Quais a importância das ações e compromisso dos professores com a educação inclusiva?

ARTIGOS

Educação inclusiva: concepções de professores e diretores

Inclusive education: the concepts of teachers and school administrators

Izabella Mendes Sant'Ana

Psicóloga, doutoranda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica-PUC, Campinas

Endereço para correspondência

RESUMO

O estudo investigou as concepções de 10 professores e seis diretores de escolas públicas do Ensino Fundamental de uma cidade do interior paulista, sobre a inclusão escolar. Foram feitas entrevistas e os dados transcritos foram submetidos à análise de conteúdo (e análise estatística-excluído) Docentes e diretores conceberam a educação inclusiva sob diferentes enfoques, com definições que ora se aproximavam dos princípios de integração, ora se referiam à orientação inclusiva. As principais dificuldades indicadas para a realização da inclusão referiram-se à falta de formação especializada e de apoio técnico no trabalho com alunos inseridos nas classes regulares. Como sugestões se destacaram: necessidade de orientação por equipe multidisciplinar, formação continuada, infra-estrutura e recursos pedagógicos adequados, experiência prévia junto a alunos com necessidades especiais, atitude positiva dos agentes, além de apoio da família e da comunidade. Os dados permitiram identificar vários aspectos necessários à efetivação da proposta inclusiva.

Palavras-chave: inclusão escolar, concepções de professores e diretores.

ABSTRACT

This study investigated the concepts of 10 teachers and six school administrators, from public schools of São Paulo, regarding School Inclusion. The participants were interviewed and the data transcription was submitted to analysis of content. Teachers and principals pointed out several aspects on the Inclusive Education. Some of their concepts involved principles of school integration and others the school inclusion itself. The participants expressed some difficulties to make the Inclusive Education happen, such as, lack of professional graduation and technique support to work with students in regular classrooms. Multidisciplinary staff support, additional in-service training, adaptive school structures and teaching material resources, experience in teaching students with special needs, positive attitude from educators toward inclusion, as well as family and community assistance, were the suggestions provided. The results allowed the identification of the necessary aspects to accomplish the Inclusive Education.

Key words: School inclusion, teacher concept, school administrator concept

Nas últimas décadas e mais especificamente a partir da Declaração de Salamanca, em 1994, a inclusão escolar de crianças com necessidades especiais no ensino regular tem sido tema de pesquisas e de eventos científicos, abordando-se desde os pressupostos teóricos político-filosóficos até formas de implementação das diretrizes estabelecidas na referida declaração.

Entre os diversos enfoques pesquisados está o que envolve as opiniões de docentes e demais profissionais da comunidade escolar sobre a proposta inclusiva e sua participação neste tipo de projeto. Uma vez que professores e diretores apresentam funções essenciais na estrutura e no funcionamento do sistema educacional, suas opiniões podem fornecer subsídios relevantes para a compreensão de como estão sendo desenvolvidos projetos dessa natureza.

É sabido que os fundamentos teórico-metodológicos da inclusão escolar centralizam-se numa concepção de educação de qualidade para todos, no respeito à diversidade dos educandos. Assim, em face das mudanças propostas, cada vez mais tem sido reiterada a importância da preparação de profissionais e educadores, em especial do professor de classe comum, para o atendimento das necessidades educativas de todas as crianças, com ou sem deficiências.

Estudos recentes sobre a atuação do professor em classes inclusivas apontam que o sucesso de sua intervenção depende da implementação de amplas mudanças nas práticas pedagógicas (O'Donoghue & Chalmers, 2000), quais sejam: a adoção de novos conceitos e estratégias, como a educação cooperativa (O'Connor & Jenkins, 1996); a adaptação ou (re)construção de currículos; o uso de novas técnicas e recursos específicos para essa clientela; o estabelecimento de novas formas de avaliação; o estímulo à participação de pais e da comunidade nessa nova realidade social e educacional (Mantoan, 1997; Mantoan, 2001; Mrech, 1998; Pires & Pires, 1998; Westwood, 1997). Depende, além disso, de atitudes positivas frente à inclusão de crianças com necessidades especiais no ensino regular (Avramidis, Bayliss & Burden, 2000).

Contudo cabe lembrar que muitas dessas sugestões já estavam presentes na literatura educacional antes do surgimento da orientação inclusiva, mas que, em alguns casos, foram (re)direcionadas a partir dos princípios da inclusão.

Na medida em que a orientação inclusiva implica um ensino adaptado às diferenças e às necessidades individuais, os educadores precisam estar habilitados para atuar de forma competente junto aos alunos inseridos, nos vários níveis de ensino. No entanto, autores como Goffredo (1992) e Manzini (1999) têm alertado para o fato de que a implantação da educação inclusiva tem encontrado limites e dificuldades, em virtude da falta de formação dos professores das classes regulares para atender às necessidades educativas especiais, além de infra-estrutura adequada e condições materiais para o trabalho pedagógico junto a crianças com deficiência. O que se tem colocado em discussão, principalmente, é a ausência de formação especializada dos educadores para trabalhar com essa clientela, e isso certamente se constitui em um sério problema na implantação de políticas desse tipo.

Diante desse quadro, torna-se importante que os professores sejam instrumentalizados a fim de atender às peculiaridades apresentadas pelos alunos. Aqui, tendo-se em vista a capacitação docente, a participação das universidades e dos centros formadores parece ser relevante. Para Gotti (1988), a universidade, além de proporcionar cursos de aperfeiçoamento e de pós-graduação, deve envolver-se em pesquisas sobre o ensino aos portadores de necessidades especiais, desenvolvendo instrumentos e recursos que facilitem a vida dessas pessoas.

Apesar de a necessidade de preparação adequada dos agentes educacionais estar preconizada na Declaração de Salamanca (Brasil, 1994) e na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996) como fator fundamental para a mudança em direção às escolas integradoras, o que tem acontecido nos cursos de formação docente, em termos gerais, é a ênfase dada aos aspectos teóricos, com currículos distanciados da prática pedagógica, não proporcionando, por conseguinte, a capacitação necessária aos profissionais para o trabalho com a diversidade dos educandos (Glat, Magalhães & Carneiro, 1998). A formação deficitária traz sérias conseqüências à efetivação do princípio inclusivo, pois este pressupõe custos e rearranjos posteriores que poderiam ser evitados.

Vale destacar, porém, que a formação docente não pode restringir-se à participação em cursos eventuais, mas sim, precisa abranger necessariamente programas de capacitação, supervisão e avaliação que sejam realizados de forma integrada e permanente. A formação implica um processo contínuo, o qual, segundo Sadalla (1997), precisa ir além da presença de professores em cursos que visem mudar sua ação no processo ensino-aprendizagem. Para a autora, o professor precisa ser ajudado a refletir sobre a sua prática, para que compreenda suas crenças em relação ao processo e se torne um pesquisador de sua ação, buscando aprimorar o ensino oferecido em sala de aula.

Na inclusão educacional, torna-se necessário o envolvimento de todos os membros da equipe escolar no planejamento de ações e programas voltados à temática. Docentes, diretores e funcionários apresentam papéis específicos, mas precisam agir coletivamente para que a inclusão escolar seja efetivada nas escolas. Por outro lado, torna-se essencial que esses agentes dêem continuidade ao desenvolvimento profissional e ao aprofundamento de estudos, visando à melhoria do sistema educacional.

No que se refere aos diretores, cabe a eles tomar as providências – de caráter administrativo – correspondentes e essenciais para efetivar a construção do projeto de inclusão (Aranha, 2000).

Para Ross (1998), o diretor de escola inclusiva deve envolver-se na organização de reuniões pedagógicas, desenvolver ações voltadas aos temas relativos à acessibilidade universal, às adaptações curriculares, bem como convocar profissionais externos para dar suporte aos docentes e às atividades programadas. Além disso, o administrador necessita ter uma liderança ativa, incentivar o desenvolvimento profissional docente e favorecer a relação entre escola e comunidade (Sage, 1999; Reis, 2000).

Diante da orientação inclusiva, as funções do gestor escolar incluem a definição dos objetivos da instituição, o estímulo à capacitação de professores, o fornecimento de apoio às interações e a processos que se compatibilizem com a filosofia da escola (Schaffner & Buswell, 1999), e ainda a disponibilização dos meios e recursos para a integração dos alunos com necessidades especiais (Marchesi & Martín, 1995). Desse modo, a atuação dos administradores escolares pode ser de grande valia na tarefa de construir uma escola pronta a atender a todos os indivíduos, sem discriminação.

Embora Reis (2000) aponte que muitas vezes a prática do diretor, nas escolas brasileiras, é dificultada pelas exigências das atividades burocráticas e administrativas, esse profissional precisa ser atuante, promovendo ações que envolvam o acompanhamento, discussões e avaliações em conjunto com os participantes do projeto educacional, a fim de exercitar as dimensões educacional, social e política, inerentes a sua função.

Além da participação de docentes e gestores no contexto da inserção dos alunos com deficiência na rede regular de ensino, outros fatores, como os relacionados à estrutura do sistema educacional, precisam ser considerados na análise e nas discussões sobre as possibilidades de implementação de projetos nessa área.

Castro (1997), ao descrever o processo de implantação de uma proposta de educação inclusiva na rede pública de uma capital da Região Nordeste do Brasil, realizou entrevistas com 30 pessoas (entre professores, diretores, supervisores e técnicos), em cinco escolas municipais desse município, com o objetivo de conhecer as dificuldades e as condições necessárias à realização da proposta. A autora verificou que entre as principais dificuldades encontradas estão as mesmas existentes em qualquer escola pública brasileira, a saber: formação insuficiente dos professores, baixos salários, falta de apoio pedagógico, infra-estrutura e condições de trabalho precárias. Além disso, constatou que as dificuldades apontadas pelos professores referem-se à atuação com a totalidade dos alunos, e não apenas com os que apresentam algum tipo de deficiência. Por último, a autora ressaltou a necessidade de os professores serem orientados a partir de fundamentos teórico-práticos, para que possam modificar práticas e métodos de ensino, com o objetivo de propiciar um ensino de qualidade para todos.

Resultados similares foram encontrados por Damião (2000); Dias, Sponchiado, Hirota, Camargo e Almeida (1998); Castro (2002) e Jusevicius (2002). Entre as necessidades mencionadas pelos autores podem-se destacar: a formação específica e continuada dos educadores, a orientação na prática cotidiana, o apoio familiar e técnico, a redução do número de alunos nas classes e alterações nas condições estruturais das escolas.

Com base nessas informações, pode-se perceber que são necessárias mudanças profundas no sistema educacional vigente a fim de garantir o cumprimento dos objetivos da inclusão. Cumpre, então, considerar as inúmeras dificuldades vivenciadas por todos os participantes do cotidiano das escolas que tentam, de diferentes maneiras, viabilizar a educação inclusiva de acordo com suas possibilidades.

Em face dessas considerações, o presente estudo visou investigar como professores e diretores entendem a inclusão escolar, buscando, também, conhecer as dificuldades existentes e as necessidades apontadas pelos profissionais no contexto da inserção de crianças com deficiência no ensino comum.

MÉTODO

Participantes

Participaram deste estudo 10 professores e seis gestores (três diretores e três vice-diretores) atuantes em escolas do ensino fundamental, da rede estadual, em um município do interior paulista. Todos os participantes eram do sexo feminino, sendo que a maioria dos docentes (seis) encontrava-se na faixa etária de 30 a 39 anos, enquanto a metade dos gestores apresentava idade na faixa de 50 a 59 anos. Os docentes e diretores estavam vinculados a três instituições educacionais abertas à inclusão, que atendem alunos de diferentes bairros: duas localizadas na periferia e um na zona central da cidade.

Material

Foram utilizados um questionário de identificação para docentes e diretores (contendo informações sobre idade, sexo, formação acadêmica, tempo de atuação profissional e participação em eventos) e um roteiro de questões orientadoras para as entrevistas semi-estruturadas com esses profissionais, além de um gravador portátil e fitas para o registro das entrevistas. O roteiro focalizou as seguintes dimensões: concepções sobre a Educação Inclusiva (conceito, idéias e opiniões que os profissionais têm acerca da Educação Inclusiva), desenvolvimento do processo de inclusão (dificuldades encontradas pelos participantes na realização do processo) e condições necessárias à efetivação da Educação Inclusiva (sugestões dos docentes e administradores quanto aos aspectos necessários para a viabilização da inclusão escolar1 1 Utilizou-se também um termo de consentimento informado, que foi assinado pelos participantes, contendo os objetivos e explicitando outras normas éticas da pesquisa, redigido de acordo com a Resolução de dezembro de 2000, do Conselho Federal de Psicologia e o que dispõe a Lei Nacional sobre a Pesquisa com Seres Humanos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da PUC-Campinas (Parecer nº 058/03). ).

Procedimento

Após obter, junto à Delegacia de Ensino, a lista de escolas em que existiam classes especiais e/ou sala de recursos, a pesquisadora fez um levantamento sobre as instituições que apresentavam alunos com deficiências inseridos no ensino regular. Dentre essas escolas, foram selecionadas três para a realização da pesquisa.

Posteriormente, a autora entrou em contato com esses estabelecimentos de ensino e expôs aos respectivos diretores a intenção de realizar o estudo. Desse modo, foi feito o agendamento das datas e horários para visitar as escolas. Por ocasião das visitas às instituições, foram apresentados os objetivos da pesquisa e solicitada a colaboração dos profissionais, sendo entregue a cópia do projeto.

A escolha dos professores baseou-se nos seguinte critério: os profissionais deveriam estar atualmente acompanhando crianças com necessidades especiais em classes regulares. As entrevistas com os participantes foram realizadas nas próprias escolas e em horários escolhidos por eles.

Após a transcrição dos relatos, fez-se uma leitura ampla do material obtido. Em seguida, realizou-se a análise de conteúdo, segundo a proposta de Bardin (2002), a qual envolveu: a) a identificação dos temas e sua posterior divisão em unidades de respostas; b) o recorte dos textos de acordo com os conteúdos apresentados; e c) o agrupamento e a categorização das unidades de respostas, que representam o conjunto de idéias comuns ao grupo pesquisado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quanto à formação educacional dos participantes, nove professores cursaram o magistério e também já haviam completado o ensino superior entre os anos de 1975 e 2002. Em relação aos diretores, apenas um não possuía o curso de magistério, sendo que todos concluíram o nível superior entre 1973 e 1995. Apenas dois profissionais apresentavam curso de pós-graduação: um docente fez especialização em Psicopedagogia e um gestor especializou-se em Supervisão Escolar. O curso de Pedagogia foi o mais freqüente entre os professores e diretores, no entanto, verificou-se que a metade dos administradores apresentou dois cursos superiores, enquanto os professores possuíam somente um curso em sua formação.

No que concerne ao tempo de exercício profissional, todos os participantes apresentaram um longo período de experiência, com no mínimo nove anos de atuação na área. No grupo de professores, a maior parte (quatro docentes) encontrava-se na faixa entre 15 a 19 anos de trabalho na profissão, enquanto entre os diretores houve maior variação acerca do tempo de atuação profissional.

Os dados sobre a experiência prévia e a formação continuada de professores para atuação com alunos que apresentam necessidades especiais encontram-se na Tabela 1. Pôde-se verificar que a metade dos professores já possuía experiência anterior junto a alunos com deficiência. Somente um professor mencionou ter participado de curso e encontro acerca da educação inclusiva sem, contudo, especificá-lo.

No grupo de diretores, somente um profissional afirmou ter participado de cursos e eventos sobre a inclusão escolar, promovido pela Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo, porém não informou o período em que tal evento foi realizado. Apesar da baixa participação dos administradores em encontros, todos indicaram ter recebido orientações de profissionais, de dentro ou de fora da escola, sobre o processo de inclusão de alunos com deficiência no ensino regular. Dentre os profissionais que forneceram orientações aos participantes, foram mencionados 1 (um)professor especializado, 1 (um), pedagogo e 2 (dois) fisioterapeutas.

Na análise de conteúdo, foram estabelecidas algumas categorias a partir das respostas de docentes e diretores, formando a base para a análise de cada questão.

Em relação ao conceito de educação inclusiva, os resultados indicaram grande variação nos argumentos dados pelos dois grupos de profissionais, conforme apresentado na Tabela 2.

Dentre os argumentos mencionados pelos professores, obteve maior destaque o que atribui à noção de compartilhar o mesmo espaço físico a condição de principal elemento do conceito de educação inclusiva, sendo ressaltado por quatro docentes. Para os diretores, verificou-se que a categoria denominada integração na sociedade foi a mais freqüente nos relatos, sendo apontada por três gestores.

Possivelmente, isso decorre do fato de os profissionais exercerem papéis diferentes, esperando-se dos gestores uma ação mais ativa quanto à integração escola-comunidade, especialmente família-escola, cuidando da inclusão tanto junto aos pais das crianças a serem incluídas quanto aos das outras crianças.

A partir da análise dos relatos dos dois grupos de sujeitos, foi possível identificar diferentes visões sobre a inclusão escolar. Os docentes deram maior destaque à presença das crianças com necessidades especiais compartilhando o mesmo espaço físico das demais, enquanto os gestores enfatizaram a inserção como uma forma de integrar essas pessoas na sociedade. A idéia da presença de portadores de necessidades especiais na classe regular constitui-se, aqui, como principal aspecto do conceito de inclusão. No entanto, o fato de esses alunos estarem no mesmo ambiente com os demais não quer dizer que estejam incluídos, realmente, no contexto escolar. A inclusão implica práticas escolares que favoreçam relações significativas dentro da perspectiva de aprendizagem colaborativa (Thousand & Villa, 1991), capazes de remover as barreiras ao acesso e à participação dessas pessoas na aprendizagem e na sociedade (Santos, Souza, Alves & Gonzaga, 2002).

Embora tenham apontado outros aspectos do princípio inclusivo (como a necessidade de adequação de métodos e estratégias de ensino, o direito à educação e inclusão com um sentido amplo, envolvendo não apenas as crianças que apresentam alguma deficiência, mas 'todos' os alunos, independente de suas condições físicas, psicológicas, étnicas e sociais), os participantes, em geral, apresentaram respostas pouco abrangentes, focalizando apenas algumas dimensões do referido conceito, respostas estas que parecem estar mais relacionadas às idéias de inclusão recentemente mais difundidas na literatura do que particularmente às de integração.

Esses resultados se diferenciam dos encontrados em outros estudos (Damião, 2000; Jusevicius, 2002), nos quais os participantes usavam essas expressões como sinônimas, havendo certa confusão entre os termos. Isso parece indicar alterações nas concepções dos educadores, possivelmente ligadas às recentes discussões sobre a inclusão nas diversas esferas sociais, inclusive com destaque da mídia; e também pode ser influência de possíveis leituras que facilitam a compreensão e a distinção dos significados.

Na Tabela 3 estão presentes as freqüências de categorias segundo as verbalizações de docentes e diretores em relação às dificuldades encontradas na realização da inclusão escolar. Para cinco professores e três diretores, a principal dificuldade encontrada na efetivação do processo de inclusão baseia-se na falta de apoio técnico, isto é, de suporte de profissionais especializados. A categoria falta de formação foi mais enfatizada pelos docentes do que pelos diretores.

O relato dos participantes evidenciou a preocupação com a falta de orientação no trabalho junto aos alunos com necessidades especiais. Mesmo aqueles profissionais que recebem ou receberam algum tipo de orientação afirmaram que o que está sendo feito não é suficiente para atender às demandas surgidas durante o processo inclusivo. A ausência de uma equipe formada por especialistas de diferentes áreas que atue em conjunto com os docentes e diretores parece ser um obstáculo importante para a realização de ações e projetos comprometidos com os princípios inclusivos.

Também foi destacada a falta de capacitação do professor e da equipe pedagógica em lidar com alunos que apresentam necessidades especiais. Alguns diretores expressaram a idéia de que a formação continuada deveria ser ofertada aos docentes pelos órgãos administrativos regionais, indicando que se faz necessária a realização cursos de capacitação para que todos os envolvidos no processo inclusivo tenham condições de desenvolver um trabalho adequado às necessidades desse alunado.

Aparentemente, a formação continuada pode favorecer a implementação da proposta inclusiva; todavia necessita estar aliada a melhorias nas condições de ensino, ao suporte de profissionais no auxílio ao trabalho do professor, bem como ao compromisso de cada profissional em trabalhar para a concretização dessas mudanças.

Cabe salientar que três docentes apontaram os problemas de comportamento dos alunos (agressividade, indisciplina) ou as necessidades apresentadas pelos alunos incluídos como aspectos dificultadores do trabalho educativo. As demais falas focalizaram outros aspectos, como a falta de experiência anterior e o uso de estratégias específicas junto a alunos com deficiências, assim como a importância de uma atitude positiva dos agentes envolvidos e de toda comunidade escolar frente aos portadores de necessidades especiais. O preconceito e o número elevado de alunos nas salas de aula também foram vistos como aspectos negativos quanto ao processo inclusivo, pois prejudicariam as relações interpessoais e o desenvolvimento de um trabalho mais próximo ao aluno com necessidades especiais, respectivamente.

Como forma de enfrentamento das dificuldades, os participantes apresentaram sugestões que poderiam favorecer a implementação da proposta inclusiva, o que pode ser observado na Tabela 4.

Para nove dos docentes e três diretores, a presença de uma equipe que dê suporte aos agentes educacionais constitui-se na principal necessidade apontada na educação inclusiva. Sugestões relativas à formação em serviço foram destacadas por cinco diretores e por oito professores. Tal fato, possivelmente, deriva da urgência que estes profissionais têm de obter auxílio e orientações a respeito do trato com alunos que apresentam necessidades especiais.

Docentes e administradores consideraram o apoio de especialistas como um aspecto fundamental na atuação com crianças que apresentam deficiências, explicitando também a idéia de que todos os funcionários devem estar informados e aptos para lidar com as diferenças e especificidades dos alunos. Esta visão assemelha-se ao que Karagiannis, Stainback e Stainback (1999) ressaltam sobre a necessidade de as escolas tornarem-se comunidades acolhedoras, sendo que o primeiro passo desse processo seria o desenvolvimento de uma cultura escolar baseada no reconhecimento, na valorização e no respeito a todos os alunos.

De acordo com os relatos, os docentes parecem crer que a habilitação específica deve ser o primeiro passo do processo inclusivo e, por isso parecem exigir que tal condição seja atendida pelos órgãos responsáveis, indicando também certa urgência em adquirir conhecimentos sobre como lidar com essa clientela. Além disso, enfatizam outras necessidades para que os alunos com necessidades especiais possam ser beneficiados em sua inserção nas classes comuns.

Alguns profissionais consideraram relevante a realização de adaptações na infra-estrutura dos estabelecimentos escolares e de um trabalho conjunto de todos os participantes da comunidade escolar, visando à inclusão desses alunos no ensino regular. Em contrapartida, outros participantes indicaram que o professor precisa estar aberto ao processo de inclusão – subjetiva e profissionalmente – para atuar junto aos alunos com deficiências, alertando também que a participação dos familiares e da comunidade e de mudanças de atitude da sociedade frente às pessoas com necessidades especiais são aspectos essenciais para a concretização dos princípios inclusivos.

As necessidades apontadas indicam que o professor precisa ser auxiliado no processo de inclusão. Por estar a maior parte do tempo atuando junto aos alunos, o docente não pode trabalhar isoladamente. É por esse motivo que os educadores destacaram, em diferentes níveis, o caráter imprescindível do apoio de profissionais especializados, da família e de toda a comunidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo apresentou alguns dados que permitiram uma reflexão sobre os aspectos que têm permeado a inserção do aluno com necessidades especiais no sistema regular de ensino. Os principais resultados apontaram que a educação inclusiva foi vista pelos participantes sob diferentes enfoques, desde definições mais próximas dos princípios de integração até definições mais relativas à educação inclusiva. O discurso da maioria dos participantes evidencia uma posição favorável à inclusão dos alunos com necessidades na educação comum, talvez pelo fato de esse tema estar sendo muito discutido e valorizado atualmente no meio acadêmico e social. Docentes e diretores parecem crer que a educação inclusiva é uma proposta viável, mas que, para ser efetivada, necessita de profundas transformações na política e no sistema de ensino vigente.

Os resultados mostraram que os professores estão cientes de não estarem preparados para a inclusão, não aprenderam as práticas educacionais essenciais à promoção da inclusão e precisariam do apoio de especialistas.

Os participantes reconheceram a importância de uma educação democrática, que atenda à totalidade dos educandos; no entanto, apontaram que os órgãos administrativos competentes devem tomar as providências necessárias, incluindo a participação ativa de educadores, dos pais e da sociedade para proporcionar aos indivíduos com deficiências um ensino adequado às suas necessidades específicas.

Ao se analisarem as dificuldades mencionadas pelos entrevistados, pôde-se perceber que muitas delas não são exclusividade do ensino aos alunos com necessidades especiais, mas problemas existentes há várias décadas na estrutura educacional do país, o que foi confirmado nos estudos de Castro (1997) e Jusevicius (2002). Nesse sentido, a inclusão desse alunado em classes comuns gera novas circunstâncias e desafios, que tendem a somar-se com as dificuldades já existentes do sistema atual, e, por conseguinte, ratifica a idéia de que profundas modificações devem ser realizadas a fim de melhorar a qualidade da educação, seja para educandos sem seja com algum tipo de deficiência.

Em face do quadro apresentado, tornam-se evidentes os obstáculos à proposta de inclusão. O principal deles parece ser a falta de preparo do professor para atuar com esses alunos. As dificuldades apresentadas pelos educadores neste estudo são graves e sugerem que ações governamentais sejam implementadas.

Os dados obtidos vêm reafirmar a necessidade de que os agentes e gestores educacionais sejam consultados e participem ativamente das mudanças e transformações ocorridas no âmbito escolar, como aponta Machado (2003). Suas experiências e seus questionamentos são fontes de informações relevantes acerca da realidade escolar e precisam ser levados em consideração no momento em que os órgãos governamentais decidem os rumos da Educação. Além disso, permitem dizer que é necessária a redefinição dos modelos de formação dos professores, com vista a contribuir para uma prática profissional mais segura e condizente com as necessidades de cada educando.

  • Endereço para correspondência

    Izabella Mendes Sant'Ana

    Rua Juca Fernando, 894, São Dimas

    CEP13416-070, Piracicaba-SP

    E-mail:

  • Recebido em 18/11/2004

    Aceito em 30/05/2005

  • 1

    Utilizou-se também um termo de consentimento informado, que foi assinado pelos participantes, contendo os objetivos e explicitando outras normas éticas da pesquisa, redigido de acordo com a Resolução de dezembro de 2000, do Conselho Federal de Psicologia e o que dispõe a Lei Nacional sobre a Pesquisa com Seres Humanos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da PUC-Campinas (Parecer nº 058/03).

  • Endereço para correspondência Izabella Mendes Sant'Ana Rua Juca Fernando, 894, São Dimas CEP13416-070, Piracicaba-SP E-mail: 1 Utilizou-se também um termo de consentimento informado, que foi assinado pelos participantes, contendo os objetivos e explicitando outras normas éticas da pesquisa, redigido de acordo com a Resolução de dezembro de 2000, do Conselho Federal de Psicologia e o que dispõe a Lei Nacional sobre a Pesquisa com Seres Humanos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da PUC-Campinas (Parecer nº 058/03).

    Qual a importância do papel do professor na educação inclusiva?

    O professor deverá promover um ensino igualitário e sem desigualdade, já que quando se fala em inclusão não estamos falando somente nos deficientes e sim da escola também, onde a diversidade se destaca por sua singularidade, formando cidadãos para a sociedade.

    Qual a importância do professor na inclusão?

    O papel do professor na educação inclusiva é imprescindível. Isso porque esse profissional é o responsável por direcionar o processo pedagógico, desenvolvendo caminhos para que o aluno adquira o conhecimento.

    O que um professor comprometido com a inclusão deve ter em mente?

    O que se deve ter em mente é que para a inclusão de crianças com necessidades educativas no ensino regular, há que se contar com professores preparados para o trabalho docente que se estribem na perspectiva de diminuição gradativa da exclusão escolar e da qualificação do rendimento do alunado, ao mesmo tempo em que, ...

    Qual o papel do professor dentro da escola na construção de ambientes escolares inclusivos?

    O papel do educador é intervir nas atividades que o aluno ainda não tem autonomia para desenvolver sozinho, ajudando o estudante a se sentir capaz de realizá-las. É com essa dinâmica que o professor seleciona procedimentos de ensino e de apoio para compartilhar, confrontar e resolver conflitos cognitivos.