Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?
por INTY SCOSS MENDOZA

Graduando em Pedagogia na Faculdade de Educa��o da Universidade de S�o Paulo, orientando da Prof. Dra. Fl�via In�s Schilling e bolsista de inicia��o cient�fica do Programa Institucional FEUSP/FAFE

a administra��o dos rios e o pensamento pol�tico na forma��o da China imperial

Inty Scoss Mendoza

Resumo: O presente artigo aborda, em uma perspectiva da sociologia hist�rica, a rela��o entre a civiliza��o chinesa e o �governo das �guas� e suas poss�veis implica��es no pensamento pol�tico chin�s, por meio de um di�logo entre os textos cl�ssicos e a moderna historiografia chinesa, as an�lises ocidentais de Max Weber e Joseph Needham, e o desafio ambiental da China moderna, que trouxe o tema de volta ao centro do cen�rio pol�tico.

Palavras-chave: China: administra��o dos rios, pensamento pol�tico, forma��o do Imp�rio, quest�o ambiental da China moderna.

Abstract: The current article approaches, in a historical perspective of sociology, the relationship between the Chinese civilization and the �government of the waters�, and their possible implications in the Chinese politics thoughts, by means of a dialogue between the classical texts and the modern Chinese historiography, the occidental analysis of Max Weber and Joseph Needham, and the environmental challenge of Modern China, that brought back the subject to the political scenario.

Keywords: China: river management, political thought, formation of the Empire, environmental issue of the Modern China

O presente artigo tem a inten��o de analisar de forma sucinta a presen�a de um tema recorrente na hist�ria chinesa, o qual a tradi��o chamou de zhi shui治水, o �governar as �guas�,[1] e suas implica��es na forma��o do pensamento pol�tico chin�s. Obviamente a tradu��o desse termo poderia, priorizando um sentido mais t�cnico, ser: �controlar a �gua�, entretanto, como procurarei esbo�ar aqui, tal controle tem muitas implica��es, entre elas a pol�tica, que justifica a abrang�ncia do termo �governo�.

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?
A express�o zhi shui aparece na hist�ria chinesa relacionada ao Grande Yu 大禹, fundador da dinastia Xia (2000? a 1520 a.c.), que por dezesseis anos trabalhou para resolver as terr�veis enchentes na regi�o da bacia do Huanghe 黄河 � o rio Amarelo �, ber�o da civiliza��o chinesa, continuando o trabalho iniciado por seu pai. As hist�rias e lendas em torno de Yu fazem parte das tradi��es transmitidas �s crian�as como exemplo de dedica��o e sacrif�cio, pois em suas viagens para �governar as �guas� por tr�s vezes ele passou em frente � pr�pria casa e n�o entrou sequer quando ouviu o choro de seu filho, para n�o se desviar de seu firme prop�sito de beneficiar o povo. [2] O Livro das Escrituras � Shu Jing 书经, os registros das primeiras dinastias compilado provavelmente entre os s�culos XI e VI a.C. (CHAI e CHAI, 1973, p. 10) � apresenta seus trabalhos de abertura de canais a fim de que as �guas pudessem escoar para o rio Amarelo e depois para o mar, que quando finalizados: Os quatro cantos se tornaram habit�veis. Nos nove montes se abriram estradas. As fontes dos nove rios foram limpas. Fizeram-se barragens nos nove lagos. Os quatro mares se uniram (III, 2� parte, 14). [3]

As escrituras prosseguem descrevendo a divis�o das terras, ap�s o sucesso de Yu, em cinco tipos de dom�nios: imperiais, principados, de pacifica��o (ou prote��o), [4] de influ�ncia e n�o desbravados (idem, 18 a 22). Essa constitui��o modelar do estado persistiu, de acordo com Conf�cio (Analectos II, 23), at� a dinastia Zhou (), 900 anos depois, onde se consolidou um sistema de hierarquia pol�tico-administrativa baseada nos rituais, o �governo pelos rituais�, que envolvia tanto a pr�tica cerimonial quanto um regime pol�tico.[5]

O governo das �guas instituiu um governo dos homens, pois o grande desafio de controlar as enchentes que assolavam aquela regi�o foi um dos principais fatores de organiza��o pol�tica (e burocr�tica) da civiliza��o chinesa. Max Weber estabelece um paralelo entre a civiliza��o chinesa e a eg�pcia por terem fundado estruturas burocr�ticas governamentais para administrar os rios, os �regimes da �gua� (WEBER, 1951, p.20). Entretanto, a rela��o peculiar entre as �guas e a pol�tica chinesa revela-se em muitos valores fundadores do pensamento chin�s. Em primeiro lugar, est� o fato de que aquela n�o era uma regi�o des�rtica e o desafio n�o era o de irrigar o solo, mas drenar a �gua das enchentes. O governo n�o assumiu, por isso, um car�ter criador que faria jorrar do ch�o �leite e mel� no meio do deserto (diferen�a apontada por Weber em sua compara��o da no��o de divindade chinesa e a do oriente m�dio) (idem p. 21). O car�ter assumido era o de regulador, o que a hist�ria do pensamento pol�tico chin�s subseq�ente apresenta em v�rias nuances, com todos os desenvolvimentos e desdobramentos do cl�ssico conceito de Tao (dao ).[6] Tal rela��o entre a pr�tica governamental de administra��o constante do n�vel dos rios � e posteriormente os canais abertos para integrar as diferentes regi�es do Imp�rio �, e o desenvolvimento do pensamento pol�tico da China Imperial, em seus desdobramentos e conflitos nos per�odos de disputas no processo de consolida��o desse regime, podem ser tratados como express�es complementares de um mesmo contexto fundador: a tarefa civilizacional chinesa de regular, canalizar e articular as �guas de seus rios.

Em sua an�lise da civiliza��o chinesa, Weber abordou esse princ�pio para fundamentar alguns elementos de sua sociologia das religi�es chinesas (confucionismo e tao�smo), e Joseph Needham, em um longo estudo (dez volumes em chin�s) intitulado �Civiliza��o e Ci�ncia da China�, apresenta em seu resumo introdut�rio da hist�ria chinesa (o primeiro volume da cole��o) a tese de que as unifica��es e fragmenta��es pol�ticas da China estavam diretamente relacionadas � constru��o dos canais de irriga��o e transporte iniciados na dinastia Zhou (s�c. 11 a 7 a.C.) e levados a termo pela dinastia Sui (581 a 618 d.C.), com o �Grande Canal�. Pretendo neste artigo contribuir com outro enfoque dessa rela��o: comparar a forma espec�fica como se deu o desenvolvimento da base te�rica do pensamento pol�tico chin�s, que genericamente � chamada de �confucionismo� no Ocidente, a esse longo processo de constitui��o de um aparato administrativo capaz de empreender a administra��o dos rios e realizar, com isso, as ambi��es dos governantes chineses. Em um �ltimo momento do artigo, abordarei o �governo das �guas� na imprensa chinesa dos dias de hoje, resgatado frente ao grave problema ambiental, para evidenciar o car�ter de perman�ncia do tema no debate pol�tico da China.

A especificidade do pensamento pol�tico chin�s pode ser ilustrada, simbolicamente, no �governo das �guas� do Grande Yu, venerado n�o somente como a resolu��o do problema das enchentes, mas tamb�m por conter uma sabedoria espec�fica, uma engenhosidade pr�pria que se expressa quando seu trabalho � comparado ao de seu pai. Ao contr�rio desse, que tentava impedir o avan�o das �guas erguendo barragens, Yu abriu canais. O Livro das Escrituras descreve detalhadamente tais caminhos (Escrituras de Xia, �Os trabalhos de Yu�) que, em conformidade com um princ�pio de n�o-oposi��o � for�a da �gua, drenou-a e permitiu a plena ocupa��o humana do territ�rio. Outra caracter�stica da obra de Yu foi sua capacidade de interligar os rios de forma a criar um sistema que permitia uma complexa auto-regula��o. Estas duas caracter�sticas, circula��o e articula��o, e a necessidade de regula��o de ambas, s�o quest�es fundamentais no pensamento chin�s, tanto em mat�ria de pol�tica quanto de filosofia. Poder-se-ia dizer que os rituais de Zhou, o zhou li周礼, considerados por Conf�cio a m�xima express�o da sabedoria de governar, s�o uma manifesta��o extremamente refinada desse princ�pio no campo pol�tico ao aplicar �s rela��es sociais uma complexa articula��o para uma melhor circula��o dos interesses. Isso n�o quer dizer que o problema, tanto das �guas quando da pol�tica, se resolveu. A hist�ria posterior da China foi constante testemunha desse �retorno do recalcado�.

O desenvolvimento social e pol�tico nos estertores da dinastia Zhou, per�odos chamados de Primavera e Outono (722 a 480 a.C.) e Estados Combatentes (480 a 221 a.C.), conduziu a um fortalecimento cada vez maior dos pr�ncipes em detrimento do poder imperial, processo esse impulsionado tamb�m pelo desenvolvimento da metalurgia e seus usos na agricultura e na guerra. Entretanto, um fator desempenhava um papel particularmente importante: a falta de integra��o entre as diferentes regi�es do Imp�rio por quest�es de interesse econ�mico imediato, diferen�as culturais e �tnicas, e tamb�m pelas dificuldades de transporte, fato que traduzido em termos do princ�pio do �governo das �guas� seria uma falta de regula��o, de articula��o. Em rela��o a essa �falta�, esse per�odo da hist�ria chinesa foi pr�digo em produ��o intelectual, pois � a �poca da �Disputa das Cem Escolas�, momento em que foram lan�ados os princ�pios de a��o pol�tica que se alternaram e se combinaram ao longo dos mais de dois mil�nios seguintes. Dessas �Cem Escolas�, uma fonte antiga, o Lunliujia yaozhi论六家要旨[Discurso do princ�pio das Seis Escolas] de Simatan 司马谈 (cerca de 140 a 110 a.C.), registrou seis escolas, e outra, o Hanshu yiwenzhi汉书艺文志 [Colet�nea de arte e literatura das Escrituras de Han] de Bangu 班固 (32 a 92 d.C.), registrou dez escolas (YANG 1995, I p.114). Dentre elas, as que geraram mais antagonismo pol�tico no per�odo, dadas as radicais diferen�as de princ�pios de condu��o do governo, s�o as quatro escolas consideradas principais: os eruditos (confucionismorujia儒家), o tao�smo (daojia 道家), o legismo[7] (fa jia 法家) e o mo�smo (mojia墨家). As outras escolas citadas por Bangu talvez n�o tenham tido tanta aten��o posterior por estarem de certa forma unidas � filosofia pr�pria de determinadas fun��es dentro da estrutura do Imp�rio, como a Escola da Agricultura (nongjia农家), Escola dos Diplomatas (zonghengjia 纵横家)[8] e a Escola do Ex�rcito (bingjia 兵家),[9] ou ainda unidas � quest�es com fortes implica��es metaf�sicas, como a Escola de Yin e Yang (yinyangjia 阴阳家) e Escola dos Nomes (mingjia 名家),[10] estando seus percursos de desenvolvimento mais sujeitos que agentes da posterior organiza��o pol�tica imperial (ressalvas feitas � Escola do Ex�rcito), ou ainda contribuindo com procedimentos metodol�gicos e cosmo vis�es que foram adotados pelas escolas principais[11].

As fronteiras entre essas linhas de pensamento s�o muito mais fluidas que sua separa��o em �escolas�, e a partir de sua disputa surge, com o passar do tempo, orienta��es pol�ticas que fundiram id�ias e princ�pios pertencentes a campos opostos desse cen�rio em uma manifesta��o do esp�rito articulador das �guas do Grande Yu, sendo esse um dos procedimentos mais caracter�sticos do pensamento chin�s (qualquer semelhan�a com o �socialismo de mercado� de Deng Xiaoping n�o � mera coincid�ncia). Como veremos na breve abordagem dessas linhas de pensamento e suas rela��es, diretas ou indiretas, com a administra��o dos rios e a forma��o do Imp�rio chin�s, tal caracter�stica articuladora n�o significa uma tend�ncia � paz, � concilia��o, pelo contr�rio, a fus�o das linhas de pensamento ocorre na China da mesma forma como se abriram os canais: � for�a.  

Caso priorizemos o aspecto do desenvolvimento econ�mico em nossa an�lise da crise do per�odo de Primavera e Outono, a necessidade pungente para a continuidade de qualquer governo naquela situa��o seria a integra��o territorial, ou seja, amplia��o dos canais de irriga��o e transporte j� insuficientes para a popula��o da �poca, e o estabelecimento de um governo racional em termos de uso do solo, coleta de impostos e administra��o do ex�rcito. Tal an�lise pode parecer anacr�nica, entretanto, era essa a leitura que os legistas fizeram de sua �poca. Para atingir tal fim, o que eles propunham era uma f�rmula igualmente �moderna�: a centraliza��o de poder.

Tais pensadores e estrategistas n�o chegaram a reunirem-se em torno de um representante, como os eruditos de Conf�cio, no entanto, compartilhavam uma vis�o extremamente pragm�tica de lidar com os assuntos do Estado. Em um contexto de disputa militar em que os diferentes reinos buscavam a supremacia, os legistas mais famosos encontravam-se nas cortes desses pr�ncipes combatentes, como Li Kui李悝 no reino de Wei, Wuqi 吴起no reino de Chu, Shenbuhai 申不害no reino de Han, Shendao 慎到no reino de Qi e Shangyang 商鞅no reino de Qin, levando a termo o tipo de administra��o que os uniu ideologicamente na busca dos objetivos mencionados acima: a reforma das leis, bianfa 变法(YANG 1995 vol.1, p. 124). Esses conselheiros acreditavam que o poder coercitivo altamente centralizado era o instrumento mais eficaz para a concretiza��o de qualquer aspira��o de um governante � sintetizado na express�o �severas penas, lei rigorosa� 严刑峻法 � e identificavam como os maiores obst�culos para o fortalecimento dos estados a divis�o do territ�rio imperial em concess�es de dom�nios feitas aos nobres da corte e nos complexos rituais de ordenamento dessa hierarquia pol�tico-administrativa (idem, ibidem). Suas reformas baseavam-se em �enriquecer o reino por meio da agricultura e controlar o inimigo com ex�rcitos� (Hanfeizi,[12]citado em YANG p. 125), o que implicava tamb�m em um controle sobre o com�rcio, que crescia com as especula��es t�picas de per�odos de guerra. Em termos de pol�tica administrativa suas id�ias eram: �sem m�rito n�o h� recompensa, sem crime n�o h� pena�, �o primeiro-ministro deve ser escolhido entre os administradores de prov�ncias e os generais, nas fileiras do ex�rcito� (idem), ou ainda, �sem distin��o entre parentes pr�ximos e distantes, sem prioridade entre nobres e humildes, julgar todos pela mesma lei� (Shiji, idem), todas elas destinadas a derrubar a pr�tica de imunidade fiscal e penal dos nobres.

Ao aproximar as pr�ticas legistas ao conceito de articula��o e regula��o herdado da administra��o dos rios e canais poder�amos considerar essa conduta pol�tica baseada na vis�o de que a capacidade de um Estado de enfrentar seus desafios militares e econ�micos est� toda condensada no conceito de �for�a� (�Hoje se guerreia pela for�a� Hanfeizi), e n�o na �virtude�, o que significa dizer que o governo � uma a��o humana e volunt�ria (e n�o celestial e divinamente determinada, como diria um erudito chin�s), ou seja, a realiza��o de uma organiza��o humana baseada no poder de utilizar o conjunto da for�a produtiva e b�lica de uma sociedade. A dimens�o metaf�sica da pol�tica legista � um grande louvor ao esp�rito guerreiro, conceito esse que n�o � desconhecido dos prim�rdios da civiliza��o chinesa, pelo contr�rio, � t�o fundador quanto o esp�rito de regula��o das �guas.

Quem planta a virtude, cuida de a regar; e quem arranca o v�cio, vai � raiz. Por isso mesmo, eu, na minha mod�stia, tomei a iniciativa, com todos v�s, meus soldados, de arrancar e extirpar vosso inimigo. Espero que v�s todos, meus soldados, avanceis com intrepidez, para al�ar o vosso Pr�ncipe. Para grande servi�o, grande recompensa. Mas quem n�o avan�ar, h� de passar por uma p�blica vergonha (Livro das Escrituras, 5, 1/3, o rei Wu 武王 fundador da dinastia Zhou convocando seus ex�rcitos para a �Grande Miss�o�)

Entretanto, essa �tica guerreira chinesa, como em tantos outros lugares do mundo, portadora de um sentido de nobreza individual do guerreiro, estava associada a um contrapeso coletivo, a burocracia de administra��o dos rios, e por isso n�o se desenvolveu em uma ordem social individualista (Weber 1951, pp. 24 e 25). Os legistas, de certa forma, uniram a tradi��o guerreira � experi�ncia de administra��o burocr�tica dos rios, n�o s� de forma metaf�rica, isto �, �canalizar� a for�a de uma sociedade para o fim da centraliza��o do poder pol�tico e econ�mico, como de maneira direta, empreendendo conquistas territoriais por meio da abertura de canais de transporte fluvial, como veremos adiante. S�o eles, com seu �governo das leis�, o oposto conceitual da vis�o confucionista de �governo pelo ritual�.

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?
No caso da proposta pol�tica de Conf�cio, a crise que cingia a sociedade de sua �poca devia-se a uma perda do que a dinastia Zhou havia realizado de mais sublime, o �governo pelos rituais�. Em seus ensinamentos, o poder � decorr�ncia da virtude do governante, proposi��o essa baseada na vis�o caracter�stica da dinastia Zhou de que o Imperador � �filho do C�u�. Apesar de seu car�ter conservador (ao contr�rio dos legistas, que propunham a ruptura com a tradi��o administrativa dos Zhou), Conf�cio opera uma mudan�a de foco no seio dessa tradi��o, pois ao inv�s de pregar estritamente o culto ao Imperador, passou a propor aos governantes o cultivo da virtude da �humanidade� como meio de restituir o equil�brio social perdido e conquistar as benesses celestiais. Talvez tenha sido esse o principal motivo de seu fracasso no campo da pol�tica. Outra caracter�stica de seu pensamento � o enfoque na import�ncia da educa��o na arte de governar, no que se refere � quest�o da institui��o da �tica baseada no amor filial, na lealdade ao governante, no respeito aos mais velhos e na obedi�ncia ao marido (um adendo �s mulheres), sendo essas as bases para a prepara��o dos homens capazes de governar. Para Conf�cio, a �articula��o� perdida deve ser resgatada pelo cultivo das virtudes, os grandes �canais� vivos do Imp�rio.

A outra escola de pensamento surgida na crise das disputas pela centraliza��o de poder � o tao�smo de Laozi 老子 (Lao-ts�). Ao contr�rio dos legistas e dos eruditos, o pensamento tao�sta pregava o m�nimo de interfer�ncia poss�vel na vida social, sendo tal conceito resumido no princ�pio de �n�o-a��o�, contr�rio tanto �s leis quanto aos rituais. O tao�smo tem suas ra�zes em uma cosmo vis�o de que a natureza est� originalmente em equil�brio e, portanto, a a��o humana sobre ela � artificial e desequilibradora. N�o h� nos cl�ssicos tao�stas qualquer men��o direta � administra��o dos rios (o mesmo ocorre no confucionismo), entretanto a �gua surge como a principal met�fora do ato de governar: �O Grande Reino � como um curso descendente [...] Se um grande reino fica abaixo do pequeno, ent�o o grande conquista o pequeno [...] Se o pequeno fica abaixo do grande, ent�o o pequeno conquista o grande� (Daodejing, 61), �Os rios e mares podem governar os cem vales por saberem ficar abaixo deles� (idem, 61).[13] Transparece, portanto, a relev�ncia da experi�ncia chinesa de lidar com esse elemento, pois aplica ao bom governo a sabedoria que permitiu o surgimento dessa civiliza��o, chegando mesmo a comparar o Dao com a �gua, pois �a bondade suprema � como a �gua, que beneficia os dez mil seres sem se opor a eles, habita os lugares que os homens abominam� (idem, 8).[14]

O pensamento de Laozi tem grande aceita��o no Ocidente (tenho conhecimento de oito tradu��es do Tao Te King � o daodejing � em portugu�s) e acredito que isso se deve tamb�m ao fato de que ele cont�m, em alguns aspectos, uma profunda avers�o � regula��o burocr�tica da vida, �s tecnologias do poder � �Perdido o Dao, surge a bondade e a justi�a [...] Desarm�nica a fam�lia, surgem os deveres filiais e parentais [...] Ca�ticas as na��es e as fam�lias, surgem os ministros leais� (idem, 18) �, que s�o abundantes na moderna sociedade ocidental, o que sugere, por outro lado, que a China da �poca era, � sua maneira, tamb�m pr�diga nessa quest�o. A face objetiva da administra��o dos rios surge, portanto, de forma indireta no discurso tao�sta, pois esse � um protesto contra uma burocracia formada primordialmente para �governar as �guas�, incorporando somente a face metaf�rica da natureza da �gua e suas aplica��es no campo do pensamento e da pol�tica.

O mo�smo, praticamente desconhecido no ocidente, tem afinidade com o tao�smo nessa quest�o, pois seu fundador Mozi (cerca de 479 a 381 a.C.) rejeitava tanto o governo das leis quanto o dos rituais, sendo um porta-voz dos pequenos agricultores, artes�os e comerciantes sobrecarregados de todas as formas, pois arcavam com o �nus dos tributos destinados a manter a burocracia e eram tamb�m os soldados e trabalhadores das obras do Imp�rio (dentre elas as fluviais). O princ�pio norteador de sua pol�tica baseava-se em um conceito de amor amplo e indistinto, em contrapartida ao hierarquicamente determinado do confucionismo, sendo sintetizado em: �Dar de comer aos que tem fome, roupa aos que tem frio e descanso aos que trabalham� (YANG 1995, I pp. 120 e 121). � importante lembrar que as disputas entre as escolas ocorriam nas cortes (idem p. 115), sendo, portanto, um luta na qual setores da sociedade tentavam fazer valer seus interesses em uma situa��o de indefini��o pol�tica. Coloca��es do pr�prio Mozi como: �Caso tenha capacidade, uma pessoa pode ser nomeada para servir o reino mesmo sendo agricultor, artes�o ou comerciante�, ou ainda, �A nobreza n�o � eterna, assim como a inferioridade n�o � sem-fim� (idem), revelam a inten��o de ocupar um lugar dentro da estrutura pol�tica, e n�o revolucionariamente derrub�-la. Mesmo sendo pouco abordado na forma��o do pensamento pol�tico chin�s, o mo�smo representa uma face igualmente ancestral da vis�o pol�tica chinesa, que se deduz de passagens como a do livro das Escrituras de Zhou (V, 1/1, 3) em que �o soberano � pai e m�e do povo�.

Dentre essas escolas de pensamento, a que venceu a batalha foi a dos ultra pragm�ticos legistas, pois o Imp�rio foi centralizado sob a espada do imperador Shihuangdi 秦始皇 (259 a 210 a.C.) � tendo sido Lisi 李斯o legista que o serviu na sua corte � e cujas medidas, ao conquistar o poder, foram unificar a escrita, a moeda e os pesos e medidas.[15] Weber aponta o fracasso dessa tentativa de unifica��o monet�ria que visava substituir as conchas, seda, estanho, p�rolas e pedras preciosas que eram usados como meio de troca e pagamento de tributos por moedas de cobre e ouro (WEBER 1951 p.4). Apesar disso, a consolida��o de um imp�rio centralizado foi levada a termo e os trabalhos com as �guas foram retomados. A integra��o entre norte e sul da China j� representava uma quest�o pol�tica crucial e a solu��o adotada foi a amplia��o da rede de canais para transporte entre o rio Amarelo e o Changjiang 长江 (Yang-ts� kiang), iniciados j� sob a dinastia Zhou. Como aponta Needham, a grande expans�o territorial (anexa��o das atuais prov�ncias de Fujian 福建, Guangdong 广东e Guangxi广西) empreendida pelo Imperador Qin deveu-se aos canais abertos nas bacias do Changjiang e Xijiang (NEEDHAM 1971 p. 191). Mesmo sendo essa uma obra relevante para a hist�ria da China, a dinastia Qin ficou mais famosa por iniciar uma outra obra: a Grande Muralha.

A constru��o dos canais, da Muralha e dos pal�cios de Shihuangdi, somados � crise gerada por um longo per�odo de guerra, agravaram mais a instabilidade pol�tica e as revoltas camponesas surgiam por toda parte. Quando o fraco sucessor de Shihuandi assumiu, a dinastia que duraria para todo o sempre se esfacelou ap�s 14 anos de exist�ncia (221 a 207 a.C.). Um dos l�deres revoltosos de origem humilde, Liubang (256 a 195 a.C.), chega ao poder e inicia a dinastia que se tornou a grande sistematizadora do pensamento pol�tico do Imp�rio chin�s, a dinastia Han (Han do oeste, 206 a.C a 25 d.C., e Han do leste, 25 a 220 d.C.). Tal processo de sistematiza��o iniciou-se com a an�lise da pungente quest�o: �Por que a dinastia Qin durou t�o pouco apesar de seu ineg�vel poder?�.

As medidas legistas s�o consideradas o motivo da �destrui��o de Qin�, pois o excesso de severidade de suas leis trazia �sofrimento ao povo� (YANG 1995, II p. 59). Entretanto, a unifica��o empreendida por eles havia proporcionado a estrutura de todo o desenvolvimento do que passou a ser chamado de China, isto �, o territ�rio e a cultura onde se espalhou a principal etnia da China hoje, denominada justamente etnia han, fato reconhecido tanto pelos conselheiros desta dinastia quanto pelos chineses de hoje.[16]Nesse in�cio da dinastia Han do oeste, as �Cem Escolas� voltaram a disputar seu espa�o, pois durante o reinado de Shihuangdi a supremacia legista fez com que livros fossem queimados e eruditos enterrados vivos e, portanto, recha�ou qualquer diverg�ncia no campo do pensamento. Surge ent�o as grandes articula��es entre as diferentes escolas.

A corte de Han valorizava o ritual como recurso na administra��o imperial, o que significa dizer que parte da vis�o legista de que o governo s� pode ser exercido pela coer��o foi substitu�da pela vis�o erudita de que cada funcion�rio imperial deve reconhecer sua posi��o na hierarquia como sendo o seu quinh�o de virtude a ser cultivado. Entretanto, apesar desse esp�rito erudito-confucionista, o in�cio dessa dinastia � marcado pelo tao�smo na vertente de um movimento filos�fico chamado �ensinamentos de Huang Lao�, fazendo refer�ncia ao Imperador Amarelo (Huangdi黄帝), figura lend�ria do tao�smo, e a Laozi. Come�a a ser aplicado o governo da �n�o-a��o�(wuwei 无为), o que do ponto de vista administrativo implicava em redu��o dos gastos da corte ao promover as id�ias de �sem desejos surge a tranq�ilidade, assim o mundo naturalmente se pacifica� (DaoDejing, cap. 37), �sem desejos pode-se governar o mundo� (DaoYuan), buscando com isso diminuir os impostos e conseq�entemente as revoltas camponesas que derrubaram Qin (idem p. 68).

Essa filosofia de Huang-Lao �, de acordo com a �Hist�ria Geral da Filosofia Chinesa�, organizada por Yang Xianbang (primeira edi��o de 1988), uma fus�o de princ�pios legistas, eruditos e tao�stas, pois as primeiras medidas de Liubang, no in�cio da dinastia Han, foram a promulga��o das �Tr�s Leis de Controle� (�Quem matar ser� morto, quem ferir ou roubar ter� a pena de ressarcir o mal cometido�) e da �Lei de Controle dos Impostos Imperiais� (�Reduzir o imposto sobre a terra cultivada, recolher uma parte de cada quinze�) (idem p. 58), o que denota uma forma de governo baseada na efic�cia da lei. A caracter�stica legista dessa promulga��o de Liubang � o fato de que, na vis�o dos eruditos, as leis n�o deviam ser de conhecimento p�blico, pois as conhecendo �o povo n�o mais respeitaria os governantes�, enquanto os legistas pensavam em torn�-las p�blicas justamente para que fossem temidas. O governo pela �n�o-a��o� do in�cio da dinastia Han era a combina��o de controle do povo, da cobi�a dos funcion�rios imperiais e dos gastos do Imp�rio atrav�s de uma pol�tica tribut�ria e de um r�gido c�digo penal legista, juntamente com a institui��o de escolas onde eram professados os preceitos ritual�sticos dos eruditos. � poss�vel perceber ainda a id�ia central do mo�smo, a de amor ao povo (agricultores, artes�os e comerciantes), na pol�tica desse per�odo, pois os primeiros imperadores han governaram para deixar o povo �descansar� depois de tantas guerras (idem pp.60 e 75).

Enfim, dentro de um universo conceitual posto pela disputa das Cem Escolas, os governantes passaram a articular pol�ticas para concretizar o ideal de eternidade de toda a dinastia. Contudo, mesmo com toda a sabedoria pr�tica e a grande capacidade de adapta��o do pensamento chin�s, existia ainda um terr�vel paradoxo: amplia��o e melhoria da rede de canais s� era realiz�vel por um governo centralizador, de �a��o� (Needham 1971, p. 216), no entanto um governo assim provocaria sua pr�pria destrui��o dado o custo � em tributos, vidas humanas e coes�o social � de uma obra dessa magnitude. Os governantes tomaram diferentes posturas frente a esse paradoxo, sendo alguns mais e outros menos centralizadores, ocasionando uma dial�tica de centraliza��o-desmembramento do Imp�rio que, segundo Needham, acompanhou os trabalhos de abertura dos canais. O grande apogeu cultural do medievo chin�s, a dinastia Tang (618 a 907 d.C.), marcou tamb�m o t�rmino da constru��o do Grande Canal, integrando o norte e o sul da China, e retirando assim essa press�o espec�fica na sociedade chinesa. Hoje ela retornou, n�o mais como uma necessidade urgente de constru��o de canais e regula��o dos rios, mas de controle da polui��o e preserva��o da �gua. Os tempos mudaram, mas parece que o elemento n�o.

Outros exemplos de articula��o dos diferentes pensamentos pol�ticos da China Imperial poderiam ser citados, como Lushi Cunqiu, os registros hist�ricos compilados em 213 a.C. por Lubuwei不韦, principal representante do que foi chamado �Escola Mista� e que construiu uma s�ntese entre confucionismo e tao�smo; ou os escritos de Huinanzi (179 a 122 a.C.), neto de Liubang e pr�ncipe do reino de Huinan, que invocou os princ�pios de �n�o-a��o� tao�sta para limitar o poder central e condenar determinadas �a��es� imperiais (leia-se restri��o ou apropria��o dos tributos), pois apesar do Imp�rio marcar uma centraliza��o e ruptura com o sistema de pr�ncipes �confederados� da dinastia Zhou, a pr�tica de concess�es de terras para as fam�lias nobres continuou e, com ela, os pr�ncipes insatisfeitos e rebeldes. O eixo de tens�o entre governo imperial e governantes locais � a pedra de toque do pensamento pol�tico chin�s desse per�odo.

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?
H� ainda os desenvolvimentos pr�prios de cada escola que tamb�m j� davam ind�cios de se influenciarem mutuamente, sendo que � tamb�m desse per�odo a ado��o do confucionismo como ideologia oficial do estado por obra do Imperador Wudi 武帝e empreendida por seu ministro Dong Zhongshu 董仲舒(179 a 104 a.C.). Entretanto, por mais confucionista (para ser fiel ao chin�s, dever�amos dizer �erudito�) que fosse Dong Zhongshu, seu pensamento buscou construir uma hierarquia dos valores conflitantes das v�rias escolas sem eliminar o alto grau de sincretismo daquele per�odo. A estrutura do seu pensamento carrega sem d�vida a assinatura confuciana ao priorizar o estudo dos cl�ssicos � particularmente os registros hist�ricos de Conf�cio, os �Anais da Primavera e Outono� � e o cultivo cavalheiresco da virtude como precondi��o para o exerc�cio das fun��es do Imp�rio, contudo, quando nos defrontamos com coloca��es como: �Educa��o � a raiz do governo, e as pris�es o seu limite; mesmo estando em pontos distantes, ambas tem uma s� fun��o�, ou ainda �Recompensar e distribuir honrarias para promover o cultivo da virtude; punir e castigar para tornar solene seu poder� (idem p.92), nos perguntamos se Conf�cio se identificaria com essa filosofia de �legista em pele de erudito�. Nesse sentido Dong Zhongshu foi um continuador de outro ministro imperial da dinastia Han, Jiayi (200 a 168 a.C.),[17] que propunha a articula��o necess�ria entre a �pol�tica da virtude� e a �pol�tica de opress�o�. A primeira significava tanto o est�mulo da virtude pela educa��o quanto afrouxar a pol�tica tribut�ria e penal � a �n�o-a��o� tao�sta dos governantes � e a segunda era a j� consagrada f�rmula legista. Para regular esses opostos, Dong Zhongshu estabeleceu a virtude como sendo a mais importante das duas pol�ticas e priorizou a quest�o da educa��o nos cl�ssicos eruditos como forma��o dos futuros funcion�rios imperiais. Est�, ent�o, sistematizada a base do mandarinato chin�s.

Ap�s as duas dinastias Han ocorre ent�o um primeiro desmembramento do Imp�rio no per�odo dos Tr�s Estados 三国 (221 a 265 d.C.), que correspondem a tr�s regi�es econ�micas chave do Imp�rio (Needham 1971,p. 214), internamente integradas, mas devido � insufici�ncia da rede de canais de transporte fluvial n�o permitiam um unidade pol�tica eficiente. Uma segunda centraliza��o, sob a dinastia Jin do oeste (265 a 317 d.C.), marca o surgimento da filosofia do Xuanxue 玄学 �o estudo do �mist�rio�, do �insond�vel� �, na qual as quest�es metaf�sicas do �vazio�,[18] das rela��es sutis entre o ser humano e o universo, s�o discutidas em reuni�es de pensadores de v�rias escolas, sendo esse per�odo considerado um momento de liberta��o em que as Cem Escolas voltaram a brilhar ap�s os anos de ortodoxia dos cl�ssicos eruditos. O Xuanxue tem como caracter�stica principal uma fus�o ainda mais profunda entre tao�smo e confucionismo (YANG 1995, II pp. 147 e 148). � desse per�odo tamb�m o crescimento de um outro importante ator no cen�rio do pensamento pol�tico chin�s: o budismo,[19] cujo profundo refinamento descritivo do mundo interior do ser humano encontrou no misticismo chin�s dessa �poca um interlocutor � altura.

O pensamento budista � e o futuro poder econ�mico e pol�tico dos seus monast�rios � foi um dos v�rtices, juntamente com o confucionismo e o tao�smo, do tri�ngulo pol�tico da posterior dinastia Tang, representando essa dinastia n�o s� a maturidade cultural e art�stica do Imp�rio chin�s, mas tamb�m a coroa��o do procedimento articulador dos pensadores imperiais. Se os canais das �guas foram constru�dos com a inten��o de unificar o territ�rio, os canais do pensamento foram constru�dos para unificar a mente.

Segue-se � dinastia Jin a fragmenta��o das dinastias do norte e do sul 南北朝 (479 a 581 d.C.), causada pelo desenvolvimento econ�mico do sul e pelos movimentos de independ�ncia dos nobres governantes locais que viviam sob um governo central distante � por motivos objetivos e terrenos, isto �, a dificuldade de deslocar tropas � e fraco � por motivos filos�ficos e celestiais, ou seja, a necessidade de  concess�es de privil�gios e recompensas para pregar a virtude, como rezava, convenientemente, a cartilha erudita.

A terceira centraliza��o sob a dinastia Sui (581 a 618 d.C.) foi um marco na quest�o do �governo das �guas�, pois o segundo imperador dessa dinastia, Yangdi 炀帝, acelerou a constru��o do Grande Canal, entre o rio Amarelo e o Changjiang, para superar a falta de integra��o entre norte e sul (que Needham considera mais apropriado chamar de centro e leste da China). A por��o oriental do Changjiang havia se tornado um importante centro produtor, mas seu afluente, o rio Huaihe 淮河, n�o chegava suficientemente at� o norte, onde estava o centro do poder imperial. A aten��o de Yangdi dividiu-se entre a interliga��o entre Huaihe e o norte, regi�o essa que � o campo de batalha mais tradicional da China, utilizando o canal para transportar suprimentos e tropas para combater as invas�es do norte, e a abertura de canais ao sul do Changjiang at� a cidade de Hangzou 杭州, integrando-se esse importante centro econ�mico ao resto do Imp�rio. Em 609, a grande rede � finalizada contando com aproximadamente 1800 quil�metros de canais.

Contudo, repetiu-se o que ocorrera com a dinastia Qin: os excessos do governo para recrutar m�o-de-obra � for�a e recolher os impostos necess�rios � constru��o do Grande Canal conduziram a mais levantes populares. Esse fato alimentou ainda mais a intensa reflex�o sobre os poss�veis benef�cios de um governo desp�tico. Um exemplo s�o as palavras de Yu Senxing 于慎行 (1545 a 1607), escritor da dinastia Ming:

N�o sabemos quantos anos do poder do Imperador Yangdi escoaram, perdidos, pelo Canal. Entretanto mais dez mil gera��es n�o substituiriam seus benef�cios para a posteridade. Ele n�o realizou um governo de bondade, mas seus m�ritos s�o grandiosos como o C�u. (citado por NEEDHAM, p. 230)

O custo humano e material necess�rio para construir essa integra��o entre o norte governante e o sul produtor foram incalcul�veis, mas o pensamento pol�tico chin�s continuou a lidar com esse tema de forma a pensar o custo como um sacrif�cio necess�rio, como mostra o trecho acima. A sabedoria de �governo das �guas� do Grande Yu envolvia o talento de perceber o fluxo natural dos rios e orient�-los para evitar a cat�strofe das enchentes. Os pensadores pol�ticos chineses aplicaram tal talento para operar a articula��o de propostas antag�nicas de governo, lidando com os movimentos da sociedade como se estes fossem o fluxo das �guas. Essa n�o � uma prova de harmonia e respeito � natureza e ao homem no campo da pol�tica, pois a inten��o era de que a for�a da sociedade servisse � integra��o e unifica��o do Imp�rio, assim como os canais abertos na terra. � a longa tradi��o chinesa de grandes programas governamentais.

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?
A dinastia que realmente colheu os frutos do Grande Canal foi a dinastia Tang, a �poca de ouro da hist�ria chinesa. A economia nesse per�odo cresceu intensamente impulsionada pelo com�rcio dentro e fora do Imp�rio devido � melhoria dos transportes fluviais, refor�ando muitas das complexas rela��es, enfocadas por Weber em sua an�lise da economia chinesa, entre governo imperial e os grupos de parentesco[20] (BENDIX 1986, pp. 111 a 114). A quest�o da press�o do governo imperial para a realiza��o de seus projetos hidr�ulicos pode ser considerada ao analisar o enfoque weberiano da aparente fraqueza do governo central na vida das aldeias e sua impot�ncia em muitas �reas da vida social, principalmente aquelas cuja prerrogativa era detida pelos grupos de parentesco. O pensamento pol�tico imperial chin�s considerou que centraliza��o excessiva era o in�cio da perda do poder e que, portanto, deveria ser exercido de formas sutis (fluidas como �gua, talvez), seja pela educa��o, seja pelo com�rcio de favores. Tal �sabedoria� chinesa foi citada por Montesquieu: �� uma perp�tua observa��o dos autores chineses que, quanto mais se via aumentar os supl�cios em seu imp�rio, mais pr�xima estava a revolu��o� (MONTESQUIEU 2005, p. 122).

Segue-se � dinastia Tang uma terceira descentraliza��o nas Cinco dinastias 五代 (907 a 960 d.C.), que na an�lise de Needham, baseando-se em Yi Caoding翼朝鼎, deveu-se � falta de aten��o que os �ltimos imperadores da dinastia Tang dedicaram �s obras hidr�ulicas. Talvez esse seja um posicionamento um tanto restrito, pois a quest�o das diferentes regi�es da China, do ponto de vista econ�mico e cultural e seu status frente ao governo central �, de certa forma, o grande motivo do talento articulador chin�s no campo do pensamento pol�tico, o que toca quest�es al�m das abordadas aqui, como a intersec��o entre culto aos antepassados e sua identidade familiar e regional e a m�quina administrativa conduzida por mandarins enviados da capital. Apesar disso, pode-se analisar essa terceira descentraliza��o atrav�s da perspectiva de que os canais constru�dos por Shihuangdi, para a unifica��o, e ampliados na dinastia Sui, para a integra��o do Imp�rio, tiveram o inesperado efeito de fortalecimento das ditas regi�es econ�micas chave que pleitearam sua independ�ncia mais uma vez (NEEDHAM pp. 248 e 249).

No entanto, a partir da dinastia Tang pode-se dizer que o Imp�rio, do ponto de vista do pensamento pol�tico e da forma��o do quadro administrativo (o concurso p�blico para os cargos na burocracia imperial foi consolidado nesse per�odo), estava estabelecido, e como sinteticamente abordado at� aqui, em tal processo esteve presente a arte de regular e articular as ��guas do poder�. Apresento abaixo a presen�a dos trabalhos de administra��o dos rios nas dinastias seguintes, de acordo com Needham, que se restringiram basicamente � manuten��o dos canais, e com isso estabelecer a linha hist�rica que nos levar� ao atual �governo das �guas� e sua nova face.

Seguiu-se uma quarta centraliza��o, e �ltima para Needham, com a dinastia Song do norte 北宋 e, ap�s a invas�o mongol, com a Song do sul 南宋 (960 a 1279 d.C.), que ao longo de seu governo realizou 496 obras relativas a transporte fluvial e represamento de lagos e rios para agricultura, as quais comparadas �s 91 obras da dinastia Tang oferecem um par�metro do interesse dos mandarins da dinastia Song em �governar a �gua�. No final do s�c. XIII os mong�is invadiram os territ�rios da dinastia Song e iniciaram sua dinastia Yuan (1260 a 1368 d.C.), e mesmo sendo um povo �estrangeiro� em terras chinesas mantiveram a tradi��o burocr�tica de aten��o � administra��o dos rios (idem p. 267). A dinastia Ming (1368 a 1644 d.C.), que sucedeu os mong�is, melhorou e aprofundou o leito dos canais, al�m de realizar in�meras obras governamentais como: estradas, parques, templos, cemit�rios; e chegou a contar com uma burocracia estatal de mais de 100 mil funcion�rios imperiais (os militares contavam 80 mil) (idem p. 272). A tradi��o de extensa burocracia imperial prosseguiu com os manchus da dinastia Qing (1644 a 1911).

A Rep�blica da China (1912 a 1949) e Rep�blica Popular da China (1949 aos dias atuais) sem d�vida representaram rupturas e ressignifica��es da tradi��o pol�tica chinesa, pois estava derrubado o Imp�rio. Entretanto, excetuados os processos de transi��o din�stica e revolu��es republicana e comunista, a China manteve sua integridade territorial b�sica entre norte e sul. Um argumento para justificar essa unidade do estado chin�s ap�s a dinastia Song, mesmo passando por tr�s dinastias � Yuan, Ming e Qing � e as rep�blicas do s�culo XX, � o fato de que o Grande Canal possibilitou uma real e efetiva integra��o, podendo ser descrito como um segundo �governo das �guas� depois do Grande Yu.

Hoje o �governo das �guas� aparece no discurso das autoridades chinesas com um significado muito diferente. N�o � mais o excesso, como nas enchentes de Yu, � a escassez. N�o � mais abertura de canais, � a pr�pria �gua que est� em falta.

Levantar a quest�o do �governo das �guas� � relevante pelo fato de que o  discurso atual, oficial ou n�o-oficial, sobre o problema dos recursos h�dricos utiliza esse mesmo termo: zhi shui 治水, o que confere ao atual desafio chin�s uma aura de continuidade dos grandes empreendimentos do passado. Deixando de lado o fato de que a l�ngua chinesa � excelente para a cria��o de slogans, dada a caracter�stica de ser concisa e ao mesmo tempo abrangente, o zhi shui moderno � um grande programa chin�s relacionado �s obras hidr�ulicas e de saneamento, controle da polui��o, regulamenta��es do uso e economia do consumo da �gua tendo em vista a situa��o cr�tica na qual a China se encontra, e que precisa legitimar-se frente � popula��o, mesmo desafiando frontalmente a �menina-dos-olhos� da China moderna: o desenvolvimento econ�mico.

O uso da �gua na China (disponibilidade de 2800 km�/ano, que corresponde a 6,9% da �gua mundial, e � utilizado 16%)[21] se divide da seguinte forma: 6% para uso dom�stico, 7% para ind�stria e 87% para agricultura[22] (GNADINGLER 2004, p.8). O uso maci�o da �gua do rio Amarelo na agricultura come�ou nas d�cadas de 1960 e 1970, quando cada governador de prov�ncia precisava garantir a produ��o de um saco de arroz ou de trigo por pessoa ao ano. Caso n�o conseguisse, tinha de renunciar (idem, p. 2). Resultou que no ano de 1972 esse rio, ber�o da civiliza��o chinesa, deixou de chegar ao mar por 15 dias. A vis�o do leito seco do rio retornou alternadamente at� 1985, e em 1997 n�o chegou ao mar por 226 dias (BROWN 2001). A situa��o � complexa, pois a agricultura chinesa tem a dif�cil miss�o de alimentar 1 bilh�o e 300 milh�es de pessoas (adiciona-se a isso a tradi��o e o orgulho de auto-sufici�ncia em gr�os) e a ind�stria precisa empregar a por��o economicamente ativa desse contingente. A op��o tem sido o desvio da �gua da agricultura para a ind�stria � gerando grandes d�ficits na produ��o de gr�os �, pois mil toneladas de �gua produzem uma tonelada de trigo a um valor de US$ 200,00, e essa mesma quantidade aplicada � ind�stria aumentaria a sua produ��o em US$ 1.200,00 (idem). Para uma economia que busca intensamente o crescimento econ�mico, essa � uma conta muito atraente.

O dilema �economia versus meio ambiente� foi abordado da seguinte forma por um importante jornal chin�s, o zhong guo ri bao中国日报, em um artigo de 05 de abril de 2005, publicado originalmente no seman�rio �Novo S�culo�, xin shi ji新世纪:

Por que o resultado de mais de dez anos de saneamento do Huaihe n�o � vis�vel? Por que a eros�o em Fengshan Yulin (prov�ncia de Hebei) piora cada vez mais? Por que os �rg�os de prote��o ambiental n�o conseguem deter a polui��o industrial? Especialistas apontam: esse � o resultado da desequilibrada batalha entre os emergentes centros industriais e as fontes naturais!

O artigo toca ainda em uma quest�o de honra: as metas relativas ao meio ambiente do d�cimo plano q�inq�enal aprovado pela Nona Assembl�ia Popular Nacional em 15 de mar�o de 2001, a serem atingidas em pouco menos de um ano na �poca em que o artigo foi publicado. Em seu quarto cap�tulo, artigos 13, 14 e 15, o plano trata do tema �popula��o, recursos e meio-ambiente�, estabelecendo pesadas a��es de engenharia e gest�o ambiental em regi�es-chave, como as bacias dos rios Amarelo e Changjiang, da Mong�lia interior, al�m de rigoroso controle da polui��o dos rios e lagos. A nova legisla��o da �gua, xin shui fa新水法, seria promulgada em outubro do ano seguinte. Mas o rep�rter do citado artigo, Wang Quanbao 王全宝,apontou que restava ao menos um ter�o das a��es governamentais ainda por fazer, pois a China ainda estava longe de atender a necessidade de retirar as 58 milh�es de toneladas de poluentes de seus rios e investir o total de 120 bilh�es de yuan (US$ 15 bilh�es) em infra-estrutura de tratamento de esgoto urbano, previstos para a concretiza��o das metas. Em tempo, o nome do artigo �: �A dificuldade de �governar a �gua� (zhi shui) em meio � batalha entre economia e meio-ambiente�.[23]

Nos debates que antecederam ao plano q�inq�enal foi publicado um artigo, assinado pelo renomado engenheiro Zhang Yue张岳, no jornal do Ex�rcito da Liberta��o Chin�s (22/11/2000) comentando uma orienta��o do Comit� Central do Partido Comunista Chin�s relativa � quest�o ambiental a ser inclu�da no plano q�inq�enal. Suas palavras iniciais d�o o tom do simbolismo desse tema no cen�rio pol�tico atual ao citar um antigo prov�rbio: �Para governar um pa�s deve-se primeiro governar a �gua. Somente governando a �gua, o pa�s ficar� em paz.�, e completa: �...essa � a li��o que a hist�ria nos mostra�.[24]

Muitos outros artigos, campanhas, programas governamentais poderiam ser citados, todos utilizando o �governo das �guas� como ponto central. Limitei-me �s duas cita��es acima por consider�-las suficientemente elucidativas do seu retorno ao cen�rio pol�tico, no qual aquele esp�rito articulador do Grande Yu est� sendo duramente desafiado a lidar com o que foi sua met�fora fundadora: a �gua. A civiliza��o chinesa � essencialmente ligada � �gua, cuja maleabilidade e a��o constante foram fonte de inspira��o para muitos pensadores e poetas ao longo de sua hist�ria. A forma��o do pensamento pol�tico pode ser descrita igualmente por essa met�fora, no entanto, mesmo com tantos usos filos�ficos e pr�ticos, a �gua n�o resistiu aos continuados abusos caracter�sticos do desenvolvimento moderno. A capacidade de articula��o dos pensadores pol�ticos chineses est� sendo testada no equil�brio entre economia e meio-ambiente, seja no ponto de vista das id�ias quanto no da a��o, e o presente artigo tem como objetivo apresentar a perspectiva hist�rica que a contextualiza.

Vale lembrar que o ideograma chin�s �governo�, zhi, � formado pelo radical ��gua� � shui �, e pelo ideograma tai que tem os significados de: plataforma, terra�o, fortaleza, eminente, respeit�vel, ou seja, o conceito original de governo foi representado pelo poder � eminente e respeit�vel � de controlar a �gua. Poder-se-ia dizer, ent�o, que na pr�pria forma��o da l�ngua chinesa ��gua� e �governo� estiveram unidos, sendo o �governo das �guas� etimologicamente uma redund�ncia.

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[1] Utilizarei as express�es �governo da(s) �gua(s)� ou �governar a �gua� dependendo do contexto, mesmo sabendo das diferentes conota��es poss�veis em portugu�s, pois o termo original em chin�s pode ter tanto a primeira como a segunda acep��o.

[2]Em uma mistura de tradi��o e modernidade tipicamente chinesa, um site dedicado ao Grande Yu (www.tw.pte.sh.cn/jicengtjwy/luochuanxx/zp/dy.htm) produzido por um grupo de jovens da Associa��o Educativa do Comit� dos Trabalhadores do bairro de Putuo em Shanghai, cont�m a seguinte enquete: �Foi Yu um bom pai?�. Pode-se votar nas seguintes op��es: �sim�, �n�o�, �mesmo sendo um mau pai, foi tamb�m um bom pai� e �n�o sei�.

[3] Mantive os n�meros �nove� e �quatro� por sua simbologia, sendo que o primeiro simboliza �v�rios� e o segundo simboliza �toda a extens�o�. Joaquim A. Guerra traduz �os quatro mares� por �toda a vastid�o do Imp�rio�. Mantive os �mares� pois trato aqui da �gua e suas implica��es sociais e pol�ticas.

[4] � interessante frisar que nos 500 li (um li corresponde a 0,5 km) quadrados do dom�nio de pacifica��o (todos tinham essa mesma �rea), 300 s�o dedicados � educa��o e os outros 200 ao treino militar.

[5]A historiografia chinesa hoje descreve essa primeira estrutura social como �sociedade escravista�, diferente da �sociedade feudal� surgida progressivamente a partir do Imp�rio com a primeira unifica��o da dinastia Qin (221 a 206 a.C.).

[6]Justi�a seja feita aos textos de outras escolas que n�o a tao�sta que apresentam o Tao como relativo ao governo, sendo tanto a capacidade como a a��o do governante. Os cl�ssicos utilizam esse termo para fazer men��o �s ordens imperiais. Obviamente tal aproxima��o do Tao com o governo n�o elimina sua conota��o de princ�pio universal, espiritual, transcendente, pois a cultura chinesa antiga era basicamente uma uni�o de cosmologia e pol�tica. A translitera��o oficial, o Pinying, grafa esse ideograma com �d� ao inv�s de �t�. Nas refer�ncias seguintes usarei, portanto, essa translitera��o.

[7]A literatura sobre a hist�ria chinesa antiga, em portugu�s, geralmente opta pela tradu��o �legalista�, mas, para evitar confus�es com o significado desse termo na hist�ria do Ocidente, optei pelo �legismo� de fontes portuguesas como: MARTINS, Dora. Os princ�pios confucionistas da ideologia chinesa actual. In: Estudos sobre a China VI. Lisboa: Instituto Superior de Ci�ncias Sociais e Pol�ticas, 2004.

[8]Zong quer dizer vertical, ou eixo norte-sul, e heng, horizontal, ou leste-oeste, e est� relacionado aos alinhamentos pol�ticos-militares entre os reinos do per�odo de Primavera e Outono, conduzidos por �diplomatas� das diferentes cortes. Os seis reinos fracos do eixo norte-sul se uniram para atacar o poderoso reino de Qin, a oeste, formando a �uni�o vertical�, hezong合纵. Entretanto, por a��o de Zhangyi张仪, do reino de Qin, cada um desses reinos procurou se aliar de forma independente a esse �nico reino poderoso, as �alian�as horizontais� lianheng 连横, com a garantia, n�o cumprida posteriormente, de n�o serem invadidos. N�o � preciso dizer que a �uni�o vertical� n�o sobreviveu, assim como nenhum dos seis reinos, sendo a primeira unifica��o da hist�ria chinesa realizada pelo Shihuangdi de Qin. A Escola dos �diplomatas� que atavam e desatavam tais alian�as se caracteriza pelo cultivo da ret�rica e por um senso de pragmatismo que os coloca em oposi��o aos eruditos, e em certa afinidade com a realpolitik dos legistas e militares.

[9] A �Arte da Guerra�, de Sunzi, � a grande obra dessa escola.

[10]Tais pensadores se preocupavam com a dif�cil rela��o entre os nomes e as coisas. A express�o �corrigir os nomes� citada por Conf�cio, e por outros pensadores da �poca, ou ainda �o nome que pode ser nomeado, n�o � o nome verdadeiro� do in�cio do Daodejing (Tao Te King) de Laozi (Lao-ts�), s�o reflexos dessa intensa discuss�o do per�odo. Uma cita��o pr�pria dos pensadores dessa escola � o paradoxo: �cavalo branco n�o � cavalo�, de Gong sunlong 公孙龙(320 a 250 a.C.).

[11]Para constar, as outras escolas citadas por Bangu, e n�o por Shimatan, s�o: a Escola Mista (zajia 杂家), nome dado ao processo, que veremos a seguir, de fus�o do pensamento de todas as escolas;e Escola dos Escritores (xiaoshuo小说家), cujos registros estavam relacionados ao shuo (�falar�, �transmitir oralmente�), isto �, seriam os pensadores que compilavam as transmiss�es orais e lendas da antiguidade chinesa.

[12]Pensador do per�odo dos �Estados Combatentes�, que viveu entre 280 e 233 a.C. e sintetizou os princ�pio de governo dos legistas na obra que passou a levar o seu nome.

[13] As aplica��es de tais princ�pios na pol�tica ser�o abordados adiante, no entanto, as coloca��es de Laozi s�o particularmente paradoxais, como se percebe nessas passagens, o que permite ao leitor interpret�-las de diversas maneiras e em v�rias �reas da vida.

[14]Tradu��o de Mario Bruno Sproviero, com algumas altera��es.

[15]A determina��o de uma bitola padr�o para as carruagens fez parte dessa unifica��o de medidas e expressa bem as preocupa��es dos legistas, pois em uma �poca em que as estradas eram sulcos na terra, carruagens de diferentes bitolas n�o circulavam em uma mesma regi�o, dificultando a integra��o do territ�rio.

[16]O filme �Her�i� (com o astro de Kung fu, Jet Li), lan�ado em 2005, traz esse paradoxo �governo severo-governo bom� na figura de Shihuangdi. � bom lembrar que essa quest�o da hist�ria chinesa passou a ser o grande precedente para legitimar �penas severas, leis rigorosas� de qualquer �poca na China.

[17] Needham cita o di�logo entre o primeiro imperador dos Han e o conselheiro deste, que sempre se expressava em linguagem po�tica. �Consegues fazer poesia em cima de um cavalo (nas campanhas militares)?�, perguntou o Imperador. Jiayi respondeu �O Imperador por acaso n�o governa em cima de um cavalo?... unir erudi��o e for�a militar � a arte [de governo] de longo prazo� (p. 197).

[18]Um dos grandes temas do pensamento chin�s foi o debate em torno da exist�ncia ou n�o de uma �mat�ria original�, sendo alguns partid�rios da tese de que nada existia no in�cio do universo, o �vazio�, e outros acreditavam que havia elementos primordiais. Nesse debate contribu�ram os ensinamentos da Escola do Yin e Yang, que internamente abarcava tanto os partid�rios do �vazio� como os que buscavam a ess�ncia material das coisas.

[19]As implica��es e articula��es espec�ficas causadas pelo encontro do budismo com a China n�o ser�o tratadas aqui por exigir uma abordagem mais aprofundada de sua forma��o na �ndia, sua chegada � China, a tradu��o e apropria��o desse pensamento por parte da civiliza��o chinesa. Mas, para o prop�sito desse artigo, qual seja, o de real�ar a influ�ncia do modo chin�s de administra��o dos rios na forma��o do pensamento pol�tico da China imperial, podemos nos limitar � matriz conceitual de articula��o das Cem Escolas nesse constante esfor�o de interligar e regular as tend�ncias pol�ticas, esse permanente movimento de altern�ncia centraliza��o-fragmenta��o, ortodoxia-pluralidade, ocorrido nas cortes imperiais chinesas.

[20]Para Yang, na �Hist�ria Geral da Filosofia Chinesa�, as rela��es cruciais do Imp�rio chin�s ocorria entre a corte imperial, os nobres donat�rio de terras, os propriet�rios n�o-nobres (onde melhor se insere o conceito weberiano de grupo de parentesco) e os camponeses (arrendat�rios das terras e fonte de m�o-de-obra para os campos e para a guerra).

[21]A t�tulo de compara��o o Brasil tem a disponibilidade de 6950 Km�/ano, que corresponde a 17% da disponibilidade mundial e � utilizado 1%.

[22]No Brasil os n�meros s�o: 43% para uso dom�stico, 17% para ind�stria e 40% para agricultura.

Qual o nome dos rios importantes para a origem e desenvolvimento da sociedade chinesa?

Quais rios foram importantes para a formação do povo chinês?

Dois rios que nascem nas montanhas, correm por ela: o Huang-Ho (também chamado de rio Amarelo) e o Yang-Tsé-Kiang. Semelhante ao que ocorreu no Egito em relação ao rio Nilo, o rio Huang-Ho favoreceu o desenvolvimento da agricultura e o surgimento de cidades na região.

Quais são os dois rios importantes para China?

Junto com o rio Amarelo, o Yang-Tsé é o rio mais importante da história, cultura e economia da China. O próspero Delta do Yangtze gera 20% do produto interno bruto chinês.

Que rios foram muito importantes para o desenvolvimento das civilizações?

Irrigado pelos rios Jordão, Eufrates, Tigre e Nilo, que compreende hoje os territórios de Palestina, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbano e Chipre, além de partes da Síria, do Iraque, do Egito, do sudeste da Turquia e sudoeste do Irã, o Crescente Fértil foi onde as primeiras grandes civilizações se desenvolveram.

Quais rios foram importantes para o desenvolvimento da sociedade egípcia mesopotâmica chinesa e indiana?

Mesopotâmia foi uma região localizada entre os rios Tigre e Eufrates. Durante a Antiguidade Oriental, ela abrigou diversas civilizações, como os babilônicos e os assírios. Mapa da região em que a Mesopotâmia estava localizada. A Mesopotâmia foi uma região localizada entre os rios Tigre e Eufrates.