De acordo com o que foi apresentado na reportagem o que é direito a cidade

Com o crescimento das cidades brasileiras, principalmente a partir da década de 1970, uma das principais dificuldades dos habitantes dos centros urbanos é a mobilidade urbana. A ênfase na utilização do automóvel como principal meio de locomoção, a precariedade, os altos preços dos transportes coletivos e a falta de investimentos satisfatórios em infraestrutura de trânsito têm colocado a questão da mobilidade urbana como caminho para a melhoria da qualidade de vida nas cidades.

O presente texto tem por objetivo levantar alguns posicionamentos sobre a mobilidade urbana, um debate contemporâneo em muitas cidades, para que os professores possam desenvolver essa temática junto a seus alunos.

Várias propostas têm surgido neste debate, que vão desde o incentivo à utilização de novos modais de transporte, como a bicicleta, até ações restritivas de utilização do automóvel, como a criação de pedágios urbanos e os rodízios de automóveis. Mas para além de uma discussão sobre os meios de transporte e as normatizações de seu uso, há no debate sobre a mobilidade urbana um pano de fundo que diz respeito ao direito à cidade, ao direito de se deslocar por ela e acessar os diversos serviços que ela oferece.

Nesse sentido, o direito à cidade está ligado à possibilidade que os diversos grupos sociais têm de se deslocarem pelos centros urbanos. Os serviços públicos essenciais, como saúde e educação, bem como o lazer e a cultura, são direitos constitucionais. O acesso aos locais de trabalho aparece como uma necessidade fundamental dos trabalhadores. Pode-se perceber, assim, que a utilização desses serviços está ligada à possibilidade que essas pessoas têm de chegar aos locais em que são oferecidos. É necessário se deslocar à escola, ao centro de saúde, ao cinema, ao teatro, ao local de trabalho etc. O debate sobre a mobilidade urbana versa, dessa forma, sobre a garantia de condições necessárias à utilização dos serviços, como também sobre os obstáculos a essa utilização.

O pagamento da tarifa do transporte público, a necessidade de possuir um automóvel e a inexistência de condições aos modais alternativos, como as ciclovias, são obstáculos à utilização dos serviços acima referidos. Os grandes congestionamentos também são situações que dificultam a garantia de acesso a esses direitos essenciais.

Há ainda outros problemas, como a localização das edificações que oferecem os serviços, geralmente se concentrando nas áreas centrais das cidades. A população das periferias é, dessa forma, mais uma vez prejudicada, já que normalmente são obrigadas a se deslocarem por grandes distâncias para terem seus direitos garantidos e poderem chegar a seus locais de trabalho.

Outro ponto que permeia o debate sobre a mobilidade urbana é o controle da emissão de poluentes por veículos automotores, demonstrando uma preocupação com o meio ambiente. O estímulo ao uso de veículos que não emitem gases, como as bicicletas, ou o incentivo ao uso do transporte coletivo – que em virtude da quantidade de pessoas que transporta, diminui a capacidade de poluição se comparado com os automóveis – são medidas apontadas como essenciais à formação de uma cidade sustentável.

Mas essas medidas esbarram muitas vezes nos interesses econômicos dos grupos sociais que controlam o desenvolvimento dos centros urbanos. As alterações urbanísticas esbarram nos planos que as grandes empreiteiras e construtoras estabelecem para seu crescimento. O aumento constante nas tarifas do transporte coletivo visa garantir o lucro das empresas de transporte. O estímulo ao uso do automóvel está em consonância com os interesses das grandes fabricantes de veículos.

As possíveis soluções para esses problemas também estão em consonância com esses interesses. Medidas de restrição do uso do automóvel constantemente são levantadas como meios para diminuir congestionamentos e o caos do trânsito, entrando na lista de ações o rodízio de veículos e a implantação de pedágios em certas áreas urbanas. A criação de ciclovias e a criação de corredores exclusivos de ônibus são intervenções urbanas apontadas como solução a esses problemas. A indústria do automóvel busca ainda desenvolver veículos menores que ocupem espaços reduzidos nas ruas das cidades.

Há ainda grupos que defendem uma tarifação do transporte coletivo que não seja paga diretamente pelo usuário ao utilizar o serviço, criando novas formas de financiamento deste modal de transporte. Essa medida possibilitaria um acesso universal ao sistema de transporte coletivo e diminuiria os obstáculos aos demais serviços essenciais.

Com estas informações, o professor poderá estimular uma pesquisa com seus alunos sobre a situação do transporte e da mobilidade urbana em sua cidade. Com os dados sobre o número de veículos, situação do transporte coletivo e de modais alternativos, os alunos podem avaliar os projetos dos órgãos públicos sobre a mobilidade urbana e de que forma há a garantia ou não de acesso aos serviços essenciais oferecidos nas cidades.

Por Tales Pinto

Graduado em História

A expressão “direito à cidade” surgiu com Henri Lefebvre (1901–1991), em seu livro “Le Droit à La Ville”, publicado em 1968.

De acordo com o que foi apresentado na reportagem o que é direito a cidade

Essa obra foi publicada em uma época na qual os movimentos sociais reivindicavam liberdades civis e o respeito aos direitos humanos.

Note-se que não se trata de uma obra jurídica, mas ainda assim serve de horizonte teórico para os operadores do direito que lidam com a complexidade do fenômeno urbano.

Ela representou um marco na análise e na compreensão dos fenômenos e antagonismos presentes nas cidades de todo o mundo ocidental.

Conceito de direito à cidade

De acordo com Henri Lefebvre (2010), o direito à cidade “só pode ser formulado como um direito à vida urbana, transformada, renovada”.

O direito à cidade visa a garantir, a todos os cidadãos, o direito de participar das decisões que digam respeito a ela. Dessa maneira, o direito à cidade é fundamental para o exercício da cidadania e para a construção de uma sociedade equânime. 

Ele se desdobra em outros direitos, como o direito ao trabalho, à moradia digna, ao saneamento ambiental, saneamento básico, saúde, transporte público, lazer e informação.

No entanto, o direito à cidade vai além do direito de estar, permanecer ou utilizar dos recursos e da estrutura de determinada cidade. Ele traduz uma demanda por um acesso renovado e transformador da vida urbana.

A cidade reflete as desigualdades sociais e econômicas, na medida em que quem usufrui dos espaços melhor localizados é quem pode pagar. Nesse sentido, o direito à cidade é cada vez mais incorporado no mundo como uma reivindicação política.

De acordo com o que foi apresentado na reportagem o que é direito a cidade

Pode-se citar como ofensa ao direito à cidade a remoção de pessoas moradoras de rua das cidades em épocas de grandes eventos turísticos.

Também ofende o direito à cidade a degradação ambiental que diminui a qualidade de vida no ambiente urbano.

O direito à cidade trata da produção de cidades que valorizem o uso do espaço urbano em detrimento de valores comerciais. Para Lefebvre, esse é um bem supremo, tendo em vista que, na cidade, o ser humano encontra aquilo que necessita para se realizar em sua prática sensível.

Conceito de cidade

Cabe ressaltar, primeiramente, que nem todo aglomerado urbano pode ser considerado uma cidade. Conforme vimos, o conceito de cidade está relacionado ao vínculo que uma determinada sociedade possui com um certo território.

Ainda de acordo com José Afonso da Silva (2010), no contexto brasileiro, a ideia de cidade está ligada a um núcleo urbano com sistema político, administrativo e econômico que tem como sede um governo municipal.

Ou seja, quando se fala em cidade, existem dois elementos principais: um núcleo urbano e um governo municipal.

Já para a Carta Mundial pelo Direito à Cidade, há dois conceitos dela.

A cidade enquanto espaço físico é “toda metrópole, urbe, vila ou povoado que esteja organizado institucionalmente como unidade local de governo de caráter municipal ou metropolitano”.

Já a cidade enquanto espaço político é “o conjunto de instituições e atores que intervêm na sua gestão, como as autoridades governamentais, legislativas e judiciárias, as instâncias de participação social institucionalizadas, os movimentos e organizações sociais e a comunidade em geral.”

Publicado dia 11 de maio de 2018

O conceito direito à cidade nasceu no ano de 1968 em uma Paris incendiária, onde uma onda de protestos contra reformas educacionais iniciada pela juventude culminou em uma greve geral, mobilizando toda a população da capital francesa.  No mesmo ano, o sociólogo e filósofo marxista Henri Lefebvre (1901-1991) publicava o primeiro de uma série de livros sobre o espaço urbano: o Direito à Cidade (no original, Le droit à la ville).

Primeiro marxista a de fato voltar sua pesquisa para a concepção do espaço urbano, Lefebvre definiu a cidade como a “projeção da sociedade sobre o terreno”. Para ele, as consequências da urbanização em muito superavam as da industrialização, e as cidades passaram a ser produzidas enquanto mercadorias.

O resultado, segundo o autor, era a alienação, a qual Lefebvre chamava miséria urbana. O trabalhador periférico que enfrentava longas horas de transporte público, trabalhava e voltava a enfrentar as mesmas horas no retorno para casa era vítima, em sua concepção, de um espaço regulado, uma demarcação de vida com pouca possibilidade para o encontro e para o lazer.

Assim, o direito à cidade surgiu como um conceito contrário à alienação provocada pelos imperativos de uma urbanização desenfreada e regulatória. Lefebvre lançava críticas e desafios aos gestores públicos e aos urbanistas, incentivando-os a pensar na cidade como um lugar de encontro, reunião e simultaneidade, onde o valor da cidade é o de uso, e não de troca.

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A cidade é “a projeção da sociedade sobre o terreno”, escreveu o francês Henri Lefebvre em 1968/ Crédito: Observatório das Metrópoles

Direito à cidade no Brasil

Recebido com fervor acadêmico e favorecido pelas intempéries políticas atravessadas por outros países, o trabalho de Lefebvre foi rapidamente traduzido para o português. Eram os anos de chumbo da Ditadura Militar (1964-1985) e a noção de um Estado de Bem-Estar Social era distante: moradia digna, transporte ou emprego não eram direitos garantidos para a maior parte da população.

Na tese Direito à Cidade: Uma trajetória Conceitual, a pesquisadora Bianca Tavalori defende que se no meio acadêmico marxista da Europa e dos Estados Unidos o livro enfrentou ceticismo, principalmente por parte de pesquisadores como Manuel Castells, que estudavam movimentos sociais de luta por moradia (os quais Lefevbre considerava impeditivos para efetivação do direito à cidade), houve no Brasil uma combinação dos pensamentos de Lefebvre, da pesquisa marxista e dos diversos movimentos sociais que se articulavam.

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Entidades que lutam por moradias populares ocupam prédio do INSS no bairro de Santo Cristo, zona norte do Rio de Janeiro (RJ). Crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil

Em vista das desigualdades e vulnerabilidades do território brasileiro, começou a nascer no País a disputa por um imaginário de direito à cidade, articulada aos direitos de moradia, transporte, cultura e moradia.

“Direito à cidade passou a ser um nome para dizer que queremos políticas de acesso a equipamentos básicos urbanos”, explica Tavolari. “Direito à cidade é uma expressão muito importante também no sentido de que gera identificação: quando mencionada em reivindicações de esfera pública, as pessoas sentem que pertencem à cidade”.

Embora não com o mesmo nome, o direito à cidade se manifesta na Constituição de 1988. Os artigos 182 e 183 garantem a função social da propriedade urbana e a usucapião. Outro marco importante para o direito à cidade foi o Estatuto da Cidade, documento que tramitou durante 11 anos e que assegura o “uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental”.

O termo retornou com força nas Jornadas de Junho de 2013, quando manifestações tomaram diversas cidades brasileiras, impulsionadas pelo aumento da tarifa de transportes públicos. O direito à cidade era um dos conceitos-chave, expresso de múltiplas formas, desde demandas por transporte público para acessar equipamentos da cidade até liberdade de se expressar publicamente sem ameça de violência e represália.

Para a arquiteta Joice Berth, especialista em feminismo negro e direito à cidade, é a possibilidade de apropriação do termo por diferentes reivindicações que o torna tão fundamental na construção de uma cidade que de fato atenda a seu propósito social.

“Cidade é um espaço público, onde você se locomove, mora, estuda, trabalha e cria raízes. As pessoas têm dificuldade de entender: como assim, direito à cidade, a cidade não é pública? É, mas não em sua totalidade”.

A diversidade da cidade

Embora exista, nos últimos anos, um alargamento na concepção da importância do direito à cidade, esse debate às vezes ignora que dentro de uma malha urbana se desenvolvem diferentes tipos de territórios, com mais ou menos acesso à direitos.

Joice Berth interliga a efetivação do direito à cidade à participação social. “Direito à cidade é falar de política, senão dentro das instituições, na montagem de grupos de discussão e na ocupação de espaços públicos”. Ela complementa que é também dever da população fiscalizar as políticas públicas em trâmite no poder legislativo.

A gritante desigualdade brasileira se materializa em uma malha urbana fragmentada. Enquanto o centro concentra maiores oportunidades de trabalho e habitação para população com maior poder aquisitivo, além de uma abundância de equipamentos de cultura, as regiões periféricas sofrem de um parco planejamento urbano, poucos pontos culturais e uma população de baixa renda aviltada de direitos básicos.

“Os urbanistas precisam ter uma consciência social, racial e de gênero bem desenhada para poder realizar um planejamento urbano”, diz a arquiteta Joice Berth. Pensar o direito à cidade implica então compreender que, para que ele se efetive, as políticas públicas precisam considerar os trajetos percorridos pelas diferentes populações e realidades brasileiras, entendendo seu papel fundamental na diminuição da desigualdade nos âmbitos raciais, de gênero e de condição social.