A POLÍTICA E AS BASES DO DIREITO EDUCACIONAL Show EVALDO VIEIRA* * Advogado, sociólogo, especialista em Direito e Doutor em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP); foi professor titular na USP, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). E-mail:
I A política social percorre dois momentos políticos distintos e marcantes do século XX no Brasil: escrevendo sobre tal assunto anos atrás (1995, p. 229-233), denomino o primeiro período de controle da política, correspondendo à ditadura de Getúlio Vargas e ao populismo nacionalista, com influência para além de sua morte em 1954; e o segundo período, de política do controle, cobrindo a época da instalação da ditadura militar em 1964 até a conclusão dos trabalhos da Constituinte de 1988. Nesses dois períodos, a política social brasileira compõe-se e recompõe-se, conservando em sua execução o caráter fragmentário, setorial e emergencial, sempre sustentada pela imperiosa necessidade de dar legitimidade aos governos, que buscam bases sociais para manter-se e aceitam seletivamente as reivindicações e até as pressões da sociedade. A política social acha-se no terceiro período de existência no Brasil, depois de 1988, que chamo de política social sem direitos sociais. Em nenhum momento a política social encontra tamanho acolhimento em Constituição brasileira, como acontece na de 1988 (artigos 6º a 11): nos campos da Educação (pré-escolar, fundamental, nacional, ambiental etc.), da Saúde, da Assistência, da Previdência Social, do Trabalho, do Lazer, da Maternidade, da Infância, da Segurança, definindo especificamente direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, da associação profissional ou sindical, de greve, da participação de trabalhadores e empregadores em colegiados dos órgãos públicos, da atuação de representante dos trabalhadores no entendimento direto com empregadores. O capítulo II, do Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), alude aos direitos sociais, pertencentes à Constituição de 1988. De outra parte, poucos desses direitos estão sendo praticados ou ao menos regulamentados, quando exigem regulamentação. Porém, o mais grave é que em nenhum momento histórico da República brasileira (para só ficar nela, pois o restante consiste no Império escravista), os direitos sociais sofrem tão clara e sinceramente ataques da classe dirigente do Estado e dos donos da vida em geral, como depois de 1995. Esses ataques aos direitos sociais, em nome de algo que se pode intitular de "neoliberalismo tardio" ou em nome da "modernização", alimentam-se no campo da política social, de forma geral, de falsas polêmicas. Geralmente, as análises relacionadas com a política social se debatem na falsa contraposição entre neoliberalismo e social-democracia. Ou, o mais sério, elas contrapõem o que chamam de política social neoliberal à política social de cunho social-democrata. Fazem uma tipologia dos Estados, fixando a oposição entre Estado de bem-estar liberal e Estado de bem-estar social-democrata, para em seguida, por vezes, admitir o surgimento de nova fase da acumulação capitalista (Laurell, 1995, p. 151-178). Tais análises maniqueístas, que confrontam o Estado de bem-estar liberal com o Estado do bem-estar social-democrata, ou então a política social neoliberal com a política social de cunho social-democrata, mostram o limite das possibilidades nelas contidas, reduzindo o futuro imediato da história à social-democracia. Nessas análises maniqueístas nada sucederá no futuro histórico, no novo século e no novo milênio, além da social-democracia. Curiosamente, essas análises dão o nome de política social neoliberal àquela política que nega os direitos sociais, que garante o mínimo de sobrevivência aos indigentes, que exige contrapartida para o gozo dos benefícios, que vincula diretamente o nível de vida ao mercado, transformando-o em mercadoria. Em geral, as políticas sociais envolvem direitos sociais, projetos, diretrizes, orçamentos, executores, resultados, impactos etc. Evidentemente, as políticas sociais devem sempre passar por avaliação, em qualquer lugar e época, constituindo exigência obrigatória quando custeadas com recursos pertencentes às sociedades. Porém, com a falta desses recursos fornecidos pelas sociedades, irrompem a cognominada "crise fiscal do Estado" e a febre avaliatória, pululando então avaliadores. No Brasil, desde o tempo da elaboração da Constituição de 1988, a febre avaliatória ganha dimensão de epidemia e os avaliadores metamorfoseiam-se em festejados demiurgos, com a justificativa de preservar o bem e o patrimônio públicos, como se antes desta Constituição tal imperativo não existisse, nem se colocasse como irrevogável. Os direitos sociais, os projetos, os executores, os processos, a eficiência, a eficácia, os resultados e os impactos das políticas sociais são em geral vistos e examinados pelos avaliadores como elementos de igual valor. O insidioso raciocínio localiza-se exatamente neste ilusório relativismo dos elementos das políticas sociais, apregoado pelos avaliadores. Em verdade, tais elementos dispõem de valores desiguais: por exemplo, não se suprimem a vida e a liberdade por onerarem o orçamento ou inexistirem fontes de financiamento para elas, embora abundem os defensores desta posição irracionalista. Na avaliação dos elementos das políticas sociais, o mínimo esperado é que os direitos sociais gozem da posição de respeito e de superioridade, por inclusive participarem da Constituição de 1988, uma das mais livremente votadas no Brasil, integrando o Título II, relativo aos Direitos e Garantias Fundamentais. Caso contrário, sobra apenas como fúnebre consolação curvar-se ao irracionalismo da meritocracia e ao seu relativismo nas políticas sociais. No caso brasileiro, depois da extinção dos direitos sociais, quem sabe se não chegará a vez de fraquejarem o Estado de direito e o regime democrático-liberal? A tradição histórica do Brasil revela constante intervenção estatal no âmbito da política social, alicerçada ao longo do século XX em direitos sociais variados e gradativamente conquistados. A política econômica brasileira é exemplar neste aspecto: mesmo em ocasiões de negação explícita de sua presença na economia, o Estado funciona como salvaguarda e como propulsor dos detentores de capital. Agora, nesta etapa de desemprego em massa e de privações ilimitadas, a intervenção estatal é imprescindível para concretizar os direitos sociais contidos na Constituição de 1988, visando construir e afiançar a segurança social no Brasil. II A idéia de sociedade civil está ligada ao pensamento liberal, que ganha projeção no século XVIII e representa a sociedade dos cidadãos. O termo civil aqui significa que a sociedade forma-se de cidadão, entendido como aquele que tem direitos e deveres. Nessa época em que a palavra "cidadão" sobressai, ela se contrapõe à palavra "súdito", que quer dizer aquele que obedece. A temática relacionada com a sociedade civil liga-se ao conceito de cidadão. Civil, que indica cidadão, ganha complexidade com o passar do tempo. Os direitos mais restritos, existentes dentro do conceito de cidadão, transformam-se em muitos direitos de cidadania, tornam-se direitos civis (as garantias individuais), direitos políticos (por exemplo: de reunião, de expressão de pensamento, de voto, de organização de partido) e depois, no século XX, direitos sociais. Os direitos sociais são recentes, posteriores à Primeira Guerra Mundial, ou seja, posteriores a 1919. Portanto, a idéia de sociedade civil sugere a idéia de cidadania de uma sociedade criada dentro do capitalismo, de uma sociedade vista como um conjunto de pessoas iguais em seus direitos. Nesta sociedade, cidadania representa igualdade jurídica. Há quem elabore outros conceitos de cidadania, considerando-a igualdade social, igualdade real. De fato, a cidadania fundamenta-se no princípio de que as pessoas são iguais perante a lei e unicamente perante a lei, porque a cidadania consiste em instrumento criado pelo capitalismo para compensar a desigualdade social, isto é, a situação em que alguns acumulam riquezas, acumulam propriedades, enquanto outros não. Então, não existe cidadania sem garantias de direitos, não existe cidadania sem igualdade jurídica. Alguns defendem o princípio de que ocorre uma cidadania sem o Estado. Defendem que é possível desenvolver uma cidadania em que os próprios grupos estabelecem-na. Por outro lado, é certo que os direitos de cidadania historicamente nascem na sociedade, que nascem entre os trabalhadores, entre os miseráveis, entre os despossuídos. Eles reivindicam seus direitos e conseguem ao longo de mais de dois séculos para cá alcançar alguns deles. Os direitos gerados dentro da cidadania só se transformam em leis, em imperatividade jurídica, quando são conquistados e impostos. Os direitos sociais, por exemplo, florescem com uma guerra mundial, a Primeira Guerra Mundial, e depois a Segunda Guerra Mundial permite o aparecimento do chamado "Estado do Bem-Estar Social", em certos países industrializados. Os principais direitos fundamentais compõem o chamado Estado de direito democrático. O Estado de direito aparece no liberalismo, todavia o Estado de direito democrático impõe algo mais: o princípio da soberania popular. Este princípio diz que o governo e o Estado necessitam de legitimidade vinda do povo. O Estado de direito democrático requer soberania popular, em geral enganosamente entendida como expressão do voto. Alega-se o seguinte: o Estado é democrático porque há o voto. Ingenuidade flagrante, porque o Estado pode ser antidemocrático e ter o voto. Napoleão I estabeleceu uma tirania na França, a partir do final do século XVIII, realizando plebiscito e ganhando com enorme maioria de votos. O consenso eleitoral representa algo fugidio e a sociedade não pode ficar nisto, não pode fundar nela a legitimação democrática do Estado, é imprescindível o controle social dele. O Estado de direito democrático exige o voto universal, o voto para todas as pessoas, mas o voto não passa de um de seus componentes para garantir a soberania popular. Outro componente básico é o controle social da administração pública. Determinadas sociedades permitem maior controle social da administração pública do que outras. Como forma de ação democrática, o controle social da administração pública representa um dos elementos mais importantes da democracia. A democracia não constitui um estágio, ela constitui um processo. O processo pelo qual a soberania popular vai controlando e aumentando os direitos e os deveres é um processo prolongado, implicando avanço muito grande dentro da sociedade. Quanto mais coletiva é a decisão, mais democrática ela é. Qualquer conceito de democracia, aliás há vários deles, importa em grau crescente de coletivização das decisões. Quanto mais o interesse geral envolve um conjunto de decisões, mais democráticas elas são. O Estado e o governo sofrem processo de democratização ou de antidemocratização. Quanto menos interesses coletivos, quanto menos coletivização existe nas decisões e, portanto, quanto mais particularização existe nas decisões, menos democrático ou nada democrático é o governo. Se a sociedade é fortemente democrática, tende a construir governo democrático, mas sociedade dominantemente autoritária, discriminatória, violenta, não tende a sustentar esta espécie de governo. O Estado não cria a sociedade, mas acontece o contrário. Determinada sociedade expressa em determinado Estado e em determinado governo suas necessidades individuais e grupais, suas ansiedades, seus preconceitos, suas contradições e sua maldade, os quais estão presentes em várias circunstâncias passíveis de análise. III A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, estabelece direitos civis, políticos e sociais. A realização desses direitos exige a mobilização da sociedade, porque dela nascem as necessidades e as angústias. Com relação à política educacional, a Constituição Federal de 1988 concede amplos direitos, confirmando e ampliando o interesse social pela educação. Desde a Constituição monárquica de 1824, a primeira Constituição brasileira, a educação irrompe como o fundamento da política social, que só alcança maior abrangência durante o século XX. No final deste século, falou-se bastante a respeito da educação e de sua importância, porém muito se desarticulou a aplicação dos direitos educacionais. Nina Beatriz Ranieri descreve a participação estatal na educação superior, da seguinte maneira:
A atuação do Estado brasileiro não é diferente nos outros ramos de ensino, notadamente no fundamental e no médio. A Constituição determina a vida social, política e jurídica do Brasil, organizando o Estado. Ao ordenar a sociedade e o Estado, a Constituição também dispõe sobre a educação e sobre a forma de concretizá-la. Assim, quando se buscam as bases do Direito Educacional, o ponto de partida deve estar na Constituição, naqueles princípios abrangentes, capazes de multiplicarem-se em muitos direitos, em muitas garantias e muitos deveres. Neste caso, é necessário considerar o artigo 3º da Constituição Federal de 1988:
Entrelaçando educação e desenvolvimento, Pinto Ferreira considera o seguinte:
A presença da educação na Constituição Federal deve ser examinada necessariamente com base nesses objetivos expostos no artigo 3º, dos quais ela não pode estar de nenhum modo afastada. Os princípios básicos, contidos no artigo 3º da Constituição, devem influir na teoria e na prática educacionais derivadas do Capítulo III, denominado "Da Educação, da Cultura e do Desporto", no Titulo VIII (Da Ordem Social), juntamente com outros preceitos distribuídos ao longo do texto constitucional. Por outro lado, os direitos e garantias fundamentais, discriminados no Título II, da Constituição Federal de 1988, constituem os outros princípios básicos a serem obedecidos na teoria e na prática educacionais, contidas no Capítulo III, do Título VIII. Estes direitos do homem somente se realizam quando estão sustentados nas garantias constitucionais, não tendo, sem elas, qualquer validade prática. Os principais direitos do homem são declarações e as garantias fundamentais representam os instrumentos necessários à efetivação deles. A ordem constitucional do Brasil protege a vida, a liberdade, a segurança e a propriedade de todos que estejam a ela subordinados. Portanto, nesta ordem constitucional se incluem os direitos educacionais especialmente do aluno, do professor, da escola e da família. Por sinal, estes direitos e garantias fundamentais já constam da Declaração Universal de Direitos, aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas então reunida em Paris, no dia 10 de dezembro de 1948, da qual o Brasil é signatário. Antes da Constituição Federal de 1988, o Brasil reconhece o que está escrito na "Proclamação" de 1948, a qual alude ao ensino e à educação:
Ocupando-se particularmente da educação, a Declaração Universal de Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas (ONU), feita em 1948, prescreve:
Em certo sentido, a comunidade internacional, na qual o Brasil se insere, por intermédio da Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU, antecede e inspira a Constituição Federal de 1988, somando-se às exigências da sociedade brasileira, também no campo educacional, além de outros. Relativamente à educação, o Brasil submete-se a pactos internacionais, firmados por ele, como por exemplo só na década de 1990: a Conferência Internacional de Educação para Todos, Jomtien, Tailândia, 1990; a Declaração de Nova Delhi, Índia, 1993; a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, Cairo, Egito, 1994; a Cúpula Mundial de Desenvolvimento Social, Copenhague, Dinamarca, 1995; a 4ª Conferência sobre a Mulher, Beijing, China, 1995; a Afirmação de Aman, Jordânia, 1996; a 45ª Conferência Internacional da Unesco, Genebra, Suíça, 1996 e a Declaração de Hamburgo, Alemanha, 1997. Quanto à gratuidade na educação, destaque-se o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1992, que a assegura no artigo 13:
IV Como se notou antes, a educação se apresenta em todas as Constituições do Brasil, na imperial de 1824 e nas demais republicanas: de 1891, 1934, 1946, 1967 e de 1988. A Constituição da monarquia brasileira traz dois itens, de números 32 e 33, do artigo 179, que se referem à educação. O primeiro item garante a gratuidade da educação primária e o segundo item faz menção à criação de colégios e de universidades. A persistência da atividade educativa nas Constituições do Brasil pode dar a impressão de que pode ser verdadeira, ao menos quanto a ela, sua presunção da constitucionalidade. Carlos Maximiliano afirma: "Forte é a presunção da constitucionalidade de um ato ou de uma interpretação, quando datam de grande número de anos, sobretudo se foram contemporâneos da época em que a lei fundamental foi votada." (1981, p. 307) Na Constituição Federal de 1988, a educação compõe os direitos sociais, junto com outros direitos. A Constituição Federal relaciona os direitos sociais em seu artigo 6º e posteriormente particulariza-os no Título VIII (Da Ordem Social): "Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição." Os direitos individuais e os direitos sociais consistem num todo, a exigir um procedimento diferente do Estado, quanto a eles. São esclarecedoras as observações de Celso Ribeiro Bastos sobre a distinção de procedimento estatal, ante os direitos individuais ou os direitos sociais:
Os direitos individuais implicam o não fazer do Estado, enquanto os direitos sociais impõem-lhe um fazer e uma maior positividade, como assevera José Afonso da Silva:
As políticas sociais, apoiadas em direitos sociais, tornam obrigatórias e imediatas as medidas estatais para elevar a condição humana dos titulares desses direitos. Tais medidas vêm em resposta às necessidades sociais e transformam em realidade os direitos sociais, sobressaindo nas medidas os pobres e os miseráveis. Na educação, as medidas originárias de direitos sociais e de políticas sociais significam ônus do Estado, de acordo com a Constituição Federal de 1988. V Constitucionalmente, a educação brasileira deve ser direito de todos e obrigação do Estado; deve acontecer em escolas; deve seguir determinados princípios; deve ratificar a autonomia universitária; deve conservar a liberdade de ensino; e principalmente deve converter-se em direito público subjetivo, com a possibilidade de responsabilizar-se a autoridade competente. Por sua grande importância, é preciso indicar aqui os artigos do regime jurídico da educação, na Constituição Federal de 1988:
O regime jurídico da educação é formado ainda por outros artigos da Constituição Federal de 1988. Estes artigos acham-se dispersos no texto constitucional e, para maior brevidade, pode-se utilizar a concisa classificação feita por Edivaldo M. Boaventura, com atualizações (1995, p. 39 e 40):
VI A educação, como direito público subjetivo, cria a situação em que é preciso haver escolas para todos, seguindo o disposto no regime jurídico constitucional e dando maior realce ao Poder Judiciário neste setor. Os indivíduos têm o direito de requerer ao Estado a prestação educacional, porque o descumprimento deste dever traz como conseqüência a responsabilização da autoridade competente, segundo o artigo 208, parágrafos 1º e 2º, da Constituição Federal de 1988. No quadro das garantias constitucionais, o mandado de segurança mostra-se um instrumento jurídico de destaque no Direito Educacional, podendo ser empregado amplamente, mesmo como mandado de segurança coletivo, em favor da escola, da atividade educativa e da vida acadêmica, protegendo direito líquido e certo, demonstrado imediatamente, e não mera expectativa de direito. A Constituição Federal de 1988 define o mandado de segurança, no artigo 5º, LXIX:
No que diz respeito ao mandado de segurança coletivo, a Constituição Federal preceitua no artigo 5º, LXX:
Como inovação, há na Constituição de 1988 o mandado de injunção, exposto em seu artigo 5º, LXXI:
Por conseguinte, o mandado de injunção permite o exercício dos direitos e das liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, caso inexista norma regulamentadora. Ao assegurar um direito, o mandado de injunção tem dois pressupostos: um direito constitucional apresentado por alguém e a falta de norma regulamentadora a obstaculizar seu exercício. Além disso, a Constituição Federal de 1988 institui o "habeas data", no artigo 5º, LXXII:
Para a utilização do "habeas data", beneficiado com a gratuidade, é necessário que os dados sejam de caráter pessoal, que estejam na posse de entidades governamentais, tais como órgãos da administração direita e indireta (autarquias, fundações criadas pelo Poder Público, sociedade de economia mista e empresas públicas). Por outro lado, a Constituição garante o direito à intimidade, previsto no artigo 5º, X: Art. 5º - (...) X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. VII Ao contrário do que quase sempre se nota, o Direito Educacional não se reduz a uma simples, às vezes simplória, exposição da legislação do ensino. O Direito Educacional consiste numa área de estudos jurídicos, com contribuições importantes, como mais recentemente as de Nina Beatriz Ranieri e de Edivaldo M. Boaventura. A educação, na Constituição Federal de 1988, é um bem jurídico, principalmente porque com ela se constrói uma sociedade livre, justa e solidária e só com ela se garante o desenvolvimento nacional, dentro do que determina o seu artigo 3º, no qual se acham os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. Como direito público subjetivo, a educação pode ser protegida por ser um bem jurídico, individual e coletivo, com a força de direito de ação. A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, conforme ordenado no artigo 22, XXIV, da Constituição, disciplinando a educação escolar, efetivada sobretudo pelo ensino em instituições próprias. Esta Lei tem dado oportunidade à abundância de normas regulamentares, impossibilitando a flexibilização das atividades educacionais. Então, nem sempre as previsões constitucionais são levadas em conta e não se concretizam, quando na verdade, de um lado, significam direitos individuais e sociais e, de outro, obrigações do Estado. Deve-se prestar atenção igualmente no fato de a Constituição Federal de 1988 dividir os encargos harmoniosamente entre a União, os Estados e os Municípios, sob a coordenação da União. As atribuições da União estão claras nos três primeiros parágrafos do seu artigo 211, em que são especificadas as "competências materiais" dos membros da federação, e em outros artigos em que são apontadas suas "competências materiais privativas", como nos casos do artigo 21, IX; do artigo 34,VII, "e"; do artigo 211, parágrafo 1º; do artigo 212, "caput"; do artigo 206, VII; do artigo 209, II. Nas disposições constitucionais, repartem-se competências materiais entre a União, os Estados e os Municípios, conciliando atribuições privativas e atribuições comuns A Constituição de 1988 não concede atuação prioritária da União a qualquer nível de ensino, o que, em vista disto, autoriza sua atuação supletiva e redistributiva em todos os níveis educacionais. Assim, a União age supletiva e redistributivamente nos vários níveis de ensino, porém suas competências legislativas são indicadas de modo explícito, ficando aos Estados e aos Municípios o restante. A organização da educação brasileira segue a mesma direção da organização político-administrativa da República, fundamentada no federalismo, havendo descentralização normativa e executiva, de acordo com o artigo 18, "caput" da Constituição: "Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição." O federalismo constitucional mostra a ausência de hierarquia entre o sistema de ensino da União, o dos Estados, o do Distrito Federal e o dos Municípios, a não ser quando a União legisla nacionalmente sobre diretrizes e bases e sobre normas gerais, para ordenar a educação brasileira (cf. Ranieri, 2000). Ao colocar em prática a Lei nº 9.394/96, que fixa as diretrizes e bases da educação nacional, os órgãos do Poder Executivo exercitam o poder regulamentar, uma função administrativa e não legislativa, exorbitando de suas faculdades. O poder regulamentar dos órgão do Poder Executivo, de essência puramente administrativa, ao inverso do que vem acontecendo, não pode exceder-se na regulamentação da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), que altera a organização educacional do Brasil e flexibiliza os processos educativos. Os abusos do poder regulamentar, na administração educacional, por parte dos órgãos do Poder Executivo, ao produzir normas de comportamento e de organização destinadas a regulamentar a Lei nº 9.394/96 (LDB), acabam por conspurcar os preceitos desta Lei e da Constituição de 1988. Tais órgãos administrativos do Poder Executivo, em seu empenho de regulamentar pormenorizadamente a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, complicam e impedem a ação educativa, criando rumos diferentes à descentralização e à flexibilidade, determinados por esta Lei. Como a Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) goza de situação distinta, goza de um regime especial, atuando como lei complementar à Constituição Federal de 1988, não pode ser violada por lei federal ordinária, que venha estabelecer algo diverso do que ela estabelece. Leis complementares, como a Lei da Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não podem ser transgredidas em suas "competências materiais privativas", porque as infrações a essas leis querem dizer, simultaneamente, infrações às normas constitucionais (Constituição de 1988: artigo 22, XXIV, quanto à LDB) (cf. Ranieri, 1999). VIII O regime jurídico da educação, e ainda o Direito Educacional, integram-se no Direito Público e, consequentemente, no Direito Administrativo, pois a educação se põe como direito público subjetivo. Em se tratando de esfera de investigação e de disciplina normativa, o Direito Educacional se distingue pela natureza pública da educação e pelo predomínio do interesse público sobre o interesse particular, abrangendo não somente as instituições públicas e privadas de ensino, como também os indivíduos vinculados a ele. No Direito Educacional, a Constituição Federal de 1988 e, em seguida, a Lei nº 9.394/96 (LDB) mudam essencialmente no campo educacional o regime privado, sujeitando este regime aos princípios constitucionais que guiam a educação brasileira. Assim, o Direito Educacional, na condição de direito especializado, envolve definições, princípios, comparações com outros sistemas, legislação, jurisprudência, levando em conta as relações jurídicas geradas na atividade educativa e tendo por objetivo proporcionar a educação a todos (cf. Boaventura, 1996; Ranieri, 2000). No que diz respeito à educação, o direito público subjetivo expressa-se na faculdade de exigir, proveniente de relação jurídico-administrativa. Pelo direito público subjetivo, o indivíduo tem a possibilidade de exigir da administração pública o cumprimento de prestações educacionais, asseguradas por norma jurídica. Além disso, pelo poder regulamentar, os órgãos do Poder Executivo possuem a capacidade de editar regulamentos, ou seja, editar regras ou normas, mas tal capacidade não se desliga da lei, não é exercida contra ela, e sim dentro da lei, que a limita e a condiciona. Na administração pública, o regulamento ocupa o mais alto grau na categoria de normas, localizando-se logo abaixo da lei, completando-a. Todavia, configura abuso do poder regulamentar o exercício indevido, por órgãos do Poder Executivo, da competência do Poder Legislativo (cf. Cretella Júnior, 1999, p. 160 e 348). O Direito Administrativo e, de modo geral, a administração pública estão subordinados a determinados princípios jurídicos, que repercutem no Direito Educacional. São eles, segundo a Constituição de 1988: os princípios jurídicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência (cf. Medauar, 2000, p. 142 e 144). O Direito Educacional, no entanto, deve partir de idéias como as de Pontes de Miranda, em seus Comentários à Constituição de 1946:
POLITICS AND THE BASES OF EDUCATIONAL LAW
Referências bibliográficas Advogado, sociólogo, especialista em Direito e Doutor em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP); foi professor titular na USP, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). E-mail: * Advogado, sociólogo, especialista em Direito e Doutor em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP); foi professor titular na USP, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). E-mail: Quais são os elementos básicos que constituem Estado brasileiro a escola?POVO, TERRITÓRIO E SOBERANIA
A formação de um Estado consiste em três elementos: uma população, um território e um governo. Esses aspectos são essenciais, porque sem eles não poderia existir um Estado.
O que é Estado Brasil escola?A palavra Estado, na linguagem corriqueira, na Constituição e nas leis, indica as unidades federadas, e no Brasil, como Estado Federal, é denominada União. O Estado pode ser conceituado como "a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território".
O que compõe o Estado?O Estado, como uma pessoa de direito internacional, deve possuir as seguintes qualificações: (1) uma população permanente, (b) um território definido, (c) governo, e (d) a capacidade de entrar em relações com os outros estados.
Como o Estado brasileiro é organizado?O Brasil é uma república federal constituída pela união de 26 estados federais – divididos em 5.570 municípios – e pelo Distrito Federal. Os municípios são as menores unidades autônomas da Federação.
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