Como fazer um teste de gravidez caseiro

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História dos testes caseiros de gravidez

O relato mais antigo que nós conhecemos de um teste de gravidez caseiro vem do antigo Egito, no ano de 1350 a.C. Um teste descrito num papiro dizia que a mulher que suspeitava estar grávida deveria urinar em cima de sementes de trigo e cevada. Se o trigo florescesse, a mulher estava grávida de uma menina. Já se fosse a cevada a florescer, a gravidez era de um menino. Se nenhum dos dois crescesse, isso era um sinal de que a mulher não estava grávida.

Na década de 1960, uma época em que não existia a fartura de testes de gravidez cientificamente comprovados que temos hoje, um grupo de cientistas resolveu pôr à prova o teste descrito no antigo papiro. Por incrível que pareça, o estudo mostrou que o teste acertava a existência da gravidez em cerca de 70% dos casos, um percentual longe de ser brilhante, mas que com certeza mostrava algum êxito, que não poderia ser explicado apenas pelo acaso. Na época, a grande concentração de estrogênio na urina das grávidas acabou sendo a explicação para esse fato.

Esse relato é interessante, pois demonstra que os povos antigos já reconheciam (ou pelo menos imaginavam) o papel da urina no diagnóstico da gravidez. Também chama a atenção o fato de que mais de 3000 anos depois, ainda muita gente utiliza métodos caseiros, não baseados no método científico, para tentar diagnosticar uma gravidez.

Portanto, se um teste caseiro idealizado por povos tão antigos e com conhecimento científico tão primitivo pode apresentar algum grau de eficácia, qual será a real utilidade dos testes de gravidez caseiros tão propagados pela Internet?

Neste artigo vamos fazer uma crítica aos mais conhecidos testes de gravidez caseiros, incluindo o teste da água sanitária, da fervura, do cloro, do vinagre e da pasta de dente.

Testes de gravidez cientificamente comprovados

Se você é uma pessoa que procura informações apenas sobre testes de gravidez cuja confiabilidade é cientificamente comprovada, então nenhum dos testes caseiro que será descrito neste artigo serve pra você. Nenhum deles, absolutamente nenhum, é baseado em premissas científicas.

Antes de seguirmos com as explicações sobre os testes caseiros, vamos só relembrar quais são os testes de gravidez devidamente estudados e comprovados pela ciência.

O teste de gravidez mais confiável que existe é a dosagem do hormônio hCG no sangue. A taxa de acerto é próxima de 100% quando a mulher já está com pelo menos 1 dia de atraso menstrual. A sua grande desvantagem é o fato de ser um exame laboratorial que precisa de uma amostra de sangue.

Os testes de farmácia são mais simples que os teste de sangue, pois podem ser feitos em casa e precisam apenas de uma amostra de urina. A capacidade de identificar a presença do hCG é um pouco mais baixa que a dos exames de sangue, porém, ainda é bastante elevada. A taxa de acerto é altíssima se o teste for feito com pelo menos 5 dias de atraso menstrual. Atualmente, um teste de gravidez de farmácia custa algo em torno de 5 a 20 reais, dependendo da marca.

Teste de gravidez da água sanitária (lixívia)

Como é feito o teste de gravidez da água sanitária:

O teste da água sanitária é simples, basta você misturar em um recipiente a urina da mulher com um pouco de água sanitária. Se a solução borbulhar ou mudar de cor, o teste é positivo e indica que você está grávida.

O teste supostamente se baseia na detecção indireta do hormônio hCG, que reagiria com a água sanitária provocando as alterações descritas acima.

Críticas ao teste de gravidez da água sanitária:

Quando fazemos uma rápida procura pelo Google à procura de informações sobre o teste caseiro da água sanitária, nos deparamos com um grave problema, que também está presente em quase todos os testes caseiros que iremos descrever: a completa falta de padronização e metodologia.

Repare que não há um recipiente adequado, dependendo da fonte, pode ser um copo de plástico, vidro, acrílico, cerâmica, etc. Também não há concordância entre as quantidades de urina e de água sanitária. A concentração mais adequada da água sanitária não é descrita e ninguém diz também a partir de que momento (quantos dias de menstruação atrasada, por exemplo) o teste deve ser feito.

Essa falta de metodologia por si só seria suficiente para tornar o teste pouco confiável. Quem já teve algum contato com trabalho laboratorial sabe que uma pequena alteração na concentração de um reagente pode ser suficiente para alterar completamente um resultado.

Mas há um problema ainda mais grave com esse teste. A urina é rica em ureia e possui quantidades variáveis de amônia. A reação destas substâncias ao contato com o hipoclorito de sódio (água sanitária) é muito conhecida. As borbulhas são geradas pela produção de cloramina e gás clorino. Além da reação nada ter a ver com o hormônio hCG da gravidez, ambas substâncias são bastante tóxicas se inaladas. Em alguns casos, a quantidade de gás tóxico produzida por ser relevante, provocando uma grande reação e um odor extremamente desagradável.

A exposição a gases de cloramina pode causar os seguintes sinais e sintomas:

  • Tosse.
  • Náusea.
  • Falta de ar.
  • Irritação na garganta, nariz e olhos.
  • Broncoespasmo.

Em casos mais severos, com exposição repetida, até pneumonite (inflamação dos pulmões) pode ocorrer.

O teste parece dar positivo para algumas pessoas e negativo para outras, estando elas grávidas ou não, exatamente pela ausência de padronização. Quantidades e concentrações diferentes de água sanitária, aliadas a quantidades e concentrações diferentes de urina podem gerar reações mais ou menos intensas. O teste pode ser positivo tanto em homens como em mulheres.

Veredito:

O teste de gravidez da água sanitária não só não funciona, como ainda pode gerar gases e vapores tóxicos.

Teste de gravidez do cloro

Como é feito o teste de gravidez do cloro:

O teste do cloro consiste em misturar dentro de um recipiente a urina da mulher com cloro. Se a solução borbulhar ou mudar de cor, o teste é positivo e indica que você está grávida.

Críticas ao teste de gravidez do cloro:

Na verdade, o teste do cloro é apenas uma variação do teste da água sanitária, uma vez que ambas substâncias contém o elemento químico cloro como principal componente. Assim como ocorre com a água sanitária, as substâncias naturais da urina reagem com o cloro e produzem gases tóxicos, como a tricloramina e o cloreto de cianogênio. A mudança de cor e a produção de espuma são resultados dessa reação. Não tem nada a ver com a presença do hormônio hCG na urina.

Só como curiosidade, você sabe por que em algumas piscinas sentimos um forte cheiro de cloro e nossos olhos ardem e ficam vermelhos? Não é porque essas piscinas tem cloro em excesso, mas sim porque elas estão contaminadas com grande quantidade de urina e suor. O odor forte de cloro e os olhos irritados ocorrem pelas substâncias tóxicas produzidas pela mistura de urina e do suor com o cloro da piscina.

Veredito:

O teste de gravidez do cloro não só não funciona, como ainda pode gerar gases e vapores tóxicos.

Teste de gravidez da pasta de dente

Como é feito o teste de gravidez do creme dental:

Em um copo transparente, você deve misturar urina com uma pequena quantidade de pasta de dente branca (não serve colorida). Se após 2 minutos a pasta branca torna-se azulada ou começar a espumar, o teste é positivo.

Críticas ao teste de gravidez da pasta de dente:

O teste da pasta de dente parece ser um pouquinho mais padronizado que o da água sanitária, ainda assim discrepâncias entre a quantidade de creme dental e urina são facilmente encontradas.

O teste não funciona. A mudança de cor não ocorre na maioria dos casos, mesmo quando a mulher está grávida. Já a formação de espuma é comum e ocorre até com a urina de homens. A espuma é uma reação da acidez da urina com a pasta de dente alcalina. Alguns cremes dentais também possuem lauril éter sulfato, substância que facilita a formação de espuma. Quanto mais alcalina for a pasta e mais ácida for a urina, maior é a chance de reações.

Veredito:

O teste de gravidez da pasta de dente não funciona. Resultados positivos e negativos ocorrem aleatoriamente, de acordo com a composição da pasta e a acidez da urina.

Teste de gravidez da fervura da urina

Como é feito o teste da fervura da urina:

O teste da fervura consiste em utilizar um recipiente de alumínio para ferver a urina.  Se a urina ferver como leite, criando um sobrenadante, o teste é positivo. Se ferver como água, o teste é negativo.

Críticas ao teste da fervura da urina:

A urina é um líquido rico em diversas substâncias, ao contrário da água, que é basicamente água e quantidades mínimas de alguns sais minerais. As substâncias presentes na urina têm pontos de ebulição distintos, diferentemente da água pura, que ferve de forma homogênea. É esperado que as características da fervura sejam mesmo diferentes. A sua urina só irá ferver de forma parecida com a água se ela estiver muito diluída. Para isso, você precisa beber muita água ao longo do dia.

Portanto, o teste da fervura vai dar positivo para a maioria das pessoas, mesmo mulheres não grávidas e homens.

Veredito:

O teste de gravidez da fervura não funciona e dá positivo na maioria dos casos.

Teste de gravidez do vinagre

Como é feito o teste do vinagre:

O teste do vinagre é feito misturando urina e vinagre em um recipiente transparente. Se a solução mudar de cor ou espumar, o teste é positivo. Se não mudar de cor, é negativo.

Críticas ao teste do vinagre:

O vinagre é composto por ácido acético, que é um ácido fraco. A urina também é uma substância levemente ácida. Em geral, a mistura das duas substâncias não provoca reação nenhuma, exceto pela mudança de cor, que se dá mais porque o vinagre tem coloração ou tonalidade diferente da urina. Aliás, esse é um dos problemas do teste, não há uma padronização do tipo de vinagre a ser utilizado.

Em algumas situações clínicas, a urina pode ser tornar alcalina, o que favoreceria a ocorrência de reações com o ácido acético. Mas isso nada tem a ver com a presença ou não do hormônio hCG na urina.

Veredito:

O teste de gravidez do vinagre não funciona.

Conclusão sobre os testes de gravidez caseiros

Nós escolhemos 5 testes como exemplo, mas na Internet existem dezenas deles. Há ainda o teste da agulha, teste da Coca Cola, teste do Pinho Sol, teste da pimenta, etc. Não é preciso falar de um por um, pois todos são falaciosos e não seguem o método científico.

A verdade é que a urina da grávida nos primeiros dias de gravidez é basicamente igual à urina da mulher não grávida. A diferença está na presença do hormônio hCG, que encontra-se em concentrações baixíssimas nos primeiros dias. Mesmo que esses testes tivessem alguma base científica por trás, dificilmente eles seriam capazes de detectar quantidades tão pequenas do hormônio hCG.

O teste de sangue, que é o teste de gravidez mais sensível de todos, utiliza técnicas laboratoriais moderníssimas, desenvolvidas ao longo de décadas. Por isso, ele é capaz de identificar concentrações mínimas de hCG circulando no sangue materno.

Se você suspeita que possa estar grávida, mas não quer ir a um laboratório colher sangue, compre um teste de gravidez de farmácia. Eles são baratos, confiáveis e fornecem o resultado em poucos minutos. Não adianta ficar sujando panela ou copos com urina, nem gastando os produtos químicos que você tem casa. Nenhum deles funciona e, como vimos, podem até fazer mal, por liberarem vapores tóxicos.


Referências

  • Home pregnancy tests: Can you trust the results? – Mayo Clinic.
  • Bleach Pregnancy Test: What to Know – WebMD.
  • Working with Household (Chlorine) Bleach – Canadian Centre for Occupational Health & Safety.
  • Dangers of Mixing Bleach with Cleaners – Washington State Department of Health.
  • On an ancient egyptian method of diagnosing pregnancy and determining foetal sex – British Society for the History of Medicine.
  • Pee is for Pregnant: The history and science of urine-based pregnancy tests – Harvard Graduate School of the Arts and Sciences.

Como fazer um teste de gravidez caseiro

Médico graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com títulos de especialista em Medicina Interna e Nefrologia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), Universidade do Porto e pelo Colégio de Especialidade de Nefrologia de Portugal.