A comparação entre cinema e sabão em pó

João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor.

"O papel do cinema é gerar uma memória em nós mesmos" - 24/03/2009
Refletindo sobre Cinema com Walter Salles Jr.

ÉPOCA – Você acha que o cinema brasileiro pode estar voltando a viver uma “crise” com as fracas bilheterias e audiência dos filmes nacionais no último ano?
Walter Salles - Para começar, cinema não é sabão em pó. O papel do cinema é gerar uma memória de nós mesmos, um retrato de uma sociedade num dado momento. Eu não sei quantas pessoas viram Vidas Secas [clássico de 1963 do diretor Nelson Pereira dos Santos], Terra em Transe [de Glauber Rocha, feito em 1967], São Paulo S.A [filme de 1965 do cineasta Luis Sérgio Person] ou Iracema - uma Transa Amazônica [filme de 1976 do diretor Jorge Bodanzky]. Mas sei que esses filmes nos explicam, dizem quem somos, de onde viemos. E mais: podem não terem sido vistos por multidões quando foram lançados, mas continuarão a serem vistos ao longo das décadas, porque são filmes essenciais à nossa compreensão enquanto sociedade. O problema é que estamos julgando hoje o cinema brasileiro com os instrumentos que são utilizados para avaliar o cinema de mercado norte-americano. É um pouco como comparar o público do McDonald’s com daquele restaurante de bairro, que te propõe uma comida autêntica, de um lugar específico. Então, a pergunta que talvez devêssemos fazer é a seguinte: os filmes brasileiros têm tido sucesso em refletir nossos desejos e contradições?  (Fonte: Revista Época, 29/08/08)

Walter Salles respira cinema. Vinte e quatro horas de seu dia são destinados à composição de um trabalho meticuloso, inteligente, único e extremamente qualificado. Quem diz isso? O mercado cinematográfico, os críticos, os técnicos, os atores... Fundamentalmente todas as pessoas que trabalham com a Sétima Arte, dentro e fora do Brasil compreendem ser a obra de Salles uma das melhores e mais viscerais traduções do cinema contemporâneo.  

Por esse motivo, quando esse jovem diretor brasileiro nos diz que “cinema não é sabão em pó” e sim, que “o papel do cinema é gerar uma memória de nós mesmos, um retrato de uma sociedade num dado momento”, temos que prestar atenção e analisar suas palavras.

Não é possível, de acordo com Salles, comparar o cinema, produção cultural que exige “tutano” por parte de um sem-número de profissionais, a itens de consumo rápido, como “sabão em pó” ou sanduíches produzidos em linha. Cinema - com “C” maiúsculo - é feito para pensar, refletir, degustar, apreciar, aprender, entreter, provocar, estimular, discordar, concordar... Não é para consumo rápido, do tipo “Coca-Cola”, tome e sinta o frescor, depois siga a sua vida como se nada mais profundo tivesse acontecido...

Outro ponto importante... O cinema fala de nossas vidas, encontros e desencontros, partidas e chegadas, amores e desamores, amizades e inimizades, aventuras e desventuras, triunfos e fracassos, dores e dissabores, alegrias e realizações... Pelo cinema criam-se imagens que procuram reproduzir um pouco daquilo que são nossas existências, a sociedade, as relações pessoais, o trabalho, o lazer... No cinema nos assistimos, nos percebemos, nos idealizamos...

Revista TAM nas Nuvens - O Brasil é um dos países em que o número de milionários mais cresce no mundo. Além disso, temos um dos maiores índices mundiais de desigualdade social e má distribuição de renda. Como cidadão, você acredita que é possível distribuir melhor a renda e diminuir a desigualdade social?
Walter Salles - Esta é uma questão com a qual me debato constantemente, e que me faz questionar a missão do cinema como agente de transformação social. Há quem acredite que o cinema não tem força para mudar nada. Se eu pensasse assim, já teria abandonado a profissão de cineasta há muito tempo. As desigualdades sociais brasileiras vem de problemas que se desenvolveram ao longo de 500 anos de história, e que precisariam de medidas mais drásticas para serem sanadas do que os paliativos que vêm sendo tomados por governos sucessivos. Enquanto isso não ocorre, a única saída é tentar fazer a parte que nos cabe, seja no trabalho, nas esferas públicas ou nas ações que tomamos de forma privada. No nosso território, o cinema, tentamos democratizar o acesso à imagem e, portanto, à informação, que é base de todo Estado democrático. Fazemos isso produzindo primeiro filmes de cineastas estreantes ou ajudando a feitura de muitos projetos com o empréstimo de equipamento. [Fonte: Revista TAM nas Nuvens]

Salles recentemente lançou outro grande filme, Linha de Passe. Cineasta consagrado, autor de filmes de repercussão mundial - como Central do Brasil, Abril Despedaçado e Diários de Motocicleta - mostra-se na declaração acima um cidadão sintonizado e preocupado com questões nacionais de grande importância como a questão da distribuição de renda injusta e a marcante desigualdade social de nosso país.

Creio, igualmente, que o cinema tem claramente esse objetivo, ou seja, o de esclarecer e comunicar ideias. Como destaca o diretor em sua declaração, ao afirmar que uma das ações empreendidas pelas pessoas que trabalham no ramo é justamente a questão da democratização do acesso à imagem e, consequentemente, a informação.

Nesse sentido é válido acentuar o uso da expressão “acesso à imagem” como sinônimo de acesso à informação. Vivemos numa sociedade em que a imagem é cada vez mais uma das principais formas de comunicação de ideias. O que vai bem ao encontro, a proposição de Paulo Freire, que sempre relembramos, da cidadania estar associada à capacidade de leitura do mundo - leitura essa ampla, geral e irrestrita – que permita a qualquer pessoa perceber-se no universo como ser decisivo, atuante, crítico...

Outra fala muito importante de Salles refere-se à ideia de que o cinema tem força para influenciar pessoas, mudar comportamentos, promover ações. Quando ele diz que se não acreditasse nisso já teria abandonado a profissão, dá uma amostra do engajamento pessoal e profissional que qualquer projeto e área de atuação com a qual estamos envolvidos exigem. O cinema, assim como a educação, tem que ser propositivos, ou seja, devem estar atentos e engajados na busca por uma sociedade mais justa, harmônica, ética...

1 Luiz Paulo Silva - São Paulo Cinema é um mero entretenimento e não um longo exercício de reflexão, sendo constituído fundamentalmente por uma ficção que não tem comprometimento com a realidade. Walter Salles jr deveria parar de se achar um intelectual para se enxergar como só um artista que vende diversão. Conhecimento e reflexão vem com a leitura de Descartes.

19/10/2012 03:41:35

2 Raimunda Araujo - PeixeBoi Pa gostei do docomemtario amazonia em chamas pois contribuiu muito para meus estudos, estou graduando em geografia pena que nem todos apreciam.

01/08/2012 22:43:47

3 Alana Maria Silva Lira - Campina GrandePb Concordo com Salles quando diz: O cinema, assim como a educação, tem que ser propositivos, ou seja, devem estar atentos e engajados na busca por uma sociedade mais justa, harmônica, ética... Sou professora e sempre tento mostrar que essa desiqualdade só vai começar a mudar, quando mudarmos nossa consciência política: começarmos a escolhermos nossos representantes pelo projeto político e aprendermos a cobrálos. Também vejo o cinema como grande transformador de consciência, proporcionando filmes nesse sentido, embora acredite, que só, em média, 30 de nossos brasileiros assitiriam. Pois, preferem ver filmes que muitas vezes só incentivam as coisas prejudiciais, como: drogas, prostituição, etc...

16/07/2012 07:51:48

4 Lucia Gomes da Costa - joão pessoa Sou professora e comungo das ideias de Walter Sales, além disso me sinto renovada no ânimo e na esperança com o posicionamentos e as ideias de um brasileiro desse gabarito.

24/05/2012 17:50:06

5 robério - guarujá Quanta sensatez, clareza e vivacidade nestas palavras do cidadão cieastra Walter Salles Jr, assim como dos comentários de outro mestre João Luís de Almeida Machado, são indivíduos como vocês que devem ser apresentados para o grande público, são pessoas como vocês que tem ciências de uma sociedade melhor, que vossos pensamentos permaneça e se multiplique em cada indivíduo da nossa sociedade, na propoção de cada cocacola vendida e saciada por nós brasileiros.

15/10/2011 18:04:07

6 Raquel - sp Quando foi publicada a entrevista?

14/03/2011 17:28:45

7 Luana Linhares - Praia Grande São Paulo Olá! Adorei a matéria e aproveito a oportunidade para divulgar meu trabalho. Sou pedagoga e utilizo o cinema como ferramenta pedagógica, inclusive meu TCC teve como tema: Cinema na Escola:da sala de cinema aos conteúdos pedagógicos Quem quiser saber mais é só entrar no meu blog: luanalinhares.blogspot.com

04/01/2011 16:52:24

8 Ana Maria - Serra Branca Paraiba Gostei muito do artigo, ajudou na minha pesquisa, sobre a importância do cinema, nas aulas de sociologia.

08/11/2010 00:55:52

9 Eliana Batista Barbosa - Gastro Alves/BA Gostei muito desse artigo,estou fazendo o curso de Mídias e nas minhas pesquisas depareime com este magnífico artigo que fala da Sétima Arte. Trabalhando com filmes em sala de aula, os alunos ficarão mais motivados e as aulas mais atrativas. Levar os educandos a terem uma visão critica acerca do conteúdo assistido. Obrigada

07/11/2010 17:14:59

10 Débora Tessarin - Barra do Piraí RJ Sou Animadora Cultural e estou produzindo um filme com os alunos. Gostei muito porque também penso assim. Fortalece e incentiva ainda mais meu trabalho. Obrigada.

09/03/2010 19:25:56

11 José Ribeiro de Bastos - Anicuns Estado de Goiás Gostei muito desse artigo, principlamente quando Walter Salles enfatiza a missão do cinema como agente de transformação social e que se ele não pensasse assim, já teria abandonado a profissão de cineasta há muito tempo. Sou roteirista e cineasta amador, também compartilho com esta linha de pensamento.

16/02/2010 14:08:51

12 MARIA DE FATIMA PIEMNTEL GOMES - TEOTONIO VILELAAL Gostei muito do arquivo,me ajudou em uma pesquisa que estou fazendo, sobre cinema na escola, para um projeto de especialização em Tecnologia na Educação e o artigo mefoi muito útil

07/10/2009 13:43:46

13 Aberlandia G. Almeida - Maceio Gostei bastante desse artigo, estou cursando especialização em formação de professores em mídia na educação o meu projeto é sobre a mídia cinema, encontrei esse artigo pesquisando no google, com certeza me esclareceu alguns pontos que precisava.

26/09/2009 23:21:05