É competente o foro da residência da mulher para a ação de separação dos cônjuges e a conversão desta em divórcio e para a anulação de casamento?

É competente o foro da residência da mulher para a ação de separação dos cônjuges e a conversão desta em divórcio e para a anulação de casamento?

O Código de Processo Civil, que é de 1973, estabelece:

Art. 100.  É competente o foro:
I - da residência da mulher, para a ação de separação dos cônjuges e a conversão desta em divórcio, e para a anulação de casamento;

A Constituição Federal de 1988, por sua vez, prevê:

Art. 226 (...)
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Diante dessas duas previsões, indaga-se: o art. 100, I, do CPC foi recepcionado pela CF/88?

Há, ainda, algumas posições intermediárias afirmando que o dispositivo, em tese, é ainda constitucional, no entanto, havendo efetiva igualdade entre homem e mulher tem que ser afastado, no caso concreto, por inconstitucional (Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero).

O que entende o STF?
A 2ª Turma do STF decidiu que o art. 100, I, do CPC foi recepcionado pela CF/88, não havendo incompatibilidade com o princípio da igualdade:

O art. 100, I, do CPC (...) não afronta o princípio da igualdade entre homens e mulheres (CF, art.5º, I), tampouco a isonomia entre os cônjuges (CF, art. 226, § 5º).
Com base nesse entendimento, a 2ª Turma desproveu recurso extraordinário por reputar que a norma processual fora recepcionada pela Constituição.
(...) Destacou-se que a Constituição seria marco histórico no processo de proteção dos direitos e garantias individuais e, por extensão, dos direitos das mulheres.
Ressaltou-se que, ao longo de mais de 2 décadas de vigência da Constituição, a doutrina e a jurisprudência alinhar-se-iam segundo 3 concepções distintas acerca do dispositivo em discussão, que preconizariam:
a) a sua não-recepção;
b) a sua recepção; e
c) a recepção condicionada às circunstâncias específicas do caso, em especial levando-se em conta o fato de a mulher se encontrar em posição efetivamente desvantajosa em relação ao marido.
Asseverou-se não se cuidar de privilégio estabelecido em favor das mulheres, mas de norma que visaria a dar tratamento menos gravoso à parte que, em regra, se encontrava e, ainda hoje se encontraria, em situação menos favorável do ponto de vista econômico e financeiro. Assim, a propositura da ação de separação judicial no foro do domicílio da mulher seria medida que melhor atenderia ao princípio da isonomia, consistente em “tratar desigualmente os desiguais na medida em que se desigualam”.
Ademais, a competência prevista no inciso I do art. 100 do CPC seria relativa, ou seja, se a mulher não apresentasse exceção de incompetência em tempo hábil, a competência prorrogar-se-ia; ou, a própria mulher poderia ajuizar a ação no foro do domicílio do ex-marido, de forma a inexistir óbice legal a que a ação prosseguisse.
RE 227114/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 22.11.2011

Outra polêmica:
O art. 100, I, do CPC fala em:
•    ação de separação dos cônjuges;
•    conversão da separação em divórcio; e
•    ação de anulação de casamento.

Esse foro privativo da mulher aplica-se também aos casos de divórcio direto?

Vale lembrar que, segundo entendimento majoritário, a separação judicial acabou por força da a EC 66/2010. Logo, não mais existiria ação de separação judicial, mas tão somente a ação de conversão da separação em divórcio e a ação de divórcio direto.

Terceira questão importante:
Esse foro privativo aplica-se também aos casos de ação de dissolução de união estável?

Deve-se ressaltar que o art. 100, I, do CPC é regra de competência relativa.
Em virtude disso, pode-se chegar às seguintes conclusões:
a) Trata-se de regra criada para atender ao interesse da mulher;
b) Somente a mulher pode alegar a incompetência (por meio de exceção de incompetência, no prazo da resposta). O MP não pode suscitar nem o juiz pode conhecer de ofício;
c) A competência pode ser alterada pela vontade da mulher. Assim, a mulher poderá abrir mão do foro de seu domicílio e propor a ação no foro de domicílio do marido. Ou ainda, poderá permitir a prorrogação de competência ao não ingressar com exceção de incompetência caso o marido tenha proposto a ação no foro de seu próprio domicílio.

Casamento homoafetivo

Por fim, uma última observação:
Se a ação de divórcio ou de anulação for relativa a um casamento homoafetivo (envolvendo duas mulheres, por exemplo), não haverá foro privativo para nenhuma das partes, devendo a ação ser proposta no foro do domicílio da requerida (art. 94, I, do CPC).

A regra geral de competência estabelecida no artigo 46 do Código de Processo Civil é a de que as ações devem ser propostas no foro do domicílio do réu. Todavia, o diploma estatui regras especiais de competência em determinadas situações. Essas regras específicas encontram previsão no artigo 53, cujo texto é bastante semelhante ao artigo 100 do diploma anterior, de 1973.

O inciso I do art. 53 do CPC/2015 trata da competência para o julgamento das ações relativas a casamento ou união estável. Segundo dispõe, para as ações de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável será competente o foro: (i) de domicílio do guardião de filho incapaz; (ii) do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz; (iii) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal ou, (iv) de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar, nos termos da lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha.

O CPC de 1973 estabelecia o foro do domicílio da mulher para as ações de separação e divórcio. Andou bem o novo diploma ao instituir, ao invés, o foro do domicílio do guardião do filho incapaz, que pode ser o de qualquer dos cônjuges, seja homem ou mulher. A regra anterior já vinha sendo considerada como não recepcionada pela constituição de 1988 em virtude da violação da isonomia entre homens e mulheres.

Outra inovação no dispositivo, essa recentíssima, foi o acréscimo da alínea "d", promovido pela lei 13.894, de 29 de outubro de 2019. Assim, instituiu-se nova hipótese de competência especial que estabelece como competente o foro de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar. Diversamente do caso anterior, aqui se justifica o foro especial tendo em vista a peculiar condição de vulnerabilidade da mulher vítima de violência doméstica e não apenas uma previsão abstrata de foro do domicílio da mulher.

O inciso II do art. 53 trata da competência para as ações de alimentos, fixando como foro competente o do domicílio ou residência do alimentando. Ao comentar a regra, Marco Gasparetti esclarece que "o objetivo desta norma, nitidamente, é privilegiar os interesses do alimentando, na linha dos dispositivos da Lei de Alimentos (lei 5.478/68), razão pela qual, embora o dispositivo faça referência às ações em que 'se pedem alimentos', a regra de competência deve ser aplicada também para as ações de revisão de alimentos e todas as demais ações que versam sobre o tema, ainda que cumulando outros pedidos ou pretensões1".

O terceiro inciso do dispositivo ora em comento, em suas alíneas "a" e "b" trata de detalhar a regra geral da competência do foro do domicílio do réu nas hipóteses em que este for pessoa jurídica. Nesses casos, será competente o foro do lugar da sede ou da agência ou sucursal, quanto às obrigações que a pessoa jurídica contraiu. A alínea "a" reproduz a regra do art. 100, IV, "a" do CPC anterior, reiterando a regra de que a ação contra pessoa jurídica deve ser proposta no juízo do local da sua sede. Já pela alínea "b", depreende-se que se a pessoa jurídica tiver diversos estabelecimentos (agências, sucursais, filiais etc.), esta deverá ser demandada no juízo do lugar do referido estabelecimento quando a ação se tratar de obrigações por ele assumidas.

O Código também cuidou de estabelecer a regra de competência para as sociedades e associações despersonificadas. Na alínea "c" do inciso II do art. 53 estabeleceu como foro competente nessas hipóteses o do local onde a sociedade ou associação exercer suas atividades.

Como se trata de sociedades de fato, não há registro de seus atos constitutivos e, consequentemente, um local definido como sua sede, o que impossibilitaria a aplicação da regra da alínea "a". Portanto, de forma coerente, estabeleceu o diploma que o foro competente deve ser o do local onde a sociedade de fato efetivamente exerce suas atividades.

Em matéria de direito das obrigações, também o Código estipulou regra de competência especial. Consoante a alínea "d", é competente o foro do lugar onde a obrigação deve ser satisfeita, para a ação em que se lhe exigir o cumprimento. Trata-se do chamado forum obligationes.

A interpretação e o alcance dessa regra suscitam diversas controvérsias, sobretudo quando utilizada para excepcionar a regra geral do foro do domicílio do réu. O local em que a obrigação deve ser cumprida nem sempre é claro e preciso, de sorte que há que se observar aspectos como a natureza da obrigação, as disposições contratuais ou mesmo regras de direito material, como a do art. 327 do Código Civil, segundo o qual as obrigações devem ser cumpridas no domicílio do devedor.

Além da definição do local do cumprimento da obrigação, há divergências quanto à extensão da regra, especialmente (i) se ela se aplica apenas para obrigações decorrentes de lei ou de negócio jurídico, ou se também pode ser aplicada para atos ilícitos; (ii) se ela se restringe às ações com conteúdo cominatório (ações que exigem o cumprimento da obrigação), ou se alcança também pedidos indenizatórios decorrentes do descumprimento da obrigação, ou mesmo pedidos constitutivos ou declaratórios de sua inexistência ou invalidade2.

A simples leitura do dispositivo não responde a essas inúmeras indagações, de modo que a doutrina e a jurisprudência vêm tentando suprir essas lacunas com interpretações mais ou menos restritivas do dispositivo. No tocante à ação de reparação de danos, com fundamento no inadimplemento contratual, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o foro competente para seu ajuizamento é o do local onde a obrigação deveria ter sido cumprida3, aplicando-se, assim, a regra ora em comento. O Tribunal também entende pela aplicação da referida regra de competência para as ações com pedido de invalidade do contrato4.

O CPC de 2015 também estabeleceu regra especial de competência para o foro de residência do idoso, para a causa que verse sobre direito previsto no respectivo estatuto. É o que aduz o art. 53, III, "e". A norma reflete proteção constitucional conferida ao idoso, no art. 230 da Carta Maior. O Estatuto do Idoso (lei 10.741) já previa, em seu art. 80, que as ações referentes à proteção judicial dos interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis ou homogêneos deveriam ser propostas no foro do domicílio do idoso, "cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa".

Assim, nenhuma dúvida pode haver de que, tratando-se de demanda coletiva, o legislador tornou absoluta a competência territorial, ao passo que as demandas individuais que versem sobre direito previsto no Estatuto do Idoso, se submetem, quanto à competência, à norma extraída do art. 53, III ora em comento, a qual é relativa5.

A última alínea do inciso III ora em comento prevê foro especial em relação à "sede da serventia notarial ou de registro, para a ação de reparação de dano por ato praticado em razão do ofício". Trata-se de inovação em relação ao Código de 1973. Aqui, o legislador fez a opção política de estabelecer que o juízo cujo foro abranger o lugar da sede da serventia notarial ou de registro é o competente para processar e julgar causas que versem sobre reparação de dano por ato praticado em razão do ofício.

Já o inciso IV do art. 53 traz a regra de competência do lugar do ato ou fato para a ação (i) de reparação de dano e (ii) em que for réu administrador ou gestor de negócios alheios. Quanto à ação de reparação de danos, trata-se do forum comissi delicti, segundo a qual é competente o foro do local do fato ou ato onde ocorreram os danos cuja reparação se pleiteia. Essa regra apenas se aplica para a responsabilidade civil extracontratual, já que para a responsabilidade civil contratual a competência é do foro do local onde a obrigação deveria ter sido satisfeita. Se os danos decorrerem de acidente de veículo ou aeronave, a ação que busque a sua reparação pode ser ajuizada tanto no local do fato como quanto no domicílio do autor, conforme previsão do inciso V do art. 53.

Já em relação à ação contra administrador ou gestor de negócios alheios, esta deve ser ajuizada no foro do lugar do ato ou fato da gestão. A regra também possuía previsão semelhante no diploma revogado, em seu art. 100, V, "b".

Desta feita, observa-se que o artigo 53 do CPC/2015 apresenta um rol de regras especiais de competência, que se distinguem da regra geral do domicílio do réu, seja pela sua especial condição de vulnerabilidade (idoso, mulher vítima de violência doméstica, filho incapaz etc.), seja para buscar maior efetividade da ação, como nos casos de reparação de dano, e cumprimento de obrigação. O dispositivo, a despeito de reproduzir parte do que já constava no ordenamento, no CPC de 1973, realizou aprimoramentos no texto, atualizando-o ao contexto social contemporâneo, bem como ampliando as regras especiais em razão do reconhecimento de sua necessidade visando aperfeiçoar a efetividade do processo e o acesso à Justiça.

__________

1 GASPARETTI, Marco Vanin. In: ALVIM, Angélica Arruda. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 106.

2 Idem, p. 107.

3 Ag 1.431.051/DF. Rel. Ministro Raul Araújo. 4ª Turma. DJe: 21/8/2012.

4 REsp 52.012/DF. Rel. Ministro Waldemar Zveiter , 3ª Turma. DJ 13/11/1995.

5 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Breves Comentários ao novo Código de Processo Civil, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 214.

É competente o foro de domicílio da mulher para a ação de divórcio anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável?

Para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento e reconhecimento ou dissolução de união estável, é competente o foro do domicílio do réu, mesmo que seja o autor quem reside no último domicílio do casal.

É competente o foro de domicílio da mulher para a ação de divórcio?

O acórdão se apoiou no artigo 100, inciso I, do Código de Processo Civil (CPC), que estabelece que é competente o foro da residência da mulher para a ação de separação dos cônjuges e de conversão desta em divórcio, bem como para a anulação de casamento.

É competente o foro do domicílio em que as partes celebraram o casamento?

O foro competente é o do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz.

É competente o foro do domicílio?

[1] Artigo 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal. Parágrafo único.