Quais os problemas mais frequentes ao fazer uso de plantas medicinais?

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Quais os problemas mais frequentes ao fazer uso de plantas medicinais?

12:04 - 30/09/2015

Quais os problemas mais frequentes ao fazer uso de plantas medicinais?

O uso das plantas medicinais da Amazônia ocorre há muitos séculos. Nossos pais, avós e bisavós costumavam realizar esse tipo de prática para curar diversas enfermidades. Mas, da mesma forma que existem cuidados e restrições para o uso dos medicamentos comprados nas farmácias, a prática da medicina tradicional  também precisa de precauções.

Formado em Farmácia e Bioquímica pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, mestre em Ciências de Alimentos pela Universidade Federal do Amazonas e Fiscal do Departamento de Vigilância Sanitária (DVisa), da Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), Fábio Markendorf, conversou com a jornalista Maxcilene Azevedo da Agência FAPEAM  de Notícias e falou sobre as leis e normas referentes ao uso das plantas medicinais no Amazonas, e alertou: “é importante esclarecer a população acerca do risco do consumo de drogas vegetais sem origem definida, pois a segurança e a possibilidade de contaminantes são um grande problema à saúde pública”, disse.

Leia a entrevista completa:

Agência FAPEAM – O que é e o que não é considerado planta medicinal/curativa para a Vigilância Sanitária?

Fábio Markendorf – Plantas medicinais são aquelas plantas cuja composição contém princípios ativos capazes de aliviar ou curar enfermidades e têm tradição de uso como remédio em uma população ou comunidade. Para usá-las, é preciso conhecer a planta e saber onde colher e como prepará-la. Quando a planta medicinal é industrializada para se obter um medicamento, tem-se como resultado o fitoterápico. O processo de industrialização evita contaminações por microorganismos, agrotóxicos e substâncias estranhas, além de padronizar a quantidade e a forma certa que deve ser usada, permitindo uma maior segurança de uso.

AF – Qual a diferença entre medicamento e remédio?

Fábio Markendorf – Remédio e medicamento são dois termos distintos, gerando muitas vezes confusão. Medicamento é o produto industrializado que contém uma droga ou associação de drogas com uma finalidade terapêutica. Já o conceito de remédio remete-se a qualquer tipo de intervenção que possa levar a melhoria do quadro clínico do indivíduo. Uma canja de galinha pode ser considerada um remédio, por exemplo, pois traz conforto ao enfermo. Todo medicamento é portanto um remédio, mas nem todo remédio é considerando ou deverá ser um medicamento.

AF – Os fitoterápicos industrializados devem ser registrados na Anvisa/Ministério da Saúde antes de serem comercializados?

Fábio Markendorf – Os fitoterápicos, assim como todos os medicamentos, devem oferecer garantia de qualidade, ter efeitos terapêuticos comprovados, composição padronizada e segurança de uso para a população. A eficácia e a segurança devem ser validadas através de levantamentos etnofarmacológicos, documentações tecnocientíficas em bibliografia e/ou publicações indexadas e/ou estudos farmacológicos e toxicológicos pré-clínicos e clínicos. A qualidade deve ser alcançada mediante o controle das matérias-primas, do produto acabado, materiais de embalagem, formulação farmacêutica e estudos de estabilidade. Existe confusão também acerca de outros termos, com por exemplo os chás, homeopatia e partes de plantas medicinais. No Brasil, os chás são enquadrados como alimentos. Se o chá se tratar, por exemplo, de bebida pronta para o consumo, já é tratado como produto sujeito a licenciamento no Ministério da Agricultura. Os medicamentos homeopáticos são produzidos de forma diferente dos fitoterápicos, através de dinamização que é, na verdade, um método de diluição seriada. Neste tipo de terapia, são também utilizados, além de princípios ativos de origem vegetal, outros de origem animal, mineral e sintética. As plantas medicinais são consideradas matérias primas a partir do qual é produzido o fitoterápico. As plantas medicinais podem ser comercializadas no Brasil em farmácias, drogarias e ervanarias, desde que não apresentem indicações terapêuticas definidas, seja feito um acondicionamento adequado e declarada sua classificação botânica.

AF – Há farmácias em Manaus credenciadas para venda e produção dessas plantas?

Fábio Markendorf – Os estabelecimentos farmacêuticos (Farmácias e drogarias) não precisam se cadastrar para comercializar plantas medicinais. O requisito necessário é que a planta medicinal comercializada tenha origem definida nos termos da lei, ou seja, deverá possuir registro na ANVISA. Para produção de plantas medicinais é necessário que exista uma planta (fabril) aprovada para tal atividade. A produção de plantas medicinais é atividade sujeita a licenciamento sanitário. Desta forma o chamado produto fitoterápico é na verdade parte ou partes de uma planta, adequadamente processada e que tem certificação de origem. Além da necessidade de certificação de origem as chamadas boas práticas de fabricação devem ser observadas durante toda a cadeia do medicamento (sim plantas medicinais são produtos medicamentosos). Atualmente não há estabelecimentos em Manaus licenciados para o beneficiamento de plantas medicinais ou mesmo Ervanárias licenciadas para comércio exclusivo de drogas vegetais. O comércio de drogas vegetais se dá de forma clandestina. As bancas nas feiras estão no extremo da irregularidade, primeiro por que não são estabelecimentos que possuem licenciamento sanitário, e na forma da lei apenas farmácias, drogarias e ervanarias podem comercializar tais produtos, sempre sob a supervisão de um farmacêutico.

AF – As plantas medicinais da Amazônia podem fazer mal à saúde?

Fábio Markendorf – Como qualquer medicamento, o mau uso de plantas medicinais, independente da origem, pode ocasionar problemas à saúde, como por exemplo: alterações na pressão arterial, problemas no sistema nervoso central, fígado e rins, que podem levar a internações hospitalares e até mesmo a morte, dependendo da forma de uso. O grande agravante observado no comércio ambulante é a questão da venda de produtos ditos “medicinais” que na verdade não passam de panaceias sem efeito terapêutico real, podendo agravar ainda mais o quadro de saúde daquele indivíduo que possui alguma enfermidade e faz uso de tal expediente buscando o restabelecimento da saúde. Tais panaceias são produzidas em condições extremamente precárias de higiene e são sem sombra de dúvida um grande risco a saúde da população.

AF – Quais as precauções devem ser tomadas em relação aos fitoterápicos?

Fábio Markendorf – Os cuidados são os mesmos destinados aos outros medicamentos: buscar informações com os profissionais de saúde. Informar ao seu médico qualquer reação desagradável que aconteça enquanto estiver usando plantas medicinais ou fitoterápicos. Observar cuidados especiais com gestantes, mulheres amamentando, crianças e idosos. Informar ao seu médico se está utilizando plantas medicinais ou fitoterápicos, principalmente antes de cirurgias. Adquirir fitoterápicos apenas em farmácias e drogarias autorizadas pela Vigilância Sanitária. Seguir as orientações da bula e rotulagem. Observar a data de validade – nunca tomar medicamentos vencidos. Seguir corretamente os cuidados de armazenamento e desconfiar de produtos que prometem curas milagrosas.

AF – Há problemas em usar outros medicamentos junto com as plantas medicinais?

Fábio Markendorf – Os fitoterápicos são medicamentos alopáticos, possuindo compostos químicos que podem interagir com outros medicamentos. As plantas medicinais também possuem compostos químicos ativos que podem promover este tipo de interação. Deve-se ter cuidado ao associar medicamentos, ou medicamentos com plantas medicinais, o que pode promover a diminuição dos efeitos ou provocar reações indesejadas. Deve-se sempre observar as informações contidas nas bulas disponibilizadas nos medicamentos e questionar o seu médico ou profissional de saúde sobre possíveis interações. Extrato seco padronizados que não precisam de prescrição médica mas que apresentam muitas interações medicamentosas como: boldo, espinheira santa, ginseng, maracujá, menta, guaraná, chá verde e outros. (Ver quadro abaixo).

AF – Há leis que permitem o uso e venda de plantas medicinais a população?

Fábio Markendorf – Sim, a Anvisa tem o papel de regulamentar todos os medicamentos, incluindo os fitoterápicos, e fiscalizar as indústrias produtoras de medicamentos com o intuito de proteger e promover a saúde da população. Sendo assim, a Anvisa controla a produção, a liberação para consumo (registro) e acompanha a comercialização dos medicamentos, podendo retirá-los do mercado caso seu consumo apresente risco para a população. O registro de fitoterápicos segue o disposto na Lei nº 6.360/73 regulamentado pelo Decreto nº 79.094/77.

AF – Quem pode receitar e indicar o uso de plantas medicinais?

Fábio Markendorf – O médico, que deve procurar se especializar na área de fitoterapia. Nutricionista que pode prescrever planta fresca ou droga vegetal, somente para uso oral, não uso tópico, assim como não pode prescrever os fitoterápicos de exclusiva prescrição médica, os tarja vermelha, e somente pode prescrever os produtos com indicação terapêutica relacionada ao seu campo de conhecimento específico. Cirurgião dentista que somente pode prescrever fitoterápicos dentro da odontologia. Médico-veterinário que somente pode prescrever fitoterápicos dentro da veterinária e o Farmacêutico que pode prescrever medicamentos feitos na própria farmácia ou isentos de prescrição médica, pode prescrever ou indicar em doenças de baixa gravidade e em atenção básica à saúde.

AF – Como saber se uma planta medicinal, é registrada na Anvisa/ Ministério da Saúde?

Fábio Markendorf – Verifique na embalagem o número de inscrição do medicamento no Ministério da Saúde. Deve haver a sigla MS, seguida de um número contendo de 9 a 13 dígitos, iniciado sempre por 1. Há a possibilidade de consultar o registro do produto no site da ANVISA no endereço eletrônico: http://www.anvisa.gov.br/medicamentos/banco_med.htm. Ao encontrar um produto sendo vendido como fitoterápico que não tenha registro na Anvisa, o ideal é denunciar ao DVISA MANAUS através do telefone 0800-092 0123.

Quadro com alguns medicamentos que apresentam interações medicamentosas

Planta Contra – indicações
Castanha-da-índia Tem um componente tóxico chamado esculina, que se não for retirado do extrato, pode causar vertigem, náusea, cefaleia, prurido. Ainda assim há risco de vertigem hepatotoxicidade, nefrotoxicidade e irritação no trato digestivo. Já tive pacientes que tiveram alergia ao composto. Há estudos que mostram interação moderada com anticoagulantes/antiplaquetários, e há risco moderado com hipoglicemiantes. Compra-se sem receita médica e há um uso “popular” consagrado de que é um bom venotônico.
Alho Aumenta a toxicidade de um retroviral usado no tratamento da Aids; aumenta a meia vida da hidroclorotiazida, um diurético comumente usado por nossos hipertensos, interação com a atorvastatina, uma medicação usada para baixar o colesterol), interage com ciclosporina, anticoagulantes, contraceptivos. Com a Isoniazida e com o Saquinavir apresenta interação considerada grave. Com Varfarina a interação é considerada moderada, assim como substratos do citocromo P450 2E1 (CYP2E1) e Citocromo P450 3A4 (CEP3A4). Interage teoricamente como ácido eicosapentaenóico (EPA).
Babosa ou Aloe vera Pode ter interação moderada com hipoglicemiantes, diuréticos, Sevoflurano, Laxantes, Varfarina. Tem interação grave com digoxina, droga comumente usada na insuficiência cardíaca. Tem ainda interação com ervas contendo glicosídeos cardíacos, ervas ou suplementos com potencial hipoglicemiante, cavalinha, alcaçuz e ervas laxantes. Interfere em testes colorimétricos.
Boldo Alto risco de sangramento por interação moderada com anticoagulantes/antiplaquetários. Pode gerar intensificação da ação de fármacos antiarrítmicos. O uso simultâneo com outras drogas ou ervas que induzem hipocalemia, como diuréticos tiazídicos, adrenocorticosteróides ou Glycyrrhiza uralensis poderá exacerbar o desequilíbrio de eletrólitos Arnica: Além dos efeitos colaterais quando usada via oral, apresenta na forma tópica o risco de dermatite de contato e irritação da mucosa. Tem forte interação com anticoagulantes e drogas antiplaquetárias, além do risco de alergenicidade cruzada.
Canela Risco de interação com hipoglicemiantes orais e insulina. Interage com outros fitoterápicos com ação hipoglicemiante. Há pacientes que relatam aumento da pressão arterial com o consumo.
Calêndula Há risco de interação com drogas hepatotóxicas. Não deve ser usada durante a gravidez e amamentação, exceto sob orientação médica
Camomila Há risco de sangramentos na interação com drogas anticoagulantes/antiplaquetárias.
Centella Asiática Há risco moderado de interação com drogas hepatotóxicas. Há um risco grave de interação com drogas depressoras do sistema nervoso central. Interage com ervas e suplementos com propriedades sedativas.
Cáscara sagrada Por irritar o trato digestivo pode diminuir a biodisponibilidade de inúmeros medicamentos. Interfere em testes colorimétricos e pode levar a hipocalemia.
Chá verde Por ter cafeína diminui absorção de metais divalentes, diminui absorção do Ferro, Ácido fólico, pode irritar a mucosa gástrica, aumentar a concentração de catecolaminas, pode aumentar os níveis de creatinina urinária e cálcio urinário, diminuição da Ferritina por diminuir absorção de Ferro. Há risco de hepatotoxicidade e elevação das enzimas hepáticas. Piora a função tireoideana por ser rico em flúor inorgânico. Altera testes de função pulmonar e testes de focromocitoma. Tem interação moderada com: Adenosina, Antibibióticos quinolônicos, Cimetidina, Dipiridamol, Dissulfiram, Anticoagulantes/antiplaquetários, Drogas hepatotóxicas, Estrógenos, IMAO, Lítio, Nicotina, Pentobarbital, Teofilina, Verapamil. Interação grave com: Anfetaminas, Cocaína, Efedrina. Interação leve com hipoglicemiantes, etanol, fluconazol, Terbinafina.
Alcachofra Contra-indicada nos casos de oclusão das vias biliares e hepatopatias graves. Por ter efeito diurético, pode interagir sinergicamente com diuréticos e levar a hipocalemia e depleção de volume. As interações mais graves poderão ser verificadas com diuréticos de alça e tiazídicos.
Eucalipto Interação moderada com hipoglicemiantes orais, diminui a eficácia de medicamentos homeopáticos, pode ocasionar alterações no sistema nervoso central quando administrado com drogas que atuam no sistema nervoso central.
Guaco Interação moderada com anticoagulantes/antiplaquetários. Interage sinergicamente “in vitro”, com alguns antibióticos como tetraciclinas, cloranfenicol, gentamicina, vancomicina e penicilina. Há risco de sangramento nas coagulopatias e dengue.
Guaraná Potencializa a ação de analgésicos. Interage moderadamente com anticoagulantes/antiplaquetários podendo aumentar o risco de sangramento.
Alcaçuz Não deve ser utilizado por pacientes com hipertensão arterial e diabéticos tipo II, insuficiência renal, hiperestrogenismo. Interações medicamentosas com corticóides e ciclofosfamida, podendo aumentar a atividade de ambos. Pode interferir em tratamentos hormonais e terapias hipoglicemiantes.
Sene Como é um laxante, ocasiona uma diminuição do tempo do trânsito intestinal e com isso diminuir a absorção de fármacos administrados por via oral. Ocasiona perda de potássio que poderá potenciar os efeitos de digitálicos.
Ginseng Há risco de interação com IMAOS, anticoagulantes/antiplaquetários. O uso concomitante de medicamentos fitoterápicos à base de ginseng e estrogênios pode provocar efeitos adversos advindos do aumento da atividade estrogênica, tais como mastalgia e sangramento menstrual excessivo. Alguns relatos de casos sugerem que o ginseng possui atividade semelhante aos hormônios estrogênicos.
Gengibre Interação leve com bloqueadores de canais de cálcio e hipoglicemiantes orais. Interação moderada com anticoagulantes/antiplaquetários.
Estévia Interação moderada com hipoglicemiantes, Lítio e com anti-hipertensivos.
Espinheira Santa Interação com álcool. Melissa ou erva-cidreira: Interação moderada com depressores do sistema nervoso central, interage com ervas e suplementos com propriedades sedativas.
Menta Interação leve com antiácidos (bloquedores de H2 e inibidores da bomba de prótons). Interação moderada com ciclosporina, Substratos do citocromo P450 1A2, 2C19, 2C9, 3A4. Pode alterar níveis de FSH, LH, testosterona.
Maracujá ou Passiflora

Interação moderada com depressores do sistema nervoso central, interage com ervas e suplementos com propriedades sedativas.

Maxcilene Azevedo – Agência FAPEAM

Quais são os maiores problemas no uso de plantas medicinais?

Ela, apesar de possuir baixa toxidade, em altas doses pode desencadear diversos problemas, incluindo aborto. É importante destacar que algumas plantas, além de não terem seu poder de cura comprovado, são apontadas como mutagênicas (causam mutações) e até carcinogênicas (provocam câncer).

Quais são os possíveis problemas na utilização de plantas medicinais como remédio?

Fábio Markendorf – Como qualquer medicamento, o mau uso de plantas medicinais, independente da origem, pode ocasionar problemas à saúde, como por exemplo: alterações na pressão arterial, problemas no sistema nervoso central, fígado e rins, que podem levar a internações hospitalares e até mesmo a morte, dependendo da ...

Quais os principais problemas decorrentes do uso incorreto de plantas medicinais?

E de contaminação secundária durante a manipulação e o armazenamento inadequado destes produtos(10). Mesmo os chás e ervas vendidos em farmácias podem ser fonte de intoxicação por vírus, bactérias e fungos contaminantes, pois não existem estudos de segurança, eficácia e qualidade de grande parte das plantas(11).

Quais são os riscos do uso de plantas medicinais e fitoterápicos?

Entretanto, podemos dizer que um dos maiores problemas do uso indiscriminado de fitoterápicos é que as substâncias presentes em algumas plantas podem interagir de forma negativa com certos medicamentos empregados no tratamento de doenças como, por exemplo, diabetes e hipertensão.