Hoje o assunto é o que faz uma mãe perder a guarda do filho. Como advogado de família, ouço constantemente: “Doutor, me separei. Agora o meu marido diz que vai tomar os meus filhos de mim. Ele pode mesmo? O que eu faço?” Show
Para responder essa questão, é preciso primeiro pensar em quais são os deveres dos pais em relação aos filhos, para depois voltar ao caso concreto e analisar o risco. Se houver identificação de problemas, aí haverá razão para se preocupar. Mas é preciso dizer que, em muitos casos, o pedido de guarda de filhos para o pai revela uma chantagem de homens que querem se beneficiar de alguma forma com o pânico que causam às mulheres com esse tipo de ameaça. Mas como saber se isso é chantagem barata ou ameaça séria? Quem vai responder é você, depois de ler os pontos que coloco abaixo. Se você é do tipo que apreende melhor a informação de forma visual, fique também à vontade para assistir ao vídeo que gravei com todas essas observações.
Uma observação inicial. Hoje em dia, a guarda compartilhada é a regra em caso de disputas entre os pais da criança, pois a Lei considera saudável que haja um certo equilíbrio na divisão do tempo de convivência e decisões. Entretanto, para que ocorra, ela deve ser viável. Não adianta estabelecer o regime compartilhado se pai e mãe vivem a 200 quilômetros de distância ou se a animosidade entre eles é tamanha que seja impossível tomar decisões conjuntas sobre a vida da criança. Mas o ponto focal desse artigo não é guarda compartilhada. O que trato aqui é em que circunstancias a mãe perde a guarda do filho, passando a ser exercida unilateralmentepelo pai. É esse o pesadelodas mães, e é sobre essa situação que iremos nos debruçar nesse artigo. A guarda dos filhos tende a ficar com a mãe, mas é preciso cautela Todos nós tomamos por favas contadas que as crianças devem ser criadas junto às mães. Não se trata de uma imposição legal, mas da combinação de instinto materno e usos e costumes. Contudo, é preciso alertar que, dependendo do universo cultural analisado ou das circunstâncias, as coisas podem não ser diferentes. Basta verificar que, em alguns países árabes, os meninos que completam 7 anos de idade por regra são afastados da mãe, passando a ser tutelados pelo pai, ao menos no que diz respeito a aspectos cruciais de educação social e religiosa. Já em nossa cultura, apesar do ponto de referência da infância serem mesmo as mães, o que está no centro do sistema judicial é outra coisa: o melhor interesse da criança. Não é nada fácil retirar a mãe do convívio do menor, mas é algo possível, e que depende basicamente da existência de um elemento que demonstre risco ao menor. Portanto, a resposta depende da análise das circunstâncias. Se o menor estiver em risco, acende-se uma luz vermelha no painel de controle do Sistema Judicial. Mãe desempregada pode perder a guarda do filho?Esta é uma questão corriqueira, pois além das dificuldades naturais da situação de desemprego, há ainda o stress de dúvida de ser arrancada do convívio com o filho. Mas fique calma. Se o ÚNICO motivo de seus temores é um hipotético pedido de guarda por razões financeiras - seja porque você perdeu o emprego ou porque o pai da criança ganha bem mais do que você – as chances de que você fique sem seu filho serão baixas. Veja o que diz o artigo 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. § 1o Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em serviços e programas oficiais de proteção, apoio e promoção. Os riscos à criança a que me refiro nos parágrafos anteriores não são aqueles causados pela diferença de condições financeiras entre pai e mãe do menor, pois para isso há remédio: a ação de alimentos. Essa providência virá para equilibrar a situação, pois fará com que ele venha a ter que colaborar efetivamente ou aumentar sua contribuição para o enfrentamento das despesas geradas pela criança. Portanto, se a ameaça do pai só tem a ver com dinheiro, ele estará dando um tiro no pé. Quando se fala em risco à criança, a situação é de outra natureza: olha-se para o AMBIENTE ao qual o menor está exposto. Se há situações que vinculem a mãe - ou outros que convivem na mesma casa, como parentes ou novo companheiro - com drogas, álcool, prostituição, abuso, ou qualquer situação que possa colocar a criança em risco (seja físico, moral ou psicológico), você estará diante de um quadro de risco potencial à sua guarda. Aquilo que você faz em sua vida pessoal poderá ter reflexos na vida da criança, e isso será fatalmente considerado pelo juiz da causa. Negligência infantil e abandono de incapazOutro ponto evidente é como você trata seus filhos. Se você é uma boa mãe, no sentido de prover as necessidades de afeto e cuidados, não há o que temer. Mas se há negligência, haverá risco à guarda. Me refiro à falta de afeto e atenção com cuidados de saúde (não levar ao médico quando necessário), de educação (deixar de atender às solicitações da escola, deixar de matricular o filho em idade escolar), higiene, alimentação, rotina, ou mesmo coisas mais graves, como uso de violência contra a criança, terror psicológico (violência psicológica infantil) ou exposição à violência sexual. Essa lista não se encerra em si mesma, e você, como boa mãe que é, tem plena consciência de tudo aquilo que pode significar risco potencial aos seus filhos. De qualquer forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nos apresente essa lista aberta de obrigações, conforme se observa de seu texto: Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta Lei. A violência doméstica infantil e maus tratos são aspectos extremamente importantes nessas considerações, e por razões óbvias. Mesmo que a barbárie seja praticada por outra pessoa - pelo novo companheiro ou companheira, por exemplo – isso não afastará a responsabilidade de quem tem o dever de zelar pelo bem estar do menor, e portanto o fato será considerado nos estudos sociais e psicológicos. O resultado poderá ser a perda da guarda. Não é preciso que o genitor ou genitora seja o agente da agressão, bastando que falhe ao dever de evitar situações de risco. Lembre-se: ser conivente com uma situação inaceitável a torna cúmplice do ato, se não na esfera criminal, certamente na familiar. Em caso de ajuizamento de ação judicial para disputa da guarda, esses detalhes serão analisados em estudo psicossocial - um trabalho conjunto da área de psicologia com a assistente social do juízo, para que se tenha uma ideia da realidade da criação oferecida à criança. Nessa avaliação serão considerados também a estrutura familiar e qualidade de relacionamento havido entre pais e filhos, tudo de modo a oferecer ao Juízo um panorama completo da criança em família. Alienação ParentalOutro aspecto importantíssimo é a chamada alienação parental. O assunto é muito vasto e não pretendo esgotar a questão em um parágrafo, mas é preciso saber que se trata de uma campanha levada a cabo por um dos pais contra o outro, que tem como instrumento a criança. Normalmente essas atitudes se materializam como uma constante reprovação das atitudes do outro genitor e concomitante fortalecimento de sua própria imagem, causando uma reação psicológica de exclusão ou rejeição do outro genitor. Mas o mais comum é que haja uma sabotagem que inviabilize constantemente a convivência com o filho, frustrando as visitas ou mesmo excluindo o contato. Trata-se de algo que se tem mostrado muito difícil de conseguir em juízo, mas uma vez provado pode acarretar a perda da guarda. Portanto, muito cuidado, pois muitas pessoas realizam a alienação parental sem ao menos perceberem que agem dessa forma. Mães que entregaram o filho ao paiFinalmente, é preciso alertar as mães que não estão convivendo com a criança (seja porque passaram os cuidados aos avós, ao pai ou mesmo a outros membros da rede de apoio) que será sempre mais difícil recuperar a guarda, já que isso levaria à total alteração na rotina do menor, o que não é algo desejável. Portanto, o afastamento voluntário – mesmo que saibamos que a vida às vezes não oferece outra alternativa – é também um fator que pesa na hora de uma decisão judicial. Se nada disso acontecer, estaremos falando de uma situação que, em juízo, poderá levar no máximo à guarda compartilhada (como explicado acima) ou regulamentação de visitas paternas, mas não a sua exclusão do convívio. ConclusãoPortanto, para responder a questão crucial desse artigo (quando a mãe pode perder a guarda do filho?) é preciso também usar o seu conhecimento sobre a personalidade do pai da criança. É muito normal que homens usem os filhos como instrumento de barganha para conseguir algo que querem – uma vantagem econômica, na maioria dos casos – e que, no frigir dos ovos, não tenham qualquer intenção real de obter a guarda unilateral. Eles simplesmente não querem tal responsabilidade. Contudo, há também casos de homens que realmente querem obter a guarda para si, mesmo com todas as dificuldades que isso lhes oferece. São aqueles que foram além do papel comum de provedores (que é o que deles se espera em uma sociedade conservadora e machista) para abraçar tarefas normais da criação, com todos as dores e prazeres que isso ocasiona. Saber em qual desses perfis psicológicos se encaixa o pai da criança é algo que poderá ajudá-la a qualificar a ameaça como algo real ou blefe. Dito isto, é importante que você sempre procure um advogado especializado em Direito de família para discutir pessoalmente todos os detalhes e monte um plano de ação, já que o assunto é relevantíssimo e precisa ser encarado de frente. Espero que com este artigo possa ter contribuído para acalmar sua mente e lhe dar um panorama realista do que tem à sua frente. Comentários são bem-vindos! ACOMPANHE AS ÚLTIMAS NOTÍCIAS NO BLOG REZENDE ADVOGADOS Quem tem mais direito mãe ou pai?A mãe não possui preferência em relação ao pai para ficar com essa função, apesar da prática mostrar que muitos julgadores ainda são conservadores e sequer olham a dinâmica específica de cada família. Compartilhar responsabilidades é diferente de dividir a moradia dos filhos.
Quem tem mais direito de ficar com o filho?Desde 2014, a guarda compartilhada é a regra para os processos de guarda no Brasil. Assim, não havendo elementos que desabonem nenhum dos pais, no divórcio quem fica com os filhos são o pai e a mãe. A guarda compartilhada pode ser tanto uma escolha do casal, como também uma determinação ou imposição judicial.
Quando o filho pode escolher com quem ficar?"A partir dos 12 anos, a criança tem o direito de escolher com qual dos pais quer ficar. Mas, também a partir dos 8 anos, a criança já é ouvida e a opinião dela é levada em consideração no momento da concessão da guarda", comenta a advogada Márcia Isabel, da equipe Mdurães Advogados & Consultores Associados.
Quais são os direitos do pai e da mãe?A Lei 13.257/2016 estabelece que a "mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas".
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