Por que os britânicos aboliram a escravidão e proibiram o tráfico negreiro

2 de mar de 2020 às 12:30

Em 2 de março de 1807, a Câmara dos Comuns do Reino Unido aprova a abolição do comércio e do tráfico de escravos entre as colônias britânicas na África e nas Américas. A medida já havia sido aplicada pela Dinamarca desde três anos antes. Agora, a Inglaterra exortaria as demais nações a renunciar ao tráfico - inclusive por meio da força. Não hesitaria em visitar e fiscalizar os navios suspeitos de transportar escravos, tornando-se assim verdadeiras patrulhas dos mares.

Muitos defensores do abolicionismo saudaram a conquista; outros questionaram a decisão por não prever a indenização aos proprietários de escravos, inclusive a Igreja Anglicana. Para a maioria, abolir a escravidão era algo aceito como um ato humanitário. Para outros, os fatores econômicos eram a principal razão, afirmando que a situação dos proprietários de escravos no Caribe a partir de 1790 era decrescente.

O Reino Unido não era o único país a estar envolvido com o tráfico, nem o único a se beneficiar financeiramente. Muitos países europeus mantinham-se ativos no comércio e tráfico de escravos negros, inclusive a França, Espanha e Portugal e suas respectivas colônias. Mas o Reino Unido era o líder na atividade mercantil. Governantes e mercadores africanos ajudavam no suprimento de escravos.

Os membros da Sociedade pela Abolição do Comércio de Escravos, em Londres, haviam decidido concentrar-se na campanha para persuadir o parlamento a proibir o comércio de escravos por razões táticas. Achavam que, assim, seriam mais bem-sucedidos do que exigir a abolição da escravatura em todo o Império Britânico. Acreditavam ainda que, com o fim do tráfico, a própria escravidão iria definhar.

Nos primeiros anos da campanha, os abolicionistas tiveram grande sucesso em obter apoio da opinião pública. A Sociedade coletava provas, dava conferências, entrava com petições no parlamento e distribuía milhares de panfletos. No entanto, o primeiro projeto de lei para abolir o comércio de escravos, votado em 1791, foi rejeitado por 163 votos a 38.

As chances da abolição tornaram-se mais favoráveis quando William Grenville - extremamente simpático à causa - tornou-se primeiro-ministro. No cargo, apresentou o projeto de abolição do comércio de escravos em 2 de janeiro de 1807, na Câmara dos Lordes. A casa votou a favor da abolição em 5 de fevereiro, por 100 votos a 34, apesar do forte lobby da Companhia das Índias Ocidentais. Finalmente, no dia 2 de março, a Câmara dos Comuns aprovou o projeto de lei por 283 votos a 16. Em 25 de março daquele ano, a lei foi sancionada pela Coroa, extinguindo esse comércio em todas as colônias do Reino Unido e tornando ilegal o transporte de escravos em navios britânicos.

Embora a lei que proibia o comércio transatlântico de escravos tivesse sido aprovada, somente em 1838 os escravos se tornaram totalmente libertos no Reino Unido. No continente americano, a escravidão prosseguiu até a segunda metade do século XIX. Os Estados Unidos aboliram-na em 1866 e o Brasil, só em 1888.

Por que os britânicos aboliram a escravidão e proibiram o tráfico negreiro
Ver artigo principal: Tráfico negreiro e Abolicionismo

O Ato contra o Comércio de Escravos de 1807 (citação 47 Geo III Sess. 1 c. 36) foi um ato do parlamento do Reino Unido aprovado em 25 de março de 1807, com o longo título de "Um Ato para a Abolição do Comércio de Escravos". O ato original está nos Arquivos do Parlamento. O ato aboliu o comércio de escravos no Império Britânico, mas não a escravidão propriamente dita; que teve de esperar pelo Ato de Abolição da Escravatura de 1833. O comércio britânico de escravos começou em 1562, durante o reinado de Elizabeth I, quando John Hawkins chefiou a primeira expedição escravagista.

Por que os britânicos aboliram a escravidão e proibiram o tráfico negreiro

Uma réplica do navio negreiro Zong, ancorado próximo à Tower Bridge em abril de 2007, nas comemorações dos 200 anos do Ato contra o Comércio de Escravos de 1807.

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O HMS Northumberland ao lado do HMS Belfast durante as mesmas comemorações, representando as modernas operações anti-escravatura.

O Comitê para a abolição do comércio de escravos, que conduziu a campanha que resultou no ato, era um grupo de protestantes evangélicos aliado aos quakers e unidos em sua oposição à escravatura e ao tráfico de escravos. Os quakers viam há muito tempo a escravidão como imoral, uma chaga para a humanidade. Em 1807, os grupos abolicionistas tiveram uma representação bastante significativa no Parlamento do Reino Unido. Eles contavam com cerca de 35-40 assentos.

Conhecida como os "santos", esta aliança era chefiada por William Wilberforce, o mais importante dos militantes anti-escravagistas.[1] Estes parlamentares tinham assessoria jurídica de James Stephen, cunhado de Wilberforce, e eram extremamente dedicados. Eles muitas vezes viam a sua batalha pessoal contra a escravatura como uma cruzada divinamente ordenada. Além disso, muitos que eram anteriormente neutros sobre o tema escravidão foram trazidos para o lado da causa abolicionista pelas preocupações com a segurança após a bem sucedida rebelião dos escravos que resultou na Independência do Haiti em 1804.

O número de simpatizantes da causa abolicionistas aumentou com a precária situação do governo sob a direção de Lorde Grenville (seu curto período como primeiro-ministro ficou conhecido como o Ministério de Todos os Talentos). Grenville pessoalmente comandou a luta pela aprovação do projeto de lei, na Câmara dos Lordes, enquanto que na Câmara dos Comuns o projeto foi liderado pelo Secretário do Exterior, Charles James Fox, que morreu antes que ele fosse finalmente transformado em lei. Não muito tempo após o ato ter sido aprovada, o governo do Grenville perdeu força para o Duque de Portland. Apesar desta mudança, os governos britânicos posteriores continuaram a apoiar a política de acabar com o tráfico de escravos.

Após os britânicos acabarem com seu próprio comércio de escravos, eles pressionaram outras nações para fazerem o mesmo. Isso refletiu um sentimento moral de que o comércio deveria ser extinto em todos os lugares e um receio de que as colônias britânicas deixassem de ser competitivas. Uma campanha britânica contra o tráfico de escravos por outras nações foi um esforço sem precedentes de política externa. Os Estados Unidos da América aboliram o seu comércio de escravos africanos no mesmo período, porém eles não tentaram abolir a escravidão na América.

Tanto as leis americanas quanto as britânicas foram promulgadas em março de 1807, a lei britânica entrou em vigor em 1 de maio de 1807, e a americana em 1 de janeiro de 1808. As pequenas nações comerciais que não tinham grandes negócios a perder, como a Suécia, rapidamente seguiram o exemplo, como também fizeram os Países Baixos. A Marinha Real Britânica declarou que os navios que transportassem escravos seriam considerados como piratas, e, portanto, sujeitos a serem destruídos e seus homens capturados estando potencialmente sujeitos à execução. A aplicação da lei nos Estados Unidos foi menos eficaz, e seu governo recusou-se a executar uma ação conjunta, em parte devido à preocupação com o recrutamento compulsório dos britânicos.

Entre 1808 e 1860, o Esquadrão da África Ocidental apreendeu cerca de 1 600 navios de escravos e libertou 150 000 africanos que estavam a bordo.[2] A ação foi também tomada contra líderes africanos que se recusaram a concordar com os tratados britânicos para tornar o comércio ilegal, por exemplo, contra "o usurpador rei de Lagos", deposto em 1851. Os tratados anti-escravidão foram assinados com mais de 50 governantes africanos.[3]

Na década de 1860, os relatos de David Livingstone sobre as atrocidades cometidas pelo comércio árabe de escravos na África despertaram o interesse do público britânico, reavivando o movimento abolicionista. A Marinha Real Britânica ao longo da década de 1870 tentou suprimir "este abominável comércio oriental", em Zanzibar, particularmente. Em 1890 a Grã-Bretanha obteve o controle da importante ilha estratégica de Heligolândia, no Mar do Norte para a Alemanha em troca do controle de Zanzibar para auxiliar nos esforços de proibir o comércio escravagista.[4][5]

  1. William Wilberforce (1759-1833)
  2. Sailing against slavery. By Jo Loosemore BBC
  3. The West African Squadron and slave trade
  4. Welcome to Encyclopædia Britannica's Guide to Black History
  5. The Blood of a Nation of Slaves in Stone Town

  • «Texto do Ato» (em inglês) 
  • «Parliamentary Archives Image of the 1807 Act» (em inglês) 
  • «The Parliamentary Archives Holds the Original of this Historic Record» (em inglês) 
  • «Anti-Slave Trade Petition of 1806 Supporting the Act of Abolition» (em inglês) 
  • «Teaching Resources about Slavery and Abolition» (em inglês) 
  • «Road to Freedom documentary - Eastside Community Heritage» (em inglês) 
  •   Portal da escravidão

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