Por que taxar grandes fortunas

O Brasil enfrenta uma das piores crises de sua história. E qual é o principal problema? A dívida pública que cresce monstruosamente a cada ano e tem uma perspectiva nada favorável até 2021/22, quando deverá chegar a pelo menos 93% do PIB (dívida bruta), mesmo se as reformas propostas para o governo nesta área forem aprovadas. Muitos alegam que nossa crise é apenas ou principalmente de arrecadação, mas vejam, esta caiu apenas em 2014 e 2015 provocada por uma queda enorme da confiança, fazendo com que a atividade econômica fosse reduzida (o PIB do Brasil caiu 3,80% em 2015 e deve cair 3,0% neste ano) e, logicamente, a arrecadação diminuísse. Em 2015, Dilma Rousseff elevou diversos tributos, o que não foi suficiente para fazer a arrecadação subir. 

Por conta desta falha de diagnóstico, muitos acham que o problema principal do Brasil foi a queda de arrecadação e querem, em vez de entender que o problema está do lado dos gastos, aumentar impostos numa economia já estrangulada. O governo já abocanha mais de 35% do PIB em impostos, acham que isso é pouco? E ainda somos os piores em retorno destes impostos para a sociedade. Qual a solução mágica da vez? Aumentar impostos sobre as grandes fortunas ou ter um imposto único sobre elas de forma a aumentar a arrecadação.

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Para começar a conversa, aumentar impostos nem sempre significa aumentar a arrecadação. Este é um conceito bem conhecido em economia conhecido como Curva de Laffer. Se o país tira cada vez mais impostos de seus contribuintes e, pior, o retorno é péssimo, isso estimula a sonegação e desestimula a produtividade. Isso, como disse antes, já aconteceu no ano passado quando diversos tributos foram aumentados e arrecadação continuou a cair. Em segundo lugar, é preciso entender que ricos não são burros. Podem ser muitas coisas ruins, mas burros não são. Quem, em sã consciência, deixaria seus negócios, seus imóveis, seus recursos, num país com uma alta carga tributária e que ainda não os retorna minimamente? Poucos, ou quase ninguém. Aqui mesmo, no Brasil, já tivemos exemplos claros de que isso acontece, já que mais de 40 empresas saíram do Brasil e foram para o Paraguai. Em vez de gerarem empregos por aqui, ajudarem na atividade da economia e fazer o país crescer, estão ajudando nosso vizinho a fazer isso. Segundo a CNI – Confederação Nacional da Indústria, quase 400 empresas foram levadas ao Paraguai nos últimos dois anos em missão comercial, atraídos pelos menores custos de produção e baixos impostos. E estes empresários estão errados? Não. Como já dizia Adam Smith, cada pessoa age pensando primeiramente em si mesma e em sua família, para depois pensar no resto. Isso é natural. Portanto, é preciso que o governo entenda como funcionam os agentes econômicos e tentar encontrar um equilíbrio. Um país que tem altos tributos, dificuldades enormes para empreender, burocracias diversas e uma legislação trabalhista complicada, definitivamente não vai ser o melhor lugar para abrir uma empresa não é mesmo?

Voltando ao tema principal, pessoas que são detentoras de grandes fortunas, definitivamente não ficarão esperando o governo taxá-las, simplesmente mudarão a cidadania (coisa que é muito fácil quando se tem dinheiro) para países com uma carga tributária menor, levando consigo também suas empresas e qualquer tipo de negócio. Não é preciso ser um Einstein para perceber que isso terá uma consequência horrível para o país e a arrecadação poderá cair, efeito contrário ao desejado por quem propõe essa medida. Vejam, um exemplo bastante recente disso aconteceu na França. Indo na contramão da maioria dos países europeus que abandonou a taxação sobre os mais ricos ainda nos anos 1990, resolveu implementar uma nova tabela de impostos que chegava até 75%, em 2012. O Presidente, François Hollande, aprendeu forçadamente que aumento de impostos sobre os ricos não redistribui a renda, mas redistribui pessoas. Milhares de franceses ricos saíram em busca de uma nova cidadania, incluindo o francês mais rico de todos, Bernard Arnault, CEO do grupo LVMH, dona das marcas Louis Vuitton, Moët Chandon, Hennessy e mais 54 marcas de luxo, que mudou sua cidadania para a Bélgica. O ator Gerard Depardieu mudou sua cidadania para a Rússia e outros vários artistas, jogadores de futebol e todo o tipo de milionário foram para a Bélgica, Suíça, etc. Na época, Emmanuel Macron, antigo Investment Banker que se tornou o ministro da economia, chamou a medida de super taxação de “Cuba sem sol”. Com o desastre propagado pela medida, Hollande baixou a alíquota para 50% e depois teve que desistir totalmente desta ideia, não renovando-a para 2015. E ainda tem gente usando este exemplo como bem sucedido, sem conhecer a história inteira e, até mesmo, sem saber que a medida foi deixada de lado completamente.

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É claro que temos um problema sério de sonegação fiscal, mas uma das principais razões para isso reside no baixíssimo retorno desses impostos mesmo com uma carga tributária alta, isso considerando os pequenos empresários e/ou pessoas físicas autônomas. Além disso, boa parte da sonegação é proveniente de grandes companhias que financiaram campanhas políticas legal e ilegalmente nos últimos anos e, não por coincidência várias delas estão listadas na operação Lava-Jato. O pior de tudo? Muita gente que é contra a operação ou diz que ela é parcial, atribui à sonegação a crise fiscal do Brasil. Boa parte desta sonegação também acontece por conta da enorme quantidade de corrupção no país, com diversos políticos enviando recursos de propinas ao exterior ou através de desvios de empresas. Esses problemas não se resolvem do dia para noite e, portanto, tentar melhorar a sonegação sem contrapartida na eficiência do gasto público e achar ainda que taxar as grandes fortunas é uma solução de curto prazo, deixa a discussão muito aquém dos problemas principais.

Qual é a solução para o Brasil, então? Ora, a primeira coisa é sabermos que nosso foco deve ser direcionado aos gastos públicos exagerados e precisamos corrigir essa trajetória fiscal. Sem isso, a confiança no país continuará baixa, os investimentos produtivos não reagirão (ainda mais com uma taxa de juros tão alta), as taxas de juros não poderão cair e a inflação, mesmo assim, permanecerá alta. E isso é a única coisa? Claro que não. O Brasil é um dos países que mais apresenta dificuldades para abrir e manter um negócio, portanto precisamos de uma reforma tributária urgentemente, além de uma reforma administrativa. Muitos falam mal do empreendedorismo como se este fosse o que justificasse o mal do país, sendo que é o tamanho e ineficiência do Estado os verdadeiros inimigos. O Estado não gera riqueza, pode estimulá-lo através de investimentos públicos que terão o investimento privado o seguindo, mas isso só acontece se a confiança no país for razoável e as condições para isso sejam boas. Não adianta continuar achando que o Estado é quem salva a tudo e todos. Empreendedores não são somente os grandes empresários, mas aqueles que têm um pequeno negócio na esquina de sua casa e fomentam a economia gerando empregos. Como esperar que um país prospere sem estímulo à geração de riqueza através de todo tipo de negócio, minúsculo, pequeno, médio, grande, enorme?

Vamos pensar melhor antes de sair por aí com ímpeto de Robin Hood? No fim das contas, quem mais vai sofrer, é justamente o pobre que os justiceiros sociais tanto bradam por defender. Não se esqueçam, economia não é conto de fadas, mas um jogo de xadrez. Mover a peça em direção ao aumento de impostos, vai nos fazer perder a partida.

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O nome já diz tudo: o Imposto de Renda Mínimo para Bilionários deve recair sobre os 700 americanos mais ricos pela primeira vez na história dos Estados Unidos, de acordo com fontes e um documento da administração americana obtidos pelo jornal The Washington Post. Este imposto inédito deve ser proposto pela Casa Branca na segunda-feira (28), como parte de seu orçamento de 2023.

O plano do governo de Joe Biden estabeleceria uma alíquota mínima de 20% sobre todas as famílias americanas com valor superior a US$ 100 milhões, diz o documento. A maior parte da nova receita arrecadada pelo imposto viria de bilionários.

"Biden defende há muito tempo impostos mais altos para os americanos mais ricos, mas a Casa Branca não introduziu um plano tributário especificamente projetado para atingir bilionários até agora", escreve The Washington Post no sábado (26).

"Com esse imposto mínimo, os americanos mais ricos já não estarão mais sujeitos a um imposto mais baixo do que o de professores ou bombeiros", acrescenta o documento do governo obtido pelo jornal. A nova medida, que precisa ser aprovada pelo Congresso, prevê uma arrecadação de cerca de US$ 360 bilhões em 10 anos.

O quadro de desigualdade social brasileiro revela que o país ainda tem um longo caminho a percorrer para que seja possível reverter esse cenário. De acordo com relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), de 2019, o Brasil ocupa o sétimo lugar em ranking que classifica as nações mais desiguais, ficando atrás apenas de alguns países da África. 

Ao longo dos anos, diversas medidas foram pensadas como ferramentas para o combate à desigualdade. Entre as ações mais recentes, que vêm ocupando o centro de grandes debates, está o Projeto de Lei Complementar 215/20, que institui o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF).

A implementação do IGF no Brasil está prevista no artigo 153 da Constituição Federal – desde que com a ocorrência de aprovação de lei completar – mas nunca saiu do papel. 

A nova proposta, em tramitação na Câmara dos Deputados, visa a aplicação do imposto com alíquota de 2,5% sobre o valor de bens de pessoas físicas ou jurídicas que tenham patrimônio líquido superior a R$50 milhões.

Além do patrimônio líquido, o imposto também se aplica a imóveis de uso pessoal e aeronaves com valor acima de R$5 milhões, automóveis a partir de R$500 mil e embarcações com montante superior a R$1 milhão. 

O enquadramento do IGF terá como base os valores dos bens declarados à Secretaria da Receita Federal do Brasil e a arrecadação com o tributo será destinada, exclusivamente, à construção de unidades de ensino ou de saúde – credenciadas pelos governos federal, estadual e municipal.

Naturalmente, a taxação sobre grandes fortunas remete à ideia de que desigualdades sociais serão reduzidas à medida que as pessoas detentoras de maior capital se responsabilizarão pelo pagamento de alíquotas mais agressivas, de modo que quanto maior o patrimônio, maior também será a incidência sobre a base de cálculo. 

Dessa forma, à primeira vista, o IGF surge e carrega consigo o sentimento de justiça social, capaz de impactar, sobretudo, as camadas mais vulneráveis da população.

No entanto, a premissa da redução da disparidade social como benefício da aplicação do IGF, tem dividido opiniões. Isso porque há quem defenda que o imposto sobre grandes fortunas pode causar efeitos colaterais à economia, como o desencorajamento de investimentos de longo prazo. 

Outro impacto negativo consiste na possibilidade de transferência de domicílio fiscal, com a fuga de capitais – problema já registrado no país mesmo sem a incidência do novo imposto. 

Com isso, a aprovação do IGF não só não reduziria a desigualdade a partir da arrecadação de impostos proporcionais ao patrimônio, como causaria danos econômicos insustentáveis.

Imposto sobre grandes fortunas no mundo

Enquanto o debate sobre o IGF ganha corpo no cenário brasileiro, a adoção do tributo já é realidade em algumas localidades ao redor do mundo. Um dos exemplos mais recentes é o caso da Argentina, que converteu em lei a aplicação de imposto extraordinário sobre grandes fortunas.

Motivado pela pandemia ocasionada pelo novo Coronavírus, o Congresso argentino aprovou o imposto com o objetivo de financiar a luta contra a Covid-19 e reduzir a pobreza, além de facilitar subsídios a pequenas e médias empresas, bem como auxiliar na tratativa de outras questões sociais prementes no país.

A lei tributará uma única vez patrimônios de 200 milhões de pesos – equivalente a cerca de R$13 milhões de reais – com percentual variante de 2% a 3,5% quando o valor declarado ultrapassar US$35 milhões. 

A estimativa é que a legislação atinja 12 mil pessoas e a expectativa do governo é arrecadar US$3,5 bilhões, os quais serão destinados a planos produtivos e de saúde.

Além da Argentina, outras nações já colocaram o IGF em prática. Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dos 37 países membros, 12 instituíram o imposto. São eles: Alemanha, Espanha, França, Dinamarca, Áustria, Noruega, Islândia, Finlândia, Luxemburgo, Suécia, Suíça e Holanda.

Contudo, a cobrança foi revogada na maior parte dessas nações que adotaram o imposto sobre grandes fortunas. Um dos mais recentes casos foi o da França, que abandonou o Imposto sobre Grandes Fortunas após a eleição de Emmanuel Macron em 2017. 

A revogação aconteceu justamente pela facilidade de driblar o imposto. Entre as principais motivações para o abandono da taxação está o risco de fuga de capitais, a possibilidade do aumento da mobilidade do capital e, consequentemente, o acesso a paraísos fiscais. 

Um levantamento realizado pela OCDE também aponta que a arrecadação com o IGF não é tão significativa: alguns países europeus que mantiveram a aplicação do imposto até 2016 arrecadaram entre 0,18% e 1,03% de seus Produtos Internos Brutos (PIBs). Como referência, no Brasil calcula-se a carga tributária bruta em aproximadamente 33% do PIB.

Atualmente, o imposto sobre grandes fortunas ainda vigora na Espanha, Noruega e Suíça – considerando as nações que fazem parte da OCDE. No caso da Noruega e Suíça, o imposto é descentralizado e arrecadado pelos governos regionais, sendo cobrado somente de pessoas físicas. 

As alíquotas, na Noruega, são de 0,7% para uma das divisões regionais norueguesas e 0,15% para o governo central, com tributação para patrimônio acima de 1,48 milhão de acordo com a moeda do país, o que corresponde, aproximadamente, a R$926 mil. No caso da Suíça, o IGF possui variação de 0,3% a 1% com taxação para valores acima de 180 mil euros, correspondendo a pouco mais de um milhão de reais.

Já na Espanha, o imposto sobre grandes fortunas passou por algumas fases. Em vigor por mais de 15 anos, o IGF foi extinto em 2008 em função da crise econômica, mas foi retomado em 2012. Por lá, as alíquotas variam de 0,5% a 2,5% e são tributados valores acima de 700 mil euros, cerca de R$4,6 milhões.

Além dos países europeus, a taxação sobre grandes fortunas também existe em países latino-americanos, como Uruguai e Colômbia, para além da Argentina. No Uruguai, a cobrança ocorre tanto para pessoas físicas como jurídicas em valores acima de 113 mil euros, o que equivale a R$742 mil. 

As alíquotas variam de 0,5% a 1,5% e no caso de empresas pode chegar a 2,8%. Já na Colômbia, a tributação acontece sobre patrimônios pessoais que ultrapassem mais de 226 mil euros, correspondente a R$1,7 milhão, e as alíquotas também apresentam variação de 0,125% a 1,5%

Os dados fazem parte do livro “Estado Social contra a Barbárie“, de Jorge Abrahão e Marcio Pochmann.

IGF e a reforma tributária

O imposto sobre grandes fortunas no Brasil ocupa lugar em uma discussão maior sobre possíveis — e necessárias — melhorias no sistema tributário brasileiro. 

O debate acerca da implementação do IGF ganha força no país dentro do contexto da reforma tributária. Atualmente, existem três propostas para a reforma: PEC 45/2019, da Câmara dos Deputados, PEC 110/2019, do Senado Federal, e PL 3887/2020, do governo federal.

De maneira geral, as proposições das Casas Legislativas buscam simplificar o modelo tributário atual. No caso da Câmara, de forma bastante simplificada, a proposta visa substituir os tributos PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), o qual incidirá sobre uma base ampla de bens, serviços e direitos, de forma a contemplar todas as utilidades voltadas ao consumo. Para isso, a transição tributária será realizada em etapas.

Já o texto apresentado pelo Senado traz alguns detalhes que divergem da PEC 45/2019 em relação à competência tributária do IBS e, também, aos tributos que serão extintos: IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS e ISS.

Por fim, o Projeto de Lei do governo prevê a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), em substituição ao PIS, Pasep e Cofins.

De acordo com o novo presidente da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco – designados aos cargos na eleição das Mesas Diretoras que aconteceu no início de fevereiro – a aprovação da reforma tributária deve ocorrer dentro do prazo de seis a oito meses.

Com isso, a tramitação da proposta ganha cada vez mais relevância, especialmente pelo potencial de transformar todo o sistema tributário brasileiro, com impacto relevante em todos os setores. 

Neste sentido, o monitoramento legislativo se faz absolutamente necessário, uma vez que a reforma trará impactos à economia do país, às empresas e à sociedade de modo geral. Podemos esperar que o impacto positivo ou negativo em cada setor da economia tenha relação direta com seu engajamento em acompanhar essa pauta e nela intervir.