São instrumentos específicos do assistente social no exercício da profissão?

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O conhecimento é, sem dúvida, o principal instrumento de trabalho em qualquer área, pois permite que o profissional tenha uma real dimensão das diversas possibilidades de intervenção. O texto de hoje abordará uma das três dimensões de competência do assistente social: a competência técnico-operativa. Esse conhecimento permite ao profissional definir quais instrumentos serão utilizados no processo de intervenção. É essa capacidade que se denomina de instrumentalidade.

Assim como as mediações que se constituem a partir da singularidade, universalidade e particularidade, a instrumentalidade deve se pautar sobre a realidade social. Sua concretude e complexidade necessitam de um aparato técnico-metodológico específico, de modo que seja possível compreender a totalidade do objeto de intervenção.

Os diferentes espaços sócio-ocupacionais impõem aos profissionais constantes reflexões acerca dos instrumentos a serem utilizados. Trata-se de uma escolha que deve ser ponderada, de modo que o indivíduo não seja penalizado quanto ao acesso dos seus direitos quaisquer que sejam. Tampouco culpabilizado, o que reforçaria a lógica da exclusão social.

Qual o melhor instrumento?

Por atuar diretamente na realidade social, o processo de qualificação profissional deve ser contínuo para o pleno exercício da prática. A apreensão da realidade social possibilita que as demandas apresentadas possam ser subsidiadas com propostas mais amplas de intervenção.

O que define quais instrumentos e técnicas serão utilizados na intervenção são os objetivos profissionais, ou seja, o ato de agir que requer planejamento para a execução da ação profissional. É no momento da execução que a metodologia a ser aplicada é construída, onde o profissional deve se questionar do “porquê”,  “para quê”  e ”como” determinado instrumento deve ser utilizado.

Vejamos agora quais são os principais instrumentos que caracterizam a prática do exercício profissional. Para tanto, o assunto será abordado em duas etapas:   instrumentos diretose  instrumentos indiretos.

São instrumentos específicos do assistente social no exercício da profissão?

Instrumentos Diretos

Os Instrumentos diretos são aqueles que proporcionam uma interação face a face, ou seja, por meio da linguagem gestual, pelo diálogo ou pela entonação.

São instrumentos diretos:

1. Entrevista

 Instrumento que permite realizar uma escuta qualificada, a entrevista por meio do processo de diálogo, visa estabelecer uma relação com o usuário, com objetivo de conhecer e intervir em sua realidade social, econômica, cultural e política. Pode ser individual ou grupal.

Sendo assim, podemos afirmar que a entrevista possui dois objetivos principais:

  • Promover o conhecimento da realidade dos usuários;
  • Realizar os encaminhamentos e orientações necessários para a garantia de direitos.

 O diálogo propicia uma análise crítica da situação, pois a partir da fala do usuário é que o assistente social consegue identificar as questões que permeiam a sua realidade, utilizando-se da mediação como um referencial teórico para sua intervenção.

Etapas da Entrevista

Antes de iniciá-la, o profissional precisa estar preparado e decidir qual será o tipo de entrevista a ser realizada. É fundamental que haja um planejamento da ação a ser executada, onde deverão ser levados em consideração o conhecimento técnico do entrevistador, a formulação conjunta de questões subjetivas e objetivas, o registro das respostas e o conhecimento prévio do campo.

O planejamento se faz necessário para que não ocorra imprevistos ou esquecimentos de aspectos importantes por parte do entrevistador, muito menos a retenção de dados importantes e que o entrevistado não seja influenciado pelo entrevistador quanto às respostas. É importante frisar que no planejamento, “os objetivos do profissional, os objetivos institucionais e as necessidades dos usuários são relevantes para decidir qual a melhor modalidade de entrevista e se ela deverá ser individual ou grupal” (LAVORATTI, 2016).

A operacionalização da entrevista deve permitir ao entrevistado clareza quanto às questões expostas pelos usuários e os possíveis encaminhamentos para seu acesso aos programas, projetos, serviços e benefícios.

Vale ressaltar que, preparar um espaço físico adequado é importante para a entrevista, permitindo assim uma exposição clara dos objetivos da entrevista, a comunicação entre o assistente social e, ainda, usuário e a manutenção do sigilo profissional.

O acolhimento é importante para que o usuário possa expor seus problemas, além de contar com uma escuta ativa e com a compreensão de um profissional que tenha por objetivo a garantia dos seus direitos sociais.

De m que a coleta de dados possa subsidiar os questionamentos e reflexões, é preciso estabelecer um diálogo para que a complexidade da realidade e a correlação entre os fatos possam ser compreendidos pelo assistente social. O profissional deve antes de tudo se abster de “não fazer críticas” e “evitar julgar o usuário”.

Registro e Sistematização das Informações coletadas

Etapa final da entrevista que tem como objetivo contribuir para a integralidade do atendimento, ou seja, por meio de uma linguagem clara, técnica e objetiva, o profissional retrata a competência teórico-metodológica e técnico-operacional do Serviço Social.

Tipos de entrevista

Ao escolher o tipo de entrevista, o assistente social deve fazer uma reflexão acerca dos objetivos específicos que ele espera alcançar. Dentre as formas de entrevista, que podem ser utilizadas pelo assistente social estão:

  • Entrevista estruturada: através de um roteiro previamente elaborado, o entrevistador formula as perguntas conforme a ordem estabelecida. Dentre as vantagens desse tipo de entrevista, estão a rapidez na aplicação das perguntas e o desenvolvimento de levantamentos sociais. Já a desvantagem, está na dificuldade da análise dos dados coletados que, dependendo do questionário pode mascarar a captação de elementos importantes para o trabalho do assistente social, como os sentimentos e motivações que ocasionaram a realização da entrevista. Geralmente, este instrumental, “têm por objetivo “traçar o perfil socioeconômico dos usuários, além de outras características exigidas como critérios de inclusão em programas sociais” (LAVORATTI, 2016) .
  • Entrevista não estruturada: este tipo de entrevista permite ao entrevistador explorar amplamente uma determinada questão. Visa obter dados relevantes quanto à intervenção profissional. Segundo Lavoratti (2016) apud Kisnerman (1978, p.27), as perguntas devem ser formuladas sem que haja introdução das respostas, permitindo assim “qualificar dados com o entrevistado, capacitar, avaliar, orientar, informar, reforçar a auto-estima e gerar participação”.
  • Entrevista semi-estruturada: neste tipo de entrevista são elaboradas perguntas abertas e fechadas. A entrevista aberta semi-estruturada é a mais utilizada por favorecer uma maior interação entre entrevistador e entrevistado, pelo fato de não se restringir apenas ao tema questionado. Possui questões norteadoras e objetivos preestabelecidos, abrindo caminho para que outros aspectos não previstos pelo entrevistador possam ser trabalhados.

2. Visita

A visita é um instrumento de suma importância e pode ser domiciliar ou institucional.

Visita domiciliar

A visita domiciliar consiste em conhecer a realidade social, de uma determinada família, ou seja, analisar o contexto familiar e o modo de vida, suas vulnerabilidades e potencialidades, permitindo ao assistente social observar o indivíduo em seu meio social, além de realizar o acompanhamento e os encaminhamentos necessários para a rede de atendimento.

No âmbito do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), a visita domiciliar é um dos instrumentos estratégicos utilizados para a abordagem com as famílias, pois possibilita que o profissional se aproxime da realidade vivenciada pelos grupos familiares nos territórios, podendo com isso acompanhar e analisar melhor o resultado de suas intervenções.

Visita institucional

A visita institucional consiste em conhecer e avaliar a qualidade dos serviços prestados pelas entidades sociais públicas ou privadas, e para isso requer do assistente social enquanto Secretário Executivo, um intenso conhecimento teórico e técnico sobre as políticas sociais. Este tipo de visita  é de competência exclusiva dos Conselhos de Direito Exemplo: visita de fiscalização a uma Instituição de Longa Permanência (ILPI) pelo Conselho Municipal da Assistência Social com objetivo de averiguar se a entidade oferece instalações físicas em condições adequadas de  acessibilidade, habitabilidade, segurança, higiene e salubridade aos idosos residentes.

3. Acolhimento Social

O acolhimento social é um processo de intervenção profissional que envolve a escuta social qualificada. Tem por objetivo identificar o problema de determinada situação no âmbito individual ou coletivo.

4. Acompanhamento Social

Procedimento técnico de caráter continuado, que necessita de um vínculo entre o usuário e o profissional, como por exemplo, o acompanhamento sócio-familiar detectado durante a entrevista, e que determina os encaminhamentos necessários.

Entenda a diferença entre Atendimento e Acompanhamento no contexto do SUAS.

5. Atendimento Social

Importante espaço de atuação profissional que envolve um conjunto de ações direcionadas ao atendimento de famílias e indivíduos, visando o acesso aos direitos sociais, políticos e civis nas diferentes políticas setoriais, como: assistência social, saúde, educação, previdência, habitação, bem como na prevenção de situações de risco. O Atendimento Social é viabilizado pelas equipes que atuam nos diversos equipamentos de assistência social como os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e os Centros Especializados de Referência da Assistência Social (CREAS).

6. Trabalho em Grupo

Antes de mais nada, é importante ressaltar que de acordo com as orientações  do conjunto CFESS/CRESS, a formação profissional do assistente social não está habilitada para o desenvolvimento de trabalhos no campo terapêutico. Dessa forma, os trabalhos em grupos devem ser utilizados apenas como recurso para o desenvolvimento de trabalhos educativos, como os desenvolvidos nos CRAS,  CREAS e demais espaços sócio-ocupacionais. 

Organizar pessoas através do trabalho com grupos exige do profissional planejamento, e como mediador, o assistente social tem a possibilidade de contribuir para a construção do conhecimento, potencializando espaços de reflexão mediante análise conjunta do contexto das relações sociais na qual o grupo está inserido (formação da identidade e de pertencimento do grupo).

7. Dinâmicas de Grupo

É uma técnica que utiliza jogos, brincadeiras ou simulações de modo a provocar uma reflexão acerca de uma determinada temática que tenha relação com o objeto de intervenção, e que no caso do Serviço Social, tem o assistente social como facilitador, o que requer do profissional habilidades teóricas e uma postura política democrática de controle no processo da dinâmica.

8. Reunião

A reunião é um instrumento presente no cotidiano de trabalho do assistente social, seja na atuação com grupos, nos encontros com usuários das políticas públicas ou nas reuniões de equipe. A reunião tem como característica, promover e intervir em espaços coletivos provocando uma reflexão crítica.

São instrumentos específicos do assistente social no exercício da profissão?

Instrumentos indiretos

Os instrumentos indiretos consistem no registro da interação realizada pelo instrumental face a face, independente da metodologia utilizada, entrevista, visita, acolhimento e/ou atendimento social.

São instrumentos diretos:

1. Estudo Social

Instrumento específico do assistente social que tem por finalidade conhecer com profundidade e de forma crítica, determinada situação ou expressão da questão social, objeto de intervenção profissional nos aspectos socioeconômicos.

O Estudo Social possibilita o acesso a determinados serviços, programas, e benefícios, bem como na efetivação de direitos ou subsidiar pareceres sociais. Têm a família como elemento central da análise que visa compreender os diversos vínculos e a estrutura das relações familiares vivenciadas pelos sujeitos, de modo a garantir a proteção de seus membros.

2. Parecer Social

É a avaliação conclusiva, teórica e técnica realizada pelo assistente social, dos dados coletados após a finalização do estudo social. Além de conter o posicionamento do profissional acerca da realidade social estudada, deve evidenciar os aspectos significativos para a viabilização de direitos sociais, fazendo referência aos elementos analíticos e aos instrumentos utilizados nas dimensões investigativa e interventiva.


Veja também: Conheça a diferença entre Parecer Social e Laudo Social!


3. Relatório Social

Os relatórios são instrumentos de sistematização da prática do assistente social, que contém o relato dos dados coletados, das intervenções realizadas e das informações adquiridas.

4. Perícia Social

No âmbito das políticas sociais, a perícia social tem o importante papel de ser um instrumento que reforça as decisões referentes à concessão de benefícios, garantindo assim o acesso aos direitos sociais e a superação da vulnerabilidade e risco social.

A perícia social é uma técnica que exige planejamento, que consiste no levantamento de documentos e coleta dados já existentes acerca de uma determinada demanda social, e que tem início pelo Estudo Social.

No campo jurídico, a perícia social constitui-se em um meio de prova, por se tratar de uma declaração técnica, conforme esquema a seguir:

São instrumentos específicos do assistente social no exercício da profissão?

Conclusão

No âmbito da intervenção profissional, o Serviço Social visa produzir as mudanças necessárias no cotidiano da vida social dos usuários atendidos. E é através da competência técnico-operativa que o Assistente Social encontra o resultado da capacidade criativa e da compreensão da realidade social, para que a intervenção possa ser realizada com eficácia, responsabilidade e competência profissional.

Existem outras técnicas e metodologias de ação utilizadas pelos assistentes sociais, como a mobilização, os registros em atas e os diários de campo, no entanto, este artigo pautou-se naqueles que são mais utilizados na prática.

Cabe aos assistentes sociais a importância de desvendar e interpretar as condições objetivas e subjetivas que permeiam o exercício profissional, condição necessária para o trabalho social enquanto categoria constitutiva.

Veja também

  • Instrumentais do SUAS com mais eficiência
  • As diferenças entre as oficinas ofertadas pelo PAIF e pelo SCFV
  • A referência e a contrarreferência no SUAS

Referências

  • COSTA, Dourival e LAVORATTI, Cleide.  Instrumentos Técnico-Operativos no Serviço Social: um debate necessário (2016).
  • GUERRA, Yolanda. A instrumentalidade no Trabalho do Assistente Social (2007).
  • SOUSA, C. T. A prática do assistente social: conhecimento, instrumentalidade e  intervenção profissional (2008).

São instrumentos específicos do assistente social no exercício da profissão?

Quais são os instrumentos de trabalho do assistente social?

São instrumentos diretos:.
Entrevista. ... .
Visita. ... .
Acolhimento Social. ... .
Acompanhamento Social. ... .
Atendimento Social. ... .
Trabalho em Grupo. ... .
Dinâmicas de Grupo. ... .
Reunião..

Quais são os três níveis da Instrumentalidade do Serviço Social?

Da instrumentalidade do Serviço Social face ao projeto burguês; da instrumentalidade face às demandas sociais; e da instrumentalidade como condição de mediação.

O que é o instrumental técnico

Para a efetivação de sua ação, os profissionais acionam um instrumental técnico- operativo que constitui um conjunto de instrumentos e técnicas diferente daquele utilizado na esfera da produção material, cuja base é a transformação de objetos materiais.

Quais são as três dimensões da instrumentalidade?

Instrumentalidade do serviço social: dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa e exercício profissional. 2008.