Faz sentido falar em arco do desmatamento explique?

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DESENVOLVIMENTO AMAZÔNICO: UMA DISCUSSÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DO ESTADO BRASILEIRO

OLIVEIRA, Robson Quintino de[1]

CARLEIAL, Liana Maria da Frota[2]

RESUMO

Pensar o desenvolvimento amazônico é mais que um desafio, deve ser encarado como fator preponderante do desenvolvimento nacional, parte integrante de um planejamento de visão macro, e não de um território isolado e distinto. Na busca pelo entendimento da dinâmica amazônica, este trabalho buscou contextualizar toda história recente das políticas públicas já implementadas pelo Estado brasileiro para o seu desenvolvimento, comparando-as com as principais políticas públicas da atualidade, o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) e o Plano Amazônia Sustentável (PAS), novas vertentes de uma política legitimada e de interação com os agentes e atores sociais. Diante de tal discussão das políticas públicas já implementadas no território amazônico, constata-se a importância do Estado como principal indutor para o desenvolvimento territorial, levando em conta a possibilidade de um Estado permeado e constituído não somente por classes dominantes, visão esta fortalecida pela crise capitalista, que dá uma nova face ao Estado nacional.

Palavras-Chave: Amazônia. Desenvolvimento. Estado. Políticas Públicas.

1 INTRODUÇÃO

Compreender as diversas e variadas concepções de desenvolvimento vivenciadas pela Amazônia brasileira é um grande desafio, uma vez que diversas visões e entendimentos, muitas vezes distorcidos e sem fundamentação técnica e/ou teórica, pautaram historicamente o desenvolvimento deste território tão múltiplo e peculiar.

As políticas públicas para a Amazônia brasileira apresentam e retratam interesses ambíguos e conflituosos. De um lado, o favorecimento de novas infraestruturas, suporte para o desenvolvimento econômico pautado somente na racionalidade econômica, principalmente do agronegócio em grande escala, o qual vem tomando grandes proporções nos estados de Mato Grosso e Pará. De outro, políticas focadas nos interesses das populações locais e na sustentabilidade socioambiental, destacando a importância do desenvolvimento de biotecnologias que pautem um novo modelo de produção na Amazônia. (Becker, 2009).

Este artigo tem como objetivo principal analisar as políticas públicas do Estado brasileiro, Plano de Prevenção e Controle ao Desmatamento da Amazônia (PPCDAM) e o  Plano Amazônia Sustentável (PAS), averiguando quais são as reais contribuições para alternativas econômicas que convirjam para o desenvolvimento sustentável da Amazônia Legal a partir de um planejamento legitimado. Os secundários se dividem em três sendo eles: 1) – caracterizar a formação sócio espacial da Amazônia brasileira; 2) – analisar as diretrizes de ações do PPCDAM e PAS e sua aplicabilidade numa perspectiva territorial; 3) – discutir a importância do Estado na formação de políticas públicas que convirjam num desenvolvimento legitimado na Amazônia.

A pesquisa se apresenta em três seções, sendo elas: Amazônia Legal - o processo de ocupação territorial e a visão do Estado brasileiro no desenvolvimento regional ao longo do século passado; Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAm) e Plano Amazônia Sustentável (PAS), uma análise das políticas públicas do Estado brasileiro para o desenvolvimento regional amazônico; e, Desenvolvimento, Subdesenvolvimento e Estado no contexto amazônico.

2 EMBASAMENTO TEÓRICO

2.1 Amazônia Legal: o processo de ocupação territorial ea visão do estado brasileiro no desenvolvimento regional ao longo do século passado

A Amazônia brasileira tem sido palco de grandes projetos que objetivam o seu desenvolvimento, sempre encarada como um grande problema devido às grandes dimensões territoriais, sua diversificada biodiversidade e diferentes concepções de identidades culturais.

No pano de fundo dessas discussões/proposições, de acordo com Locatelli (2009), sempre está presente o interesse da reprodução do capital e a apropriação dos bens regionais pela iniciativa privada, descartando os interesses e necessidades dos atores locais e a capacidade endógena de um desenvolvimento comprometido com o equilíbrio socioambiental, onde se possa ter equidade com as questões territoriais econômicas, sociais e ambientais. 

Espera-se que esse pensar seja coadunante com o desenvolvimento nacional, sendo mais uma vértice da matriz econômica e energética do país.

À luz de Becker (2009), a Amazônia vive este momento no qual há a possibilidade do favorecimento de novo modelo de desenvolvimento, com base na modernização dos setores econômicos tradicionais, evidenciando a sustentabilidade destes, a utilização da biotecnologia na criação de novos produtos e serviços e o fomento para ações e atividades que demonstrem a importância (e possibilidades de remuneração) na manutenção da floresta de pé.

Esta primeira seção destina-se a contextualizar a Amazônia, enquanto território onde se implementaram diversas políticas públicas do Estado brasileiro para o seu desenvolvimento; enfim, entender a Amazônia, sua ocupação e suas mutações desde o século passado até o presente momento. Ressalta-se a importância de um estudo mais aprofundado deste território que é marcado por diversos conflitos, tanto por questões fundiárias, de preservação ambiental, como pela dificuldade de promoção social.

O processo de ocupação deste gigantesco território pode ser compreendido pela forma que o Estado brasileiro o conduziu através de suas políticas públicas para a povoação e desenvolvimento, contrastado pelos diversos matizes culturais e pela rica biodiversidade, onde, de forma amplamente ambígua, têm-se diversos problemas sociais, como a falta de acesso à saúde de base, dificuldade ao acesso à educação, transporte terrestre e aéreo deficitário, escoamento de produção problemática, falta de comunicação e tantos outros, como avalia Becker (2009).

2.1.1 Planos e Programas de Desenvolvimento na Amazônia

A contextualização histórica do desenvolvimento da Amazônia é marcada por duas fases segundo Locatelli (2009). A primeira é marcada por políticas desenvolvimentistas[3] do Estado (visão somente do crescimento econômico), implementada durante toda a metade do século passado. Já a segunda, no início deste século, por políticas que propuseram uma transversalidade de propostas e de dimensões das discussões do pensar e planejar amazônico.

Essas observações e o modo que será apresentado cada fase e momento da Amazônia em seu processo de desenvolvimento até os dias de hoje e tornam-se importantes para compreendermos como o Estado brasileiro viu e vê esta região e o que determina o atual relacionamento Estado, sociedade e meio ambiente.

2.1.1.1 Plano de Valorização Econômica da Amazônia

Em meados da década de 30 do século passado, como parte da discussão do programa de colonização e ocupação dos grandes vazios demográficos do território brasileiro, foram fundadas diversas cidades e órgãos governamentais para o ordenamento de políticas de povoamento e direcionamento das correntes migratórias no país e (re)distribuição de terras do estado pela então política varguista, fazendo com que surgissem as primeiras concepções do pensar amazônico.

Já em 1946, com a nova Constituição, a qual buscava uma maior equidade entres as regiões da nação, com preocupação especial nas regiões Norte e Nordeste, de acordo com Silva (2003), a constituição estabeleceu regras para a implementação e execução do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, onde este novo procedimento legal dava direito à posse de terras para os que já estavam ocupando terras amazônicas, com o limite de 25 hectares para cada família.

Em 1953, foi criada por Getúlio Vargas a Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia, a qual definia os principais objetivos e diretrizes do plano, na busca de selecionar os principais espaços econômicos para o desenvolvimento da região, constituindo pólos de crescimento.

De acordo com Locatelli (2009), a Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia foi a responsável por todo o planejamento e execução do plano. Era formada por uma superintendência, uma comissão de Planejamento e comissões especializadas em áreas de atuação, tais como: produção agrícola, transportes, comunicações e energia, crédito e comércio, desenvolvimento cultural, saúde, entre outras.

Enfatizando a grande dimensão da região amazônica e a grande extensão em fronteiras com países vizinhos e vasta diversidade em recursos naturais, riquezas minerais e possibilidade de produção agrícola extensiva, a Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia apresentou, em 1954, o Programa de Emergência para o Desenvolvimento na Amazônia. De cunho desenvolvimentista, o programa buscava, além do interesse na integração nacional, estabelecer formas para a ocupação das terras amazônicas e o estabelecimento de frentes produtivas pautadas na extração de matérias-primas e produção agrícola, o que garantia e resguardava o interesse privado na política estatal. Segundo Locatelli (2009, p. 42):

[...]foi apresentado o Plano Quinquenal com sete setores básicos de investimentos do Estado brasileiro na região amazônica.Tratava-se de investimentos nas seguintes áreas: 1) produção de alimentos, 2)industrialização de matérias-primas, 3)implantação de um sistema pessoal de crédito bancário rural, 4) investimentos em transportes, 5) comunicação e energia, 6) saúde, saneamento, abastecimento de água, campanhas preventivas contra doenças transmissíveis, assistência à maternidade e infância e pesquisa bioestatísticas, 7) educação e cultura.

Pela falta de avaliação do plano e desconhecimento da população que habitava a região, alheia aos dados e estudos socioeconômicos e culturais, uma vez que não existiam canais para uma troca de experiências entre Estado e sociedade, os resultados obtidos com o plano quinquenal deixaram aparente a discrepância entre a proposta e o que realmente foi implementado na região amazônica. Conforme Locatelli (2009, p. 43):

[...] pois além das irregularidades no repasse de recursos, houve interferências no Plano em decorrência do jogo de interesses que rondavam as votações anuais do orçamento no Congresso. Deste modo, alterou-se a destinação e se fez o contingenciamento de verbas, houve desgaste dos valores investidos provocado pela inflação da época, além da constituição extremamente burocrática da Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia.

É clara a visão desenvolvimentista nos planejamentos e no modo de ver a Amazônia com ações focadas somente no econômico, como também no respaldo estatal na acumulação e reprodução do capital, através da conservação do interesse privado, evidenciando-se ainda mais após a criação da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), que substituiu sua antecessora, a Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia em 1966.

2.1.1.2 Plano de Integração Nacional (PIN)

Constituído sob as orientações do já estabelecido regime militar, o Plano de Integração Nacional (instituído em 1970) foi o segundo grande planejamento da Amazônia brasileira e tinha como objetivo a ocupação das terras amazônicas por meio de projetos de colonização, sendo selecionadas algumas áreas para o recebimento desses projetos como áreas estratégicas para o desenvolvimento regional.

De acordo com Kohlhepp (2002), o Plano de Integração Nacional sob o slogan “Integrar para não Entregar” foi baseado com vistas à implementação de estradas como a Transamazônica, Cuiabá-Santarém, entre outras, com a intenção de transformar essas estradas em corredores do desenvolvimento amazônico, como também roteiro da migração e colonização da Amazônia, mudando a visão de desenvolvimento regional, um olhar voltado para as questões da região amazônica, para uma nova concepção de desenvolvimento inter-regional, ligando as principais regiões produtivas do país. Kohlhepp (2002, p. 38) esclarece:

As bases legais foram estipuladas no sentido de estabelecer corredores de 200 quilômetros de extensão para colonização estatal. De acordo com o modelo do INCRA, para a operação de assentamento em grande escala, principalmente de trabalhadores rurais e arrendatários do Nordeste, foi fixada uma faixa de 10 quilômetros de extensão de ambos os lados das estradas através da Amazônia, com vistas ao estabelecimento de pequenas propriedades de 100 hectares cada, num sistema de rotação de terras com apenas 50% de devastação – o restante era organizado em unidades de três mil hectares.

Para o governo militar, a construção desses corredores era uma prova do poder do estado e uma questão de ego para os militares, sendo que o discurso estatal era contraditório com a efetiva ocupação, visto que a baixa fertilidade do solo e as condições ecológicas e de mercados não foram consideradas no planejamento, afetando de forma contundente no baixo número de assentados em relação à otimista previsão do Estado, como afirma Silva (2011).

A submissão do Estado em relação aos interesses do capital privado foram sempre claros, pois a proposição era, de certa forma, contraditória com a prática estatal que ressaltava em sua proposta a desapropriação de terras ocupadas de forma ilegal e especulativa na região amazônica, o que se tornou uma prática e não uma exceção na Amazônia brasileira. Nesse ponto, é visível e de fácil compreensão o porquê de nossos problemas fundiários, uma questão estrutural, advinda de práticas anteriores e da falta de competência e vontade do Estado brasileiro.

Para o entendimento dos conflitos socioambientais desta região, é pertinente um recorte dentro deste item do capítulo sobre o Arco do Desmatamento, pois demonstra todo o engendramento produtivo (das commodities) e destrutivo (do meio ambiente).

2.1.1.2.1 Arco do Desmatamento

Esta expressão identifica uma faixa do território da Amazônia, sendo que, na última década, diversas ações como projetos e programas foram desenvolvidos especialmente para esta área, que percorre as fronteiras das regiões centro-oeste e norte do país. Segundo o Instituto Socioambiental (ISA, 2011) essa faixa de riquíssima biodiversidade, por ser transição dos dois maiores biomas, Amazônia e Cerrado, se destaca pela sua extraordinária diversidade de espécies e de fenômenos biológicos únicos. Conhecida também por fronteira agrícola protagonizou e protagoniza os principais índices de degradação florestal, onde milhares de km² deram lugar a pecuária, ao cultivo de arroz, milho e principalmente a soja, conforme Silva (2003).

ISA (2011) define:

É a área onde mais se detectam queimadas no Brasil e onde, em certos meses, ocorre até mesmo a interdição dos aeroportos regionais em virtude da fumaça na atmosfera. A combinação entre a abertura de estradas de integração entre a Amazônia e as outras regiões brasileiras e as políticas de incentivos fiscais para a ocupação agropecuária criou as condições que geraram um tipo de ocupação predatória, onde a vegetação nativa é considerada um entrave a ser destruído, tanto pelo pequeno e médio, quanto pelo grande produtor rural.

A pecuária na Amazônia se desenvolveu principalmente dentro desse território conhecido como “Arco do Desmatamento”; cuja atividade vem em constante crescimento desde a década de 1970, sendo a principal atividade responsável pelo desmatamento na região, segundo o Greenpeace (2008). Um estudo financiado pelo Banco Mundial (2003) demonstra uma relação direta entre pecuária e desmatamento, e esse desmatamento é estimulado pelo baixo custo das terras com floresta, o que aumenta a lucratividade da atividade.

A exponenciação do número de cabeças de gado na Amazônia Legal, mais de 3 cabeças por habitante, segundo dados do IBGE (2010), se dá pela expansão do setor através da entrada de capital externo nas empresas brasileiras, como também a compra de muitas delas por empresas estrangeiras, fazendo com que a reprodução do capital privado aconteça de forma rápida e contínua, sem levar em conta o impacto ambiental na região.

Este crescimento do setor pecuário na Amazônia Legal pode ser notado com os seguintes dados: entre 2000 e 2010, das 39,6 milhões de cabeças de gado adicionadas ao rebanho nacional, 30,3 milhões encontram-se em terras amazônicas. No entender do GREENPEACE (2008, p. 03):

Essa presença massiva de gado na Amazônia decorre de mais de 30 anos de políticas públicas que estimularam a construção de infraestrutura (estradas, represas), ocupação do território (migração induzida) e financiamento da atividade com fundos públicos da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e, mais recentemente, do Fundo Constitucional do Norte (FNO) e Banco Nacional de Desenvolvimento.

Outro fator de relevância na economia regional é a soja, um dos itens mais importantes nas exportações brasileiras, com grande responsabilidade no aumento dos índices de desmatamento na região.

Sob a influência direta do mercado externo, por ser uma commodity, com o aumento do valor de comercialização da soja no mercado externo, a produção interna (sob a pressão pela reprodução do capital privado) se amplia, maximizando assim a área cultivada, fazendo com que a fronteira agrícola avance sobre as florestas, agravando ainda mais a degradação florestal na região.

Vale ressaltar que, segundo dados do IBGE (2010), a Amazônia Legal já responde por 31,22% da soja produzida no país, cujo número era somente de 13,84% em 1990, uma ampliação de sua produção em mais de 220%, no período.

O arco do desmatamento é cheio de refutações, principalmente das políticas públicas implantadas, como a exemplo de Becker (2009), que o considera obsoleto para entender e explicar a realidade sobre esse processo de degradação na atualidade, pois acredita que a lógica do desmatamento já não é mais a mesma da década de 1980, sendo que a fronteira Amazônica não é mais uma fronteira de ocupação e sim uma área de povoamento consolidado. Para Becker (2009, p.76):

[...] é ainda no contato deste arco com a floresta que se concentra o desmatamento na Amazônia. Mas o que se deseja aqui demonstrar é que a escala e que a lógica do desmatamento são outras, associadas a atividades que tendem a se intensificar, e que essa vasta área não é mais uma fronteira de ocupação, mas sim uma área de povoamento consolidado, com significativo potencial de desenvolvimento.

Portanto, essa área não deve mais ser somente encarada como resultado de um processo de degradação florestal em grande escala, e sim como uma consolidação das políticas desenvolvimentistas do Estado brasileiro, iniciadas no governo militar e promulgadas em outros governos, assumindo as políticas de ocupação que existiram no território, e dando respaldo aos que nele se encontram (migrantes de diversas etnias e regiões).

É buscar a concretização das políticas de desenvolvimento nacional, não se esquecendo de considerar os vetores tecnoecológicos e de recuperação ambiental com políticas públicas que levem em conta as comunidades locais, num processo de conscientização da importância da preservação e do desenvolvimento de biotecnologias que fortaleçam uma produção sustentável e um novo modelo de desenvolvimento regional.

Em continuidade a esta seção, vale destacar um dos principais auges da política desenvolvimentista implementada na Amazônia, que são os pólos de desenvolvimento que buscavam investimentos privados para o desenvolvimento amazônico.

1.3.2.2 Os Polos de Desenvolvimento

Com a crise do petróleo no começo da década de 70 do século passado, o Estado brasileiro se deparou com muitas dificuldades na manutenção de diversos setores da economia, sendo que a importação de produtos era uma delas devido à exagerada oneração, segundo Kohlhepp (2002), enquanto a Amazônia vivenciava o seu auge, conhecida como o “Eldorado”. Após o estabelecimento de cidades e a estabilidade dos projetos de colonização, o foco do desenvolvimento estatal se tornou o fortalecimento das atividades de exploração privada, ampliadas principalmente pela distribuição de terras.

Com o novo foco de desenvolvimento, o governo federal implantou o Polamazônia, uma estratégia seletiva de produção na Amazônia, cujo objetivo era criar polos de desenvolvimento, onde seriam oferecidos atrativos tributários e diversos benefícios para os investidores, tanto nacionais, quanto internacionais. Esta ação proporcionou a criação de inúmeras empresas do ramo agropecuário, agricultura e mineração, sendo os maiores expoentes as companhias de seguro, bancos, mineradoras e construtoras, que investiram pesadamente na devastação de uma grande área de floresta para a criação de gado, extração vegetal e mineração.

Com esses projetos e outros implementados pelo Estado brasileiro entre as décadas de 70 e 80 do século passado, as consequências foram a dissipação do capital social formado inicialmente e já existente nessa região, provocando assim, um estímulo à imigração desordenada, à grilagem de terras e, consequentemente, o desequilíbrio socioambiental da região, que é palco de conflitos até hoje. As grandes queimadas para a abertura de fazendas de gado, a extração da madeira, o garimpo clandestino foram (e são) os grandes vilões do cenário socioambiental que temos hoje, provocado pela ausência de um Estado regulador e supervisor desta ocupação, alimentada através de políticas públicas de caráter desenvolvimentista[4] e predatório.

1.3.3 Programas Brasil em Ação e Avança Brasil

1.3.3.1 Programa Brasil em Ação

Com os programas Brasil em Ação e Avança Brasil, mais uma vez a ótica do Estado era integrar a região amazônica como um espaço produtivo e também de políticas na consolidação de segurança de suas fronteiras e integração latino-americana.

Foi lançado em 1996, pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, cujo pacote de ações e obras do governo federal seria desenvolvido em parceria com os estados, município e empresas privadas.

Com a retomada do planejamento na integração da Amazônia com a matriz produtiva e energética do país, o governo de Fernando Henrique Cardoso acreditava que com o aumento no volume de recursos em infraestrutura, conseguiria eliminar os gargalos e o atraso do crescimento econômico na região. No entender de Brasil (2011):

Enfrentar os problemas estruturais e sociais do País com ações gerenciadas, em parceria com a iniciativa privada e com garantia efetiva de investimento. Esse é o princípio básico do Programa Brasil em Ação. Lançado em agosto de 1996, o Brasil em Ação agrupa 42 empreendimentos: 16 na área social e 26 na área de infraestrutura. Todos com o objetivo de reduzir custos na economia, propiciar o aumento da competitividade do setor produtivo e melhorar a qualidade de vida da população.

Mais uma vez o Estado brasileiro se mostra como avalista (braço direito) do capital privado para desenvolver uma região até o momento mal compreendida e pouco estudada, deixando de lado qualquer possibilidade e incentivo de um desenvolvimento efetivo.

Um diferencial nesta abordagem desenvolvimentista tida pelo Estado brasileiro foi a grande pressão por questões ambientais na Amazônia, visto que o Estado atrelou o programa Brasil em Ação ao capital externo, cujo financiamento destas atividades e ações eram do Banco Mundial e do Programa Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil – programa de iniciativa do Estado brasileiro e da comunidade internacional -  que apresentavam os mais diversos interesses políticos e ideológicos, como também econômicos, dando cadência ao novo formato de intervenção estatal.

Dentre os projetos implementados pelo Estado no programa Brasil em Ação, os principais foram a recuperação das BR 164 e 163 – estradas que ligam Brasília ao Acre e Cuiabá a Santarém, respectivamente – a criação das hidrovias no rio Madeira e Araguaia-Tocantins, as linhas de alta tensão ligando Tucuruí-Altamira-Itaituba e o gasoduto de Urucu.

Esses projetos faziam parte de uma estratégia dos Eixos de Integração e Desenvolvimento muito parecidos com os já conhecidos “Corredores de Desenvolvimento” apresentados pelo governo militar que, segundo Becker (1999), tinham a intenção de potencializar novas oportunidades econômicas para a comunidade amazônica, atraindo mais investimentos, migrantes e, é claro, consequentemente, mais pressão sobre os recursos florestais.

Os resultados obtidos com a implementação do Programa Brasil em Ação também não conseguiram integrar o desenvolvimento da região (num todo, pensando em Amazônia Legal) com o restante do país, pois, como nos outros programas anteriores, não houve a efetiva preocupação de saber e analisar o que pensavam as comunidades locais, fazendo com que o programa não envolvesse os atores e a participação de agentes mobilizadores.

Esse não envolvimento é perceptível quando se cria um ambiente que não o favorece, quando o interesse maior está voltado apenas para a reprodução do capital e dos interesses privados, propósito defendido e orientado pelo próprio Estado.  Na opinião de Becker (1999, p. 36): “É possível depreender que a noção de eixo, na filosofia do Brasil em ação corresponde não a uma linha, mas a um espaço que possa gerar investimentos articulados - sinergia - e atrair o movimento de capitais.”

1.3.3.2 Programa Avança Brasil

Com a relativa movimentação e organização de atores e agentes locais devido à percepção e à inquietude provocada pela degradação ambiental, a Amazônia tomou novos rumos, forçando o Estado a repensar algumas ações e interagir com essa nova dinâmica socioeconômica que se estabelecera nesta região.

Esse diferencial, ou seja, a interação entre Estado e sociedade no pensar amazônico, apresentado pelo programa Avança Brasil estava numa nova ordem de revalorização do conceito de inte­gração que redefine sua matriz como um renovado plano de desenvolvimento e de percepção da Amazônia enquanto uma fronteira consolidada, ideia defendida por Castro (2004), como também por Becker (2009).

Nesta nova abordagem, não existiu a tendência anterior de grandes obras. As mais relevantes eram os projetos de gasoduto para abastecer as usinas termoelétricas de Porto Velho e Manaus, o que já acarretaria diversos impactos ambientais.

Os investimentos do programa na região centro-oeste visando o desenvolvimento desta região com a expansão da agricultura, faz com que houvesse um avanço enorme da fronteira agrícola rumo à Amazônia e a expansão do já conhecido Arco do Desmatamento.

Portanto, fica constatada a ausência de diálogo com a sociedade civil organizada, justifica-se este fato devido ao Estado brasileiro depender quase que exclusivamente do capital externo e utilizar modelos neoliberais e, desta forma, acaba se distanciando dos interesses coletivos.

Até o momento, foi retratado o contexto histórico da amazônica, como também, feita a análise e apresentação dos Planos/Programas do Estado e a forma que o mesmo encara essa realidade.

3 MATERIAIS E MÉTODOS

3.1 Área de Estudo

A área de estudo que contextualiza esta pesquisa é a Amazônia legal brasileira, termo que delimita o bioma Amazônia dentro do território brasileiro, é composta por todos os estados da região norte do país, sendo eles: Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Roraima, Rondônia e Tocantins, além do estado de Mato Grosso, pertencente à região centro-oeste, e do estado do Maranhão, região nordeste, com mais de 25 milhões de habitantes, correspondendo a uma área superior a 5 milhões de km², o que equivale a quase 60% do território nacional.

3.2 Metodologia

A metodologia utilizada na realização desta pesquisa foi a bibliográfica, utilizando-se de fontes secundárias, método este que resultou na localização e consulta de fontes diversas de informações, possibilitando coletar dados gerais e específicos a respeito do tema proposto. A dificuldade na execução deste método foi o escasso material que aborda o tema proposto, visto que não são comuns pesquisas e abordagens específicas do desenvolvimento da Amazônia, seja por falta de incentivo de estudos nesta área ou porque propositalmente fosse conveniente a ocultação da trajetória socioeconômica deste território, como defende Locatelli (2009).

Esta pesquisa se desenvolveu em três fases, sendo que na primeira foi feita a coleta de materiais que pudessem oferecer uma visão global das políticas públicas que o Estado brasileiro implementou ao longo da história recente na busca do desenvolvimento deste território.

Na segunda fase, após a organização do material coletado, deu-se a análise de documentos por meio da técnica da análise de conteúdo, quando se constata as primeiras atividades na Amazônia brasileira.

A terceira e última fase deste trabalho se dá pela análise e comparação (e relação) dos conceitos de desenvolvimento/subdesenvolvimento, com os eixos Estado e Amazônia, visto que é entendido que o conceito de desenvolvimento é mutável ao longo do tempo, e os interesses do mesmo podem ser discrepantes entre sociedade civil organizada e Estado. Esta análise e o entendimento destas correlações ajudam na construção de uma proposta alternativa para a formulação de um modelo de desenvolvimento relacionando sociedade civil e Estado numa prospecção mais legitimada.

Com foco nas concepções de desenvolvimento (político, social, econômico e ambiental) dos planos destinados para a Amazônia foram estabelecidos parâmetros para a delimitação temporal da pesquisa a partir do início do século passado (por volta da década de 30) até o primeiro trimestre do ano de 2012.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia e Plano Amazônia Sustentável (PAS), uma análise das políticas públicas do estado brasileiro para o desenvolvimento regional amazônico (PPCDAM)

Do período anterior, décadas de 60, 70 e 80 do século passado, há, certamente, ganhos de ordem econômica e infraestrutural, como meios para escoação da produção, Zona Franca de Manaus, desenvolvimento dos meios de comunicação, como tantos outros que se obteve na Amazônia através destas políticas, conforme apresentado neste trabalho. O que foi constatou-se através do material pesquisado, a falta da concepção de um planejamento para o desenvolvimento amazônico dentro de uma racionalidade ambiental e de equidade, ficando claro que desenvolvimento, para o Estado brasileiro no século passado, estava pautado somente na concepção de caráter econômico e de ocupação do território.

Tem como intuito este trabalho discutir o conceito de desenvolvimento como sendo mutável ao longo tempo, mas isso não impede e muito menos desresponsabiliza o Estado brasileiro de seu compromisso com a população que ocupou a Amazônia sob o chamado e as expectativas de suas políticas no passado. É com este olhar que iremos analisar as atuais políticas públicas que incluem a preservação no desenvolvimento da Amazônia Legal.

3.1.1 Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM)

O Desmatamento na Amazônia brasileira é um dos principais fatores do agravamento da questão ambiental nacional e internacional, levando em conta que o maior percentual deste desmatamento ocorre na área denomina Arco do Desmatamento (citado na seção anterior com a apresentação de dados que comprovam esta afirmação), ocasionado pela fácil extração de matéria-prima vegetal, como também na expansão das fronteiras agrícolas e pecuária.

Este fato é consequência de políticas públicas do Estado brasileiro, implementadas no passado, em que foi fortalecida uma visão do baixo custo de produção numa vasta área produtiva de matéria-prima. Área esta em que o Estado brasileiro denota atualmente ser de suma importância o aumento da produtividade econômica (sustentável), infraestrutura adequada à população, formação de mercado e escoamento da produção regional, tudo sem o aumento do desmatamento, o que precisa ser considerado e realmente acontecer neste território. Para o Governo Federal (2009, p. 9):

O desmatamento acarreta diversos problemas, como a perda de biodiversidade, as emissões de gás carbônico, de metano e de outros gases causadores de efeito estufa, assim como a diminuição de territórios de populações que tradicionalmente habitam a floresta. A sua expansão além de alarmar a sociedade brasileira é motivo de preocupação também para a comunidade internacional, frente à importância estratégica que a Amazônia ocupa no contexto das mudanças globais..

Neste cenário, em 2003, foi criado o Grupo Permanente de Trabalho Interministerial, (GPTI) sob condução da Casa Civil, com a responsabilidade executiva da implementação das ações e atividades definidas pelo grupo de trabalho, que buscava analisar e propor medidas para a diminuição dos índices de desmatamento na Amazônia Legal, em especial no Arco do Desmatamento.

O Plano de Prevenção e Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) tem como objetivo a redução dos índices de desmatamento na Amazônia Legal, ressaltando que, no ano anterior à sua implementação, atingiu-se um dos maiores índices de desmatamento já registrados pelo Estado brasileiro.

Para conseguir implementar um plano que obtivesse sucesso neste cenário, o Estado brasileiro ousou na interação interdisciplinar de seus ministérios, criando um conjunto de ações integradas para o alcance de um ordenamento territorial e fundiário, investindo no monitoramento e controle e no fomento de produção sustentável através de atividades de conscientização e educação ambiental, envolvendo as três esferas governamentais (federal, estadual e municipal), como também a sociedade civil organizada e o setor privado, como apresenta o Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), conforme entendimento de Brasil (2008).

Após consultas[5] e debates desenvolvidos na busca de constituir um plano sólido e legitimado, foi lançado, em abril de 2004, o PPCDAM, estruturado em eixos temáticos, de acordo com PNMC (2008): I – Ordenamento Fundiário e Territorial;II – Monitoramento e Controle Ambiental; III – Fomento a Atividades Produtivas Sustentáveis;um quarto eixo temático do PPCDAM, “Infraestrutura Ambientalmente Sustentável”, se desdobrou tornando-se o PAS – Plano Amazônia Sustentável, que iremos conhecer e analisar logo mais.

É notável que, após a instituição do PPCDAM, grandes avanços aconteceram no que concerne à preservação ambiental, visto que após 2004, diversas operações da Polícia Federal juntamente com o IBAMA e Exército detiveram diversos grupos criminosos que atuavam na grilagem de terras, falsificação de autorizações ambientais e extração vegetal ilegal, tais como as operações Curupira e Faroeste.

3.1.1.2 Integração Sociedade, Estado e Iniciativas Públicas/Privadas na busca de uma Amazônia mais Sustentável

Na busca de um novo modelo de desenvolvimento para a região amazônica com aproximação Governo Federal, Governos Estaduais, Governos Municipais, setor financeiro público/privado, sociedade civil organizada, ONGs, empresas, associações, federações entre outras, estão formalizando pactos em diferentes setores, adotando medidas para diminuir os índices do avanço da degradação ambiental na Amazônia brasileira. Esses pactos visam incentivar iniciativas de produção num conjunto de ações que promovam a equidade ambiental, social e econômica, fortalecendo a responsabilidade socioambiental dos setores produtivos na Amazônia.

Alguns destes exemplos de iniciativas que vem tendo êxito na redução das taxas de desmatamento e queimadas na Amazônia, de acordo com Brasil (2009), são: a Moratória da Soja, os Protocolos de Intenções pela Responsabilidade Socioambiental entre MMA, BNDES, CEF, BASA, BB e BNE e entre MMA e FEBRABAN (Novo Protocolo Verde), Pacto pela Madeira Legal e Desenvolvimento Sustentável. Iniciativas em movimentos organizados empresariais, que assumem o compromisso de somente adquirirem madeira certificada, comprovando sua origem de fontes legais.

Na implantação do PPCDAM, segundo IPEA (2012), notou-se a dificuldade em se implementar e obter êxito nos resultados do plano somente com a atuação do governo federal fazendo frente às questões da degradação ambiental na Amazônia, como também algumas ações isoladas de governos estaduais, não estavam surtindo os efeitos esperados no combate às frentes de conversão de florestas.

Entre os impasses para dar efetividade ao plano, tanto do isolamento das ações em combate ao desmatamento, quanto na não confiança de dados repassado entre governo federal e governos estaduais, dificultando operações conjuntas de fiscalização e controle, o Ministério do Meio Ambiente, em parceria com instituições internacionais proporcionou uma cooperação técnica juntamente com os estados que compõem a Amazônia Legal para a formulação dos Planos Estaduais de Prevenção e Controle do Desmatamento. Brasil (2009).

3.1.2 Plano Amazônia Sustentável (PAS)

Pensar em um novo modelo que altere o processo produtivo vicioso e sua concepção predatória há mais de um século não é simples e muito menos fácil quando se trata do enorme território da Amazônia brasileira.

Foi apresentada, em 2003, no estado do Acre, o documento Amazônia Sustentável – Diretrizes e Prioridades, que reconhecia a necessidade da redução das desigualdades regionais do país e de implementação de um novo modelo de racionalidade e de desenvolvimento para Amazônia brasileira.

De acordo com o documento PAS apresentado em 2003, o plano se desdobraria em 5 (cinco) eixos temáticos, sendo eles: I - Produção sustentável com tecnologia avançada, II - Novo padrão de financiamento, III - Gestão ambiental e ordenamento territorial, IV - Inclusão social e cidadania, e V - Infraestrutura para o desenvolvimento.

Em meio ao processo de formulação do PAS e de consultas públicas, o cenário que se apresenta na região é o embate entre duas concepções (podendo ser ideológicas), uma atual, que está pautada numa produção agropecuária expansiva sem levar em conta o enorme passivo ambiental gerado pelas práticas deste setor produtivo, destacando o cinturão soja/boi que avança sobre a Amazônia, e a segunda, uma perspectiva futura de integração sustentável entre sociedade, processo produtivo e preservação, aliado ao desenvolvimento de biotecnologias que propulsionem o desenvolvimento regional preservando a biodiversidade e a multiplicidade sociocultural da Amazônia. Em relação a este embate, Becker (2005, p. 38) adverte:

Neste contexto, as áreas protegidas tornam-se vulneráveis e menos capazes de barrar a expansão da fronteira móvel. A administração desse desafio para o governo federal, na medida em que ambos os usos, o atual e o futuro, são essenciais à economia e à sociedade nacional e que o confronto é acompanhado por conflitos de governabilidade que afetam a face interna da soberania sobre a região. O que não se justifica é destruir o potencial de um futuro – já presente – da Amazônia, em nome do uso atual, que tem grandes espaços para se expandir no cerrado e nas áreas desmatadas.

Neste cenário, torna-se necessário planejar e pensar a Amazônia com um olhar diferenciado, levando em conta as particularidades e singularidade das diversas e múltiplas comunidades locais.  De acordo com Brasil (2008, p. 08):

[...] o PAS surge com o desafio de evitar que o cumprimento de metas nacionais seja meramente transferido para a Amazônia, sem levar em conta suas especificidades e sem internalizar os benefícios gerados ao país, tal como foi feito no passado. Mudar este paradigma é condição necessária para o sucesso das ações estruturantes do desenvolvimento regional.

Com esta afirmativa, o Estado se propõe orientar uma racionalidade ambiental e de respeito às singularidades da região nos processos de produção, garantindo uma estabilidade econômica coadunante com a qualidade dos serviços e a sustentabilidade da produção amazônida.

Em paralelo às atividades dos grupos de trabalhos temáticos, a Secretaria Geral da Presidência realizou diversas audiências públicas, em diversas localidades, objetivando discutir a elaboração do PPA 2004-2007. A conciliação entre discurso e efetividade de ações não foi bem sucedida logo no início da implantação do PAS, sendo que suas diretrizes e metas não foram observadas. Mello, Pasquis e Théry (2005, p. 50) entendem:

[...] infelizmente, deve-se constatar que o PAS e o PPA seguiram caminhos paralelos e ainda não conseguiram integrar-se. O tempo disponível foi muito curto para coordenar dois processos cujos ritmos e métodos eram muito diferentes. De um lado, o PPA, um procedimento programático-orçamentário sob a coordenação do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO) e o outro, um processo de consulta popular, o PAS. O desafio é agora a revisão do PPA de acordo com o PAS, e a distribuição do orçamento do PPA na estrutura do PAS.

Os meios financeiros para a viabilização do PAS, de acordo com Mello,Pasquis e Théry (2005), não apareceram no PPA 2004-2007, sendo que a dotação orçamentária para o PPA 2008-2011 direcionou-se muito mais para as ações o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), pouco considerando as proposições relacionadas no documento do PAS, Brasil (2008).

3.1.2.1  A Amazônia Brasileira e Políticas Públicas para o Desenvolvimento Regional Sustentável: Uma Concepção Ambígua

Dentre os programas implementados no século passado, e os do começo deste século, todos nasceram, de certa forma, como meio de mitigação de algum problema socioeconômico das mais diversas matizes como tensões agrárias, crises econômicas e de soberania nacional.

Reafirmam esse posicionamento, de acordo com Castro (2004), as diversas ações implementadas pelo Estado, a exemplo das ocupações de regiões, programas de colonização, integração da região amazônica e consolidação do desenvolvimento nacional.

É pertinente o questionamento se é possível o desenvolvimento de um novo paradigma de desenvolvimento na Amazônia brasileira, conciliando e convergindo interesses tão diversos, que vão desde os econômicos aos socioambientais. Neste cenário é imprescindível a inserção de variáveis ambientais e sociais no processo produtivo na Amazônia legal brasileira. Na concepção de Castro (2004, p. 17):

[...] apenas questiona se é possível pensar de uma outra forma, se é possível construir um outro pensamento considerando que esta região, (...) O desafio é saber se podemos ou não ser capazes de pensar um outro projeto, porque o projeto atual é da década de 1970, revitalizado.

Devido a fortes pressões internas e externas, o Estado brasileiro, em resposta a estes posicionamentos, elaborou ações de controle, combate, fiscalização, regularização e conscientização para um novo marco no desenvolvimento regional sustentável da Amazônia.

Nesta pesquisa, foram destacadas duas destas políticas, o PPCDAM e o PAS, consideradas como as principais, pois são norteadoras de todas as ações que visam este novo paradigma na Amazônia legal.

O PPCDAm, por sua vez, é um plano já concretizado, implantado e com resultados já expostos e avaliações contínuas. Prova disto são os dados mencionados no início nesta seção. Seu foco é o combate ao desmatamento ilegal numa das regiões mais ricas em biodiversidade e riquezas naturais do mundo, de acordo com Brasil (2009).

Desta forma, torna-se necessário esforço governamental coordenado para contribuir com a transição do atual modelo de crescimento predatório, considerando a importância da floresta em pé e dos recursos naturais associados à promoção de meios econômicos e sociais em benefício dos 25 milhões de pessoas que habitam a Amazônia.

Muitos são os resultados do PPCDAm, mas pouca é a clareza de seu foco, com objetivos e ações que se confundem com o PAS. A falta de foco é um dos principais pontos elencados e reconhecidos pelo próprio Estado brasileiro (2009, p. 15), quando admite:

[...] nas avaliações feitas sobre o Plano, um dos pontos mais destacados foi a dificuldade de se monitorar uma grande quantidade de ações. A crítica central era de que o Plano precisava focar a sua intervenção, selecionando ações que se relacionavam mais diretamente com o desmatamento, e concentrando seus esforços nessas.

Mas, em contraponto, no que se refere ao seu principal objetivo que é o controle e combate ao desmatamento ilegal na Amazônia, o PPCDAm vem promovendo grandes avanços, pois, a partir de sua implantação em 2004, a taxa de desmatamento que era de 27.772 mil km² na Amazônia, reduziu-se em mais de 445%, chegando a 6.238 mil km² em 2011, segundo dados do PRODES, INPE (2011).

A segunda política pública analisada e não menos importante é o PAS, formado por um conjunto de diretrizes que visam inserir e direcionar variáveis socioambientais nas ações implementadas pela iniciativa pública e privada. Uma das principais críticas ao PAS é que estas estratégias deveriam ser implantadas, entendendo por serem implantadas, a sua efetiva execução, sendo que o próprio Estado brasileiro (2008, p. 08) declara que:

[...] o PAS não é um plano operacional, mas um plano estratégico contendo um elenco de diretrizes gerais e as estratégias recomendáveis para a sua implementação, devendo as ações específicas se materializarem mediante planos operacionais sub-regionais.

O PAS atribui sua responsabilidade como instrumento de um novo marco de desenvolvimento da Amazônia brasileira para outros planos, como é o caso o PPCDAm, PAC e o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu, o que é muito preocupante, pois mesmo que esses planos se relacionam com as diretrizes do PAS, os mesmos tem suas singularidades e particularidades territoriais, não assumindo um compromisso na íntegra com o desenvolvimento desde imenso território, Amazônia.

Torna-se complexo relacionar que, em um país de cultura predatória dos recursos naturais, planos estratégicos e não operacionais consigam de fato viabilizar a inserção de variáveis ambientais e sociais nas políticas públicas e nos processos econômicos, sem uma efetiva participação do Estado.

3.1.3 Estado, Desenvolvimento e Subdesenvolvimento no Contexto Amazônico

Tratar do desenvolvimento amazônico é compreender que desenvolver a Amazônia é pré-requisito para o desenvolvimento da nação, pois a Amazônia é uma questão nacional e não deve ser tratada como uma variável isolada em detrimento do desenvolvimento da nação como um todo.

A partir deste pressuposto, a discussão das principais políticas públicas que pautam o desenvolvimento amazônico faz inferência quanto à capacidade do Estado brasileiro em pautar uma proposta de desenvolvimento pleno não só para Amazônia, mas sim de inseri-la no contexto de um planejamento de nação.

3.1.3.1Amazônia e a Crise de Legitimidade do Estado

As diversas implementações de políticas públicas para o desenvolvimento da Amazônia ao longo dos anos representam e amplificam o distanciamento do Estado com a lógica e a dinâmica socioeconômica local, pois as diversas óticas do desenvolver amazônico estão enraizadas sob a ótica de paradigmas externos, como é visto por Castro (2004). “A grande maioria das formulações teóricas que enquadram nos projetos de desenvolvimento da Amazônia baseiam-se em visões da região cujas matrizes residem em uma compreensão externa”.

Para que se crie uma linha de raciocínio sobre como estes paradigmas externos se intensificaram e deram origem à crise de legitimidade do Estado brasileiro, pontuaremos de forma cronológica tais intervenções.

Como ponto de partida, podemos considerar a década de 50 do século passado, onde JK, Juscelino Kubitschek, lança o modelo desenvolvimentista industrial como prioridade da ação política do Estado e como instrumento de ação política, capaz de mobilizar diferentes setores da sociedade a partir da propagação de um ideário nacionalista, como aponta Sarmento (2012).

Já nas décadas de 60 e 70, para justificar as ações interregionais de colonização e continuação do “Integrar para não Entregar”, a segurança a integração nacional ganhram grande destaque, sendo esses eixos diretamente ligados ao modelo de desenvolvimento adotado na região amazônica, afirmando a inserção de uma visão de um paradigma externo, não que esta abordagem não fosse necessária, mas reafirmando a falta de interação, dinâmica e entendimento de rico e peculiar território.

Nas décadas de 80 e 90, emergem as vertentes do desenvolvimento de cunho ambientalista, que sofrem severas críticas por servir de desculpas para o atraso da Amazônia, que segundo Silva (2004, p. 112): “o pensamento ambientalista introduz diversos diagnósticos sobre a ocupação e o desenvolvimento da Amazônia, que poderiam ser resumidos numa constatação recente: o impacto negativo da maior parte da intervenção humana na região”.

Diante deste pressuposto, acabam se justificando ações políticas que tinham como intuito somente o foco para a preservação ambiental, ficando de lado a vertente social. A ocupação e o processo de colonização da Amazônia, defendidos nas décadas anteriores, passam a ser criticados por conta da impossibilidade ecológica local de sustentar essas grandes populações, atraídas pelas promessas e políticas do Estado brasileiro.

Ainda na década de 90, com a propositura de um Estado neoliberal, se consolidaram-se, principalmente na Amazônia, organizações não governamentais que tinham como objetivo suprir a ausência do Estado, fazendo com aumentasse a consciência local dos direitos e da necessidade de um desenvolvimento legítimo para aquela reunião. De acordo com Locatelli (2009), é neste cenário que os Programas Avança Brasil e Brasil em Ação protagonizam uma nova possibilidade de um desenvolvimento legitimado, porém com uma carga de autoritarismo estatal e sob financiamento de capital externo, capital este carregado de interesses externos, o que dificulta a reinvidicação endógena de um desenvolvimento, Castro (2004, p. 23) assim se manifesta: “integrado com a política econômica eque o Governo não pode fazer uma política, um planejamento para a sociedade civil se não incluí-la com ator principal”.

De acordo com Locatelli (2009), a herança desses diversos modelos que foram implementados ao longo da história recente da Amazônia, gerou uma crise de legitimidade nunca vista, e muito menos experimentada pelo Estado brasileiro, o que pode ser constatado em fatos de grande repercussão nacional e internacional, podendo citar alguns deles: o Massacre de Eldorado de Carajás, em 1996 (19 mortes); o Massacre da Reserva Roosevelt, em 2004 (29 mortes); o assassinato da missionária DorotyStang, em 2005 e sindicalistas e ambientalistas que lutam contra grileiros e grandes latifundiários no Pará, como é o caso do casal de extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo em 2011.

Esta sucessão de violência, mandos e desmandos, conotam um Estado ausente e frágil para os amazônidas e, o quanto são ineficientes e raros os órgãos públicas, ofertando serviços precários a uma sociedade fragilizada e marginalizada. Na visão de Locatelli (2009, p. 77):

Aproveitando-se do vazio de poder estatal formaram-se verdadeiros feudos de acumulação privada ligados aos latifundiários e grileiros, bem como se aglomeraram incontáveis organizações não governamentais nacionais e estrangeiras – o Terceiro Setor – que simultaneamente substituem a prestação de serviços públicos em alguns setores e se autoentitulam porta-vozes da sociedade representando-a e reivindicando a atuação do Estado.

Mesmo sendo reconhecida a falta de empoderamento da sociedade, como apontado por Locatelli (2009), ela jamais poderá ser desassociada deste processo de engendramento e evolução social, pois é fato que qualquer possibilidade de desenvolvimento amazônico perpassa pela participação ativa e direta da comunidade local.

Neste contexto de participação ativa e direta, destacamos a ótica do desenvolvimento de territórios, que sempre foi tido como meta do progresso econômico, político e social. Constata-se que nem todo território consegue o mesmo resultado, como é a discrepância entre algumas nações que alcançaram elevadas taxas de crescimento, mas não avançaram na questão da dependência financeira e/ou tecnológica frente aos países mais desenvolvidos, como foi (ou é) o caso do Brasil com reflexos sobre os seus territórios.

3.1.3.3 Desenvolvimento e Subdesenvolvimento: Um Processo de Engendramento da Prevalência

Em suas abordagens críticas sobre desenvolvimento, Furtado (2009, p. 85), ressalta que desenvolvimento e subdesenvolvimento é a dinâmica da atuação estrutural social que resulta na prevalência, ou seja, na superioridade de um sobre o outro (classe, povos, territórios e outros):

O crescimento de uma economia desenvolvida é, portanto, principalmente, um problema de acumulação de novos conhecimentos científicos e de progressos na ampliação tecnológica desses conhecimentos. O crescimento das economias subdesenvolvidas é, sobretudo, um processo de assimilação da técnica prevalecente na época.

Nesta perspectiva, é inevitável a vinculação do processo de acumulação do capital, como fator de impulsão e definição do estado de desenvolvimento e subdesenvolvimento, o que caracteriza e aponta algumas das dificuldades na implementação de políticas públicas condizentes e que respondam as reais necessidades da Amazônia. Segundo Castro (2004, p.11):

A questão econômica é fundamental para se entender as diversas variáveis, a dinâmica espacial dos atores sociais e ao mesmo tempo, a dinâmica da própria atividade e do crescimento do País que está direta­mente interligado com a ocupação das novas fronteiras.

Segundo Furtado (2009), todo desenvolvimento tente a criar alguma desigualdade, como se fosse uma lei universal intrínseca a dinâmica do crescimento. Tal concepção tem como base que os baixos níveis de absorção tecnológica de territórios periféricos, marginais, traduzem as desigualdades no cerne das comunidades, reproduzindo e perpetuando seu atraso devido a acumulação e reprodução do capital privado.

Celso Furtado (2009) conclui que a dinâmica de mercado, através de seus mecanismos, por si só, é incapaz de se desvencilhar do círculo vicioso do subdesenvolvimento. Desta forma, a atuação do Estado sob o domínio econômico é uma exigência inevitável para superação das limitações (pelo fato de restringir) que a dinâmica espontânea dos mercados impõe.

3.1.3.4 Estado: sua Dinâmica e Poder de Indução

3.1.3.4.1 Estado

O entendimento de Estado pode ser definido como um complexo de relações sociais, pois é constituído e engendrado por indivíduos ativos, agentes transformadores e atores sociais, mas sob forma que foge a sua consciência e a seu controle imediato. Na opinião de Hirsch (2009, p. 20):

[...] Estado não pode ser compreendido direta e imediatamente. Como toda ciência crítica, a teoria materialista do Estado tem como objetivo remeter as categorias teóricas dominantes às suas relações sociais básicas e, com isso ajudar os indivíduos a entenderem a si mesmos, a sua ação a as condições que os determinam como pré-requisito para sua autolibertação.

Desta forma, entende-se que Estado não é simplesmente definido, e delineado como ligação organizativa, mas como expressão de uma relação de socialização antagônica e contraditória. A luz de Joaquim Hirsch (2009) o ponto de partida da teoria materialista do Estado, que defende uma perspectiva de uma Estado forte e presente, em se tratando da regulamentação da economia, são as relações materiais de produção, isto é, o modo como se comportam os indivíduos entre si no processo de produção.

Nessa perspectiva, a de Hirsch (2009), diferencia-se Estado de outras formas de dominação política que predominaram ao longo da história, dominação que em seu sentido próprio, apenas poderia formar-se quando as sociedades tivessem implementado e desenvolvido suas divisões de trabalhos e sua concepção econômica, possibilitando a geração de um subproduto que ultrapassasse suas necessidades imediatas. Somente sob tal condição é possível a exploração dos produtos de outros, a separação entre trabalho manual e intelectual e, com isso, a formação de grupos e classe dominantes.

Compreende-se Estado como “Estado Moderno”, implementado como aparelho centralizado de força para o engendramento do desenvolvimento capitalista e da sociedade burguesa. Complementando, vale destacar Hirsch (1998, p. 24):

[...] o Estado não é conceituado como organização instaurada conscientimente pelas pessoas, segundo objetivos definidos, e menos ainda como corporificação do “bem estar comum”, mas deve ser entendido, até certo ponto, como resultado de lutas de classes que operam sobre os agentes, ou seja, da luta pelo sobreproduto.

Uma das principais características da sociedade capitalista, que tem como base e mola propulsora o Estado, é que a relação social dos indivíduos que nela interagem, não é estabelecida por eles mesmos de forma direta e consciente, mas por processos que operam atrás deles, através da produção privada e da relação de trocas de mercadorias. Desse modo, Silva (2011, p. 1):

Assim, a produção material dos indivíduos se envolve tanto numa ampliação da esfera do consumo como na deterioração da qualidade das condições do trabalho e da formação humana. E implica numa crescente manipulação do consumidor pela publicidade das empresas capitalistas nas esferas da produção e do consumo. Sobretudo, porque insiste na produção do mesmo (no sentido do sempre igual), tanto na forma de reproduzir o capital quanto na reprodução do fetiche da mercadoria como produto da vida social.

Nesta ótica, observa-se a permeabilidade do Estado por uma classe não dominantes, porém, não consciente de suas reais possibilidade de transmutação do Estado, que é entendido como complexo de relações sociais, o que favorece uma nova vertente levando em conta as mudanças sociais das últimas décadas.

No caso das lutas de classe dos Amazônidas, a Amazônia requer para si, de acordo com o próprio Hirsch (2009), que sua luta busque ajudar os indivíduos, agentes/atores, a entenderem a si mesmos, a sua ação/reação e as condições que os determinam como pré-requisito para sua autolibertação.

Diante desse contexto, destacamos a definição de Santos (1978, p. 104) que declara como espaço derivado, o qual a dinâmica de interação e desenvolvimento do território, tida e delineada por vontades alheias, ou seja, de fora para dentro, não levando em consideração o território existente e constituído, perpetuando o subdesenvolvimento destas regiões. “É o que estamos chamando espaço de­rivado, cujos princípios de organização devem muito mais a uma vontade longínqua do que aos impulsos ou organizações simplesmente lo­cais”.

3.1.3.5 Estado Nacional e Participação popular

3.1.3.5.1Estado Nacional: uma nova cadência

Ao abordar nesta seção as concepções de desenvolvimento, subdesenvolvimento e Estado, evidencia-se a necessidade da discussão em relação a esta nova perspectiva, apresentada por Peter Evans, o Estado ativo.

Ressalta-se a presença do Estado nacional (Estado ativo), como fator primordial para o avanço econômico e manutenção do equilíbrio econômico neste período de crise econômica mundial.

No segundo semestre de 2008, foi evidenciada a crise econômica financeira com a quebra do banco Lehaman Brother, o estopim e o momento mais crítico da atual, e não interrompida, crise econômica financeira mundial. O DIEESE (2011) comenta: “Seguindo essa linha de análise, a crise atual não é uma novidade, mas a continuação de uma situação explicitada a partir de 2007, e que teve o seu momento mais agudo, até aqui, ao longo do segundo semestre de 2008”. (Dieese, 2011).

Neste cenário, atuou o G-20[6], criando um leque de ações a fim de combater os efeitos drásticos da crise, conduzindo a recuperação do sistema econômico financeiro, que se desconstruía em meio às turbulência do mercado devido à especulação financeira e recessão econômica.

Esta abordagem e contextualização da crise financeira mundial, se faz necessária para o resgate do pensamento e análise da importância dos Estados nacionais, em propor, intervir e ser o condutor de um novo marco ideológico/econômico/financeiro.

O poder de resgate e recuperação do sistema financeiro pelos Estados Nacionais nos apresenta uma nova possibilidade de arguição e de ponderações no que tange ao processo democrático/participativo da coletividade sob o sistema de capital.

No caso da Amazônia brasileira, a ausência de um Estado nacional, presente e ativo – a exemplo de Evans (1995), retrata e reafirma a visão de Furtado (2009) de que a busca de seu desenvolvimento, ao longo das últimas décadas, reproduz a perpetuação de seu subdesenvolvimento, visto que a implementação de políticas públicas de inserção da Amazônia no contexto nacional somente favorecia o engendramento do acúmulo de capital.

À luz de Carleial e Cruz (2012, p.24), coaduna o ideal de que a questão do desenvolvimento territorial, neste caso, a Amazônia brasileira, é possível a promoção de um real desenvolvimento para esta região, pautando um marco de transição e atuação de um Estado nacional que enfrente novos desafios e conflitos na busca de um desenvolvimento legítimo, implementando novas estruturas produtivas regionais.

Essa estratégia precisa superar o clássico caminho de identificar vocações regionais, transformá-las em potencialidades e disputar as transferências de renda efetuadas pelo governo federal.

Ou seja, o trinômio vocações + potencialidades + redistribuição precisa ser superado por uma estratégia que objetive alterar as estruturas produtivas regionais, especialmente as das regiões mais empobrecidas como o Norte e o Nordeste brasileiros. Esta proposição reconhece que só superando as vantagens comparativas é possível promover o desenvolvimento. Nesse sentido, o desenvolvimento exige que façamos escolhas, enfrentemos desafios e conflitos.

Ressalta-se que, para o direcionamento desta nova cadência de Estado, a participação popular é de fundamental importância.

3.1.3.5.2 Participação popular

Nesta perspectiva de um Estado promotor de um novo tom de sinergia entre sociedade/Estado, vale ressaltar a importância da participação popular.

Segundo Menezes (2005), modelos tradicionais de representação democrática se apresentam como insuficientes para garantir os princípios democráticos, já que, na perspectiva de um Estado ativo, não caberia uma administração pública isolada, burocrática e fechada à participação. A participação da sociedade apresentaria um novo tom de reciprocidade de interesses e ações coordenadas.

Vale ressaltar que, desde 1988, o direito da participação popular é garantida. A Constituição Federal, conhecida como Constituição Cidadã, prevê a participação popular direta através dos chamados institutos de democracia, entre alguns destes institutos, pode-se citar o plebiscito, o referendo, a iniciativa popular na formulação de leis, os conselhos e outros.

A participação social efetiva na administração pública surge como meio de garantir e ratificar sua legitimidade, reafirmando o ideal de que a democracia participativa e a atuação do Estado de forma eficiente não são exigências contraditórias. Menezes (2005, p. 1) entende:

Acredita-se que governos que asseguram a participação dos cidadãos na formulação e implementação de políticas públicas tornam-se mais eficientes do que os governos puramente tecnocratas, em razão da sustentabilidade política e legitimidade que logram para os seus programas de ação.

Outro fator a ser considerado é a qualidade da participação social. Leva-se em conta as inúmeras privações impostas à participação do indivíduo. Deve-se considerar a liberdade individual como um meio de comprometimento social, devendo a expansão da liberdade real e concreta (não apenas aparente) dos indivíduos ser vista como o principal fim e de igual acessibilidade, como também o principal meio de desenvolvimento.

Este mesmo desenvolvimento consiste, precisamente, na eliminação das privações de liberdade que limitam o desenvolvimento das pessoas de exercer equilibradamente sua condição de agente, efetivo participador e condicionador de um raciocínio e de uma prática ampliada e emancipatória.

Segundo Sen (2000), para que um real desenvolvimento aconteça, exige-se que sejam removidas as principais fontes de privação de liberdade, quais sejam, pobreza, coronelismos, carência de oportunidades econômicas, não acesso à socialização sistêmica, serviços públicos de má qualidade e repressão estatal. Essas privações de liberdade podem surgir tanto em razão de processos inadequados quanto de oportunidades inadequadas para se realizar o mínimo que se desejaria.

Para Sen (2000), a resposta para a maximização desse acesso são as políticas públicas. Políticas essas formadas na base, através da participação da sociedade, fortalecendo a democracia, a participação social nas estratégias e dando uma nova dinâmica institucional. Segundo Menezes (2005, p. 7):

A atuação do administrador público é legítima quando atenta aos princípios constitucionais e certamente logrará maior legitimidade quando aberta a uma participação qualitativa. Para isso é preciso que a cidadania cresça..

Portanto, a participação popular no território amazônico muito tem de avançar, levando em conta questões de limitação, sendo elas, econômicas, sociais e culturais, o que perpetua as desigualdades regionais e mantém o processo de subdesenvolvimento territorial.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Amazônia brasileira é marcada, ao longo de sua história recente, por profundas intervenções na tentativa de pautar o desenvolvimento territorial deste singular território.

O Estado brasileiro, em meados do século passado, na busca de integrar o desenvolvimento da Amazônia legal ao restante do país, o que realmente seria importante e necessário, deu cadência de descontinuidade ao desenvolvimento amazônico, devido à falta de sinergia e sintonia entre os diferentes agentes promotores de políticas públicas de tal região, como também pela falta de entendimento e compreensão deste imenso território.

No desenvolvimento desta pesquisa, nota-se que a ação do Estado brasileiro como também sua presença ao longo do tempo, com instituições como SUDAM, BANCO DA AMAZÔNIA e outros, tem como característica a centralização de suas ações, como também a falta de articulação e interação com as experiências da comunidade local.

Justifica-se esta falta de interação e é entendida devido ao modelo desenvolvimentista industrial dominante, nunca dar abertura, voz e vez à participação popular na elaboração e implementação de políticas públicas.

É clara esta posição na primeira seção deste trabalho, que contextualiza a colonização da Amazônia em meio às políticas públicas estatais, políticas, estas de cunho desenvolvimentista, que implementaram frentes produtivas, pautando a ocupação e colonização da Amazônia brasileira, resguardando os interesses não só do Estado brasileiro em constituir a sonhada integração nacional, como também garantir os interesses do capital privado.

Pode-se pensar o desenvolvimento da Amazônia em duas partes, sendo a primeira antes de 1988, marco da retomada da democracia e garantia da participação popular, garantida pela Constituição Federal, a Constituição Cidadã, e logo após este marco, a segunda parte.

A primeira se caracteriza por políticas Estatais de cunho desenvolvimentista, sem levar em conta as particularidades e as populações locais, num processo agressivo sobre a floresta sob principal domínio do regime militar.

A segunda, a partir de novas concepções na busca de uma racionalidade ambiental, preocupada com uma proposta sustentável, no Brasil, esta vertente ganha força com a Rio 92.

Esta evidencia o objetivo principal desta pesquisa, analisar as políticas públicas do Estado brasileiro, Plano de Prevenção e Controle ao Desmatamento da Amazônia (PPCDAM) e o Plano Amazônia Sustentável (PAS), averiguando quais são as reais contribuições para alternativas econômicas que convirjam para o desenvolvimento sustentável da Amazônia Legal a partir de um planejamento legitimado. Constata-se que o Estado brasileiro, carece de legitimidade na região amazônica, não consegue avançar nesta perspectiva; a de incluir a variável ambiental e a transversalidade de políticas públicas implementadas pelo Estado brasileiro, para o enfrentamento à grilagem de terras, degradação ambiental e o avanço de desmatamento sob a floresta.

É notório o avanço do PPCDAM no combate ao desmatamento e implementação de uma racionalidade ambiental, mas é muito pouco, visto que o principal plano para recuperação e viabilização de uma nova realidade do desenvolvimento amazônico, a de implementação de políticas públicas transversais, emancipação social e que marcaria um novo padrão de produção na Amazônia, não tenha saído do campo teórico, o PAS.

Diante desse cenário, fica claro que o Estado brasileiro continua a seguir um modelo desenvolvimentista industrial, apesar de ter implementado, ou melhor, formulado um plano que alcançaria toda a concepção defendida neste trabalho, a do desenvolvimento sustentável pleno na Amazônia como também a expansão das liberdades substantivas tão necessárias ao cenário amazônico, como defendido por Sen (2000), mas principalmente a esperança, pautada na teoria de Hirsch (2009), que o Estado pode, sim, ser permeado por classes menos desfavorecidas, constituindo assim um novo patamar de dinâmica e interação social.

Acredita-se que o PAS, como também o PPCDAM, apesar de seus avanços (PPCDAM), não passem de mero discurso estatal, discurso este exigido no cenário internacional como também nacionalmente, devido a uma nova percepção de uma racionalidade pautada no ambiental.

Diante disto, como resultado, é visto que a reformulação, o pensar em uma nova concepção de Estado, se faz necessária, visto que práticas descentralizadas e articuladas com a teia social local propiciam a formação efetiva da participação social de forma direta e indireta.

Acreditar nesta nova possibilidade de Estado, o Estado nacional, não é mais um caminho, e sim um imperativo para que o Estado brasileiro adquira legitimidade perante a sociedade amazônica, como também, implemente ações que pautem o desenvolvimento pleno de seus territórios numa proposta ampla de nação.

Desenvolvimento sustentável e participação popular não é mero acontecimento, tende a vigorar e se fortalecer em linhas opostas pactuadas pelo poder econômico - acumulador e reprodutor do capital -, resultam de um processo efetivo de participação social, estabelecendo uma visão comum do futuro, resguardada pela sinergia de um Estado presente e atuante.

AMAZONDEVELOPMENT: A DISCUSSION OF PUBLIC

POLICIESOFBRAZILIAN STATE

ABSTRACT

Thinking the Amazonian development is more than a challenge, it should be seen as a major factor of national development, an integral part of planning a macro view, and not a separate and isolated territory. In the quest for understanding the dynamics Amazon, this study sought to contextualize the whole recent history of public policies already implemented by the Brazilian government for its development, comparing them with key public policy today, the PPCDAM - Plan for Prevention and Control of Deforestation in Amazon and PAS - Sustainable Amazon Plan, new strands of policy legitimized and interaction with agents and social actors.Faced with this discussion of public policies already implemented in the Amazon territory, notes the importance of the state as the main inducer for territorial development, taking into account the possibility of a state permeated and constituted not only by the ruling classes, a view strengthened by crisis capitalist, giving a new face to the nation state.

Keywords: Amazon. Development. Public Policy. State.

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©️ REFAF 2020 - Revista Eletrônica Multidisciplinar da Faculdade de Alta Floresta - ISSN: 2238-5479

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