Porque não podemos administrar medicamento preparado por uma outra pessoa

Obrigatoriedade do técnico de enfermagem administrar uma droga após ser reconstituída por um colega no plantão anterior, sabendo que a mesma está sendo mantida na conservação adequada e devidamente identificada.

  1. Do Fato

Aportou neste Departamento de Fiscalização solicitação de Parecer Técnico de Enfermeira que questiona sobre a obrigatoriedade do técnico de enfermagem administrar uma droga após ser reconstituída por um colega no plantão anterior, sabendo que a mesma está sendo mantida na conservação adequada e devidamente identificada”. Para o cumprimento do requerido, foi exarado o Despacho nº 1175/2016-COORD./DEFIS, fls. 003 do Processo Administrativo – PAD nº 0419/2016.

  1. Da Fundamentação e Análise

É cediço que a prerrogativa da Administração de Medicamentos nas Unidades de Saúde está sob a responsabilidade da Equipe de Enfermagem. Tal prática é muito mais complexa do que se imagina, devendo-se ser analisada desde o momento da prescrição médica até sua administração ao paciente, averiguando criticamente o sistema de medicação através da avaliação de possíveis falhas e suas causas. É na administração da medicação que se tem a última oportunidade de prevenção de erros que podem ter surgido desde a prescrição médica, dispensação dos medicamentos, preparo e diluição. A colaboração da equipe multidisciplinar, em especial da Enfermagem, é de extrema importância para implementação e análise da segurança do sistema, onde medidas preventivas deverão ser estabelecidas através de estratégias que visem proteger todos os envolvidos, principalmente o paciente.

Cumpre ressaltar que o National Coordinating Council for Medication Error Reporting and Prevention (NCCMERP)1, composta de 27 organizações, apresenta a seguinte definição para erro na medicação: “é qualquer evento evitável que pode causar ou induzir ao uso inapropriado de medicamento ou prejudicar o paciente enquanto o medicamento está sob o controle do profissional de saúde, paciente ou consumidor. Tais eventos podem estar relacionados ao exercício profissional, produtos de saúde, procedimentos e sistemas, incluindo a prescrição, comunicação ordem, rotulagem do produto, embalagem e nomenclatura, composição, distribuição, administração, educação, monitoramento e uso”.

A Resolução da Diretoria Colegiada – RDC 45/20032 da ANVISA que “Dispõe sobre o Regulamento Técnico de Boas Práticas de utilização das Soluções Parenterais (SP) em Serviços de Saúde” fixa requisitos mínimos exigidos para utilização de SP, a fim de assegurar que tais produtos, quando administrados, sejam seguros e eficazes:

[…]

Anexo II

BOAS PRÁTICAS DE PREPARO E ADMINISTRAÇÃO DAS SP

[…]

3.1. Preparo

3.1.1. A responsabilidade pelo preparo das SP pode ser uma atividade individual ou conjunta do enfermeiro e do farmacêutico.

3.1.2. Devem existir procedimentos escritos e disponíveis que orientem o preparo das SP nos serviços de saúde.

[…]

3.2 Administração

3.2.1. Os serviços de saúde devem possuir uma estrutura organizacional e de pessoal suficiente e competente para garantir a qualidade na administração das SP, seguindo orientações estabelecidas neste Regulamento.

3.2.2. O enfermeiro é o responsável pela administração das SP e prescrição dos cuidados de enfermagem em âmbito hospitalar, ambulatorial e domiciliar.

3.2.3. A equipe de enfermagem envolvida na administração das SP é formada pelo enfermeiro, técnico e/ou auxiliar de enfermagem, tendo cada profissional suas atribuições específicas em conformidade com a legislação vigente.

3.2.4. O enfermeiro deve regularmente desenvolver, rever e atualizar os procedimentos escritos relativos aos cuidados com o paciente sob sua responsabilidade.

[…]

O Ministério da Saúde3, para garantir a segurança do paciente, elaborou o Programa Nacional de Segurança do Paciente-PNSP, onde cita-se:

PROTOCOLO DE SEGURANÇA NA PRESCRIÇÃO, USO E ADMINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS

[…]

5.1.5. Posologia, diluição, velocidade e tempo de infusão.

[…]

  1. b) Diluição

Para medicamentos de uso endovenoso, intramuscular, subcutâneo e em neuroeixo e plexos nervosos, a prescrição deverá conter informações sobre diluente (tipo e volume), velocidade e tempo de infusão (para endovenosos).

A reconstituição e diluição dos medicamentos é etapa importante e que gera impacto sobre a estabilidade e até mesmo sobre a efetividade do medicamento, pois em alguns casos as incompatibilidades levam a diminuição ou perda da ação farmacológica do medicamento.

[…]

De forma imperativa a Lei nº 7.4984 de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem e dá outras providências, que é regulamentada pelo Decreto nº 94.4065 de 08 de junho de 1987, tratam de proposições diretamente ligadas ao tema em questão quando fala de organização dos serviços de Enfermagem:

Lei nº 7.498/1986

[…]

Art. 11. O Enfermeiro exerce todas as atividades de enfermagem, cabendo-lhe:

I – privativamente:

[…]

b)organização e direção dos serviços de enfermagem e de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses serviço;

c)planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de enfermagem;

[…]

II – como integrante da equipe de saúde:

a)participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde;

b)participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde;

[…]

Decreto nº 9.4406/1987

[…]

 Art. 8º – Ao enfermeiro incube:

I – privativamente:

[…]

b)organização e direção dos serviços de enfermagem e de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses serviço;

c)planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de enfermagem;

[…]

II – como integrante da equipe de saúde:

a)participação no planejamento, execução e avaliação da programação de saúde;

b)participação na elaboração, execução e avaliação dos planos assistenciais de saúde;

[…]

f)participação na elaboração de medidas de prevenção e controle sistemático de danos que possam ser causados aos pacientes durante a assistência de Enfermagem;

 […]

Art. 11 – O Auxiliar de Enfermagem executa as atividades auxiliares, de nível médio atribuídas à equipe de Enfermagem, cabendo-lhe:

[…]

III – executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, além de outras atividades de Enfermagem, tais como:

ministrar medicamentos por via oral e parenteral;

[…]

Para tanto, os indicadores de resultados são de vultosa importância para a avaliação dos serviços de Enfermagem, onde os mesmos são representações quantitativas ou qualitativas dos resultados. Cabe ressaltar que um dos indicadores mais importantes são as taxas de eventos adversos, que constituem ocorrências indesejáveis de natureza danosa ou prejudicial, porém previníveis, que comprometem a segurança do paciente que se encontra sob os cuidados dos profissionais de saúde. Associado a isso, temos o crescimento dos Programas de Acreditação Hospitalar como sendo uma avaliação externa, que atuam na verificação da concordância da estrutura e dos processos assistenciais adotados com o conjunto de padrões previamente estabelecidos. Além disso, o Enfermeiro Gerente/Coordenador da Equipe de Enfermagem conta com duas normativas do Conselho Federal de Enfermagem-COFEN que têm fundamental importância na organização desses serviços, a saber, Resolução COFEN nº 358/20096 que “Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem, e dá outras providências” e Resolução COFEN nº 509/20167 que “Atualiza a norma técnica para anotação de responsabilidade técnica pelo serviço de enfermagem e define as atribuições do enfermeiro responsável técnico”, onde destaca-se:

Resolução COFEN nº 358/2009

Art. 1º O Processo de Enfermagem deve ser realizado, de modo deliberado e sistemático, em todos os ambientes, públicos ou privados, em que ocorre o cuidado profissional de Enfermagem.

 […]                                                

Resolução COFEN nº 509/2016

[…]

Art. 10 São atribuições do enfermeiro RT:

[…]

VIII – Organizar o Serviço de Enfermagem utilizando-se de instrumentos administrativos como regimento interno, normas e rotinas, protocolos, procedimentos operacionais padrão e outros;

[…]

XIII – Promover a qualidade e desenvolvimento de uma assistência de Enfermagem segura para a sociedade e profissionais de Enfermagem, em seus aspectos técnicos e éticos;

XIV – Responsabilizar-se pela implantação/implementação da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), conforme legislação vigente;

[…]

Outra técnica que pode ser utilizada para assegurar uma prática medicamentosa livre de riscos de eventos adversos para o paciente são os nove certos: usuário certo, dose certa, medicamento certo, hora certa, via certa, anotação certa, orientação ao paciente, compatibilidade medicamentosa e o direito do paciente em recusar a medicação (TEIXEIRA; CASSIANI, 2010)8.

Ademais, o compromisso ético dos profissionais de Enfermagem, pautado na Resolução COFEN nº 311/20079 que “Aprova a Reformulação do Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, deve ser condição indispensável para a prática do exercício da Enfermagem, onde destacam-se os artigos que seguem em seu anexo:

[…]

DIREITOS

Art. 10 – Recusar-se a executar atividade que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal, ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, família e coletividade;

[…]

Art. 12 – Assegurar à pessoa, família e coletividade assistência de enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência;

Art. 13 – Avaliar criteriosamente sua competência técnica, científica, ética e legal e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si e para outrem.

Art. 14 – Aprimorar os conhecimentos técnicos, científicos, éticos e culturais, em benefício da pessoa, família e coletividade e do desenvolvimento da profissão.

 […]

RESPONSABILIDADES E DEVERES

[…]

Art. 21 – Proteger a pessoa, família e coletividade contra danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência por parte de qualquer membro da Equipe de Saúde.

[…]

PROIBIÇÕES

[…]

Art. 30 – Ministrar medicamentos sem conhecer a ação da droga e sem certificar-se da possibilidade dos riscos.

[…]

Não se pode olvidar do ínsito nos incisos II e XIII, do artigo 5º, da Lei Mater10:

[…]

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[…]

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

[…]

XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

[…]

  1. Da conclusão

Diante do exposto e considerando o ordenamento jurídico em vigência, entendemos que sobre “a obrigatoriedade do técnico de enfermagem administrar uma droga após ser reconstituída por um colega no plantão anterior, sabendo que a mesma está sendo mantida na conservação adequada e devidamente identificada”, não há óbice legal para tal desde que a Unidade disponha de Protocolo para administração de medicamentos, considerando as recomendações do fabricante e/ou do farmacêutico da Instituição. Na etiqueta de identificação deverá constar no mínimo: a dosagem, fármaco/princípio ativo, solução utilizada para a diluição, tempo de estabilidade, validade, conservação, temperatura ideal do refrigerador para os medicamentos que necessitam de refrigeração, tempo para alcançar a temperatura ideal das medicações sob refrigeração para posterior administração nos pacientes, aspecto normal da solução, horário do preparo e identificação do profissional que procedeu com a diluição. Para tanto, o profissional Enfermeiro deverá aplicar ferramentas fundamentais para estruturar e metodizar as atividades prestadas, haja vista que conhecer e realizar a diluição e a identificação correta dos medicamentos facilita o processo de recuperação do doente e permite que órgãos e sistemas não sejam ainda mais prejudicados (TELLES FILHO; CASSIANI, 2004)11.

É o parecer salvo melhor juízo.

Recife, 06 de Outubro de 2016.

Giovana Júlia Martins Mastrangeli de Melo

Coren-PE nº 108.995-ENF

Enfermeira Fiscal

Referências

  1. NCCMERP. National Coordinating Council for Medication Error Reporting and Prevention. Disponível em: http://www.nccmerp.org/about-medication-errors. Acesso em 05 Out. 2016.
  1. ANVISA. Resolução nº 45 de 12 de março de 2003. Dispõe sobre o Regulamento Técnico de Boas Práticas de Utilização de Soluções Parenterais (SP) em Serviços de Saúde. Disponível em: < https://pt.scribd.com/document/92553470/RESOLUCAO-RDC-N-%C2%BA-45-DE-12-DE-MARCO-DE-2003 > Acesso em: 05 Out. 2016.
  1. Ministério da Saúde. Disponível em: <http://www.hospitalsantalucinda.com.br/downloads/prot_meficamentos.pdf> Acesso em: 05 Out. 2016.
  1. Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem e dá outras providências. D.O.U. de 26.6.1986. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7498.htm. Acesso em: 05 Out. 2016.
  1. Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987. Regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem, e dá outras providências. DOU de 9.6.1987. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/decreto-n-9440687_4173.html. Acesso em: 05 Out. 2016.
  1. Resolução COFEN nº 358/2009. Anexos. Disponível em <http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-3582009_4384.html > Acesso em: 20 Set. 2016.
  1. Resolução COFEN 509/2016. Disponível em: <http://novo.portalcofen.gov.br/wp-content/uploads/2016/03/RESOLUCAO5092016.PDF> Acesso em: 22 Jul. 2016.
  1. TEIXEIRA, T.C.A.; CASSIANI, S.H.B. Análise de cauda raiz: Avaliação de erros de medicação em um hospital universitário. Revista da Escola de Enfermagem da USP. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0080-62342010000100020>. Acesso em: 05 Out. 2016.
  1. Resolução COFEN nº 311/2007. Anexos. Disponível em: <http://www.cofen.gov.br/wpcontent/uploads/2012/03/resolucao_311_anexo.pdf> Acesso: 05 Out. 2016.
  1. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 22 Jul. 2012.
  1. TELLES FILHO, P.C.P.; CASSIANI, S.H.B. Administração de medicamentos: aquisição de conhecimentos e habilidades requeridas por um grupo de enfermeiros. Rev Latino Am- Enfermagem , v.12, n. 3, p. 553-540, 2004.

Quais os cuidados o profissional de enfermagem deve ter no preparo e administração de medicamentos?

Cuidados de Enfermagem na Administração de Medicamentos.
Boa iluminação no local de preparo;.
Realizar a higiene das mãos;.
Manter a Concentração e atenção durante o preparo da medicação;.
Não interromper a tarefa antes de finalizada;.
Manter a prescrição médica sempre à frente enquanto é preparada;.

Quais os requisitos necessários para o profissional administrar medicamentos?

Segurança no Preparo Administração de Medicamentos.
Prescrição por ordem verbal somente em situação de emergência..
Administrar medicamento somente com prescrição médica..
Não administrar medicamento sem rótulo ou sem identificação..
Verificar data de validade antes da administração..

Quais são os cuidados básicos no preparo e administração dos medicamentos?

Cuidados na Administração de Medicamentos.
Medicação certa..
Paciente certo..
Dose certa..
Via certa..
Horário certo..
Registro certo..
Ação certa..
Forma farmacêutica certa..

O que deve ser observado nos medicamentos antes de Prepara

No momento do preparo e administração de medicamentos é importante que enfermeiro fique atento e leve em consideração o conceito dos 9 certos:.
Paciente certo;.
Medicamento certo;.
Via certa;.
Hora certa;.
Dose certa;.
Registro certo;.
Orientação certa;.
Forma/Apresentação certa;.