Por quê precisamos da abelhas

Néctar e pólen, presentes nas plantas com flores e frutos, são ingredientes essenciais do café da manhã das abelhas. Porém, numa realidade em que não existem esses alimentos para elas, esses animais deixariam de existir. Por consequência, isso afetaria o nosso típico café da manhã, que conta com pãozinho, manteiga, café, leite, suco e frutas, restando apenas um terço dele.

Isso aconteceria porque, visitando flor a flor para se alimentarem do néctar (fonte de carboidratos e sais minerais) e do pólen (fonte de proteínas, vitaminas, sais minerais e lipídeos), as abelhas acabam prestando um serviço de polinização, que permite a reprodução de diversas espécies de plantas que estão ligadas ao que consumimos diariamente. Na polinização, esses insetos levam parte do pólen de uma flor – que contém células reprodutivas masculinas – ao encontro do ovário da mesma flor ou de outra flor da mesma espécie (polinização cruzada). Esse encontro garante o sucesso reprodutivo das plantas. O pólen que sobra é transportado para dentro da colmeia para ser armazenado em potes, que servirão de alimento tanto na fase larval quanto na fase adulta.

Por quê precisamos da abelhas

Perda de biodiversidade coloca em risco o bem-estar e a saúde das abelhas. Na imagem, ninho de abelha Jatai (Tetragonisca angustula) (Foto: Thiago Zina Crepaldi)

Infelizmente, o que se tem acompanhado nas últimas décadas é o declínio de populações de abelhas. Episódios nos Estados Unidos, Europa e, recentemente, no Brasil têm preocupado pesquisadores, apicultores (criadores de abelhas com ferrão) e meliponicultores (criadores de abelhas sem ferrão). Segundo a professora da Pós-graduação em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Fernanda Helena Nogueira-Ferreira, o sumiço das abelhas provavelmente está relacionado a múltiplos fatores.

“O processo de desmatamento de áreas naturais e as queimadas, que resultam em menos flores. E, sem flores, as abelhas ficam sem o que comer. Além disso, as monoculturas e o uso desenfreado de agrotóxicos afetam diretamente as abelhas”, explica a pesquisadora, que há quase 30 anos dedica-se ao estudo das abelhas.

Nogueira-Ferreira comenta ainda que as abelhas em geral, principalmente as abelhas sem ferrão (espécies nativas do Brasil), são muito sensíveis a essas mudanças ambientais causadas pelo ser humano. “Esses desequilíbrios no ambiente deixam as abelhas debilitadas e fracas. A desnutrição afeta a imunidade, por consequência elas ficam mais suscetíveis aos predadores e às doenças causadas por vírus e fungos. Por fim, não resistem, morrem”, lamenta.

Abelha Canudo (Scaptotrigona depilis) em processo de enxameação (divisão do ninho). Essa espécie é boa para se dividir e ocupar colmeias vazias. (Imagem: Thiago Zina Crepaldi)

A morte das abelhas tem consequências para nós. Uma frase atribuída ao cientista Albert Einstein previa que: “se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, não há reprodução da flora, sem flora não há animais, sem animais, não haverá raça humana”. E Einstein pode ter tido razão. Segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), das 141 espécies de plantas que utilizamos na nossa alimentação, cerca de 60% (85 espécies) dependem, em certa medida, das abelhas para serem produzidas. No mundo, esse valor chega a 75%, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

Assim, o alerta para o desaparecimento das abelhas não se restringe geograficamente e se justifica pelo fato de elas serem as principais responsáveis pela polinização da maioria dos ecossistemas do planeta. Umestudo de mestrado da UFU realizado por Bárbara Matos Guimarães e orientado por Fernanda Helena Nogueira-Ferreira, no Programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação de Recursos Naturais (PPGECRN) da UFU, em 2018, comparou a eficiência das abelhas mandaçaia (Melipona quadrifasciata) como polinizadoras na agricultura convencional de tomate, na qual se utilizava agrotóxicos no manejo, e no sistema agroflorestal (é um sistema de plantio de alimentos que é sustentável em meio a floresta) de berinjela. 

Por quê precisamos da abelhas

Pesquisadores ficaram de campana para estimar a diversidade e comportamento de abelhas visitantes das flores no cultivo de tomate na zona rural de Araguari-MG. (Foto: Arquivo pessoal)

Guimarães destaca as descobertas desta pesquisa. “Observamos que, ao introduzirmos as abelhas nas plantações, elas aumentaram o número de sementes dos tomates devido à polinização. Mas, por conta do uso excessivo de agrotóxico no cultivo, os ninhos foram afetados e começaram a definhar”. A pesquisadora acrescenta: “imediatamente retiramos as colônias da área e as levamos para análises laboratorial”.

Por quê precisamos da abelhas

A utilização de agrotóxicos é um dos fatores responsáveis pela morte das abelhas e a destruição das colmeias. (Foto: Thiago Zina Crepaldi)

Em laboratório, a pesquisadora analisou a massa de pólen, que estava dentro das colmeias afetadas pelos agrotóxicos, e detectou a presença de metais pesados. “Essa contaminação deixou as abelhas operárias desnorteadas e aumentou a mortalidade delas. Em consequência disso, as colônias foram enfraquecendo e diminuindo a postura [de ovos pela abelha rainha], até morrer a colônia inteira”, relata.

Ciência cidadã 

Por quê precisamos da abelhas

Pesquisadoras do Laboratório de Ecologia e Comportamento de Abelhas (LECA-UFU) apostam na educação como o caminho para a preservação das abelhas. (Foto: arquivo pessoal)

“Podemos mudar esse quadro por meio da educação. Cativando as pessoas para conhecer as abelhas, porque assim elas vão poder cuidar e exigir políticas públicas de conservação”, diz, confiante, Bárbara Matos Guimarães, hoje doutoranda do PPGECRN. É com esse objetivo que a pesquisadora busca despertar, em crianças e adolescentes de escolas públicas de Uberlândia, que é importante preservar e conservar as abelhas. 

Para isso, ela tem trabalhado na perspectiva da Ciência cidadã, que conta com a participação da comunidade no estudo das abelhas nos jardins das escolas, permitindo a proximidade com os insetos e, consequentemente, a sensibilização para as questões da conservação e da preservação. “É evidente a importância das abelhas para nossa vida, mas mudar a mentalidade e a atitude das pessoas em relação às abelhas é o princípio. E, a partir disso, é que nós vamos ampliando para o poder público”, completa.

Abelhas popularmente chamadas de Uruçu (Melipona rufiventris).  Ao abrir a colmeia, os potes de mel se abrem e elas bebem. (Imagem: Thiago Zina Crepaldi)

*Thiago "Zina" Crepaldi é estudante do curso de Graduação em Jornalismo da UFU

O que acontece se as abelhas deixarem de existir?

Por serem organismos sensíveis, elas sofrem com agricultura intensiva, defensivos agrícolas, poluição, introdução de espécies invasoras e alterações climáticas. Uma hipotética extinção das abelhas poderia levar o mundo a um colapso dos ecossistemas, com a agricultura e a cadeia alimentar inviabilizadas.

Por que é importante preservar as abelhas?

Se não houver abelhas, não se dá 80% da polinização, não haverá alimentos para grande parte dos pássaros, insetos e outros animais, toda a cadeia alimentar sofre, os animais morrem. O ecossistema fica destruído. Além disso, as abelhas contribuem em muito para a biodiversidade no planeta.