira, entre outras coisas, da crise do petróleo de 1973, tornou-se mais difícil administrar a economia e resistir às tendências econômicas internacionais. Os impulsos e condicionamentos provenientes da economia internacional — incluindo, por exemplo, os mecanismos transmissores da inflação e da recessão, as mudanças dos termos de troca e a expansão contínua do capitalismo industrial na chamada periferia da economia internacional (Coréia do Sul, Taiwan e os demais países recentemente industrializados) — tornaram-se mais visíveis. A crescente interconexão das economias do mundo, por isso mesmo, foi aceita mais facilmente, em particular pelos governos que valorizavam o mercado como um, senão o, padrão fundamental do processo racional de tomada de decisão.

    4. É claro que a perda de controle sobre os programas econômicos racionais não afeta uniformemente o conjunto dos setores econômicos e, de modo geral, das sociedades; alguns mercados e alguns países podem isolar-se das redes econômicas transnacionais mediante, entre outras coisas, tentativas de restabelecer os limites ou a separação dos mercados e/ou de estender a leis nacionais a fatores móveis no plano internacional e/ou de adotar políticas de cooperação com outros países para a coordenação das políticas econômicas52 52 Cooper, Economic Policy in an Interdependent World, pp. 1-22; e Gilpin, The Political Economy of International Relations, pp. 397 e ss. . Além disso, a regionalização de setores da economia mundial, pela qual a atividade econômica concentra-se em torno de um certo número de pólos (entre os quais o Mercado Comum Europeu, os Estados Unidos e a Bacia do Pacífico e o Japão), proporciona alguma margem de manobra para a regulação das tendências de mercado. As tensões específicas entre as estruturas políticas e econômicas provavelmente são diferentes em diferentes esferas, e entre elas: oeste-oeste, norte-sul, leste-oeste. Não se pode, em conseqüência, simplesmente dizer que a própria idéia de economia nacional está superada. Não há dúvida, contudo, de que a internacionalização da produção das finanças e de outros recursos econômicos reduz a capacidade dos Estados individuais de controlar seu próprio futuro econômico. No mínimo assistimos a uma diminuição da autonomia do Estado, e a uma disjuntiva entre a idéia de um Estado soberano capaz de determinar seu próprio futuro e as condições de funcionamento das modernas economias, caracterizadas pela intersecção de forças econômicas nacionais e internacionais.

    DISJUNTIVA 2: ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

    Uma segunda grande área de disjuntiva entre a teoria do Estado soberano e o sistema global contemporâneo é a vasta gama de organizações e regimes internacionais estabelecida para administrar setores inteiros da atividade transnacional (comércio, os oceanos, o espaço, e assim por diante). O crescimento do número dessas novas formas de associação política reflete a rápida expansão das ligações transnacionais53 53 Ver Luard, Evan, International Agencies: The Emerging Framework of Interdependence, Macmillan, London, 1977; Krasner, Stephen, International Regimes, Cornell University Press, Ithaca, NY., 1983- Em 1909 havia 37 organizações intergovernamentais e 176 organizações internacionais não-governamentais. Os números para 1984 eram, respectivamente, 280 e 4.615. .

    1. O desenvolvimento das organizações internacionais e transnacionais levou a importantes mudanças na estrutura das decisões políticas mundiais. Foram estabelecidas novas formas de política multinacional e, com elas, novas formas de decisões coletivas envolvendo Estados, organizações intergovernamentais e uma variedade de grupos de pressão transnacionais.

    2. No espectro dás agências e organizações internacionais encontram-se algumas que tratam, primariamente, de questões técnicas: a União Universal de Correios, a União Internacional de Telecomunicações, a Organização Mundial de Meteorologia e muitas outras organizações. Essas agências tendem a trabalhar com eficiência e a levantar poucas controvérsias, complementando, na maior parte dos casos, os serviços oferecidos pelos Estados-nação individuais54 54 Burnheim, John, "Democracy, nation-states and the world system", in New Forms of Democracy, eds. Held, David, e Pollitt, Christopher, Sage, London, 1986, p. 222. . Elas não envolvem excepcionalidade política, visto que suas tarefas foram precisamente delimitadas. Nó polo oposto, encontram-se organizações como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a Unesco e as Nações Unidas. Envolvidas com questões mais centrais da administração e alocação de normas e recursos, essas organizações sempre foram altamente controvertidas e politizadas. Diferentemente do que ocorre com as agências técnicas, de menores dimensões, essas organizações estão no centro de um contínuo conflito em torno do controle de políticas55 55 Ibid., pp. 220 e ss. . Mesmo que o modo de operar dessas agências tende a variar, todas elas se beneficiaram ao longo dos anos de uma certa "consolidação da autoridade" investida em alguns poderes decisivos de intervenção.

    3. As operações do Fundo Monetário Internacional constituem um caso interessante. Implementando uma certa orientação de política econômica, o FMI pode insistir em que um certo governo corte suas despesas, desvalorize sua moeda e reduza seus programas subsidiados de bem-estar como condição para a concessão de empréstimos. No Terceiro Mundo, isso pode deflagrar uma onda de saques em busca de alimentos, ou a queda de um governo, ou ainda contribuir diretamente para a imposição da lei marcial56 56 Cf. Harris, Lawrence, "Governing the world economy: Bretton Woods and the IMF", in The State and Society, 6 (26) (D209), The Open University, Milton Keynes, 1984; e Girvan, N., "Swallowing the IMF medicine in the seventies", Development Dialogue, 2, 1980. . É preciso ter em mente que a intervenção do FMI é rotineiramente motivada pela solicitação das autoridades governamentais ou grupos políticos particulares no interior dos Estados, e com frequência resulta do reconhecimento de que o espaço para políticas nacionais independentes é mínimo; aquela intervenção, portanto, não pode ser diretamente considerada como uma ameaça à soberania. Não obstante, gerou-se uma grande tensão entre a idéia do Estado soberano - centrado na política nacional e nas instituições políticas - e a natureza das decisões no plano internacional. Essas últimas levantam sérias questões a respeito das condições sob as quais uma comunidade torna-se capaz de definir suas próprias políticas e orientações, dados os condicionamentos da ordem econômica internacional e a vigência de normas operacionais emanadas de agências como o FMI.

    4. A Comunidade Européia é outro exemplo importante das questões postas pelas organizações internacionais. Sua significação, porém, ultrapassa a de qualquer outra organização em razão do seu direito de elaborar leis que devem ser obedecidas pelos Estados membros. Mais de que qualquer outra agência internacional, ela merece a designação "quase-supranacional". Entre as instituições da Comunidade, o Conselho de Ministros tem uma posição única, pois dispõe de poderosos instrumentos legais (sobretudo os "regulamentos", as "diretivas" e as "decisões") que lhe permitem elaborar e implementar políticas. Desses instrumentos, os regulamentos são os mais importantes porque têm o estatuto de leis independentemente de qualquer outra negociação ou ação por parte dos Estados membros. Conseqüentemente, os Estados membros da Comunidade Européia já não são os únicos centros de poder no interior de suas fronteiras57 57 Ver Wickham, Ann, "States and political blocs": the EEC", in The State and Society, 6 (28) (D209); e Hoffmann, Stanley, "Reflections on the nation-state in Western Europe today", Journal of Common Market Studies, XXI (1 and 2), 1982. . . Por outro lado, convém ter presente que os poderes da Comunidade foram obtidos pela "rendição voluntária" de aspectos da soberania por parte dos Estados membros: uma "rendição" que, demonstravelmente ajudou na sobrevivência dos Estados-nação europeus face à dominância dos Estados Unidos nas três décadas que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, e face ao desafio econômico do Japão. Em suma, como muitas outras organizações internacionais, a Comunidade Européia oferece oportunidades e limitações. Os Estados membros detêm o poder geral, e, em última instância, com respeito a muitas áreas da sua política interna e externa, e a Comunidade ela própria parece ter fortalecido esse poder em algumas daquelas áreas. Contudo, a soberania é hoje claramente dividida no âmbito da Comunidade. Qualquer concepção de soberania que a tome como uma forma indivisível, ilimitada, exclusiva e perpétua do poder público está morta.

    DISJUNTIVA 3: O DIREITO INTERNACIONAL

    O desenvolvimento do direito internacional submeteu indivíduos, governos e organizações não-governamentais a novos sistemas de regulação legal.O direito internacional reconheceu poderes e limitações, direitos e deveres que transcendem os Estados-nação, e que, mesmo não sendo garantidos por instituições dotadas de poder coercitivo, têm consequências de grande alcance.

    1. Há duas regras jurídicas que, desde o início da comunidade internacional, serviram para sustentar a soberania nacional: a "imunidade de jurisdição" e a "imunidade das agências estatais". A primeira estipula que "nenhum Estado pode ser processado em tribunais de outro Estado em razão de atos praticados no exercício da sua soberania". De acordo com a segunda, "se um indivíduo viola a lei de outro Estado enquanto agente de seu país de origem e for por isso processado, ele não será considerado 'culpado' porque não. agiu como indivíduo privado mas como representante do Estado"58 58 Cassese, Antonio, Violence and Law in the Modern Age, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 150 e ss. , o propósito subjacente dessas regras é proteger a autonomia dos governos em tudo o que diz respeito à política externa e impedir os tribunais de cada país de decidir sobre o comportamento de Estados estrangeiros (presumindo-se que todos os tribunais domésticos em todos os países serão igualmente impedidos de fazê-lo). O resultado do respeito a essas normas tem sido, tradicionalmente, o de liberar os governos para a promoção de seus- interesseis, ficando eles subordinados apenas às limitações da "arte da política". É notável, contudo, que esses sustentáculos legais, internacionalmente reconhecidos, da soberania, tenham sido cada vez mais questionados por tribunais ocidentais; e embora a soberania nacional tenha com frequência saído vitoriosa, a tensão entre soberania e direito internacional é atualmente muito clara, e não se sabe como se resolverá. No quadro jurídico da Comunidade Européia, essa tensão evoluiu para uma "crise"; com a aprovação da Lei Européia única (Single European Act), que substituiu a unanimidade pelo "voto de maioria qualificada" no Conselho de Ministros para um número significativo de questões, o lugar da soberania nacional não está mais assegurado59 59 Ver Noel Emile, "The Single European Act", Government and Opposition, 1989, especialmente pp. 10-11. .

    2. Entre todas as declarações de direito do pós-guerra, a Convenção Européia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (1950) merece menção especial60 60 Ver Negro, J., "International institutions", in Democractic Government and Politics, 4 (13) (D308), The Open University, Milton Keynes, 1986. . Em nítido contraste com a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas (1947) e outras cartas subsequentes das Nações Unidas, a Convenção Européia preocupou-se, tal como indicado no seu preâmbulo, em "dar os primeiros passos na direção da imposição coletiva (collective enforcement) de certos direitos da Declaração de Direitos das Nações Unidas" (ênfase do autor). A iniciativa européia comprometia-se com a inovação legal mais notável e mais radical: uma inovação que em princípio permitiria aos cidadãos acionar seus próprios governos. Os países europeus já aceitaram uma cláusula (opcional) da Convenção que permite aos cidadãos pleitear diretamente junto à Comissão Européia de Direitos Humanos, que pode levar pendências ao Comitê de Ministros do Conselho Europeu e daí (com a aprovação de dois terços do Conselho) ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Embora o sistema ainda seja complicado e problemático de vários pontos de vista, considera-se que, em conjunção com outras mudanças legais introduzidas pela Comunidade Européia, ele já não concede aos Estados "a liberdade de tratar seus cidadãos como lhes pareça melhor"61 61 Capotorti, F., "Human rights: the hard road towards universality", in The Structure and Process of International Law, eds. Macdonald, R. St. J., e Johnson, D.M.Martinus Nijhoff, The Hague, 1983. Na Grã-Bretanha, por exemplo, a lei sobre grampeamento de telefones foi alterada em razão da intervenção da Comissão Européia, e as descobertas do Tribunal Europeu de Justiça levaram a mudanças na legislação britânica sobre várias questões tão importantes como discriminação sexual e igualdade salarial. .

    3. O hiato entre a idéia de associação a uma comunidade nacional, isto é, de cidadania, que tradicionalmente atribui aos indivíduos tanto direitos quanto deveres, e a criação no direito internacional de novas formas de liberdades e obrigações, é exemplificado também pelos resultados dos julgamentos pelo Tribunal Internacional de Nuremberg. O Tribunal estabeleceu, pela primeira vez na história, que quando normas internacionais que protegem direitos humanos básicos entram em conflito com as leis do Estado, cada indivíduo deve transgredir as leis do Estado (exceto quando não há possibilidades de "escolha normal")62 62 Casesse, Violence and Law in the Modern Age, p. 132. . O quadro jurídico do Tribunal de Nuremberg assinalou uma mudança altamente significativa na orientação legal do Estado moderno, pois as novas normas questionaram o princípio da disciplina militar e subverteram a soberania nacional num dos seus pontos mais sensíveis: as relações hierárquicas entre os militares:

    4. O direito internacional é "um vasto e cambiante corpus de normas e quase-normas que lança as bases da coexistência e da cooperação na ordem internacional. Tradicionalmente, o direito internacional identificou e sustentou a idéia de uma sociedade de Estados soberanos como o "supremo princípio normativo" da organização política da humanidade63 63 Bull, The Anarchical Society, pp. 140 e ss. . Nas últimas décadas, a matéria, alcance e fonte do direito internacional foram contestados, e fortaleceu-se uma opinião contrária à doutrina de que o direito internacional é e deve ser um "direito entre Estados, apenas e exclusivamente"64 64 Ver Oppeheim, L., International Law, vol. 1. Longmans, London, 1905,cap. 1. . No âmago dessa mudança está um conflito entre proposições em favor do sistema de Estados e proposições em favor de um princípio alternativo organizador da ordem mundial: em última análise, uma comunidade cosmopolita. Mas esse conflito está longe de ser resolvido, e o ressurgimento de movimentos tais como o Islã, bem como a renovada intensidade de muitas lutas nacionalistas indicam que os argumentos em favor de uma comunidade cosmopolita podem ter sido, no mínimo, apressadamente apresentados.

    DISJUNTIVA 4: POTÊNCIAS HEGEMÔNICAS E BLOCOS DE PODER

    Há uma outra disjuntiva envolvendo a idéia do Estado como um ator autônomo, estratégico e militar, por um lado, e, por outro, o sistema global de Estados caracterizado pela existência de grandes potências e blocos de poder, que às vezes debilita a autoridade e a integridade do Estado.

    1. A dominância dos Estados Unidos e da União Soviética como potências mundiais, e a existência de alianças como a OTAN e o Pacto de Varsóvia limitaram a capacidade de decisão de muitos Estados depois da guerra. A capacidade de um Estado tomar a iniciativa de uma certa política externa, perseguir certos interesses estratégicos, escolher entre tecnologias militares alternativas e controlar certos sistemas de armamentos localizados no seu território - essa capacidade pode ser restringida pela sua posição no sistema internacional de relações de poder65 65 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 230-233; ver . também . Kaldor, Mary e Falk, Richard A.eds., Dealignment, Basil Blackwell, Oxford, .1987. .

    2. Na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), por exemplo, pode-se descobrir claras evidências do que se poderia denominar a "internacionalização da segurança" na sua estrutura de comando militar unificada e integrada. Desde que a OTAN foi criada, no fim dos anos 40, seu objetivo de segurança coletiva teceu delicados vínculos entre, de um lado, a manutenção de uma organização de Estados soberanos (que em princípio permite a um Estado membro individual não agir se tal lhe parece mais apropriado) e, de outro, o desenvolvimento de uma organização internacional que de facto, se não de jure, opera segundo sua própria lógica e seus próprios procedimentos de decisão. A existência de uma estrutura de comando integrada supranacional — chefiada pelo Supremo Comandante Aliado na Europa, que sempre foi um general americano nomeado pelo presidente dos Estados Unidos -garante que, numa situação de guerra, os "exércitos nacionais" da OTAN operariam no âmbito de estratégias e decisões desta última66 66 Smith, Dan, "States and military blocs: Nato", 6 (27) (D209), p. 131 . A soberania de um Estado nacional é decisivamente qualificada no momento em que suas forças armadas envolvem-se num conflito da esfera da OTAN.

    3. Mesmo sem esse envolvimento, a autonomia e a soberania do Estado podem ser limitadas, pois a atuação da OTAN implica rotineiramente a integração das burocracias nacionais de defesa em organizações internacionais de defesa. Estas, por sua vez, criam sistemas transgovernamentais de decisão que podem escapar ao controle de qualquer Estado membro individual. Tais sistemas podem levar, ademais, ao estabelecimento de redes ou coalizões de pessoal transgovernamentais, poderosas embora informais, que são difíceis de acompanhar através de mecanismos nacionais de cobrança e de controle67 67 Cf. Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process"; e Richelson J. e Ball, D., The Ties that Bind, Allen and Unwin, London, 1986. .

    4. A associação à OTAN não cancela a soberania; antes, ela qualifica de diferentes maneiras a soberania com respeito a cada Estado. Nenhuma descrição da OTAN, por breve que seja, poderia omitir o fato de que seus membros são também rivais, competindo por recursos escassos, contratos de armamentos, prestígio internacional e outros meios de promoção nacional. Aspectos da soberania são negociados através da aliança da OTAN. (No momento em que este trabalho está sendo redigido, tudo leva a crer que, se o Pacto de Varsóvia sobreviver, ele será remodelado de acordo com o modelo da OTAN.)

    A DEMOCRACIA E O SISTEMA GLOBAL

    A ordem internacional, e com ela o papel do Estado-nação, está mudando. Ainda que um padrão complexo de interconexões globais já tenha sido observado há bastante tempo, não há dúvidas de que houve, recentemente, um aumento da internacionalização das atividades domésticas e uma intensificação dos processos de decisão em contextos internacionais68 68 Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process", p. 370. . É certamente muito forte a evidência de que as relações internacionais e transnacionais debilitaram os poderes do moderno Estado soberano. Os processos globais afastaram sensivelmente a política das atividades cristalizadas em primeiro lugar e principalmente em torno de objetivos estatais ou interestatais.

    As "disjuntivas" revelam um conjunto de forças que se combinam para limitar a liberdade de ação de governos e Estados ao tornar menos nítidas as fronteiras da política doméstica; ao transformar as condições do processo de decisão; ao modificar os contextos institucional e organizacional das comunidades políticas nacionais; ao alterar o arcabouço jurídico e as práticas administrativas dos governos e ao obscurecer as linhas de responsabilidade e prestação de contas (accountability) dos próprios Estados nacionais. A observação apenas desses processos permite dizer que operando num sistema internacional cada vez mais complexo, os Estados têm ao mesmo tempo sua autonomia limitada e sua soberania afetada. Qualquer concepção de soberania que a tome como uma forma ilimitada e indivisível de poder público, portanto, está posta em questão. A soberania, tal como ela deve ser concebida hoje em dia, já se divide entre um certo número de agências - nacionais, regionais e internacionais - e é limitada pela própria natureza dessa pluralidade.

    Em consonância com esses desenvolvimentos, o significado e o lugar da democracia devem ser repensados em relação a uma série de estruturas e processos locais, regionais e globais que em parte se recobrem. Pois é essencial dar-se conta de pelo menos as consequências centrais da globalização: em primeiro lugar, da maneira pela qual os processos de interconexão econômica, política, legal e militar, entre outras, estão modificando por cima a natureza do Estado soberano; em segundo lugar, da maneira pela qual os nacionalismos locais e regionais estão erodindo os Estados-nação por baixo; e em terceiro lugar, da maneira pela qual a interconexão global cria cadeias de decisões políticas e resultados interligados entre os Estados e seus cidadãos que alteram a natureza e a dinâmica dos próprios sistemas políticos nacionais. A democracia tem de acertar contas com esses três desenvolvimentos e suas implicações para os centros de poder nacionais e internacionais.

    Mesmo que a teoria da democracia já não possa ser elaborada tão-somente como teoria da comunidade política territorialmente delimitada, o Estado-nação não pode ser posto de lado como um ponto de referência central. Os processos globais não podem ser exagerados a ponto de eclipsar inteiramente o sistema de Estados ou de confundir-se simplesmente com a emergência de uma sociedade mundial integrada69 69 Ruggie, J. G., "Human rights and the future international comunity", Daedalus, 112,4, 1983. . Estados podem ter aberto mão de alguns direitos e liberdades, mas ao longo do mesmo processo obtiveram e ampliaram outros. Além disso, parece claro que uma descrição geral do impacto da globalização tem de ser qualificado com respeito a diferentes padrões de desenvolvimento local e regional. O que se necessita, em resumo, não é uma teoria do Estado ou uma teoria da ordem internacional, mas uma teoria do lugar cambiante do Estado democrático no contexto da ordem internacional.

    Como poderemos entender a democracia num mundo de autoridades políticas independentes e interdependentes? Não é verdade que um sistema de estruturas interligadas de autoridade, criando demandas potencialmente conflitantes, ameaça as bases do Estado moderno como uma ordem impessoal, uma ordem jurídica privilegiada e como uma ordem constitucional - como uma estrutura de poder circunscrita com jurisdição suprema num território e responsável a um corpo determinado de cidadãos?70 70 Cf. Skinner, The Foundations of Modern Political Thought, vol. 2, pp. 353-8. Poderá a própria idéia de comunidade ou Estado democrático manter-se, especialmente se as áreas de interconexão crescerem entre, digamos, o governo do Reino Unido, a Comunidade Européia, as organizações governamentais internacionais e as estruturas legais internacionais?

    Fazendo uma extrapolação a partir das tendências atuais e projetando-as na forma de um tipo-ideal, não seria por demais fantasioso imaginar, como observou Hedley Bull, o desenvolvimento de um sistema internacional que é a contraparte moderna e leiga do tipo de organização política que existia na Europa cristã da Idade Média, cuja característica essencial era "um sistema de autoridades que se recobriam de múltiplas lealdades"71 71 Bull, The Anarchical Society, p. 254. . Nos termos de Bul:

    "Na Cristandade ocidental da Idade Média (...) nenhum governante era soberano no sentido de absoluta supremacia sobre um dado território e um dado segmento da população cristã; ele tinha de partilhar a autoridade com os vassalos, abaixo dele, e com o Papa e (na Alemanha e na Itália) com o Imperador Romano, acima (...). Se os Estados modernos chegassem a repartir sua autoridade sobre os seus cidadãos e a sua capacidade de ganhar-lhes a lealdade com autoridades mundiais e regionais, por um lado, e com autoridades subestatais ou subnacionais, por outro, a ponto tal que o conceito de soberania deixasse de ser aplicável, então seria possível dizer que uma forma neomedieval de ordem política universal teria emergido"72 72 Ibid., pp. 254-5. .

    Não sou de opinião que a soberania nacional no mundo atual, mesmo em regiões onde há estruturas de autoridade superpostas e divididas, tenha sido subvertida. Longe disso. Mas faz parte do meu argumento a proposição de que existem áreas e regiões onde se observam lealdades cruzadas, interpretações conflitantes sobre direitos e deveres e estruturas de autoridade interligadas, que deslocam a noção de soberania como uma forma de poder público ilimitado, indivisível e exclusivo. Mesmo que concentrações maciças de poder formem-se e reformem-se no interior de muitos Estados (especialmente nos seus aparatos de coerção e de administração), tais concentrações com frequência apóiam-se sobre domínios fragmentados de autoridade política, e articulam-se com eles.

    Tal sistema, ademais, poderia reivindicar várias vantagens, especialmente se se cristalizasse numa forma de organização política universal — uma ordem internacional "neomedieval": notadamente, a vantagem de fornecer mecanismos institucional para o convívio pacífico de grandes populações e para evitar, por um lado, os perigos típicos e os "continuados ciúmes" (Hobbes) do sistema de Estados, e por outro o risco de enorme concentração de poder que poderia acompanhar um sistema de "governo mundial". Mas nada garante que tal sistema seria mais ordeiro, seguro, responsável e legítimo que formas anteriores de organização política - talvez até menos, de todos os pontos de vista.

    Poderia ser menos ordeiro e seguro porque, vale lembrar, o acordo no sentido de tolerar diferenças de crença e de ideologia foi um princípio constitutivo do moderno sistema de Estados. Este desenvolveu-se precisamente no contexto dos cismas e terríveis conflitos que dominaram a Europa desde o início da Reforma73 73 Ibid., p. 248, e ver o meu livro Models of Democracy, pp. 36-41. . Era um sistema de estruturas superpostas de autoridade e de lealdades conflitantes, que constituía a condição crítica de fundo para o nascimento do Estado moderno. Este último emergiu, em parte, como solução conceitual e institucional dada aos conflitos e turbulências criados pelo sistema anterior. Como poderíamos justificar a idéia de que um novo medievalismo secular poderia sustentar e defender o princípio da tolerância? Como, conceitual e institucionalmente, um sistema de "soberania dividida" manteria a ordem e forneceria um corpo de normas e procedimentos para sustentar a tolerância? Se o moderno Estado secular foi a solução conceitual e institucional de demandas, reivindicações e interesses conflitantes de governantes e governados, qual seria - se é que se pode pensar em alguma -sua contraparte num sistema político no qual o Estado territorial tem de partilhar sua "autoridade exclusiva" com outras organizações e agências?

    Além disso, haverá razões para pensar que o sistema de estruturas de autoridades superpostas, mesmo onde ele já existe, é mais sujeito a controles (accountable) que os modelos democráticos tradicionais com seus mecanismos de controle, isto é, as instituições e práticas da democracia representativa? A democracia representativa tem sido defendida como a inovação institucional chave para sustentar ao mesmo tempo a autoridade e a liberdade: o dilema de como assegurar o poder soberano do Estado e definir ao mesmo tempo limites estritos para esse poder pode ser resolvido, segundo os líberal-democratas, através do reconhecimento da igualdade política dos indivíduos adultos e da outorga a eles do direito de voto74 74 Para uma discussão desse dilema, ver o artigo 1, "Central perspectives on the modern state", do meu livro Political Theory and the Modern State, pp. 11-51. . Mas qual seria - se é que existe algum - o mecanismo equivalente num sistema de soberania dividida? Se a eficácia do sistema da democracia está sendo tensionado e debilitado pela interconejcão global, que mecanismos poderiam assegurar o controle sobre os governantes e a responsabilidade destes na nova ordem internacional? O desafio que a interconexão nacional e internacional das decisões e resultados apresenta à idéia e à coerência da democracia, por um lado, e os limites impostos aos controles que as nações têm sobre seu destino e que os cidadãos têm sobre suas instituições, pela teia de organizações e redes regionais e globais emergentes, por outro, levantam questões urgentes sobre a natureza das organizações e forças que estão colocando esse desafio; em outras palavras, é preciso saber a quem prestam contas organizações tão diversas quanto empresas multinacionais, o FMI e a OTAN. Mesmo que certos mecanismos proporcionem um certo grau de controle de algumas dessas organizações - as multinacionais prestam contas aos acionistas, o FMI e a OTAN aos Estados membros - a natureza da sua responsabilidade, se é que ela existe, perante os cidadãos comuns dos Estados-nação na qual elas operam ou perante os vários grupos afetados por elas além das fronteiras de um dado Estado, permanece uma questão aguda e urgente.

    Ademais, disso, se é possível questionar as bases democráticas das organizações e das forças da ordem internacional, pode-se, da mesma forma, questionar sua legitimidade. Como já se observou, o princípio do consenso, que se manifesta no princípio do governo da maioria, tem sido o princípio subjacente da legitimidade nas democracias ocidentais. O argumento apresentado neste trabalho sugere não apenas que as decisões rotineiras e extraordinárias dos representantes das nações e Estados-nação afetam profundamente os cidadãos de outros Estados-nação — que muito provavelmente não tiveram a ocasião de dar ou negar o seu consentimento — mas também que a ordem internacional é estruturada por agências e forças sobre as quais os cidadãos têm um controle mínimo, se é que têm algum, e a respeito das quais os cidadãos não tem como sinalizar seu acordo ou desacordo. Nas democracias ocidentais, tradicionalmente a legitimidade é estreitamente relacionada a princípios e procedimentos democráticos; a evolução recente da Europa do Leste trouxe de novo à tona — como se isso fosse necessário — a importância e a intensidade dessa conexão, tanto filosófica como politicamente. Contudo, no momento em que, mais e mais, a cidadania reivindica o princípio da legitimidade democrática, reclama para si o controle do seu destino e afirma que, para ser legítimo, o governo deve agir em seu nome — nesse momento mesmo, como indiquei no início do trabalho, o alcance e a relevância desse princípio são contestados pelos processos de reestruturação global.

    É parte do argumento deste trabalho dizer que a ordem internacional atual caracteriza-se ao mesmo tempo pela persistência do sistema de Estados soberanos e pelo desenvolvimento de estruturas plurais de autoridade. As objeções que se podem fazer a tal sistema híbrido são severas. Pode-se perguntar se ele oferece uma solução aos problemas fundamentais do pensamento político moderno, que se preocupa, entre outras coisas, com a rationale e a base da ordem e da tolerância, da democracia, da responsabilidade política e do governo legítimo. Meu pensamento, porém, que esboçarei no restante deste trabalho, é o de que essas objeções podem ser respondidas, e os perigos que elas apontam podem ser coerentemente tratados no quadro do pensamento constitucional e democrático. Penso que os perigos podem em princípio ser evitados se se vincular o sistema de autoridade múltipla a princípios e normas ordenadoras fundamentais. A natureza potencialmente fragmentada e não-democrática desses desenvolvimentos pode ser superada desde que eles façam parte de uma ordem comum comprometida com uma estreita colaboração e com outros princípios e orientações constitucionais similares. Os perigos inerentes a um "novo medievalismo" podem ser enfrentados se suas partes componentes promulgam uma estrutura comum de normas de ação consensuais. As agências e organizações internacionais bem como os Estados poderiam optar por fazer parte dessa estrutura se escolherem um futuro político democrático. Refiro-me, aqui, a um "modelo federal de autonomia democrática"75 75 A idéia da "autonomia democrática" foi apresentada no meu livro Models of Democracy, cap. 9, e. em Political Theory and the Modern State, artigo 6. O modelo federal da autonomia democrática é um tema central do meu livro Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente. . Na esperança de concluir este trabalho com algumas observações construtivas, a seguir exponho esse modelo, ainda que de modo muito rápido. A rapidez da exposição aparece na apresentação em forma de teses. As teses, devo dizer, são referidas a dois objetivos fundamentais: primeiro, o de oferecer uma teoria da democracia e das condições da autoridade legítima; segundo, o de examinar a aplicação dessa teoria nos mundos entrelaçados da vida nacional e internacional. Essas teses não constituem, obviamente, uma exposição completa do modelo; elas sugerem uma orientação para análises futuras.

    SOBERANIA, AUTODETERMINAÇÃO E AUTONOMIA DEMOCRÁTICA

    1. Historicamente, a idéia de soberania serviu para pensar de maneira diferente um velho problema: o da natureza do poder e do governo. Ela estabeleceu um novo vínculo entre poder e direção política, e forneceu um modo alternativo de conceber a legitimidade das reivindicações de poder: uma alternativa às concepções teocráticas da autoridade dominante na Europa medieval. A teoria de soberania tornou-se uma teoria do exercício do poder segundo o direito. Ela tinha duas preocupações predominantes: com a sede da autoridade soberana e com as formas e limites - com o alcance legítimo - da ação estatal76 76 Hinsley, F.H. Sovereignty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 222-3. . Da teoria da soberania desenvolvida por Jean Bodin para a frente, ela tornou-se uma teoria da possibilidade e das condições do exercício legal do poder político. Tornou-se, assim, a teoria do poder legítimo ou da autoridade.

    2. No âmbito dos debates sobre a soberania, duas posições ficaram bem estabelecidas: a da soberania do Estado e a da soberania popular. Os defensores da primeira tenderam a atribuir ao Estado a autoridade final para definir o direito público; os defensores da segunda tenderam a considerar o Estado como um ente "comissionado" para a realização da vontade do povo, submetendo-se ele, portanto, diretamente, às determinações do "público"77 77 Para uma análise mais completa, ver o meu Political Theory and the Modern State, pp. 214-225. . As duas posições, contudo, enfrentam uma objeção comum: ambas apresentam concepções do poder político com implicações tirânicas. A tese da soberania do Estado coloca o Estado numa posição de poder total face à comunidade; a tese da soberania popular coloca a comunidade (ou a maioria) numa posição de total predomínio sobre os cidadãos individuais: a comunidade é todo-poderosa e portanto a soberania do povo poderia destruir facilmente a liberdade dos indivíduos78 78 Cf. Berlin, Isaiah, Four Essays on Liberty, Oxford University Press,. Oxford, 1969, pp. 164 ss. . Concepções de soberania que descuidam da demarcação dos limites e alcance legítimo da ação política devem ser tratadas com máxima cautela.

    3. Uma alternativa às teses da soberania do Estado e da soberania popular está implícita na concepção lockeana da comunidade política independente, e é essencial na tradição de análise política que não localiza a soberania nem no Estado nem na sociedade79 79 Sobre o conceito lockeano de comunidade política, ver Dunn, John, Locke, Oxford University Press, Oxford, 1984, especialmente pp. 44-57. . Essa tradição - que é sobretudo uma tradição de pensamento constitucional - buscou, nas relações entre Estado e sociedade, modalidades de mediação, equilíbrio e contrapesos capazes de proporcionar proteção tanto ao direito público como ao direito privado. Em última análise, só um princípio de soberania centrado no ceticismo a respeito da soberania estatal ou da soberania popular pode ser tomado como um princípio aceitável. Tal princípio deve insistir, contra a soberania do Estado, na determinação, pelo "povo", das condições que governam sua própria vida, e insistir, contra a soberania popular na especificação dos limites do poder do público, ou seja, numa estrutura reguladora que ao mesmo tempo torna possível e restringe esse poder. Esse terreno de pensamento é demarcado pelo "princípio da autonomia".

    4. O princípio da autonomia pode ser enunciado como segue:

    os indivíduos devem usufruir de direitos iguais (bem como, por isso mesmo, assumir deveres iguais) no quadro social geral em que as oportunidades abertas a eles são geradas e limitadas; isto é, eles devem ser livres e iguais na determinação das condições da sua própria existência, desde que não mobilizem aquele quadro de modo a negar os direitos de outros80 80 Eu modifiquei a minha concepção anterior desse princípio em Models of Democracy, pp. 270-71. . Várias noções devem ser esclarecidas:

    a) o princípio da autonomia procura articular os fundamentos da possibilidade de consenso; é um princípio de poder legítimo;

    b) a noção segundo a qual os indivíduos devem usufruir de direitos e obrigações iguais no quadro social geral que molda suas vidas e oportunidades significa que eles devem usufruir de "uma estrutura comum para a ação" para que possam desenvolver seus projetos - individuais e coletivos - como agentes livres e iguais81 81 Cf Rawls, John, "Justice as fairness: political not metaphysical", Philosophy and Public Affairs, XIV 3, 1985, pp. 245 e ss. para uma discussão da noção de "estrutura básica da sociedade" como um quadro limitativo da ação. ;

    c) num primeiro momento, o conceito de "direitos" conota qualificações ou titularidade (entitlements) para desenvolver ações e atividades sem risco de interferência arbitrária ou injusta. Os direitos definem esferas legítimas de ação (ou inação) independente. Ainda que os benefícios dos direitos sejam definidos com respeito a indivíduos particulares (ou grupos, ou agências), eles constituem um fenômeno social, pois circunscrevem redes de relações entre o indivíduo, ou detentor de direitos, outros, ou a comunidade e seus representantes82 82 Ver Dagger, Richard, "Rights", in Political Innovation and Conceptual Change, pp. 304-5, que faz uso proveitoso de uma série de distinções apresentadas em Hohfeld, Wesley, Fundamental Legal Conceptions, Yale University Press, New Haven, Conn., 1964. . Os direitos são titularidades no âmbito das limitações da comunidade tornando possível a ação independente - isto é, criando espaços para a ação -e constrangendo, isto é, especificando os limites da ação independente, de tal maneira que essa ação reduza ou infrinja a liberdade de outros. Segue-se que os direitos têm uma dimensão estrutural, outorgando tanto oportunidades como obrigações. Outros direitos, destinados a especificar a capacidade das pessoas de usufruir de uma série de liberdades não só em princípio como na prática, devem ser ao mesmo tempo formais e concretos. Isso implica a especificação de uma ampla gama de direitos, com uma profunda incidência nos âmbitos do Estado e da sociedade civil;

    d) a idéia de que as pessoas devem ser livres e iguais na "determinação" das condições da sua própria existência significa que elas devem ser capazes de participar de um processo de deliberação, aberto a todos, em bases livres e iguais, a respeito de questões públicas importantes. Uma decisão legítima, nesse quadro, não deriva da "vontade de todos", mas da "deliberação de todos"83 83 Manin, Bernard, "On legitimacy and political deliberàtion", Political Theory, 15, 3,1987, p. 352 e pp. 351-362 para uma interessante discussã o do "processo de deliberação". . O processo de deliberação, por isso mesmo, é compatível com os procedimentos e mecanismos do governo da maioria;

    e) a qualificação presente no princípio - de que direitos individuais requerem proteção explícita -representa uma demanda bem conhecida de governo constitucional. O princípio da autonomia especifica ao mesmo tempo que os indivíduos devem ser "livres e iguais" e que as "maiorias" não podem ser capazes de impor-se sobre outros. Deve haver sempre arranjos institucionais - isto é, normas e garantias constitucionais - destinados a proteger a posição dos indivíduos ou das minorias.

    5. Tomando emprestada a frase de John Rawls, a rationale do. princípio da autonomia, ou seus fundamentos últimos, é "política e não metafísica"84 84 Cf. Rawls, "Justice as fairness: political not metaphysical". Philosophy and Public Affairs 14, nº 3, 1985. . É um princípio situado no coração do projeto liberal-democrático moderno, preocupado com a capacidade dos indivíduos de determinar e justificar suas ações, com a sua capacidade de assumir obrigações voluntariamente, e com a condições subjacentes da sua liberdade e igualdade. A luta pela participação em igualdade de condições em comunidades políticas remodelou a política ocidental moderna. Isso se deve a que a luta por direitos re-formou antigas noções a respeito das esferas legítimas de ação independente. Enquanto que no passado a obtenção, de direitos envolvia a luta pela autonomia ou independência com relação ao local de nascimento e às ocupações predeterminadas, mais recentemente as lutas referiram-se a outras coisas, tais como a liberdade de expressão, de credo religioso e de associação, bem como a liberdade das mulheres no casamento e além dele85 85 Ver o meu artigo "Citizenship and Autonomy", in Political Theory and the Modern. State, pp. 189-213. . A autonomia do cidadão pode ser representada pelo conjunto de direitos de que os indivíduos usufruem em virtude do seu status de membros livres e iguais da sociedade.

    6. A base do princípio da autonomia é ao mesmo tempo normativa e empírica. A base empírica deriva do desenvolvimento das diferentes condições e sítios em que se travou a luta pelo reconhecimento da condição de membro da comunidade política e, potencialmente, a luta pela participação plena nessa comunidade; a base normativa deriva de uma reflexão sobre as condições em que a autonomia é possível. A base normativa do princípio da autonomia se define no âmbito da tentativa de elaborar e projetar uma concepção de autonomia baseada num "experimento intelectual": um experimento sobre como as pessoas interpretariam suas capacidades e necessidades, e sobre que regras, leis e instituições elas considerariam justificadas caso elas tivessem acesso a uma informação mais completa de sua posição no sistema político e das condições da sua participação86 86 Cf. Habermas, Jurgen, Theory and Practice, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 41-82; e Legitimation Crisis, Heinemann, London, 1976, pp. 111-17. . Tal experimento mental prende-se ao interesse em examinar as maneiras pelas quais as práticas, instituições e estruturas da vida social poderiam ser transformadas para permitir aos cidadãos entender, moldar e organizar suas vidas. Preocupa-se, de modo central, com o exame das condições e regras a serem usufruídas necessariamente pelas pessoas para que elas sejam livres e iguais. A meu ver, esse experimento revela que cinco categorias de direitos são cruciais para permitir que as pessoas participem, em termos de liberdade e igualdade, no ordenamento de sua própria associação: os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e reprodutivos87 87 Não seria apropriado, nos limites deste trabalho, tentar uma justificação adequada ou uma explicação dessas categorias. Devo sublinhar, contudo, que elas fazem referência a condições fundamentais de realização da participação política, e, portanto, do governo legítimo. A menos que sejam livres nessas cinco esferas, os cidadãos não podem participar plenamente do "governo" do Estado e das questões civis. As cinco categorias de direitos não articulam uma lista interminável de bens; elas articulam, antes, as condições necessárias para a participação livre e Igual. Uma constituição e declaração de direitos que estipulem as liberdades correspondentes a cada um desses cinco domínios reforçaria a capacidade dos cidadãos - refiro-me à sua capacidade real, ligada a condições de saúde, qualificação profissional, recursos - de valer-se das oportunidades que se oferecem a eles. Seria útil constituir uma ordem legal "capacitadora", definindo um quadro, ou âmbito comum de ação, tal como indicado no quadro abaixo. . Em conjunto, esses feixes de direitos constituem o espaço inter-relacionado no qual o princípio da autonomia pode ser buscado e realizado.

    Qual é o papel da instituição analisada e seu ganho para o exercício democrático no Brasil?

    7. O princípio da autonomia pode orientar uma exposição de natureza e significado do poder legítimo. Mas tal exposição não seria completa sem uma reflexão sobre a base organizacional e institucional do princípio. Isso porque a reflexão abstrata sobre princípios tem de ser suplementada por análises detalhadas das condições em que tais princípios podem ser realizados: sem essa análise o próprio significado do princípio dificilmente pode ser enunciado88 88 Cf. O'Neil, Onora, "Justice, Gender and International boundaries", numa coletânea editada por Nussbau, Martha, e Sen, Amartya K., Clarendon Press, Oxford, a ser publicada em breve. . Em outro lugar, eu me referi às "condições de realização" (conditions of enactment) do princípio da autonomia: tais condições seriam, em última análise, a reforma do poder do Estado e a reestruturação da sociedade civil89 89 Models of Democracy, cap. 9. , isso envolve, o reconhecimento de que um "duplo processo de democratização" é indispensável: a transformação independente tanto do Estado como da sociedade civil. A natureza dessa transformação foi indicada no modelo que eu chamo de "autonomia democrática". A ênfase, nesse modelo, recai: na inscrição do princípio da autonomia numa constituição e numa declaração de direitos; na reforma do poder do Estado, no sentido de maximizar sua responsabilidade política (nos termos da constituição) face aos representantes eleitos e, em última instância, à cidadania; enfim, experimentação, no plano da sociedade civil, de diferentes mecanismos e procedimentos democráticos.

    8. Num mundo interconectado, porém, as condições de realização do princípio da autonomia têm de ser pensadas em relação às redes internacionais de Estados e organizações e em relação às redes internacionais da sociedade civil. A forma e a : estrutura internacionais da política e da sociedade civil têm de ser incorporadas aos fundamentos da teoria da democracia. O problema da democracia em nosso tempo consiste em especificar o modo pelo qual o princípio da autonomia pode ser inscrito e assegurado numa série de centros interconectados de poder e autoridade. Isso porque se escolhermos hoje a democracia, esolhemos necessariamente a operacionalização de um sistema radical de direitos numa estrutura de poder complexa, intergovernamental e transnacionaL A autonomia democrática só pode ser plenamente garantida nas e através das agências e organizações que constituem um elemento e ao mesmo tempo atravessam as fronteiras territoriais do Estado-nação. A autonomia democrática será o resultado, e apenas o resultado, de um núcleo, ou de uma federação de Estados e agências. Os princípios e requisitos da autonomia democrática têm de ser inscritos nos centros nacionais e internacionais de poder, e realizados no interior, desses centros, para que essa autonomia seja possível mesmo numa área limitada. A democracia no interior do Estado-nação requer a democracia no interior de uma rede de forças e relações internacionais entrecruzadas. Tal é o significado da democratização hoje em dia.

    9. A estrutura das decisões e resultados políticos interligados que tornam os Estados-nação incapazes de controlar uma grande variedade de recursos e de forças, e que coloca os próprios Estados-nação em posição de interferir em outros Estados e impor-se a eles, requer o alargamento da noção de base política territorial relevante, de maneira que essa base incorpore os setores e grupos de pessoas afetadas por tal interconexão. A autonomia democrática, requer, em princípio, uma moldura em expansão, ou uma federação de Estados e agências democráticas que abranja as ramificações das decisões e torne essas decisões responsáveis. Há aqui duas questões: a primeira é a de mudar os limites territoriais dos sistemas de responsabilidade política de tal maneira que as questões que escapam ao controle do Estado-nação — por exemplo aspectos da administração monetária, questões ambientais, saúde, novas formas de regulamentação das comunicações — possam ser melhor controladas (trata-se de uma mudança que implicaria, por exemplo, o deslocamento de algumas decisões do Estado-nação para um quadro regional ou global ampliado). A segunda é a questão da necessidade de articular comunidades políticas territorialmente delimitadas com agências, associações e organizações-chave do sistema internacional, de tal maneira que este último torne-se parte de um processo democrático, ao mesmo tempo em que aquelas agências, associações e organizações adotem em seu modus operandi uma estrutura de regras e princípios compatível com os da autonomia democrática. Face ao sistema global a democracia requer a remodelação da natureza e do alcance das comunidades políticas territorialmente delimitadas, bem como da forma e da estrutura das forças e agências centrais da sociedade civil internacional. O que está em questão, em suma, é a democratização tanto do sistema de Estados quanto os quadros (frameworks) interligados da ordem civil internacional.

    10. A base institucional do modelo federal de autonomia democrática pressupõe, de início, um reforçamento do papel dos parlamentos regionais (como por exemplo do Parlamento Europeu), de modo que as decisões desses órgãos sejam reconhecidas, em princípio, como fontes legítimas independentes do direito internacional90 90 Deixo em aberto aqui um conjunto de questões referentes à aplicação (enforcement) do direito internacional. Cf., The anarchical Society, Bull, cap. 6; Falk, Richard A., The Status of Law in International Society, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1970; e Cassese, Antonio, International Law in a Divided World, Clarendon Press, Oxford, 1986, seção II. . Paralelamente a tais desenvolvimentos o modelo antecipa a possibilidade de referendos gerais abrangendo grupos mais amplos que os das nações e Estado-nação, com bases políticas territoriais definidas de acordo com a natureza e o alcance das questões internacionais controversas. Ademais, a abertura das organizações governamentais internacionais ao escrutínio público e a democratização dos órgãos internacionais "funcionais" (talvez mediante a criação de conselhos de supervisão eleitos e que sejam representativos de suas bases políticas) seriam significativas91 91 Sobre a representação estatística, ver Burnheim, John, Is Democracy Possible?, Polity Press, Cambridge, 1985. . Lado a lado com essas mudanças, o modelo pressupõe que o princípio da autonomia se consolide (bem como que se consolidem os vários direitos a ela associados) de modo que o processo de decisão democrático seja dotado de forma e de limites. Isso requer a inclusão do princípio nos regulamentos dos parlamentos e assembléias (nos níveis internacional e nacional), bem como a expansão da influência dos tribunais internacionais, de maneira a possibilitar a indivíduos e grupos que acionem as autoridades políticas para o efetivo reconhecimento e garantia de direitos fundamentais no interior e além das associações políticas92 92 Na Europa isso significaria, por exemplo, a proteção e reforçamento do programa europeu de direitos humanos, e um maior desenvolvimento do papel do sistema de tribunais de justiça europeus. . Em última análise, a formação de uma assembléia investida de autoridade de todos os Estados democráticos (uma Assembléia Geral das Nações Unidas reformada, ou um corpo complementar a ela) seria um objetivo. Tal assembléia, caso seja possível chegar na prática a um acordo sobre seus termos de referência, forneceria uma instância internacional para o exame de questões globais urgentes (como por exemplo a oferta de alimentos, a dívida externa do Terceiro Mundo, a destruição da camada de ozônio e a redução dos riscos de uma guerra nuclear)93 93 Caso tal assembléia se revele um sonho impossível (e há boas razões para pensar que essa hipótese é muito provável), uma rede mais restrita de Estados regionais e sociedades democráticas ainda poderia oferecer a possibilidade de uma regulamentação e meios de controle mais efetivos do que os que existem no atual sistema de Estados. .

    11. As implicações disso para a sociedade civil são, em parte, claras. Uma federação democrática de Estados e sociedades civis é incompatível com a existência de conjuntos poderosos de relações e organizações que, dadas as bases sobre as quais se desenvolvem suas operações, podem distorcer sistematicamente os processos democráticos e, por isso mesmo, distorcer seus resultados. Entre outras coisas, o que está em questão aqui é a redução do poder que têm as companhias multinacionais de influenciar a agenda política (utilizando-se, nessa redução, de expedientes tais como participação especial no capital, participação de cidadãos na diretoria das empresas, financiamento público das eleições) bem como a restrição das atividades de poderosos grupos de interesse internacionais que perseguem seus objetivos sem limitações (através, por exemplo, da regulamentação dos procedimentos de negociação para minimizar a utilização de argumentos de força nas relações intra e entre associações públicas e privadas, e o estabelecimento de normas impedindo o patrocínio -de representantes políticos por parte de interesses setoriais, sejam esses últimos indústrias ou sindicatos específicos). Se se pretende que indivíduos sejam livres e iguais na determinação das condições de sua existência, é preciso que haja um conjunto de esferas sociais - como por exemplo empresas privadas e cooperativas, meios de comunicação e centros de saúde independentes — cujos recursos são controlados pelos seus membros sem interferência direta de agências políticas ou terceiros de qualquer tipo94 94 Os modelos para a organização de tais esferas teriam muito que aprender das concepções de democracia direta. Mas seria necessário utilizar um enfoque experimental de tais estruturas organizacionais.. O estado atual da teoria da democracia e os conhecimentos que temos das experiências democráticas radicais não permitem previsões seguras sobre as estratégias mais adequadas para a mudança no campo da organização. Nesse sentido específico, a "música do futuro" (Marx) somente pode ser composta na prática através da inovação e da pesquisa. Ver Held, David, e Pollitt, Christophe, eds., New Forms of Democracy. . Também está em questão uma sociedade civil que nem é planejada nem meramente orientada pelo mercado; trata-se de uma sociedade aberta a organizações, associações e agências que desenvolvem seus próprios projetos e se submetem aos limites impostos por uma estrutura comum de ação e pelos processos democráticos.

    12. Uma teoria do poder legítimo constitui, inescapavelmente, uma teoria da democracia nos processos e estruturas interligados da ordem global e uma teoria do impacto da ordem global no Estado democrático. Semelhante teoria não requer a premissa de uma ordem internacional cosmopolita harmoniosa, mas deve presumir que os processos e práticas democráticos têm de articular-se à arena complexa da política nacional e internacional. O destino da democracia no fim do século XX e inseparável do resultado desse processo. Há boas razões para ser otimista- quanto ao resultado - bem como boas razões para ser pessimista.

  • *

    Trabalho apresentado na Conferência "Aprofundando e Globalizando a Democracia", realizada em Yokohama, Japão, 17-22 de março de 1990.

  • **

    Tradução de Régis de Castro Andrade.

  • 1

    Agradeço os comentários feitos por Tony McGrew, Michelle Stanworth, John Thompson e Anthony Giddens a uma versão anterior deste trabalho. Tony McGrew orientou-me constantemente através da volumosa literatura sobre relações internacionais; suas críticas construtivas foram particularmente úteis. Os temas e argumentos deste artigo serão ampliados num trabalho a ser publicado brevemente,

    The Foundation of Democracy, Polity Press, Cambridge.

  • 2

    Fukuyama, Francis. "The end of history?

    National Interest, verão 1989.

  • 3

    Para uma avaliação crítica dessas teorias/ver o

    meu livro Models of Democracy, Polity Press, Cambridge, 1987, parte II.

  • 4

    É claro que houve exceções. Ver, por exemplo, Therborn, Goran, "The Pule of Capital and the Rise of Democracy",

    New Left Review, 103, maio/junho de 1977; Howard, Michael,

    War and the Liberal Conscience, Oxford University Press, Oxford, 1981 e Hinsley, F. H.,

    Power and the Pursuit of Peace, Cambridge University Press, Cambridge, 1963.

  • 5

    Ver por exemplo Brittan, S., "Can Democracy Manage an Economy?",

    in: The End of the Keynesian Era, ed. por Skidelsky, R., Martin Robertson, Oxford, 1977; e Nordhaus, W. D., "The Political Business Cycle",

    Review of Economic Studies, 42, 1975. Para uma resenha e discussão das questões envolvidas, ver o meu livro,

    Political Theory and the Modern State, Polity Press, Cambridge, 1989, artigos 4 e 6.

  • 6

    Hayek,

    The Constitucion of Liberty Routledge and Kegan Paul, London, 1960, pp. 405-6.

  • 7

    Skinner, Quentin

    The Foundations of Modern Political Thought, Cambridge University Press, Cambridge, 1978, vol. 2, pp. 349 e ss.

  • 8

    Macpherson, C. B.

    The Life and Times of Liberal Democracy, Oxford University Press, Oxford, 1977; e Pateman, Carole,

    The Problem of Political Obligation: A Critique of Liberal Theory, 2ª. edição, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 171

    e ss.

  • 9

    Ver por exemplo, Macpherson, C. B.,

    The Life and Times of Liberal Democracy, cap. 5; Pateman, Carole,

    Participation and Democratic Theory, Cambridge University Press, Cambridge, 1970; Held,

    Models of Democracy, caps. 8 e 9; e Keane, John,

    Democracy and Civil Society, Verso, London, 1988.

  • 10

    Entre as honrosas

    exceções estão Laski, Harold,

    Studies in Law and Politics, George Allen and Unwin, London, 1932, pp. 237 é

    ss. ; e Figgis, John N.,

    Churches in the Modern State, Longmans, Green and Co., Londori, 1913, pp-54-93- Ver também suas obras escolhidas (com G. D..H. Cole) in

    The Pluralist Theory of the State, ed. por Hirst, Paul, Routledge, London, 1989.

  • 11

    Ver o meu

    Political Theory and the Modern State, artigo 8.

  • 12

    Dunn, John, "Responsability Without Power", no seu

    Interpreting Political Responsibility Polity Press, Cambridge, l990;:- e Giddens; Anthony,

    The Nation-State and Violence, Polity Press, Cambrige,1985.

  • 13

    Ver Spitz, E.,

    Majority Rule, Chatham House, Chatham, NJ, 1984.

  • 14

    Offe, Claus,

    Disorganized Capitalism, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 283-4.

  • 15

    McHenry, D. F. e Bird, K. "Food bungle in Bangladesh",

    Foreign Policy, verão, 27, 1977; e Sobhan, R., "Politics of food and famine in Bangladesh",

    Economic and Political Weekly, 1º. dezembro, 1979.

  • 16

    Ver Leftwich, Adrian,

    Redefining Politics, Methuen, London, 1983.

  • 17

    Offe, Claus,

    Disorganized Capitalism, pp. 286 e

    ss.

  • 18

    Held, D.,

    Models of Democracy, pp. 73-78, 254-262, 267-289.

  • 19

    Cf, Hanson, Russell L; "Democracy",

    in Political Innovation and Conceptual Chatige, eds. Terence Ball, James Farr and Russel L. Hanson, Cambridge University Press, Cambridge, 1989, pp. 68-69. "

  • 20

    Cf. Laski, H.,

    Studies in Law and Politics, pp. 262-275.

  • 21

    Ver Wallerstein, Immanuel,

    The Modern World-System, Academic Press, New York, 1974; e Anderson, Perry,

    Líneages of the Absolutist State, New Left B

    ooks, London,

    1974.

  • 22

    Gaurevitch Peter, "The Second Image Reversed: The International Sources of Domestic Politics",

    International Organization, 32, 4, 1978, p. 908.

  • 23

    Ibid, pp. 908-911.

  • 24

    Callieres, François de,

    On the Manner of Negotiating with Princes, trad. por A. F.Whyte, Uniyersity of Notre Dame Press, Notre Dame, 1963, p. 11.

  • 25

    Bull, Hedley,

    The Anarchical Society, Macmillan, London, 1977, pp. 278-80.

  • 26

    Ibid, cap. 1, e Hinsley,

    Power and the Pursuit of Peace, parte 1. Entre as primeiras e mais importantes obras sobre essa matéria estão Kant, I. "Idea for a Universal History with a Cosmopolitan Purpose"," 1784, e "Perpetual Peace", 1795,

    in Kant's Political Writings, ed. por Hans Reiss, Cambridge University Press, Cambridge; 1970.

  • 27

    McGrew, Tony, "Conceptualizing Global Politics",

    in Global Politics, 1 (1) (D312), The Open University, Milton Keynes, 1988, pp. 19-20.

  • 28

    Kegley, Charles W. e Wittkopf, Eugene R.,

    World Politics, Macmillan, London, 1989, p. .511.

  • 29

    Ver Morse, Edward,

    Modernization and the Transformation of Internacional Relations, Free Press, New York, 1976; Mansbach, Richard, et al.,

    The Web of Politics, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1976; Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., eds.,

    Transnacional Relations and World Politics, Harvard Uniyersity Press, Cambridge, Mass, 1972; Rosenau, James N.,

    The Study of Global interdependence, Francis Pinter, London, 1980; Soroos, Marvin S.,

    Beyond Sovereignty University of South Carolina Press, Columbia, 1986.

  • 30

    Ver Keohane e Nye,

    Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5; e Cooper, Richard N.,

    Economic Policy in an Interdependent World, MIT Press, Cambridge, Mass., 1986, pp. 1-22.

  • 31

    Ver Morse, Edward, op. cit.

  • 32

    Ver Keohane, Robert O.,

    After Hegemony, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1984; e McGrew, Tony, "Toward Global Politics?"

    in Global Polítics, 7 (30), pp. 12-20.

  • 33

    Kaiser, Karl, "Transnational Relations as a Threat to the Democratíc Process",

    in Transnational Relations and World Politics, eds. Keohane e Nye, pp. 358-360.

  • 34

    Ver em particular, Morse, Edward, op. cit.; e Brown, S.,

    New Forces, Old Forces and the Future of World Politics, Scott/Foreman, Boston, 1988.

  • 35

    cf. Modelski, George,

    Principies of World Politics, Free Press, New York, 1972; Herz, John H.,

    The Nation-State and the Crisis of World Politics, McKay, New York, 1976, pp. 226-252; e Gilpin, Robert,

    War and Change in World Politics, Cambridge University Press, Cambridge, 1981.

  • 36

    Krasner, Stephen D., "Sovereignty": an Institucional Approach",

    Comparative Political Studies, 21, 1, 1988, p. 40.

  • 37

    Herz,

    The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 234 e ss.

  • 38

    Bull,

    The Anarchical Society, p. 280.

  • 39

    Ver Bozeman, Adda B., "The International Order in a Multicultural World",

    in The Expansion of International Society, eds. Hedley Bull e Adam Watson, Oxford University Press, Oxford, 1984.

  • 40

    Ver Cassese, Antonio, "Violence, War and the Rule of Law in the International Comunity", nesse volume, e Vicent, R. J.,

    Human Rights and International Relations, Cambridge University Press, Cambridge, 1986. Voltarei a essas questões adiante.

  • 41

    Hinsley, F. H.,

    Sovereighty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 229-35.

  • 42

    Parte do material desta seção foi adaptada do meu livro

    Political Theory and the Modern State, artigo 8.

  • 43

    Essas questões são discutidas no meu

    Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente.

  • 44

    Held,

    Political Theory and the Modern State, p. 215.

  • 45

    Held e McGrew, "

    Globalization and the Advanced Industrial State", documento de pesquisa não publicado, Open University, Milton Keynes, 1989, p. 13.

  • 46

    Uma comparação entre as experiências dos países europeus, e, por exemplo, dos Estados Unidos e dos países de industrialização recente seria muito ilustrativa. Mas essa comparação excederia os limites deste artigo.

  • 47

    Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., Power and Interdependence, Little, Brown, Boston, 1977; Gourevitch, "The second image reversed"; e Katzenstein, Peter J., ed.,

    Between Power and Plenty: Foreign Economic Policies of: Advanced Industrial States, University of Wisconsin Press, Madison, 1978.

  • 48

    Keohane e Nye,

    Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5.

  • 49

    Ver, por exemplo, Smith, R., "Political economy and Britain's external position",

    in Britain in the World, compilação do ESRC, London, 1987.

  • 50

    Cf. Giddens, Anthony, "Globalization, change and conflict", falta a referência no original, Gilpin, Robert,

    The Political Economy of International Relations, Princeton University Press, Princeton, 1987, pp. 345 e

    ss. ; Cox, Robert

    W., Production Power and World Order, Columbia University Press, New York, 1987, caps. 8 e 9; Ruggie, John G., "International regimes, transactions and change: embedded liberalism in the post-war economic order",

    International Organization, 36 (1982); Ruggie, J. G., ed.,

    The Antonomies of Interdependence, Columbia University Press, New York, 1983; e Kolko, J.,

    Restructing the World Economy, Pantheon, New York, 1988.

  • 51

    Ver Keohane, Robert O., "The world political economy and the crisis of embedded liberalism",

    in Order and Conflict in Contemporary Capitalism, ed. Goldthorpe,J.H. Oxford University Press," Oxford, 1984.

  • 52

    Cooper,

    Economic Policy in an Interdependent World, pp. 1-22; e Gilpin,

    The Political Economy of International Relations, pp. 397 e ss.

  • 53

    Ver Luard, Evan,

    International Agencies: The Emerging Framework of Interdependence, Macmillan, London, 1977; Krasner, Stephen,

    International Regimes, Cornell University Press, Ithaca, NY., 1983- Em 1909 havia 37 organizações intergovernamentais e 176 organizações internacionais não-governamentais. Os números para 1984 eram, respectivamente, 280 e 4.615.

  • 54

    Burnheim, John, "Democracy, nation-states and the world system",

    in New Forms of Democracy, eds. Held, David, e Pollitt, Christopher, Sage, London, 1986, p. 222.

  • 55

    Ibid., pp. 220 e ss.

  • 56

    Cf. Harris, Lawrence, "Governing the world economy: Bretton Woods and the IMF",

    in The State and Society, 6 (26) (D209), The Open University, Milton Keynes, 1984; e Girvan, N., "Swallowing the IMF medicine in the seventies", Development

    Dialogue, 2, 1980.

  • 57

    Ver Wickham, Ann, "States and political blocs": the EEC",

    in The State and Society, 6 (28) (D209); e Hoffmann, Stanley, "Reflections on the nation-state in Western Europe today",

    Journal of Common Market Studies, XXI (1 and 2), 1982. .

  • 58

    Cassese, Antonio,

    Violence and Law in the Modern Age, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 150 e ss.

  • 59

    Ver Noel Emile, "The Single European Act",

    Government and Opposition, 1989, especialmente

    pp. 10-11.

  • 60

    Ver Negro, J., "International institutions",

    in Democractic Government and Politics, 4 (13) (D308), The Open University, Milton Keynes, 1986.

  • 61

    Capotorti, F., "Human rights: the hard road towards universality",

    in The Structure and Process of International Law, eds. Macdonald, R. St. J., e Johnson, D.M.Martinus Nijhoff, The Hague, 1983. Na Grã-Bretanha, por exemplo, a lei sobre grampeamento de telefones foi alterada em razão da intervenção da Comissão Européia, e as descobertas do Tribunal Europeu de Justiça levaram a mudanças na legislação britânica sobre várias questões tão importantes como discriminação sexual e igualdade salarial.

  • 62

    Casesse,

    Violence and Law in the Modern Age, p. 132.

  • 63

    Bull,

    The Anarchical Society, pp. 140 e ss.

  • 64

    Ver Oppeheim, L.,

    International Law, vol. 1. Longmans, London, 1905,cap. 1.

  • 65

    Herz,

    The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 230-233; ver . também . Kaldor, Mary e Falk, Richard A.eds., Dealignment, Basil Blackwell, Oxford, .1987.

  • 66

    Smith, Dan, "States and military blocs: Nato", 6 (27) (D209), p. 131

  • 67

    Cf. Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process"; e Richelson J. e Ball, D.,

    The Ties that Bind, Allen and Unwin, London, 1986.

  • 68

    Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process", p. 370.

  • 69

    Ruggie, J. G., "Human rights and the future international comunity",

    Daedalus, 112,4, 1983.

  • 70

    Cf. Skinner,

    The Foundations of Modern Political Thought, vol. 2, pp. 353-8.

  • 71

    Bull,

    The Anarchical Society, p. 254.

  • 72

    Ibid., pp. 254-5.

  • 73

    Ibid., p. 248, e ver o meu livro

    Models of Democracy, pp. 36-41.

  • 74

    Para uma discussão desse dilema, ver o artigo 1, "Central perspectives on the modern state", do meu livro

    Political Theory and the Modern State, pp. 11-51.

  • 75

    A idéia da "autonomia democrática" foi apresentada no meu livro

    Models of Democracy, cap. 9, e. em

    Political Theory and the Modern State, artigo 6. O modelo federal da autonomia democrática é um tema central do meu livro

    Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente.

  • 76

    Hinsley, F.H.

    Sovereignty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 222-3.

  • 77

    Para uma análise mais completa, ver o meu

    Political Theory and the Modern State, pp. 214-225.

  • 78

    Cf. Berlin, Isaiah,

    Four Essays on Liberty, Oxford University Press,. Oxford, 1969, pp. 164 ss.

  • 79

    Sobre o conceito lockeano de comunidade política, ver Dunn, John,

    Locke, Oxford University Press, Oxford, 1984, especialmente pp. 44-57.

  • 80

    Eu modifiquei a minha concepção anterior desse princípio em

    Models of Democracy, pp. 270-71.

  • 81

    Cf Rawls, John, "Justice as fairness: political not metaphysical",

    Philosophy and Public Affairs, XIV 3, 1985, pp. 245 e ss. para uma discussão da noção de "estrutura básica da sociedade" como um quadro limitativo da ação.

  • 82

    Ver Dagger, Richard, "Rights",

    in Political Innovation and Conceptual Change, pp. 304-5, que faz uso proveitoso de uma série de distinções apresentadas em Hohfeld, Wesley,

    Fundamental Legal Conceptions, Yale University Press, New Haven, Conn., 1964.

  • 83

    Manin, Bernard, "On legitimacy and political deliberàtion",

    Political Theory, 15,

    3,1987, p. 352 e pp. 351-362 para uma interessante discussã o do "processo de deliberação".

  • 84

    Cf. Rawls, "Justice as fairness: political not metaphysical".

    Philosophy and Public Affairs 14, nº 3, 1985.

  • 85

    Ver o meu artigo "Citizenship and Autonomy",

    in Political Theory and the Modern. State, pp. 189-213.

  • 86

    Cf. Habermas, Jurgen,

    Theory and Practice, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 41-82; e

    Legitimation Crisis, Heinemann, London, 1976, pp. 111-17.

  • 87

    Não seria apropriado, nos limites deste trabalho, tentar uma justificação adequada ou uma explicação dessas categorias. Devo sublinhar, contudo, que elas fazem referência a condições fundamentais de realização da participação política, e, portanto, do governo legítimo. A menos que sejam livres nessas cinco esferas, os cidadãos não podem participar plenamente do "governo" do Estado e das questões civis. As cinco categorias de direitos não articulam uma lista interminável de bens; elas articulam, antes, as condições necessárias para a participação livre e Igual. Uma constituição e declaração de direitos que estipulem as liberdades correspondentes a cada um desses cinco domínios reforçaria a capacidade dos cidadãos - refiro-me à sua capacidade real, ligada a condições de saúde, qualificação profissional, recursos - de valer-se das oportunidades que se oferecem a eles. Seria útil constituir uma ordem legal "capacitadora", definindo um quadro, ou âmbito comum de ação, tal como indicado no quadro abaixo.

  • 88

    Cf. O'Neil, Onora, "Justice, Gender and International boundaries", numa coletânea editada por Nussbau, Martha, e Sen, Amartya K., Clarendon Press, Oxford, a ser publicada em breve.

  • 89

    Models of Democracy, cap. 9.

  • 90

    Deixo em aberto aqui um conjunto de questões referentes à aplicação

    (enforcement) do direito internacional. Cf.,

    The anarchical Society, Bull, cap. 6; Falk, Richard A.,

    The Status of Law in International Society, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1970; e Cassese, Antonio,

    International Law in a Divided World, Clarendon Press, Oxford, 1986, seção II.

  • 91

    Sobre a representação estatística, ver Burnheim, John,

    Is Democracy Possible?, Polity Press, Cambridge, 1985.

  • 92

    Na Europa isso significaria, por exemplo, a proteção e reforçamento do programa europeu de direitos humanos, e um maior desenvolvimento do papel do sistema de tribunais de justiça europeus.

  • 93

    Caso tal assembléia se revele um sonho impossível (e há boas razões para pensar que essa hipótese é muito provável), uma rede mais restrita de Estados regionais e sociedades democráticas ainda poderia oferecer a possibilidade de uma regulamentação e meios de controle mais efetivos do que os que existem no atual sistema de Estados.

  • 94

    Os modelos para a organização de tais esferas teriam muito que aprender das concepções de democracia direta. Mas seria necessário utilizar um enfoque experimental de tais estruturas organizacionais.. O estado atual da teoria da democracia e os conhecimentos que temos das experiências democráticas radicais não permitem previsões seguras sobre as estratégias mais adequadas para a mudança no campo da organização. Nesse sentido específico, a "música do futuro" (Marx) somente pode ser composta na prática através da inovação e da pesquisa. Ver Held, David, e Pollitt, Christophe, eds.,

    New Forms of Democracy.

    • 1 Agradeço os comentários feitos por Tony McGrew, Michelle Stanworth, John Thompson e Anthony Giddens a uma versão anterior deste trabalho. Tony McGrew orientou-me constantemente através da volumosa literatura sobre relações internacionais; suas críticas construtivas foram particularmente úteis. Os temas e argumentos deste artigo serão ampliados num trabalho a ser publicado brevemente, The Foundation of Democracy, Polity Press, Cambridge.

    • 2 Fukuyama, Francis. "The end of history? National Interest, verão 1989.

    • 3 Para uma avaliação crítica dessas teorias/ver o meu livro Models of Democracy, Polity Press, Cambridge, 1987, parte II.

    • 4 É claro que houve exceções. Ver, por exemplo, Therborn, Goran, "The Pule of Capital and the Rise of Democracy", New Left Review, 103, maio/junho de 1977;

    • Howard, Michael, War and the Liberal Conscience, Oxford University Press, Oxford, 1981 e Hinsley,

    • F. H., Power and the Pursuit of Peace, Cambridge University Press, Cambridge, 1963.

    • 5 Ver por exemplo Brittan, S., "Can Democracy Manage an Economy?", in: The End of the Keynesian Era, ed. por Skidelsky, R., Martin Robertson, Oxford, 1977;

    • e Nordhaus, W. D., "The Political Business Cycle", Review of Economic Studies, 42, 1975.

    • Para uma resenha e discussão das questões envolvidas, ver o meu livro, Political Theory and the Modern State, Polity Press, Cambridge, 1989, artigos 4 e 6.

    • 6 Hayek, The Constitucion of Liberty Routledge and Kegan Paul, London, 1960, pp. 405-6.

    • 7 Skinner, Quentin The Foundations of Modern Political Thought, Cambridge University Press, Cambridge, 1978, vol. 2, pp. 349 e ss.

    • 8 Macpherson, C. B. The Life and Times of Liberal Democracy, Oxford University Press, Oxford, 1977;

    • e Pateman, Carole, The Problem of Political Obligation: A Critique of Liberal Theory, 2ª. edição, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 171 e ss

    • 9 Ver por exemplo, Macpherson, C. B., The Life and Times of Liberal Democracy, cap. 5;

    • Pateman, Carole, Participation and Democratic Theory, Cambridge University Press, Cambridge, 1970;

    • Held, Models of Democracy, caps. 8 e 9;

    • e Keane, John, Democracy and Civil Society, Verso, London, 1988.

    • 10 Entre as honrosas exceções estão Laski, Harold, Studies in Law and Politics, George Allen and Unwin, London, 1932, pp. 237 é ss.

    • ; e Figgis, John N., Churches in the Modern State, Longmans, Green and Co., Londori, 1913, pp-54-93-

    • Ver também suas obras escolhidas (com G. D..H. Cole) in The Pluralist Theory of the State, ed. por Hirst, Paul, Routledge, London, 1989.

    • 12 Dunn, John, "Responsability Without Power", no seu Interpreting Political Responsibility Polity Press, Cambridge, l990;:- e Giddens; Anthony, The Nation-State and Violence, Polity Press, Cambrige,1985.

    • 13 Ver Spitz, E., Majority Rule, Chatham House, Chatham, NJ, 1984.

    • 14 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 283-4.

    • 15 McHenry, D. F. e Bird, K. "Food bungle in Bangladesh", Foreign Policy, verão, 27, 1977;

    • e Sobhan, R., "Politics of food and famine in Bangladesh", Economic and Political Weekly, 1ş. dezembro, 1979.

    • 16 Ver Leftwich, Adrian, Redefining Politics, Methuen, London, 1983.

    • 17 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, pp. 286 e ss.

    • 18 Held, D., Models of Democracy, pp. 73-78, 254-262, 267-289.

    • 19 Cf, Hanson, Russell L; "Democracy", in Political Innovation and Conceptual Chatige, eds. Terence Ball, James Farr and Russel L. Hanson, Cambridge University Press, Cambridge, 1989, pp. 68-69.

    • 20 Cf. Laski, H., Studies in Law and Politics, pp. 262-275.

    • 21 Ver Wallerstein, Immanuel, The Modern World-System, Academic Press, New York, 1974;

    • e Anderson, Perry, Líneages of the Absolutist State, New Left Books, London, 1974

    • 22 Gaurevitch Peter, "The Second Image Reversed: The International Sources of Domestic Politics", International Organization, 32, 4, 1978, p. 908.

    • 24 Callieres, François de, On the Manner of Negotiating with Princes, trad. por A. F.Whyte, Uniyersity of Notre Dame Press, Notre Dame, 1963, p. 11.

    • 25 Bull, Hedley, The Anarchical Society, Macmillan, London, 1977, pp. 278-80.

    • 26 Ibid, cap. 1, e Hinsley, Power and the Pursuit of Peace, parte 1. Entre as primeiras e mais importantes obras sobre essa matéria estão Kant, I. "Idea for a Universal History with a Cosmopolitan Purpose"," 1784, e "Perpetual Peace", 1795, in Kant's Political Writings, ed. por Hans Reiss, Cambridge University Press, Cambridge; 1970.

    • 27 McGrew, Tony, "Conceptualizing Global Politics", in Global Politics, 1 (1) (D312), The Open University, Milton Keynes, 1988, pp. 19-20.

    • 28 Kegley, Charles W. e Wittkopf, Eugene R., World Politics, Macmillan, London, 1989, p. .511.

    • 29 Ver Morse, Edward, Modernization and the Transformation of Internacional Relations, Free Press, New York, 1976;

    • Mansbach, Richard, et al., The Web of Politics, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1976;

    • Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., eds., Transnacional Relations and World Politics, Harvard Uniyersity Press, Cambridge, Mass, 1972;

    • Rosenau, James N., The Study of Global interdependence, Francis Pinter, London, 1980;

    • Soroos, Marvin S., Beyond Sovereignty University of South Carolina Press, Columbia, 1986.

    • 30 Ver Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5;

    • e Cooper, Richard N., Economic Policy in an Interdependent World, MIT Press, Cambridge, Mass., 1986, pp. 1-22.

    • 32 Ver Keohane, Robert O., After Hegemony, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1984;

    • e McGrew, Tony, "Toward Global Politics?" in Global Polítics, 7 (30), pp. 12-20.

    • 33 Kaiser, Karl, "Transnational Relations as a Threat to the Democratíc Process", in Transnational Relations and World Politics, eds. Keohane e Nye, pp. 358-360.

    • 34 Ver em particular, Morse, Edward, op. cit.; e Brown, S., New Forces, Old Forces and the Future of World Politics, Scott/Foreman, Boston, 1988.

    • 35 cf. Modelski, George, Principies of World Politics, Free Press, New York, 1972;

    • Herz, John H., The Nation-State and the Crisis of World Politics, McKay, New York, 1976, pp. 226-252;

    • e Gilpin, Robert, War and Change in World Politics, Cambridge University Press, Cambridge, 1981.

    • 36 Krasner, Stephen D., "Sovereignty": an Institucional Approach", Comparative Political Studies, 21, 1, 1988, p. 40.

    • 37 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 234 e ss.

    • 38 Bull, The Anarchical Society, p. 280.

    • 39 Ver Bozeman, Adda B., "The International Order in a Multicultural World", in The Expansion of International Society, eds. Hedley Bull e Adam Watson, Oxford University Press, Oxford, 1984.

    • 40 Ver Cassese, Antonio, "Violence, War and the Rule of Law in the International Comunity",

    • nesse volume, e Vicent, R. J.,Human Rights and International Relations, Cambridge University Press, Cambridge, 1986.

    • 41 Hinsley, F. H., Sovereighty, 2ş. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 229-35.

    • 44 Held, Political Theory and the Modern State, p. 215.

    • 45 Held e McGrew, "Globalization and the Advanced Industrial State", documento de pesquisa não publicado, Open University, Milton Keynes, 1989, p. 13.

    • 47 Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., Power and Interdependence, Little, Brown, Boston, 1977;

    • Gourevitch, "The second image reversed";

    • e Katzenstein, Peter J., ed., Between Power and Plenty: Foreign Economic Policies of: Advanced Industrial States, University of Wisconsin Press, Madison, 1978.

    • 48 Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5.

    • 49 Ver, por exemplo, Smith, R., "Political economy and Britain's external position", in Britain in the World, compilação do ESRC, London, 1987.

    • 50 Cf. Giddens, Anthony, "Globalization, change and conflict",

    • falta a referência no original, Gilpin, Robert, The Political Economy of International Relations, Princeton University Press, Princeton, 1987, pp. 345 e ss.

    • ; Cox, Robert W., Production Power and World Order, Columbia University Press, New York, 1987, caps. 8 e 9;

    • Ruggie, John G., "International regimes, transactions and change: embedded liberalism in the post-war economic order", International Organization, 36 (1982);

    • Ruggie, J. G., ed., The Antonomies of Interdependence, Columbia University Press, New York, 1983;

    • e Kolko, J., Restructing the World Economy, Pantheon, New York, 1988.

    • 51 Ver Keohane, Robert O., "The world political economy and the crisis of embedded liberalism", in Order and Conflict in Contemporary Capitalism, ed. Goldthorpe,J.H. Oxford University Press," Oxford, 1984.

    • 52 Cooper, Economic Policy in an Interdependent World, pp. 1-22;

    • e Gilpin, The Political Economy of International Relations, pp. 397 e ss.

    • 53 Ver Luard, Evan, International Agencies: The Emerging Framework of Interdependence, Macmillan, London, 1977;

    • Krasner, Stephen, International Regimes, Cornell University Press, Ithaca, NY., 1983-

    • 54 Burnheim, John, "Democracy, nation-states and the world system", in New Forms of Democracy, eds. Held, David, e Pollitt, Christopher, Sage, London, 1986, p. 222.

    • 56 Cf. Harris, Lawrence, "Governing the world economy: Bretton Woods and the IMF", in The State and Society, 6 (26) (D209), The Open University, Milton Keynes, 1984;

    • e Girvan, N., "Swallowing the IMF medicine in the seventies", Development Dialogue, 2, 1980.

    • 57 Ver Wickham, Ann, "States and political blocs": the EEC", in The State and Society, 6 (28) (D209);

    • e Hoffmann, Stanley, "Reflections on the nation-state in Western Europe today", Journal of Common Market Studies, XXI (1 and 2), 1982.

    • 58 Cassese, Antonio, Violence and Law in the Modern Age, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 150 e ss.

    • 59 Ver Noel Emile, "The Single European Act", Government and Opposition, 1989, especialmente pp. 10-11.

    • 60 Ver Negro, J., "International institutions", in Democractic Government and Politics, 4 (13) (D308), The Open University, Milton Keynes, 1986.

    • 61 Capotorti, F., "Human rights: the hard road towards universality", in The Structure and Process of International Law, eds. Macdonald, R. St. J., e Johnson, D.M.Martinus Nijhoff, The Hague, 1983.

    • 62 Casesse, Violence and Law in the Modern Age, p. 132.

    • 63 Bull, The Anarchical Society, pp. 140 e ss.

    • 64 Ver Oppeheim, L., International Law, vol. 1. Longmans, London, 1905,cap. 1.

    • 65 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 230-233;

    • ver . também . Kaldor, Mary e Falk, Richard A.eds., Dealignment, Basil Blackwell, Oxford, .1987.

    • 66 Smith, Dan, "States and military blocs: Nato", 6 (27) (D209), p. 131

    • 67 Cf. Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process";

    • e Richelson J. e Ball, D., The Ties that Bind, Allen and Unwin, London, 1986.

    • 68 Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process", p. 370.

    • 69 Ruggie, J. G., "Human rights and the future international comunity", Daedalus, 112,4, 1983.

    • 70 Cf. Skinner, The Foundations of Modern Political Thought, vol. 2, pp. 353-8.

    • 71 Bull, The Anarchical Society, p. 254.

    • 73 Ibid., p. 248, e ver o meu livro Models of Democracy, pp. 36-41.

    • 74 Para uma discussão desse dilema, ver o artigo 1, "Central perspectives on the modern state", do meu livro Political Theory and the Modern State, pp. 11-51.

    • 76 Hinsley, F.H.Sovereignty, 2ş. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 222-3.

    • 77 Para uma análise mais completa, ver o meu Political Theory and the Modern State, pp. 214-225.

    • 78 Cf. Berlin, Isaiah, Four Essays on Liberty, Oxford University Press,. Oxford, 1969, pp. 164 ss.

    • 79 Sobre o conceito lockeano de comunidade política, ver Dunn, John, Locke, Oxford University Press, Oxford, 1984, especialmente pp. 44-57.

    • 80 Eu modifiquei a minha concepção anterior desse princípio em Models of Democracy, pp. 270-71.

    • 81 Cf Rawls, John, "Justice as fairness: political not metaphysical", Philosophy and Public Affairs, XIV 3, 1985, pp. 245 e ss.

    • 82 Ver Dagger, Richard, "Rights", in Political Innovation and Conceptual Change, pp. 304-5,

    • que faz uso proveitoso de uma série de distinções apresentadas em Hohfeld, Wesley, Fundamental Legal Conceptions, Yale University Press, New Haven, Conn., 1964.

    • 83 Manin, Bernard, "On legitimacy and political deliberàtion", Political Theory, 15, 3,1987, p. 352 e pp. 351-362 para uma interessante discussã

    • 84 Cf. Rawls, "Justice as fairness: political not metaphysical". Philosophy and Public Affairs 14, nş 3, 1985.

    • 85 Ver o meu artigo "Citizenship and Autonomy", in Political Theory and the Modern. State, pp. 189-213.

    • 86 Cf. Habermas, Jurgen, Theory and Practice, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 41-82;

    • e Legitimation Crisis, Heinemann, London, 1976, pp. 111-17.

    • 88 Cf. O'Neil, Onora, "Justice, Gender and International boundaries", numa coletânea editada por Nussbau, Martha, e Sen, Amartya K., Clarendon Press, Oxford, a ser publicada em breve.

    • 90 Deixo em aberto aqui um conjunto de questões referentes à aplicação (enforcement) do direito internacional. Cf., The anarchical Society, Bull, cap. 6; Falk, Richard A., The Status of Law in International Society, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1970;

    • e Cassese, Antonio, International Law in a Divided World, Clarendon Press, Oxford, 1986, seção II.

    • 91 Sobre a representação estatística, ver Burnheim, John, Is Democracy Possible?, Polity Press, Cambridge, 1985.

    • 94 Os modelos para a organização de tais esferas teriam muito que aprender das concepções de democracia direta. Mas seria necessário utilizar um enfoque experimental de tais estruturas organizacionais.. O estado atual da teoria da democracia e os conhecimentos que temos das experiências democráticas radicais não permitem previsões seguras sobre as estratégias mais adequadas para a mudança no campo da organização. Nesse sentido específico, a "música do futuro" (Marx) somente pode ser composta na prática através da inovação e da pesquisa. Ver Held, David, e Pollitt, Christophe, eds., New Forms of Democracy.

    * Trabalho apresentado na Conferência "Aprofundando e Globalizando a Democracia", realizada em Yokohama, Japão, 17-22 de março de 1990. ** Tradução de Régis de Castro Andrade. 1 Agradeço os comentários feitos por Tony McGrew, Michelle Stanworth, John Thompson e Anthony Giddens a uma versão anterior deste trabalho. Tony McGrew orientou-me constantemente através da volumosa literatura sobre relações internacionais; suas críticas construtivas foram particularmente úteis. Os temas e argumentos deste artigo serão ampliados num trabalho a ser publicado brevemente, The Foundation of Democracy, Polity Press, Cambridge. 2 Fukuyama, Francis. "The end of history? National Interest, verão 1989. 3 Para uma avaliação crítica dessas teorias/ver o meu livro Models of Democracy, Polity Press, Cambridge, 1987, parte II. 4 É claro que houve exceções. Ver, por exemplo, Therborn, Goran, "The Pule of Capital and the Rise of Democracy", New Left Review, 103, maio/junho de 1977; Howard, Michael, War and the Liberal Conscience, Oxford University Press, Oxford, 1981 e Hinsley, F. H., Power and the Pursuit of Peace, Cambridge University Press, Cambridge, 1963. 5 Ver por exemplo Brittan, S., "Can Democracy Manage an Economy?", in: The End of the Keynesian Era, ed. por Skidelsky, R., Martin Robertson, Oxford, 1977; e Nordhaus, W. D., "The Political Business Cycle", Review of Economic Studies, 42, 1975. Para uma resenha e discussão das questões envolvidas, ver o meu livro, Political Theory and the Modern State, Polity Press, Cambridge, 1989, artigos 4 e 6. 6 Hayek, The Constitucion of Liberty Routledge and Kegan Paul, London, 1960, pp. 405-6. 7 Skinner, Quentin The Foundations of Modern Political Thought, Cambridge University Press, Cambridge, 1978, vol. 2, pp. 349 e ss. 8 Macpherson, C. B. The Life and Times of Liberal Democracy, Oxford University Press, Oxford, 1977; e Pateman, Carole, The Problem of Political Obligation: A Critique of Liberal Theory, 2ª. edição, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 171 e ss. 9 Ver por exemplo, Macpherson, C. B., The Life and Times of Liberal Democracy, cap. 5; Pateman, Carole, Participation and Democratic Theory, Cambridge University Press, Cambridge, 1970; Held, Models of Democracy, caps. 8 e 9; e Keane, John, Democracy and Civil Society, Verso, London, 1988. 10 Entre as honrosas exceções estão Laski, Harold, Studies in Law and Politics, George Allen and Unwin, London, 1932, pp. 237 é ss. ; e Figgis, John N., Churches in the Modern State, Longmans, Green and Co., Londori, 1913, pp-54-93- Ver também suas obras escolhidas (com G. D..H. Cole) in The Pluralist Theory of the State, ed. por Hirst, Paul, Routledge, London, 1989. 11 Ver o meu Political Theory and the Modern State, artigo 8. 12 Dunn, John, "Responsability Without Power", no seu Interpreting Political Responsibility Polity Press, Cambridge, l990;:- e Giddens; Anthony, The Nation-State and Violence, Polity Press, Cambrige,1985. 13 Ver Spitz, E., Majority Rule, Chatham House, Chatham, NJ, 1984. 14 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, Polity Press, Cambridge, 1985, pp. 283-4. 15 McHenry, D. F. e Bird, K. "Food bungle in Bangladesh", Foreign Policy, verão, 27, 1977; e Sobhan, R., "Politics of food and famine in Bangladesh", Economic and Political Weekly, 1º. dezembro, 1979. 16 Ver Leftwich, Adrian, Redefining Politics, Methuen, London, 1983. 17 Offe, Claus, Disorganized Capitalism, pp. 286 e ss. 18 Held, D., Models of Democracy, pp. 73-78, 254-262, 267-289. 19 Cf, Hanson, Russell L; "Democracy", in Political Innovation and Conceptual Chatige, eds. Terence Ball, James Farr and Russel L. Hanson, Cambridge University Press, Cambridge, 1989, pp. 68-69. " 20 Cf. Laski, H., Studies in Law and Politics, pp. 262-275. 21 Ver Wallerstein, Immanuel, The Modern World-System, Academic Press, New York, 1974; e Anderson, Perry, Líneages of the Absolutist State, New Left B ooks, London, 1974. 22 Gaurevitch Peter, "The Second Image Reversed: The International Sources of Domestic Politics", International Organization, 32, 4, 1978, p. 908. 23 Ibid, pp. 908-911. 24 Callieres, François de, On the Manner of Negotiating with Princes, trad. por A. F.Whyte, Uniyersity of Notre Dame Press, Notre Dame, 1963, p. 11. 25 Bull, Hedley, The Anarchical Society, Macmillan, London, 1977, pp. 278-80. 26 Ibid, cap. 1, e Hinsley, Power and the Pursuit of Peace, parte 1. Entre as primeiras e mais importantes obras sobre essa matéria estão Kant, I. "Idea for a Universal History with a Cosmopolitan Purpose"," 1784, e "Perpetual Peace", 1795, in Kant's Political Writings, ed. por Hans Reiss, Cambridge University Press, Cambridge; 1970. 27 McGrew, Tony, "Conceptualizing Global Politics", in Global Politics, 1 (1) (D312), The Open University, Milton Keynes, 1988, pp. 19-20. 28 Kegley, Charles W. e Wittkopf, Eugene R., World Politics, Macmillan, London, 1989, p. .511. 29 Ver Morse, Edward, Modernization and the Transformation of Internacional Relations, Free Press, New York, 1976; Mansbach, Richard, et al., The Web of Politics, Prentice Hall, Englewood Cliffs, 1976; Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., eds., Transnacional Relations and World Politics, Harvard Uniyersity Press, Cambridge, Mass, 1972; Rosenau, James N., The Study of Global interdependence, Francis Pinter, London, 1980; Soroos, Marvin S., Beyond Sovereignty University of South Carolina Press, Columbia, 1986. 30 Ver Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5; e Cooper, Richard N., Economic Policy in an Interdependent World, MIT Press, Cambridge, Mass., 1986, pp. 1-22. 31 Ver Morse, Edward, op. cit. 32 Ver Keohane, Robert O., After Hegemony, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1984; e McGrew, Tony, "Toward Global Politics?" in Global Polítics, 7 (30), pp. 12-20. 33 Kaiser, Karl, "Transnational Relations as a Threat to the Democratíc Process", in Transnational Relations and World Politics, eds. Keohane e Nye, pp. 358-360. 34 Ver em particular, Morse, Edward, op. cit.; e Brown, S., New Forces, Old Forces and the Future of World Politics, Scott/Foreman, Boston, 1988. 35 cf. Modelski, George, Principies of World Politics, Free Press, New York, 1972; Herz, John H., The Nation-State and the Crisis of World Politics, McKay, New York, 1976, pp. 226-252; e Gilpin, Robert, War and Change in World Politics, Cambridge University Press, Cambridge, 1981. 36 Krasner, Stephen D., "Sovereignty": an Institucional Approach", Comparative Political Studies, 21, 1, 1988, p. 40. 37 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 234 e ss. 38 Bull, The Anarchical Society, p. 280. 39 Ver Bozeman, Adda B., "The International Order in a Multicultural World", in The Expansion of International Society, eds. Hedley Bull e Adam Watson, Oxford University Press, Oxford, 1984. 40 Ver Cassese, Antonio, "Violence, War and the Rule of Law in the International Comunity", nesse volume, e Vicent, R. J., Human Rights and International Relations, Cambridge University Press, Cambridge, 1986. Voltarei a essas questões adiante. 41 Hinsley, F. H., Sovereighty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 229-35. 42 Parte do material desta seção foi adaptada do meu livro Political Theory and the Modern State, artigo 8. 43 Essas questões são discutidas no meu Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente. 44 Held, Political Theory and the Modern State, p. 215. 45 Held e McGrew, " Globalization and the Advanced Industrial State", documento de pesquisa não publicado, Open University, Milton Keynes, 1989, p. 13. 46 Uma comparação entre as experiências dos países europeus, e, por exemplo, dos Estados Unidos e dos países de industrialização recente seria muito ilustrativa. Mas essa comparação excederia os limites deste artigo. 47 Keohane, Robert O., e Nye, Joseph S., Power and Interdependence, Little, Brown, Boston, 1977; Gourevitch, "The second image reversed"; e Katzenstein, Peter J., ed., Between Power and Plenty: Foreign Economic Policies of: Advanced Industrial States, University of Wisconsin Press, Madison, 1978. 48 Keohane e Nye, Transnational Relations and World Politics, pp. 392-5. 49 Ver, por exemplo, Smith, R., "Political economy and Britain's external position", in Britain in the World, compilação do ESRC, London, 1987. 50 Cf. Giddens, Anthony, "Globalization, change and conflict", falta a referência no original, Gilpin, Robert, The Political Economy of International Relations, Princeton University Press, Princeton, 1987, pp. 345 e ss. ; Cox, Robert W., Production Power and World Order, Columbia University Press, New York, 1987, caps. 8 e 9; Ruggie, John G., "International regimes, transactions and change: embedded liberalism in the post-war economic order", International Organization, 36 (1982); Ruggie, J. G., ed., The Antonomies of Interdependence, Columbia University Press, New York, 1983; e Kolko, J., Restructing the World Economy, Pantheon, New York, 1988. 51 Ver Keohane, Robert O., "The world political economy and the crisis of embedded liberalism", in Order and Conflict in Contemporary Capitalism, ed. Goldthorpe,J.H. Oxford University Press," Oxford, 1984. 52 Cooper, Economic Policy in an Interdependent World, pp. 1-22; e Gilpin, The Political Economy of International Relations, pp. 397 e ss. 53 Ver Luard, Evan, International Agencies: The Emerging Framework of Interdependence, Macmillan, London, 1977; Krasner, Stephen, International Regimes, Cornell University Press, Ithaca, NY., 1983- Em 1909 havia 37 organizações intergovernamentais e 176 organizações internacionais não-governamentais. Os números para 1984 eram, respectivamente, 280 e 4.615. 54 Burnheim, John, "Democracy, nation-states and the world system", in New Forms of Democracy, eds. Held, David, e Pollitt, Christopher, Sage, London, 1986, p. 222. 55 Ibid., pp. 220 e ss. 56 Cf. Harris, Lawrence, "Governing the world economy: Bretton Woods and the IMF", in The State and Society, 6 (26) (D209), The Open University, Milton Keynes, 1984; e Girvan, N., "Swallowing the IMF medicine in the seventies", Development Dialogue, 2, 1980. 57 Ver Wickham, Ann, "States and political blocs": the EEC", in The State and Society, 6 (28) (D209); e Hoffmann, Stanley, "Reflections on the nation-state in Western Europe today", Journal of Common Market Studies, XXI (1 and 2), 1982. . 58 Cassese, Antonio, Violence and Law in the Modern Age, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 150 e ss. 59 Ver Noel Emile, "The Single European Act", Government and Opposition, 1989, especialmente pp. 10-11. 60 Ver Negro, J., "International institutions", in Democractic Government and Politics, 4 (13) (D308), The Open University, Milton Keynes, 1986. 61 Capotorti, F., "Human rights: the hard road towards universality", in The Structure and Process of International Law, eds. Macdonald, R. St. J., e Johnson, D.M.Martinus Nijhoff, The Hague, 1983. Na Grã-Bretanha, por exemplo, a lei sobre grampeamento de telefones foi alterada em razão da intervenção da Comissão Européia, e as descobertas do Tribunal Europeu de Justiça levaram a mudanças na legislação britânica sobre várias questões tão importantes como discriminação sexual e igualdade salarial. 62 Casesse, Violence and Law in the Modern Age, p. 132. 63 Bull, The Anarchical Society, pp. 140 e ss. 64 Ver Oppeheim, L., International Law, vol. 1. Longmans, London, 1905,cap. 1. 65 Herz, The Nation-State and the Crisis of World Politics, pp. 230-233; ver . também . Kaldor, Mary e Falk, Richard A.eds., Dealignment, Basil Blackwell, Oxford, .1987. 66 Smith, Dan, "States and military blocs: Nato", 6 (27) (D209), p. 131 67 Cf. Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process"; e Richelson J. e Ball, D., The Ties that Bind, Allen and Unwin, London, 1986. 68 Kaiser, "Transnational relations as a threat to the democratic process", p. 370. 69 Ruggie, J. G., "Human rights and the future international comunity", Daedalus, 112,4, 1983. 70 Cf. Skinner, The Foundations of Modern Political Thought, vol. 2, pp. 353-8. 71 Bull, The Anarchical Society, p. 254. 72 Ibid., pp. 254-5. 73 Ibid., p. 248, e ver o meu livro Models of Democracy, pp. 36-41. 74 Para uma discussão desse dilema, ver o artigo 1, "Central perspectives on the modern state", do meu livro Political Theory and the Modern State, pp. 11-51. 75 A idéia da "autonomia democrática" foi apresentada no meu livro Models of Democracy, cap. 9, e. em Political Theory and the Modern State, artigo 6. O modelo federal da autonomia democrática é um tema central do meu livro Foundations of Democracy, a ser publicado brevemente. 76 Hinsley, F.H. Sovereignty, 2º. ed., Cambridge University Press, Cambridge, 1986, pp. 222-3. 77 Para uma análise mais completa, ver o meu Political Theory and the Modern State, pp. 214-225. 78 Cf. Berlin, Isaiah, Four Essays on Liberty, Oxford University Press,. Oxford, 1969, pp. 164 ss. 79 Sobre o conceito lockeano de comunidade política, ver Dunn, John, Locke, Oxford University Press, Oxford, 1984, especialmente pp. 44-57. 80 Eu modifiquei a minha concepção anterior desse princípio em Models of Democracy, pp. 270-71. 81 Cf Rawls, John, "Justice as fairness: political not metaphysical", Philosophy and Public Affairs, XIV 3, 1985, pp. 245 e ss. para uma discussão da noção de "estrutura básica da sociedade" como um quadro limitativo da ação. 82 Ver Dagger, Richard, "Rights", in Political Innovation and Conceptual Change, pp. 304-5, que faz uso proveitoso de uma série de distinções apresentadas em Hohfeld, Wesley, Fundamental Legal Conceptions, Yale University Press, New Haven, Conn., 1964. 83 Manin, Bernard, "On legitimacy and political deliberàtion", Political Theory, 15, 3,1987, p. 352 e pp. 351-362 para uma interessante discussã o do "processo de deliberação". 84 Cf. Rawls, "Justice as fairness: political not metaphysical". Philosophy and Public Affairs 14, nº 3, 1985. 85 Ver o meu artigo "Citizenship and Autonomy", in Political Theory and the Modern. State, pp. 189-213. 86 Cf. Habermas, Jurgen, Theory and Practice, Polity Press, Cambridge, 1988, pp. 41-82; e Legitimation Crisis, Heinemann, London, 1976, pp. 111-17. 87 Não seria apropriado, nos limites deste trabalho, tentar uma justificação adequada ou uma explicação dessas categorias. Devo sublinhar, contudo, que elas fazem referência a condições fundamentais de realização da participação política, e, portanto, do governo legítimo. A menos que sejam livres nessas cinco esferas, os cidadãos não podem participar plenamente do "governo" do Estado e das questões civis. As cinco categorias de direitos não articulam uma lista interminável de bens; elas articulam, antes, as condições necessárias para a participação livre e Igual. Uma constituição e declaração de direitos que estipulem as liberdades correspondentes a cada um desses cinco domínios reforçaria a capacidade dos cidadãos - refiro-me à sua capacidade real, ligada a condições de saúde, qualificação profissional, recursos - de valer-se das oportunidades que se oferecem a eles. Seria útil constituir uma ordem legal "capacitadora", definindo um quadro, ou âmbito comum de ação, tal como indicado no quadro abaixo. 88 Cf. O'Neil, Onora, "Justice, Gender and International boundaries", numa coletânea editada por Nussbau, Martha, e Sen, Amartya K., Clarendon Press, Oxford, a ser publicada em breve. 89 Models of Democracy, cap. 9. 90 Deixo em aberto aqui um conjunto de questões referentes à aplicação (enforcement) do direito internacional. Cf., The anarchical Society, Bull, cap. 6; Falk, Richard A., The Status of Law in International Society, Princeton University Press, Princeton, NJ., 1970; e Cassese, Antonio, International Law in a Divided World, Clarendon Press, Oxford, 1986, seção II. 91 Sobre a representação estatística, ver Burnheim, John, Is Democracy Possible?, Polity Press, Cambridge, 1985. 92 Na Europa isso significaria, por exemplo, a proteção e reforçamento do programa europeu de direitos humanos, e um maior desenvolvimento do papel do sistema de tribunais de justiça europeus. 93 Caso tal assembléia se revele um sonho impossível (e há boas razões para pensar que essa hipótese é muito provável), uma rede mais restrita de Estados regionais e sociedades democráticas ainda poderia oferecer a possibilidade de uma regulamentação e meios de controle mais efetivos do que os que existem no atual sistema de Estados. 94 Os modelos para a organização de tais esferas teriam muito que aprender das concepções de democracia direta. Mas seria necessário utilizar um enfoque experimental de tais estruturas organizacionais.. O estado atual da teoria da democracia e os conhecimentos que temos das experiências democráticas radicais não permitem previsões seguras sobre as estratégias mais adequadas para a mudança no campo da organização. Nesse sentido específico, a "música do futuro" (Marx) somente pode ser composta na prática através da inovação e da pesquisa. Ver Held, David, e Pollitt, Christophe, eds., New Forms of Democracy.

    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 1991

    Qual é o papel da instituição analisada e seu ganho para o exercício democrático no Brasil?