Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?

A variabilidade genética e os métodos tradicionais de melhoramento

O melhoramento genético de plantas, animais ou microrganismos só é possível se existir variabilidade genética, isto é, se, dentro das espécies a serem melhoradas, ocorrerem indivíduos com diferentes características que podem ser herdadas. Essa variabilidade é facilmente constatada tanto na espécie humana como em qualquer outra. Tem origem, fundamentalmente, em mutações, que são a base da evolução. Resultam de modificações que ocorrem nas moléculas do ácido desoxirribonucléico (DNA), que é o material genético de praticamente todos os seres vivos. O mecanismo de recombinação — resultante da hibridação, ou seja, do cruzamento entre tipos portadores de diferentes mutações — promove uma variabilidade adicional nas populações, propiciando a ocorrência de uma seleção natural. Os tipos mais aptos sobrevivem, em detrimento dos menos adaptados.

Porém, uma seleção artificial vem sendo praticada pelos melhoristas há muito tempo. Desde o início da agricultura, há cerca de dez mil anos, populações humanas utilizam empiricamente métodos de melhoramento genético que imitam os processos da evolução natural. A domesticação do trigo, da cevada, da ervilha e das lentilhas data de sete mil anos antes de Cristo (a.C.). Banana, maçã, batata, milho, sorgo e muitas outras culturas vegetais começaram a ser melhoradas a partir de cinco mil a.C. Outras, como o abacaxi, certas hortaliças, o morango, a seringueira e o dendê, foram melhoradas já na era cristã. Com a redescoberta das regras da genética, métodos racionais de melhoramento genético começaram a ser utilizados pelos geneticistas em plantas culti-vadas, animais domésticos e microrganismos úteis, como os envolvidos na produção de antibióticos, vitaminas, enzimas e outros produtos.

Complexos sistemas de cruzamentos e retrocruzamentos (ver Glossário), associados a diferentes métodos de seleção, são utilizados quando os genes de interesse localizam-se em diferentes indivíduos de uma mesma espécie que se deseja melhorar geneticamente. Tomemos um exemplo: dentro de uma mesma espécie como Zea mays (o milho cultivado) podem existir plantas resistentes a determinada doença, mas de baixa produtividade, ao lado de outras sensíveis à mesma doença, mas de alta produtividade. Nesse caso, um programa de melhoramento genético pode combinar as características favoráveis de cada uma — resistência e alta produtividade —, produzindo assim um milho geneticamente melhorado. Mas há casos em que um gene favorável não está disponível em indivíduos da espécie em questão. Pode-se então recorrer a espécies silvestres aparentadas. O cruzamento de uma espécie selvagem com outra cultivada pode levar à formação de híbridos interespecíficos que, quando retrocruzados sucessivamente com a espécie cultivada e acompanhados por seleção, dão origem a descendentes semelhantes ao parental cultivado, porém enriquecidos com alguns genes derivados da espécie silvestre. Através desse processo, denominado hibridação introgressiva, evoluíram muitas plantas cultivadas que têm sido intensamente utilizadas pela espécie humana.

Um cruzamento interespecífico, como entre plantas de trigo e centeio, deu origem ao Triticale, atualmente cultivado em larga escala no mundo e que resultou da mistura de milhares de genes de cada espécie. Mesmo quando cruzamentos interespecíficos (ver Glossário) não são possíveis naturalmente, por incompatibilidade entre espécies, certas técnicas permitem cruzamentos entre elas, com a utilização de "pontes". Por exemplo, se uma espécie A não se cruza com a espécie C, pode-se usar uma espécie B como "ponte", se ela for compatível com as outras duas. Nesse caso, cruza-se A com B e B com C, transferindo-se, assim, genes entre duas espécies naturalmente incompatíveis. Outra técnica utilizada mais recentemente pelos melhoristas é a da fusão de protoplastos,* que permite a junção de espécies e até gêneros distintos de plantas ou microrganismos naturalmente incompatíveis. Muitos híbridos vegetais e microbianos se originaram dessa maneira, resultando em produtos de interesse para a agricultura e a indústria. Às vezes — quando se deseja transferir genes entre espécies pouco relacionadas pertencentes a gêneros, famílias e até reinos distintos — esses métodos esbarram em limitações impostas por barreiras intransponíveis de incompatibilidade sexual.

Os organismos transgênicos

É nesse contexto que se insere uma das aplicações da tecnologia do DNA recombinante*, conhecida popularmente como engenharia genética. Ela possibilita o isolamento de um gene de um dado organismo e sua transferência para outro organismo, transpondo barreiras de cruzamento entre os reinos vegetal, animal, protista e fungi. O resultado é um indivíduo geneticamente igual ao utilizado para receber a molécula de DNA recombinante, porém acrescido de uma nova característica genética, proveniente de outro, que não é da mesma espécie. Esse indivíduo é chamado transgênico.

Plantas, animais e microrganismos transgênicos — estes últimos, em geral, denominados microrganismos geneticamente engenheirados — têm sido produzidos em espécies de valor comercial, principalmente a partir da década de 1980.

As primeiras plantas transgênicas foram utilizadas na China no início da década de 1990. Nos Estados Unidos, a primeira aprovação de uso comercial de uma planta transgênica ocorreu em 1994, quando a empresa Calgene lançou um tomate com elevada resistência ao armazenamento. Os dados revelam que plantações comerciais de transgênicos vêm aumentando. Em 1999, estavam cultivados com vegetais transgênicos, em todo mundo, cerca de quarenta milhões de hectares. A Figura 1 mostra dados sobre países produtores de plantas transgênicas, espécies mais cultivadas e características genéticas preferencialmente introduzidas em transgênicos. O mercado mundial de plantas transgênicas, estimado em 75 milhões de dólares em 1995, chegou a cerca de dois bilhões de dólares em 1999, e a estimativa é de que atinja cerca de 25 bilhões de dólares em 2010 (James, 1999).

Figura 1 - Percentagem das áreas (em hectares) cultivadas com plantas transgênicas em 1999, distribuídas pelos países produtores (A). Principais espécies transgênicas cultivadas (B) e características genéticas introduzidas (C). Fonte: James (1999).
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?

Até o momento, a grande maioria das plantas transgênicas comerciais teve como alvo imediato o produtor agrícola. Os caracteres mais freqüen-temente incorporados têm sido aqueles que reduzem o custo de produção de um cultivar transgênico cujas demais características são equivalentes ao não-transgênico. Embora haja divergências nesse sentido — e é evidente que isso depende também do manejo, do local de plantio e de muitos outros fatores —, uma estimativa otimista é de que, para o agricultor, haja uma economia de cerca de 15% a favor da soja transgênica em relação à não-transgênica; percentagem semelhante seria encontrada a favor do milho transgênico, resistente a pragas. Em certos casos, a redução no uso de agrotóxicos também parece ser relevante. No do algodão, estima-se que a redução no uso de pesticidas, com a introdução de cultivar transgênico, foi de cerca de três milhões de litros anuais. Todos esses valores, entretanto, devem ser levados em consideração com cautela. A experiência com transgênicos ainda é recente, e muitas vezes os dados limitam-se a locais e regiões determinados. Não foram estimados com exatidão o ganho financeiro e o impacto ecológico decorrentes da redução no uso de agroquímicos graças ao emprego de transgênicos. Se isso é verdade para países nos quais os transgênicos já vêm sendo usados comercialmente, muito mais difícil é prever possíveis ganhos ou prejuízos para o agricultor nos países com experiência comercial praticamente nula em transgênicos, como o Brasil.

Exemplos de plantas transgênicas: prós e contras

Vale a pena, neste ponto, examinar alguns exemplos de plantas transgênicas já largamente utilizadas. Um deles, talvez o mais divulgado, é o da soja transgênica com o gene de resistência ao glifosato, princípio ativo do herbicida Roundup, comercializada pela empresa Monsanto. O DNA dessa soja, designada soja RR, tem um gene adicional — proveniente de uma bactéria do solo, do gênero Agrobacterium — que confere resistência ao glifosato e foi incorporado à soja por técnicas de engenharia genética. Embora o vetor de DNA utilizado para transferir o gene da bactéria à planta contivesse outros genes, como os de resistência a antibióticos, estes não foram introduzidos na soja, de modo que ela praticamente só possui o gene que interessa, ou seja, o que confere resistência ao herbicida. Sendo a soja uma planta que se reproduz quase exclusivamente por autofecundação, fica difícil — embora não seja impossível — transferir para outras plantas o gene inserido. Além do mais, a soja não é natural do Brasil. Assim, não existem plantas aparentadas a essa espécie em nosso meio, o que elimina a possibilidade da transferência, em nossas condições, do gene introduzido. Mais ainda, esse gene de resistência ao herbicida já existe na natureza, em microrganismos que vivem em constante interação com as plantas, e o herbicida Roundup já é utilizado no país há mais de vinte anos, não tendo sido detectado o aparecimento de resistência em plantas daninhas. Não parece haver também qualquer efeito em microrganismos úteis, como os fixadores de nitrogênio e fungos micorrízicos, que vivem em associação com o vegetal. Também até o momento, nada foi detectado de excepcional em animais e pessoas alimentados com grãos da soja RR. Assim, pode-se afirmar que esse é um exemplo positivo da utilização da tecnologia do DNA recombinante na produção de plantas transgênicas. Alguns ensaios adicionais feitos em condições de nosso solo, clima e microbiota — que, se ainda não foram realizados, não levariam mais do que uma ou duas safras — seriam suficientes para aprovar ou não o material transgênico, nas nossas condições.

Outro exemplo bem-sucedido de planta transgênica é o caso do milho que recebeu de uma bactéria, o Bacillus thuringiensis ou Bt, um gene de resistência a insetos. O gene recebido codifica uma toxina que impede que a planta seja danificada por insetos-pragas. O uso dessa bactéria no controle biológico de insetos data de 1930, e sabe-se que ela é muito mais específica ao seu alvo que os inseticidas químicos. Desde que esse método de controle biológico de pragas agrícolas foi introduzido, não há registros de problemas de surgimento de resistência ou outros, decorrentes da pulverização de Bt em plantas (Arantes, 2000). Hoje cultivado em escala comercial, esse milho transgênico apresenta vantagens, como a redução de insumos (inseticidas) a serem utilizados pelo agricultor, com conseqüentes vantagens para os consumidores e o ambiente. Alguns problemas levantados, como o surgimento de insetos resistentes à toxina ou a possível eliminação de insetos úteis pela dispersão do pólen de milho, são contornáveis. No primeiro caso, existem duas centenas de diferentes genes produtores de toxinas do tipo Bt. Se a média do aparecimento de resistência for estimada em cinco anos para cada toxina, teoricamente serão necessários mil anos para que surjam insetos resistentes a todas elas.

A experiência com resistência aos antibióticos tem revelado, por outro lado, que a resistência a qualquer um desses produtos desaparece poucos anos depois de sua retirada do mercado (Costa e Azevedo, 1976). Se surgir uma população de insetos resistentes a uma toxina produzida por gene introduzido em planta transgênica, a substituição dessa planta por outra fará com que, depois de algum tempo, a população de insetos resistentes volte a apresentar sensibilidade à primeira toxina. Outros mecanismos — como a utilização de plantas "refúgio", isto é, aquelas que não são transgênicas, colocadas estrategicamente junto com população transgênica — reduzem os riscos de surgimento de resistência nos insetos. Experimentos iniciais referentes aos perigos da dispersão de pólen transgênico, publicados na revista Nature (Losey, 1999), mostraram-se inadequados, pela falta de critérios e controles apropriados. É interessante que esse trabalho — que dificilmente seria aceito até mesmo em uma revista científica regional brasileira — foi publicado em uma conceituada revista internacional, de índice de impacto alto e dotada de um corpo editorial possivelmente idôneo, mostrando que nem sempre índice de impacto pesa na qualidade das publicações. Este, entretanto, é assunto que fica para um próximo artigo. A publicação mereceu grande destaque na mídia, mas foi logo refutada. Outras pesquisas, efetuadas com controles apropriados, mostraram que a dispersão de pólen transgênico não afetava insetos, a não ser aqueles que atacavam o milho.

Cada transgênico, entretanto, deve ser considerado separadamente. Ao lado de exemplos positivos, como os indicados, surgem outros que certamente acarretarão problemas aos agricultores, aos consumidores e ao ambiente. Um deles é o da produção de sementes estéreis em plantas. Essas plantas modificadas apresentam sementes que não germinam na geração seguinte, fazendo com que o agricultor tenha de comprar novas sementes para o plantio seguinte. O processo está baseado na introdução de um gene, chamado exterminator, capaz de produzir uma toxina que mata o embrião da semente em formação; esse gene, por sua vez, depende de outros para se manifestar. Vantagem há para a empresa produtora, que pode vender suas sementes anualmente. Outra alegada vantagem é que o investimento no melhoramento de plantas autógamas — ou seja, que se reproduzem por autofecundação, como soja, arroz e trigo — deverá ser incrementado, o que poderá acarretar ganhos em produtividade semelhantes aos ocorridos após a introdução de híbridos, por exemplo, no milho. As desvantagens, entretanto, são evidentes. Aspectos negativos serão a maior dependência do agricultor para obter sementes; a contaminação, por genes que conferem esterilidade, de cultivares que têm sementes férteis; e a chamada erosão genética, com redução da diversidade.

Ao lado de exemplos francamente positivos ou negativos, como os apresentados, há outros que merecem estudos mais aprofundados. Um deles é o do arroz transgênico, denominado Liberty Link, contendo o gene de uma bactéria do solo, o actinomiceto Streptomyces higroscopicus, que confere resistência ao herbicida Liberty, produzido pela empresa AgrEvo e cujo princípio ativo é o glifosinato de amônia. A aplicação do herbicida no arroz comercial resistente não o afetaria, mas eliminaria plantas invasoras, inclusive o arroz vermelho, da mesma espécie e que causa severos danos aos agricultores. As vantagens são evidentes, pois o arroz vermelho causa perdas anuais de milhões de reais só no Rio Grande do Sul. Por outro lado, o arroz vermelho ou outras espécies nativas de arroz podem adquirir, por transferência, o gene de resistência ao herbicida. Embora cruzamentos sejam raros e mesmo sabendo-se que o herbicida não é atualmente usado no arroz, há necessidade de precaução e de ensaios regionais.

Polêmica e legislação sobre os transgênicos

Existe polêmica sobre as conseqüências que a liberação dos transgê-nicos pode trazer ao ambiente. Sem dúvida, a tecnologia que gera os transgênicos, assim como muitas outras, pode dar origem a produtos que coloquem em risco o ambiente e a segurança alimentar. Não se deve generalizar: há transgênicos bons e ruins, e cada um deve ser analisado quanto às suas vantagens, às suas desvantagens e à sua contribuição à melhora da qualidade de vida no planeta. Por isso, após um produto transgênico potencialmente útil ter sido desenvolvido em laboratório, a legislação exige que este seja analisado sob diferentes aspectos, tendo em vista a segurança. Plantas transgênicas que passarem por testes bioquímicos, fisiológicos, alimentares e de impacto ambiental, e só depois deles forem comercializadas, serão tão seguras quanto aquelas que já consumimos (Ferreira e Avidos, 1999). Pode-se dizer que não há no mundo, atualmente, alimentos que tenham sido submetidos a tais níveis de avaliação e rigor científico como os transgênicos. Vários alimentos que já consumimos resultam de melhoramentos genéticos grosseiros, muitas vezes resultantes de mistura de milhares de genes de espécies distintas. Outros são decorrentes de mutações, espontâneas ou induzidas por agentes mutagênicos, ou de fusões de protoplastos. Eles são consumidos pela população humana sem que tenham sido testados com o mesmo rigor que os transgênicos. É uma utopia, portanto, querer que os alimentos transgênicos só sejam liberados quando tivermos 100% de segurança de que não haverá problemas de alergia ou outros. Se o mesmo rigor fosse aplicado a outros alimentos — não-transgênicos, porém resultantes de alguma modificação genética —, os defensores de alimentos 100% seguros morreriam de fome e não poderiam mais batalhar contra os transgênicos.

Para conhecimento dos menos avisados, o Brasil é o quarto maior consumidor mundial de agroquímicos. Anualmente, são usados 101 milhões de litros de fungicidas, herbicidas e inseticidas nas lavouras brasileiras, com custo anual de cerca de cinco bilhões de reais. Apenas em 1997, a Fundação Oswaldo Cruz (Sinitox) registrou 11 mil pessoas atingidas severamente por agrotóxicos, com 143 óbitos. A própria agricultura orgânica apresenta problemas de aumento do risco de contaminação humana e de animais por microrganismos patogênicos; alimentos produzidos por hidroponia podem conter certos metais em níveis acima dos ideais. Enfim, toda a agricultura — e não apenas os transgênicos — é uma atividade antiecológica. Há cerca de dez mil anos, quando o homem deixou de ser nômade e passou a cultivar o solo, começaram a surgir problemas ambientais. Deve-se levar em conta, entretanto, os pontos positivos e os negativos gerados. Nesse particular, a agricultura trouxe mais benefícios que malefícios. Na agricultura primitiva, por exemplo, eram necessários 25 hectares para alimentar uma pessoa; atualmente, o cultivo da mesma área alimenta três mil pessoas (Paterniani e Azevedo, 1996). É interessante também constatar que o rigor observado em relação às plantas transgênicas não se repete no caso de outros produtos que envolvem as mesmas tecnologias de engenharia genética, como as que geraram antibióticos ou vacinas, na área de saúde. Estes produtos são ingeridos ou injetados em crianças e adultos em todo mundo, embora também neles não se possa ter 100% de segurança. Produtos de limpeza, como detergentes, contêm material obtido por tecnologia do DNA recombinante, sem que haja maiores restrições à sua utilização.

O Brasil possui uma CTNBio que analisa as solicitações que lhe são encaminhadas. Os pareceres são específicos caso a caso (Scholze, 1999). Embora com poder limitado e com dificuldades iniciais – por causa da pouca experiência, da necessidade de manter inteira neutralidade, com uma visão ampla, multi e interdisciplinar –, ela tem cumprido satisfatoriamente suas funções, emitindo pareceres técnicos conclusivos, que pesam na liberação ou não dos produtos submetidos à tecnologia do DNA recombinante.

Existem pesquisas com plantas transgênicas no Brasil, como alface, amendoim, batata, cana-de-açúcar, eucalipto e fumo (Souza, 1999), algumas delas em fase de campo. Enfim, o Brasil está preparado, tanto em pesquisa como em tecnologia, para começar a utilizar transgênicos. Nesse particular, sendo um país de grande extensão, com vastas terras agricultáveis e detentor da melhor tecnologia agrícola tropical do mundo (Azevedo, 1996), ele pode fazer valer essas vantagens para: produzir alimentos transgênicos com custos mais reduzidos e competitivos, para atender aos países importadores que já aderiram ao consumo dos transgênicos; produzir alimentos não-transgênicos, que mesmo com custos um pouco mais elevados atenderiam, especialmente, as populações de países europeus que não aceitam o consumo de transgênicos; e produzir alimentos orgânicos, desde que haja mercado e preços convidativos.

Problemas econômicos e políticos tornam a polêmica sobre os transgênicos ainda mais complexa, mas este é outro assunto, que pode ficar para outra ocasião. De qualquer forma, vale ressaltar que organismos transgênicos são apenas uma pequena ponta do iceberg que está por vir, entre as novas tecnologias de melhoramento. Algumas delas, até mais simples e facilmente aplicáveis, vão gerar produtos geneticamente modificados. Essas alterações serão muito mais aleatórias do que as causadas pela introdução de uns poucos genes nos transgênicos. Abordaremos a seguir um conjunto dessas novas tecnologias.

Evolução dirigida

A tecnologia do DNA recombinante tornou possível romper as barreiras de cruzamento entre espécies. Muitas vezes, o melhorista necessita de genes que conferem propriedades não requeridas pelos organismos vivos em condições naturais. Formas gênicas que não conferem vantagens adaptativas a esses organismos não são selecionadas no decorrer da evolução natural e, portanto, não estão disponíveis neles. Entretanto, é possível induzir seu aparecimento e selecioná-las, utilizando as ferramentas hoje disponíveis na engenharia genética. Por exemplo, o processo chamado evolução dirigida, ou evolução in vitro, baseia-se nos princípios da evolução natural, ou seja, na geração de variabilidade, sua ampliação e seleção, só que da forma desejada pelo geneticista.

Na tecnologia da evolução dirigida, a indução das mutações — ou seja, do aparecimento de variantes de um dado gene — é feita utilizando-se uma metodologia denominada "PCR propensa a erros". Nela, amplifica-se o gene a partir do qual se deseja obter variantes que interessem ao melhoramento genético, utilizando-se uma reação de PCR (polimerase chain reaction).* Ela é muito usada em biologia molecular e serve, entre outras coisas, para produzir milhares de cópias de genes em laboratório. Na "PCR propensa a erros", coloca-se manganês na reação de amplificação do gene. Isto gera erros ao acaso durante a amplificação, criando, além das cópias iguais à original, cópias alteradas ou mutantes do gene. Essas cópias alteradas são inseridas em vetores, que são os "veículos" usados pelo biólogo molecular para levar os "passageiros" — no caso, os genes modificados — de uma célula para outra. Nessas células receptoras, os genes podem se expressar, isto é, produzir proteínas. Assim, ao lado de produtos inativos do gene e de produtos com propriedades indesejáveis, são detectados outros, que têm as propriedades desejadas pelo melhorista (Figura 2). Pode-se fazer uma seleção, entre as desejadas, daquelas mais promissoras. A evolução dirigida pode ir além, adaptando-se a ela técnicas que permitem a recombinação in vitro, ampliando-se mais ainda a variabilidade genética, tudo dentro do laboratório. Variantes favoráveis de um dado gene, selecionados após a metodologia, ou mesmo por evolução natural (Figura 3), podem ser submetidos a processos que induzem recombinação, visando selecionar formas que acumulem mutações favoráveis. A técnica utilizada é chamada "embaralhamento do DNA" (DNA shuffling)*, pela qual todos os DNAs que compõem variantes alterados de um mesmo gene são tratados com uma enzima — uma Dnase — (ver Glossário) que quebra a molécula de DNA ao acaso, dando origem a fragmentos de diferentes tamanhos. Se eles forem submetidos a uma reação de PCR, na qual os próprios fragmentos gerados pela DNase funcionam, uns aos outros, como iniciadores, no final de duas dezenas (ou mais) de ciclos da reação de PCR resultam recombinantes gênicos (Figura 4). Destes, após rigoroso processo, selecionam-se os mais desejados. Finalmente, os variantes gênicos criados em laboratório pelo melhorista, por evolução dirigida, podem ser introduzidos em organismos apropriados para desenvolver a função desejada. Dessa maneira, podem surgir transgênicos que não resultam da introdução de genes nem são mutantes já existentes na natureza. O que se introduz neles são genes mutantes praticamente criados em laboratório.

Figura 2 - Técnica da evolução dirigida ou evolução Uma cron. A partir de gene selecionado (1), são obtidas mutações por reação de PCR em presença de manganês para indução de erros (2). Essas seqüências de DNA alterado são introduzidas em vetores (3), veículos que levam os genes para células receptoras (4) por um processo de transformação no qual eles se expressam e os melhores são selecionados (5). O processo pode ser repetido várias vezes (6), até que se obtenha o melhoramento desejado.
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?

Etapas de um Experimento de "Evolução Enzimática Dirigida"

Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?

Figura 3 - Recombinação artificial em genes selecionados pela evolução natural. A partir de um gene ancestral, em cem milhões de anos foram selecionados naturalmente genes distintos de uma mesma proteína homóloga, em quatro diferentes espécies. Elas não se cruzam na natureza, mas no laboratório, pela técnica do "embaralhamento do DNA" (DNA shuffling), produzem-se proteínas que são misturas daquelas que existem nas quatro espécies.
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?
Figura 4 - A combinação das técnicas de evolução dirigida e de recombinação por embaralhamento produz artificialmente um pool de genes recombinantes que, depois, podem ser introduzidos em células vivas de diferentes espécies, resultando em organismos transgênicos.
Quais os aspectos positivos e negativos em relação aos transgênicos?

Conclusão

Pelo que foi mencionado, cientistas de todo mundo, após muito estudo e pesquisa, desenvolveram técnicas que permitem avanços antes não imaginados no melhoramento genético de plantas, animais e microrganismos. Como todas as técnicas novas e revolucionárias, elas causaram impacto, dividindo autoridades e opinião pública. Isto não é de se estranhar. Ocorreu o mesmo quando Galileu provou que a Terra se movia ou quando Darwin sugeriu que a espécie humana descendia do macaco. A introdução do milho híbrido, no fim da primeira metade do século XX, foi polêmica e sujeita a críticas. O mesmo está ocorrendo com os transgênicos gerados pelas tecnologias modernas. Como ocorre em todas as áreas, estão sendo produzidos transgênicos que merecem aprovação, pelos benefícios que trazem, e outros que são prejudiciais e devem ser banidos. Mas, o que estamos assistindo é apenas o início de uma imensa quantidade de plantas transgênicas que está por vir. Demostrando talvez uma falta de sensibilidade das empresas responsáveis, os primeiros transgênicos visaram principalmente a introdução, em plantas, de genes de resistência, por exemplo, a herbi-cidas. A atitude seria outra se o exemplo inicial fosse a introdução de genes que determinam maior produção de vitamina A e de ferro, como ocorre em variedade transgênica de arroz recentemente desenvolvida pelo grupo do Instituto Central de Pesquisa de Chiba, no Japão. Um arroz desse tipo pode reduzir o problema da anemia em mais de quatro milhões de crianças de até dois anos de idade, só no Brasil.

Ser contra ou a favor dos transgênicos é insensatez. É o mesmo que se posicionar contra toda a indústria farmacêutica e promover o banimento de fármacos, por existirem, ao lado de medicamentos úteis, outros que são prejudiciais ou causam efeitos colaterais em algumas pessoas. Ou ser contra a indústria automobilística e lutar por sua extinção, pois os automóveis causam acidentes e aumentam a poluição. Ou ser contra a Internet, pois ela também transmite pornografia infantil! Infelizmente, com relação aos transgênicos, essa foi a atitude inicialmente tomada, até mesmo por alguns pesquisadores, organizações não-governamentais, sociedades de defesa de consumidores e sociedades científicas atuantes. Aos poucos, entretanto, a postura de ser contra os transgênicos pelo simples fato de serem transgênicos foi cedendo, e hoje o assunto está tomando um rumo correto. Daqui para frente, devem ser aceitas plantas transgênicas que favoreçam o agricultor, o consumidor e, é claro, também as empresas produtoras, sem afetar o ambiente. Outras, que não apresentarem atributos favoráveis, serão barradas por meios legais ou não chegarão à etapa de comercialização.

Quais são os pontos positivos e negativos da produção de transgênicos?

Esses alimentos foram criados com o objetivo de aumentar a produtividade, melhorar a qualidade do produto e a resistência aos herbicidas. No entanto, eles não estão livres de desvantagens. São alimentos que podem causar alergias, elevar o uso de agrotóxicos e ainda aumentar a resistência humana aos antibióticos.

Quais são os aspectos positivos dos transgênicos?

Entre os aspectos positivos dos alimentos transgênicos o destaque é para: Aumento da produção de alimentos; Aumento do conteúdo nutricional; Maior resistência, durabilidade e tempo na estocagem e armazenamento; Maior resistência às pragas (bactérias, fungos, vírus e insetos); Diminuição de agrotóxicos.