O que é contrato por escopo

Rodrigo Pironti Aguirre de Castro



1 Introdução - 2 Diferenciação entre contrato por escopo e contratopor prazo certo - 3 Prorrogação quando já escoado o prazo de execução docontrato sem o cumprimento de seu escopo - 4 Extinção do contrato por

escopo - 5 Conclusão - Referências



Direito administrativo; contratos administrativos; contrato por escopo; prorrogação; extinção



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DOI: http://dx.doi.org/10.21056/aec.v4i16.604

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O que é contrato por escopo


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ISSN 1516-3210 | e-ISSN 1984-4182

O que é contrato por escopo

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A vigência dos contratos de escopo

A vigência dos contratos de escopo

2.1 OS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS DE ESCOPO

A classificação do contrato administrativo como de escopo é utilizada para distingui-los dos denominados contratos de execução continuada. Segundo essa distinção, contratos de escopo seriam aqueles contratos que "impõem a parte o dever de continuação de realizar uma conduta específica definida. Uma vez cumprida a prestação, o contrato se exaure (...]"[1]. Nos contratos de execução continuada, as obrigações se protraem no tempo, não havendo apenas uma obrigação específica e definida. Assim, nos contratos de execução continuada, o serviço é prestado enquanto o contrato perdurar. Já nos contratos de escopo o que interessaria é a conclusão do objeto, sendo ‘o prazo’ um elemento acessório, condicionado ao objeto. São exemplos comuns de contrato de execução continuada os de limpeza de vigilância e como típico contrato de escopo temos as obras públicas.

O principal efeito da distinção supracitada reflete na questão do prazo contratual para adimplemento e na sua prorrogação, tanto que a Lei nº 8.666/93 concede tratamento diferenciado às formas de prorrogação de cada um dos tipos de contratos. A título ilustrativo, basta comparar o inciso II com o §1º, ambos do art. 57 da Lei 8.666/93, no que tange aos requisitos para que se possa autorizar uma prorrogação. Enquanto no contrato de escopo o prazo de vigência se destina a delimitar o período de tempo para execução da prestação pela contratada, nos de execução continuada o prazo de vigência destina-se a estabelecer o período de tempo durante o qual a contratação produzirá efeitos.

Desta forma, num tipo de contrato (o de escopo), o prazo dependeria do objeto. Assim, um contrato para execução de obra teria "x" dias dependendo da dimensão da obra. Note-se que nestes casos é o objeto (a obra) que determinaria a extensão do prazo. Já no contrato de execução continuada, o serviço será prestado enquanto não tiver expirado o prazo de vigência do contrato. Ou seja, nestes casos, ao revés é o prazo de vigência que determina o objeto. 

No contrato de escopo, o objeto é que está no centro da contratação e o prazo se torna um fator derivado, ou seja, o prazo de vigência seria estabelecido em função do objeto a ser executado. No outro caso (execução continuada) é o prazo que condiciona o objeto, uma vez que o serviço será prestado enquanto vigente o contrato.

Essa distinção leva uma parte da doutrina a entender que os contratos administrativos de escopo não se extinguem pelo mero esgotamento do prazo, subsistindo enquanto não for concluído seu objeto, pois a conclusão do objeto seria mais importante e o prazo de vigência teria relevância secundária, natureza meramente formal e acessória. Necessário é, portanto, distinguir os contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto e os que terminam pela expiração do prazo de sua vigência. Enquanto nos primeiros, o que se tem em vista a obtenção do objeto contratual concluído, operando o prazo meramente como um demarcador da entrega da obra, do serviço ou da compra sem sanções contratuais.

No segundo caso, o prazo delimita a vigência e eficácia do negócio jurídico contratado, assim sendo, expirado tal prazo, extingue-se automática e inexoravelmente o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público. Eis lição de Marçal Justen Filho que defende tese minoritária[2]:

“Há, portanto, prazo de execução/prazo extintivo do contrato. [...] Nos demais contratos, como no de empreitada de obra pública, não se exigiria, nem se justificaria cláusula de prorrogação, porque tais contratos não se extinguiriam pela fluência do prazo fixado, mas sim pela conclusão da obra. Nestes contratos o prazo é apenas limitativo do cronograma físico e será prorrogado (com ou sem mora das partes) tantas vezes quantas sejam necessárias para conclusão da obra independentemente de previsão contratual"4. (destaques nossos)

Ante o exposto, observamos que alguns poucos defendem a tese da não extinção do contrato administrativo de escopo pelo mero encerramento do prazo. Não se desconhece que referida tese tenha tido certa aceitação doutrinária[3] e que esteve, há algum tempo, em ressonância com as decisões do Tribunal de Contas da União (TCU). Há de se reconhecer também um benfazejo efeito prático e instrumental da aceitação da referida teoria, dada a possibilidade de não conclusão de obras e serviços contratados e cujos contratos acabaram por não ter sido prorrogados formal e tempestivamente por equívoco de alguma ordem.

No entanto, uma análise mais detida e minuciosa do tema permitirá visualizar as incompatibilidades da referida tese com o sistema de contratações públicas no ordenamento jurídico brasileiro.

Nesse diapasão, serão reproduzidas decisões recentes do Tribunal de Contas da União condenando a prática de prorrogar (ou mesmo rescindir) contratos depois de expirado seu prazo de vigência. Por fim, serão propostas soluções que se vislumbra compatíveis com o ordenamento jurídico pátrio e que, igualmente, possibilitam conclusão do objeto previsto em contrato que tenha, de modo inadvertido, encerrado seu prazo de vigência sem prorrogação tempestiva.

2.2 ASPECTOS FORMAIS DO CONTRATO ADMINISTRATIVO

Todo contrato, seja privado, ou da Administração em sentido amplo, traz em si uma gama de obrigações. Para o presente estudo importa ter em mente que o contrato é um instrumento que contém determinadas obrigações. Os contratos administrativos, diferentemente dos contratos privados, devem ser necessariamente formais e escritos, o que significa inferir que as obrigações contratuais precisam estar reduzidas a termo em documento escrito. Além disso, se envolver contrato da Administração Pública, a assinatura desse documento (contrato) deve, em regra, submeter-se a um prévio procedimento denominado licitação (exceto nos casos de contratação direta) sendo essa uma das formalidades essenciais que se referiu no título deste tópico.

Utilizando-se da classificação civilista o contrato administrativo é consensual, em regra, oneroso, comutativo e de caráter personalístico ou ‘intuitu personae’. Formal porque se expressa por escrito com requisitos especiais. Destarte, leciona Di Pietro[4]: "exige-se, para todos os contratos da Administração, pelo menos forma escrita."

As formalidades, ora citadas, inclusive a forma escrita, não são formalismos exacerbados ou mero rigorismo. Isso ocorre para possibilitar maior publicidade e segurança jurídica aos contratos dessa natureza. Boa parte dos contratos de natureza privada, sequer se revestem de forma escrita, apresentando-se na maioria das vezes como contratos verbais. Por sua vez, os contratos administrativos exigem uma série de formalidades, dentre elas a adoção da forma escrita, como visto.

Todas essas características aplicam-se da mesma forma aos contratos administrativos classificados como "de escopo", cuja única peculiaridade de ter um objeto certo determinado a ser entregue em prazo definido, não o afasta do regime de direito público de que trata Lei nº 8.666/93. Assim, ainda que seja uma contratação por escopo, tal característica não equipara o contrato administrativo ao contrato privado, pois algumas formalidades são imperativas e inafastáveis com o intuito de conferir segurança jurídica tanto à Administração contratante como à contratada, assim como para resguardar o princípios da ampla publicidade (e assim o controle interno e externo sobre o contrato administrativo). Uma dessas formalidades é a necessidade da forma escrita dos aditivos contratuais, inclusive nas prorrogações de prazo.

Destacamos três peculiaridades formais do contrato administrativo: (a) impossibilidade de celebração de contrato com prazo indeterminado; (b) obrigatoriedade de formalização escrita do contrato dos seus aditamentos contratuais; (c) necessidade, via de regra, de prévia licitação.

Como restará demonstrado, admitir uma prorrogação intempestiva ou defender a inexistência de prazo de vigência determinado nos contratos por escopo ‘fere de morte’ tais salvaguardas formais dos contratos administrativos. Fala-se aqui em "salvaguardas formais" porque essas exigências configuram mais do que meras formalidades, tendo por finalidade resguardar bens maiores do que a mera forma, tais como a publicidade, a transparência, a economicidade, a segurança jurídica, dentre outros vetores a nortear a atividade administrativa.

A fundamentar a linha de raciocínio da boa doutrina até então apresentada, convém reproduzir alguns dispositivos da Lei nº 8.666/93:

“Art.54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado. Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam: [...] IV os prazos de início de etapas de execução, de conclusão, de entrega, de observação de recebimento definitivo, conforme o caso (...) Art. 57. (...) §3º É vedado contrato com prazo de vigência indeterminado. (...) Art. 60. Os contratos seus aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais manterão arquivo cronológico dos seus autógrafos registro sistemático do seu extrato, salvo os relativos direitos reais sobre imóveis, que se formalizam por instrumento lavrado em cartório de notas, de tudo juntando-se cópia no processo que lhe deu origem.

Parágrafo único. É nulo de nenhum efeito contrato verbal com Administração, salvo de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea ‘a’ desta Lei, feitas em regime de adiantamento. (Negritos de ora)

Passemos a analisar um caso prático: por exemplo, um contrato administrativo por escopo, como uma obra pública e cujo prazo de vigência tenha expirado sem que a obra tenha sido concluída. Pela tese citada supra, superada pela doutrina e recentemente pelos julgados colegiados, seria possível continuar a execução do contrato, prorrogar prazo, efetivar acréscimo ou decréscimo de quantitativo ou rescindi-lo, ainda que expirado o prazo de vigência, uma vez que o fim do prazo não teria o condão de extinguir contrato, que pereceria apenas depois da conclusão do objeto.

No exemplo controverso temos o ponto fulcral do tópico: reside a ocorrência capaz de pôr fim ao contrato administrativo de escopo é o alcance do termo final do prazo de vigência ou a efetiva entrega do objeto?

Ocorrdo o primeiro (o término do prazo de vigência) antes do segundo fato (a conclusão e entrega do objeto contratual), como ficariam as relações entre os contratados? Pela tese do contrato de escopo, as relações continuariam como antes, sem que prazo de vigência tenha qualquer efeito sobre as relações constituídas ou pendentes.

Pois bem, reiteramos, em consonância com a boa doutrina, entendimentos recentes do TCU e julgados pretorianos, que a solução acima vislumbrada (continuidade do contrato depois do prazo de vigência) não possui respaldo na sistemática de contratações públicas, principalmente pelo teor expresso e inequívoco de dispositivo da Lei nº 8.666/93 que veda contrato administrativo por prazo indeterminado {art. 57, §3º):

“Art. 57.  A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos(...)

§ 3o  É vedado o contrato com prazo de vigência indeterminado.” (Negritos de ora)

Tal vedação implica na exigência de previsão expressa de um prazo final definido, atingido o qual o contrato considera-se extinto. Não se admite, em sede de contratação pública, a sistemática aplicável em sede de direito privado segundo o qual "o meio usual de extinção do contrato e a sua execução"[5], pois os contratos administrativos regidos pela Lei nº 8.666/93 se regulam por suas cláusulas e pelos preceitos de direito público.

A aplicação dos princípios da teoria geral dos contratos e disposições de direito privado é meramente supletiva em sede de contrato administrativo, como observamos da letra do art. 54, caput do Estatuto Licitatório.

No que tange ao prazo indeterminado, reiteramos não há dúvida quanto a sua vedação, dada a clareza da Lei, por isso não há que se recorrer à teoria geral dos contratos ou às disposições de direito privado. No que tange aos contratos administrativos, as obrigações contratuais devem estar previstas em instrumento escrito, com cláusulas obrigatórias e ou exuberantes, dentre elas o prazo de execução de duração do contrato (prazo de vigência). Esse foi o formato que Lei nº 8.666/93 previu como adequado para que se possa qualificar um contrato administrativo como regular e apto a produzir efeitos.

Por isso, a Lei 8666/93 prevê casos em que, por variados motivos, permite-se a ampliação do prazo de execução e de vigência, de modo que se possa concluir o objeto de forma tempestiva e de acordo com os dispositivos estabelecidos em Lei. Fora dessa "disciplina legal", um contrato perde a natureza de ‘contrato administrativo’ e passa a ter natureza diversa. Se a sistemática jurídica concedesse amparo ao contrato de escopo, não precisaria estipular os casos em que os prazos seriam prorrogáveis, pois estaria implícita a possibilidade de prorrogação ‘ad aeternum’, até que fosse concluído o objeto contratual.

Desta forma, se o prazo de vigência expirar sem a prorrogação tempestiva, impõe-se reconhecer a extinção do contrato administrativo, assim entendido o instrumento formal escrito e celebrado mediante prévia licitação (via de regra). Não resta dúvida de que caso permaneça uma situação fática de continuidade contratual sem a devida formalização de referida alteração por regular aditamento, em termos jurídicos podemos no máximo inferir: em razão da expiração do prazo de vigência, sobejam obrigações com suporte, no máximo, em contrato verbal.

Como o contrato verbal é considerado nulo pela Lei nº 8.666/93 (art. 60, parágrafo único), não se pode admitir que esteja respaldada na Lei essa situação de transmutação do contrato formal em verbal.

Juridicamente, não se sustenta que um contrato administrativo permaneça em vigor até a entrega do objeto, como pretendem os que advogam tese de que "o prazo de execução somente se extingue quando contratado entrega para Administração objeto contratado."

Uma legitimação do caso supracitado implicaria em admitir que um contrato administrativo deve ter prazo sujeito a um evento futuro e incerto, qual seja, a conclusão do objeto contratual, que pode acontecer ou não, portanto incerteza não apenas no que se refere ao prazo, mas do próprio fato, qual seja, do adimplemento (ou não) da obrigação. Não vislumbramos diferença entre essa situação e a vedada pelo art. 57, §3º da Lei n 8.666/93 supratranscrita. Até porque sujeitar a expiração de um contrato a um evento futuro e incerto é explicitamente reconhecer que contrato possui prazo indeterminado, situação não albergada por Lei.

 Logo e na esteira desse raciocínio, comprova-se exaustivamente que a tese do contrato por escopo viola frontalmente a obrigatoriedade de formalização escrita do contrato administrativo e dos seus termos aditivos, que tem como escopo evitar a configuração de contrato verbal, ante à impossibilidade de celebração de contrato com prazo indeterminado.

Adicionalmente, a continuidade de execução de contrato expirado viola ainda uma terceira salvaguarda constante dos contratos administrativos: a homologação de novo contrato, pois tal irregularidade (prorrogação por tempo indefinido e automática nos contratos de escopo) implica numa ‘recontratação’ sem prévia licitação ou contratação direta, se for o caso.

Esse entendimento não exige maiores fundamentos jurídicos, porque já resta pacífico e remanso no âmbito da Advocacia-Geral da União (AGU) e é entendimento majoritário nos demais órgãos colegiados, como será visto posteriormente.

Reiteramos que, uma vez expirado o prazo de vigência, tem-se por extinto qualquer ato ulterior em sede do contrato, ou seja, isso equivaleria a uma nova contratação. Ocorre que uma nova contratação – pela Constituição Republicana e pela lei – deve necessariamente ser instrumentalizada por uma nova contratação.

2.3 A IDÉIA EQUÍVOCA DE QUE A TESE ‘DO PRAZO INDETERMINADO DO CONTRATO POR ESCOPO’ TERIA AMPARO NO TCU

Existem de fato algumas decisões do TCU minimizando problema da perda de prazo contratual nos contratos de escopo. Em alguns julgados, o Tribunal até admitiu fosse realizado um aditivo fora do prazo, como se constata de notícia veiculada no Informativo de Licitações e Contratos nº 44, referente ao Acórdão nº 3.131/2010-Plenário.

A notícia supra reflete um entendimento minoritário que defende que - analisando casos de forma casuística - podemos tratar o fim do prazo contratual como um erro ou incidente meramente formal. Em julgados mais antigos, o Tribunal de Contas da União admitia esta ultrapassada tese.

Eis trecho do voto proferido no Acórdão nº 1.980/2004 Primeira Câmara:

“Nessa linha, jurisprudência do Tribunal tem-se manifestado no sentido de permitir retomada ou prosseguimento de contratos quando sua inexecução provocada pela Administração, como no presente caso, decorrente da descontinuidade de liberação de recursos orçamentários. Pode-se aplicar a interpretação de que contratada adquiriu direito de executar o objeto pactuado, tendo sido impedida por motivos aos quais não deu causa. Analisando aspecto da vigência do contrato, deve-se entender que prazo está vinculado também conclusão do objeto, não somente ao decurso do tempo.”

Mais uma vez constata-se a chancela, a posteriori da tese, consideradas as circunstâncias do caso concreto, porém, como já foi observado, os julgados são antigos. A atual posição e entendimento constante de julgados do Tribunal de Contas da União acerca do tema segue em sentido inverso, nos moldes infra[7]:

“CONTRATOS. DOU de 05.06.2013, 05.06.2013, p. 88. Ementa: notificação ao [...] no sentido de que foi identificada irregularidade (nas obras serviços de adequação reforma de armazém) caracterizada pela celebração de termo aditivo de prorrogação de prazo contratual com vigência do contrato já expirada e execução de serviços sem amparo contratual, constituindo infração ao art. 60. ‘caput’. da Lei nº 8.666/1993 e à jurisprudência do TCU.”

A ilegalidade da tese da vigência indefinida do contrato de escopo parece já ter sido reconhecida pela Orientação Normativa nº 03 da Advocacia-Geral da União (AGU), de 1º de abril de 2009, agora invocada analogicamente.

Eis teor da citada ON nº 03/2009 da Advocacia-Geral da União (AGU):

“Na análise dos processos relativos prorrogação de prazo, cumpre aos órgãos jurídicos verificar se não há extrapolação do atual prazo de vigência, bem como eventual ocorrência de solução de continuidade nos aditivos precedentes, hipóteses que configuram extinção do ajuste, impedindo sua prorrogação.” (Negritos de ora)

Como um dos fundamentos principais da referida ON temos a Nota DECOR nº57/2004-MMV[9] que foi aprovada pelo Advogado Geral da União e cujo trecho transcrevemos infra:

 “Ninguém discrepa que o contrato exaure-se pela expiração do prazo não prorrogado em tempo hábil, sendo ilícito qualquer aditivo assinado após extinção da vigência do contrato, por configurar recontratação sem licitação com infringência aos arts. 2.º e 3.º da Lei n.º 8.666/1993, devendo, portanto, o administrador precaver-se em tomar as providências necessárias a prorrogação do contrato a tempo, eis que, a formalização de aditivo ao contrato visando sua prorrogação, antes da data prevista para sua extinção, é forma essencial ao ato, não sendo, pois, passível de convalidação quando praticado com vício.(...) Assim, uma vez expirado o prazo de vigência do contrato, sem tempestiva prorrogação, deve o administrador, obrigatoriamente, providenciar nova licitação. Caso haja comprovado prejuízo do interesse público com imediata paralisação dos serviços, devidamente justificado, o administrador pode até valer-se da contratação emergencial com dispensa de licitação, por prazo suficiente realização da nova licitação, (...)” (Negritos de ora) 

Não deve existir, portanto, qualquer distinção de tratamento jurídico no que tange aos contratos de escopo. Logo, vem entendendo o TCU que relativamente aos processos que versem sobre aditamento de contratos, convênios ou instrumentos congêneres, com finalidade de prorrogar o prazo de vigência, deverá ser levado em conta data de expiração do prazo assinalado, rejeitando-se, de plano, os contratos com vigência expirada, devendo ser exigido, para compleição do exame prévio, que o processo esteja devidamente instruído com cópia completa do edital, do contrato original e dos termos aditivos anteriormente celebrados.

Trazemos à colação mais um pronunciamento da AGU: a Conclusão DEPCONSU/PGF/AGU nº 34/2013, cujo trecho passamos a transcrever:

“(...)II) prorrogação da vigência após sua expiração, mesmo que por culpa do concedente, não pode ser objeto de convalidacão, haja vista não se tratar de vício sanável. Deverá a concedente analisar eventual reconhecimento de dívida pela União, bem como verificar possibilidade aprovação da prestação de contas com ressalvas, se o objeto tiver sido concluído. Além disso, cabe apuração nos casos acima da responsabilidade de quem deu causa expiração da vigência. III) Com base na ON AGU nº 03, o parecerista deve apontar impossibilidade de prorrogação do instrumento que teve extrapolação de vigência e solução de continuidade nos aditivos anteriores. IV) Avulta notar ainda que, tendo em vista interesse público, a Administração Pública deverá, como solução jurídica mais viável no caso em análise, verificar possibilidade de assinatura de um novo convênio com convenente para continuidade do objeto, ou ainda, valer-se Administração Pública Federal da prerrogativa trazida no inciso VII do Art. 43 da Portaria n2 507/2011.” (Negritos de ora)

No que tange aos prazos de execução e de vigência, a sistemática dos convênios é muito similar a de um contrato de escopo: com prazo estipulado em função do objeto, pois, em regra, mais importante do que este prazo em si é que o objeto pelo o qual os convenentes uniram esforços em comum e aportaram recursos seja entregue no tempo estimado.

Desta forma, resta patente que a observância do prazo de vigência do contrato administrativo é formalidade essencial e inafastável, devendo ser observada sua tempestividade quando dos eventuais aditamentos contratuais.

2.4 SOLUÇÕES DA BOA DOUTRINA, ÓRGÃOS DE CONTROLE, TRIBUNAIS QUE PARA UM CONTRATO DE ESCOPO COM PRAZO EXPIRADO SEM OBJETO CONCLUÍDO.

Findo um contrato administrativo pela expiração do prazo de vigência sem que o objeto contratual tenha sido entregue ou finalizado, inequívoco que restam obrigações por serem cumpridas, chamadas de obrigações remanescentes.

Visando albergar essas obrigações pendentes e evitar enriquecimento ilícito de uma das partes, pode ser – a análise deve ser caso a caso - imperativa e necessária a conclusão do objeto tal qual inicialmente planejado, num instrumento jurídico válido, imprescindível que Administração celebre um novo contrato administrativo. Como no presente caso estamos tratando de dispensa e o objeto é o mesmo, analógica e logicamente uma nova dispensa se impõe aos três contratos sob análise neste estudo.

Em termos práticos, uma forma de inserir as obrigações não executadas no tempo, aqui tidas como remanescentes, seria, a partir da verificação do fim do prazo contratual, apurar o que efetivamente foi executado e fazer um projeto com o que não foi executado a fim de contratar novamente essa parte remanescente. O natural decurso do tempo entre a extinção do contrato original e a novel contratação pode ensejar algum prejuízo à obra ou ao serviço parcialmente executado, o que legitima uma possível contratação emergencial.

No presente caso, se verificada a configuraç de dispensa de licitação, poderá a Administração Pública fazer uma contratação direta. Temos a possibilidade legal, dependendo das peculiaridades do caso concreto, de se invocar a letra do art. 24, IV, da Lei nº 8.666/9316, que dispõe sobre contratação direta, sem licitação, "nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos outros bens, públicos ou particulares".

A exegese que hodiernamente se confere ao dispositivo supra permite sua aplicação mesmo aos casos em que reste verificada a desídia/culpa da Administração Pública. Eis letra da lei:

“Art. 24. É dispensável licitação: [...] IV- nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos outros bens, públicos ou particulares, somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada prorrogação dos respectivos contratos;”

Assim, não importa segundo recentes julgados colegiados, se a situação emergencial teve origem em ato culposo da Administração por seus agentes, pois a intenção do dispositivo é precipuamente a de preservar o interesse público em sentido amplo. E resguardar os bens, públicos ou privados.

Essa mudança de paradigma nos julgados recentes dos órgãos de controle e julgados pretorianos em relação a aplicação da dispensa do art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93 se encontra bem explicitada no seguinte Acórdão do TCU:

“DISPENSA DE LICITAÇÃO. DOU de 06.07.2012, S. 1, p. 153. Ementa: TCU deu ciência [...] no sentido de que situação prevista no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/1993 não distingue emergência real, resultante do imprevisível, daguela resultante da incúria ou inércia administrativa, sendo cabível, em ambas as hipóteses, contratação direta, só que, na segunda hipótese, será responsabilizado agente público gue não adotou tempestivamente as providências ele cabíveis.”

Esse entendimento também adotado na ON/AGU de nº 11/2009,é que a contratação direta com fundamento no inc. IV do art. 24 da Lei nº 8.666, de 1993, exige que concomitantemente, seja apurada se a situação emergencial foi gerada por falta de planejamento, desídia ou má gestão, hipótese que, deve se apurar uma eventual responsabilidade funcional.

Enfim, quando houver motivo para prorrogação, mas a Administração deixar de celebrar aditivo por desídia ou falta de planejamento, será igualmente lícito proceder a uma contratação emergencial, por dispensa de licitação, desde que preenchidos todos os requisitos do art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93, dentre os quais se destaca o limite de prazo de 180 (cento oitenta) dias do contrato emergencial para debelar ou regularizar situação.

A ON/AGU nº 03/2009, vislumbra reflexamente a possibilidade de contratação emergencial até que seja realizada uma nova licitação. Se objeto puder ser concluído em até 180 (cento oitenta) dias, é o caso de avaliar possibilidade de já celebrar contrato para conclusão do objeto, se isso for imprescindível à "segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos outros bens, públicos ou particulares", como exige a hipótese legal de dispensa.

No procedimento de apuração de preços ou vantajosidade comercial para eventual celebração de contratação emergencial, sem licitação, convém averiguar se o executor do contrato extinto por perda de prazo propõe-se a realizar os serviços emergenciais (objeto contratual) nas mesmas condições de preços anteriormente contratados, caso mais vantajosos. Essa medida, além de evitar os custos com desmobilização nova mobilização dentre outros, permite manter os preços anteriormente contratados, caso seja essa efetivamente uma proposta vantajosa para celebração do contrato emergencial.

Não há que se cogitar de eventual ilegalidade no procedimento acima vislumbrado, pois se o executor do contrato expirado poderá apresentar uma proposta para celebração do contrato emergencial, por que não facultá-lo continuar executar ou preservar obra ou serviço até nova licitação - pelo preço anteriormente contratado, possivelmente até mais vantajoso? Trata-se, aqui, de regularizar situação crítica já mencionada, qual seja, pendência de obrigações por cumprir sem contrato formal escrito que as ampare. No caso, as obrigações restariam reduzidas termo num contrato formal celebrado, sem realização de licitação mas com fundamento para dispensa, com preços que foram anteriormente licitados mais vantajosos.

Para fazer uso da dispensa de licitação, é imprescindível que sejam preenchidos todos os requisitos legais e que o prazo contratual não se tenha esvaído por culpa do contratado. Assim, nos casos ora analisados, a nova contratação direta do objeto remanescente de contrato anterior dar-se-ia sem licitação, mas com amparo na legislação, mais especificamente no art. 24, IV, da Lei nº 8.666/93, afastando a ilegalidade vislumbrada pelo TCU pela AGU quando condena a execução de contrato vencido.

Desta forma, não permitir a recontratação do atual executor implicaria violar os princípios da isonomia, economicidade e razoabilidade ao impor uma demorada desmobilização e novo procedimento de contratação com outra empresa. Como a legislação faculta contratação de terceiro para realização dos serviços emergenciais- possivelmente até conclusão da obra ou serviço, do objeto contratado -, não se vislumbra motivo para não permitir também contratação do anterior executor que não concorreu para situação de emergência ou calamidade, de culpa exclusiva da Administração, que deixara de celebrar aditivo de prazo tempo modo.

Urge consignar que, ainda que seja celebrado contrato emergencial, não se deve esquecer-se da ocorrência de uma situação irregular: a perda do prazo contratual. Independentemente da solução a ser conferida para viabilizar a conclusão do objeto contratual, impõe-se apuração de eventual responsabilidade de quem deu causa a situação excepcional, ainda que seja para afastar a responsabilidade do agente público em função das justificativas apresentadas.

Por fim, vale registrar que eventual continuidade da execução após expirado prazo de vigência representa situação equivalente de um contrato verbal, haja vista extinção do contrato escrito. Aduz a ON/AGU nº 04/2009:

"A despesa sem cobertura contratual deverá ser objeto de reconhecimento da obrigação de indenizar nos termos do art. 59, parágrafo único, da Lei nº 8.666, de 1993, sem prejuízo da apuração da responsabilidade de quem lhe der causa".