O que é uma pessoa não binaria

Não binário é um termo “guarda-chuva” para definir um indivíduo que não se reconhece nem como homem, nem como mulher. A identidade de gênero não binária pode incluir diversas outras identidades, como gênero fluido (que “flui” entre dois ou mais gêneros), agênero (sem gênero), nonpuer ou nonpuella, queer, andrógine – e a lista continua.

Em outras palavras, indivíduos não binários são aqueles que não se encaixam em nenhum dos dois gêneros socialmente aceitos. Pessoas que se reconhecem no gênero feminino ou masculino, portanto, seriam binárias, em oposição às pessoas não binárias. Pode parecer confuso no começo, mas basta pensar que os não binários se veem à margem da dualidade homem versus mulher, que constitui a norma de gênero na nossa sociedade.

Em 2016, a Comissão dos Direitos Humanos da cidade de Nova York passou a reconhecer 31 diferentes nomenclaturas que poderiam ser usadas em âmbito profissional e oficial, em uma medida histórica de reconhecimento à diversidade de gênero. No entanto, pessoas não binárias defendem que cada identidade diz respeito ao indivíduo, que é o único com autonomia para designar o próprio gênero.

O movimento Orientando.org, por exemplo, disponibiliza uma lista com mais de 300 identidades não binárias possíveis, oferecendo uma orientação às pessoas que ainda não estão tão familiarizadas com os termos. Mas a regra é clara: não há regra. É você quem sabe qual é seu próprio gênero – e é você quem escolhe seus pronomes.

A língua portuguesa não possui gênero neutro – ou seja, os gêneros masculino e feminino são marcados na nossa linguagem cotidiana, inclusive na nomeação de substantivos como “a cadeira” (substantivo feminino) ou “o armário” (substantivo masculino).

Uma vez que o idioma pátrio é, por natureza, binário, as pessoas não binárias encontram dificuldade para se autonomear adequadamente – daí a importância de adaptar a linguagem para essa realidade.

As primeiras tentativas de inserir a neutralidade no discurso cotidiano em língua portuguesa foram marcadas pela inclusão do símbolo @ e, posteriormente, da letra x para substituir a marcação de gênero feminino ou masculino, representada, respectivamente, pelas letras a e o. Essas primeiras alternativas esbarraram em duas questões: acessibilidade e dificuldade de transmitir a neutralidade na linguagem oral.

Isso porque softwares de leitura desenvolvidos para pessoas com deficiência visual não conseguem reconhecer palavras como “todxs” ou “tod@s”, emitindo sons confusos ao tentarem decifrar as marcações de neutralidade. Pessoas com dislexia e surdez também manifestaram dificuldade para compreender textos que se utilizavam desse tipo de recurso para manter a neutralidade de gênero.

Além disso, havia ainda a impossibilidade de pronunciar palavras como “todxs” ou “tod@s” numa palestra, aula ou conversa informal. Para resolver o problema, as desinências indicadoras de gênero (a e o) seriam substituídas por e. Assim, as palavras “todas” e “todos”, por exemplo, tornam-se “todes” na linguagem neutra.

Os pronomes

Além das desinências indicadoras de gênero, a linguagem neutra também pressupõe adaptações nos pronomes relativos às pessoas. Para se referir a um indivíduo que se reconhece exclusivamente como mulher, podemos dizer: “Ela é bonita”.

No caso de uma pessoa não binária, diremos: “Elu é bonite”. A escolha do u marca a neutralidade nos casos em que a letra e já é utilizada para marcar o gênero nos pronomes (como no pronome masculino “ele”). Para pronomes possessivos, a regra é a mesma: “A bolsa é dela” se tornaria “A bolsa é delu”, em linguagem não binária.

Não binários são transgêneros?

Uma pessoa transgênero é aquela que não é cisgênero, ou seja, que não se identifica com o gênero que lhe foi imposto no nascimento. Simplificando: existem dois tipos de transgênero – os binários (como as mulheres trans, que foram designadas homens no nascimento, mas não se identificam como tal) e os não binários (como os genderfluid, que podem ter sido designados como menina ou menino nascimento, mas não se identificam nem com um gênero, nem com o outro).

O ideal é sempre perguntar por quais nomes e pronomes a pessoa gostaria de ser chamada. No entanto, basicamente, você pode utilizar os pronomes “ele” e “dele” para indivíduos que se identificam como homens trans, e “elu” e “delu” para aqueles que se identificam como não binários.

A identidade de gênero diz respeito à maneira como uma pessoa se reconhece e se identifica: como mulher, homem ou não binária. Pessoas cisgêneras são aquelas cuja identidade de gênero corresponde ao sexo que lhes foi atribuído no nascimento.

Por outro lado, transgênero é um termo genérico usado para descrever “toda a gama de pessoas cuja identidade de gênero não está em conformidade com o que é tipicamente associado ao sexo atribuído no nascimento”.

A identidade de gênero é diferente da expressão de gênero. Enquanto a identidade de gênero é um senso interno de si, associado à subjetividade da pessoa, a expressão de gênero é como uma pessoa expressa externamente sua identidade de gênero. É importante notar que a expressão de gênero diz respeito à aparência, podendo ou não corresponder à identidade de gênero de uma pessoa.

O gênero também é diferente do sexo e da orientação sexual. Embora sexo se refira à biologia de uma pessoa – cromossômica, hormonal e anatômica –, gênero é um termo construído socialmente, culturalmente e ambientalmente.

Orientação sexual

A orientação sexual se refere ao interesse sexual e/ou romântico de uma pessoa por outras. É importante ressaltar que esse interesse (afetivo ou sexual) independe de gênero. Os conceitos são, portanto, autônomos – e vale o bom senso na hora de classificar as pessoas.

Uma mulher trans (ou seja, designada homem ao nascer) pode ser lésbica (caso se interesse por uma mulher cis e/ou trans). Da mesma forma, um homem trans pode ser heterossexual (se tiver interesse por mulheres cis e/ou trans) ou homossexual (caso seu afeto e/ou sexualidade estejam voltados para pessoas do gênero masculino).

Assim como existem diversos gêneros, também existem diversas orientações sexuais, que podem variar dependendo de cada indivíduo. Em ambos os casos, o respeito sana todas as dúvidas: perguntar como a pessoa deseja ser tratada e respeitar sua autodesignação é essencial. Saiba mais na matéria:

Vídeo do Canal das Bee

O que é uma pessoa não binaria
O que significa ser uma pessoa não-binária (Foto: Tim Samuel/Pexels)

Você provavelmente já se deparou com a expressão “gênero não binário” na internet. O termo, apesar de não ser novo, ganhou maior destaque recentemente em função das declarações de celebridades que não se identificam simplesmente como homens ou mulheres.

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Esse é o caso da atriz brasileira Bárbara Paz que, em uma entrevista para o podcast Almasculina, se descreveu como uma pessoa inquieta. “Uma mulher, um homem, não binária. Descobri que sou não binária há pouco tempo”, disse no episódio que foi ao ar em 1º de maio.

E, no dia 19 do mesmo mês, a cantora norte-americana Demi Lovato também compartilhou o seu processo de autoconhecimento nas redes sociais. “Eu passei por um trabalho de cura e reflexão e, com isso, tive a revelação de que me identifico como pessoa não binária”, falou em vídeo publicado no Twitter. “Acredito que isso representa melhor a fluidez que sinto na minha expressão de gênero”, complementou.

Bom, mas o que exatamente significa ser uma pessoa não binária? Para começo de conversa, é interessante resgatar dois conceitos: cisgênero e transgênero. O indivíduo cisgênero é aquele que se identifica com o gênero que lhe foi designado de acordo com o órgão genital.

Os transgêneros, por sua vez, são aqueles que não se identificam com o gênero imposto no nascimento com base no sexo biológico — e é aqui que se encontram os não binários, além de mulheres trans e homens trans.

“Pessoas não binárias sentem que sua identidade de gênero não pode ser definida dentro das margens da binariedade”, explica a organização LGBT Foundation. “Em vez disso, elas entendem o gênero de forma que ultrapassa a mera identificação como homem ou mulher.”

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Assim, os não binários podem se reconhecer nos gêneros femino e masculino ao mesmo tempo, mas também não se identificar com nenhum desses dois rótulos, ou então se sentir às vezes como homens e outras vezes como mulheres.

Qual pronome usar?

O que é uma pessoa não binaria
Acima, uma placa escrito "Olá, meus pronomes são" com espaços em branco para serem preenchidos conforme a preferência de cada indivíduo (Foto: Sharon McCutcheon/Unsplash)

No dia a dia, a linguagem é um mecanismo importante de afirmação de identidade, autoconfiança e autenticidade, pontua a LGBT Foundation. E, assim como os seres humanos, esse é um recurso bastante diverso, então vale se atentar para a maneira correta de se referir às pessoas.

É dentro desse contexto que, visando a inclusão, a linguagem neutra ganha força. Enquanto alguns indivíduos não binários optam por um pronome de tratamento específico ("ele" ou "ela"), outros preferem os neutros, como “ile” ou “elu”, que substitui os marcadores de gênero (“a” e “o”) por “u”. 

No caso de outras palavras, “a” e “o” podem ser trocados por “e”, como em “senhore”, “filhe”, “amigue” e “todes”. E, ao utilizar o masculino para falar de forma genérica, como em "professores", é possível optar por termos mais amplos, como "corpo docente".

Diante de tanta diversidade, não há regras universais. O princípio, porém, é básico: respeito. Se você não souber como se referir a alguém, basta perguntar.

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Também é fundamental respeitar o nome com o qual a pessoa se apresenta e não questionar qual seria o nome antigo. “Esse é um dos principais pontos para ser respeitoso com uma pessoa não binária, porque o nome que você utiliza pode não refletir a identidade de gênero dela”, explica a fundação norte-americana National Center for Transgender Equality.

Apesar de não ser nova, a não binariedade ainda é desconhecida por muitos e frequentemente é alvo de discriminações e atitudes desrespeitosas. Por isso, é importante ter em mente que a forma como você deseja ser tratado não necessariamente é a maneira mais adequada de tratar outras pessoas e que a identidade de gênero é uma experiência interna e individual.