Quais relações podem ser estabelecidas entre a modernização no campo e a urbanização brasileira?

X Coloquio Internacional de Geocrítica

DIEZ AÑOS DE CAMBIOS EN EL MUNDO, EN LA GEOGRAFÍA Y EN LAS CIENCIAS SOCIALES, 1999-2008

Barcelona, 26 - 30 de mayo de 2008
Universidad de Barcelona

REDES AGROINDUSTRIAIS E URBANIZA��O DISPERSA NO BRASIL

Redes agroindustriais e urbaniza��o dispersa no Brasil (Resumo)

Ao lado da metropoliza��o, o Brasil passou por significativas transforma��es urbanas, a partir dos anos de 1980, quando crescem tamb�m as cidades m�dias e locais. Tudo isto promove a quebra de paradigmas, fazendo com que os antigos esquemas utilizados para classificar a rede urbana brasileira, as divis�es regionais e as regi�es metropolitanas, at� hoje amplamente empregados, encontrem-se, em parte, ultrapassados. Uma das vias de reconhecimento das mudan�as � a compreens�o de como se processa a produ��o dos espa�os urbanos n�o metropolitanos associados � reestrutura��o produtiva da agropecu�ria. Temos como objetivo principal reconhecer os processos e a din�mica de (re)produ��o dos espa�os urbanos n�o metropolitanos e as novas rela��es campo-cidade promovidas pela reestrutura��o produtiva da agropecu�ria, especialmente considerando cidades com pap�is de intermedia��o na rede urbana brasileira, n�s importantes de gest�o das redes agroindustriais globalizadas.

Palavras-chave: Reestrutura��o produtiva da agropecu�ria; redes agroindustriais; cidades m�dias; Brasil.

Agro-industrial networks & disperse urbanization in Brazil (Summary)

Beside the metropolitan process, Brazil has experienced significant urban transformations, starting from the years of 1980, when the medium size and local cities also increase. All this promotes the breaking of paradigms, so that the old outlines used to classify the Brazilian urban network, the regional divisions and metropolitan areas, until now largely used, are, in part, outdated. One of the ways of recognition of these changes is the understanding of the production process of non-metropolitan urban spaces in relation to the restructuring of agricultural production. We have as main objective to recognize the processes and dynamics of (re) production of the non-metropolitan urban spaces and the new field-city relationships promoted by the productive restructuring of agriculture, especially considering cities with intermediation roles in the Brazilian urban network, important nodes for of management of globalized agro-industry networks.

Key-words: productive restructuring of agriculture: agro-industrial networks, medium size cities, Brazil.


O presente artigo procura sintetizar alguns dos fundamentos te�ricos e metodol�gicos que v�m norteando a estrutura significativa das linhas de pesquisa por n�s trabalhadas nos �ltimos anos, com o objetivo de compreender como se processa a produ��o do espa�o urbano n�o metropolitano, no Brasil, em �reas que passam por processo de reestrutura��o produtiva da agropecu�ria, denotando novas din�micas aos espa�os agr�colas e urbanos do entorno. Reflete tamb�m o recorte tem�tico por n�s trabalhado em projeto em andamento pela Rede de Pesquisadores sobre Cidades M�dias (ReCiMe)[2], intitulada Cidades m�dias brasileiras: agentes econ�micos, reestrutura��o urbana e regional, do qual participam profissionais de diversas universidades brasileiras[3].

Para tanto, baseamo-nos no fato de que, paralelamente � metropoliza��o, principal caracter�stica da urbaniza��o brasileira nas d�cadas de 1960 e 1970, o Brasil passou, a partir dos anos de 1980, por significativas transforma��es urbanas, quando crescem tamb�m as cidades m�dias e locais. Tudo isto promove a quebra de paradigmas, fazendo com que os antigos esquemas utilizados para classificar a rede urbana brasileira, as divis�es regionais e as regi�es metropolitanas, at� hoje amplamente empregados, encontram-se, em parte, ultrapassados, necessitando de uma revis�o que d� conta da complexidade da realidade atual.

Uma das vias de reconhecimento das mudan�as � a compreens�o de como se processa a produ��o dos espa�os urbanos n�o metropolitanos, aqui inclu�das as cidades m�dias. Com a generaliza��o do fen�meno da urbaniza��o da sociedade e do territ�rio, que o Brasil atinge no final do s�culo XX, os trabalhos de investiga��o cient�fica sobre estas cidades t�m sua relev�ncia refor�ada, suscitando estudos de alguns dos mais renomados pesquisadores brasileiros, especialmente a partir da d�cada de 1990, sendo que os da Geografia e do Planejamento Urbano e Regional merecem destaque[4].

Como hip�tese central, consideramos que a reestrutura��o produtiva da agropecu�ria, que atinge tanto a base t�cnica quanto a econ�mica e social do setor, tem profundos impactos sobre os espa�os agr�colas e urbanos, que passam por um processo acelerado de reorganiza��o. Estes se mostram extremamente abertos � expans�o dos sistemas de objetos e dos sistemas de a��o (Santos, 1996), pr�prios do atual sistema temporal, que t�m na globaliza��o uma de suas principais caracter�sticas (Santos, 2000; Ianni, 1996). Com a compress�o tempo-espa�o (Harvey, 1996), o campo apresenta-se como um espa�o com menos rugosidades (Santos, 1985), possuidor de uma flexibilidade muito superior � apresentada pelas cidades e, assim sendo, como um l�cus de difus�o dos capitais industriais e financeiros.

Com a expans�o dos sistemas de objetos voltados a dotar o territ�rio de fluidez para os investimentos produtivos de uma maneira geral, os fatores locacionais cl�ssicos s�o redimensionados, ocorrendo uma verdadeira descentraliza��o da produ��o. Neste contexto, se at� a d�cada de 1980, o conjunto da agropecu�ria da Regi�o Nordeste do Brasil permaneceu quase inalterado, passa a receber vultosos investimentos de empresas agr�colas. O Semi-�rido brasileiro[5], notadamente alguns dos seus vales �midos, que at� ent�o, de certa forma, compunham o ex�rcito de lugares de reserva (Santos, 1993) para o agroneg�cio, tornam-se atrativos e s�o incorporados aos circuitos produtivos globalizados de empresas nacionais e multinacionais hegem�nicas do setor.

Tal inser��o baseia-se, muito fortemente, no modelo econ�mico predominante nas �ltimas d�cadas no Brasil, claramente de inser��o passiva do pa�s � economia e consumo globalizados, cujo objetivo maior � atrelar as �reas e setores econ�micos considerados mais competitivos do pa�s � din�mica do mercado mundializado. Parte do Semi-�rido assume, assim, novos pap�is na divis�o internacional do trabalho agr�cola e vive, desde ent�o, importantes transforma��es socioespaciais (Elias, 2006a,c, 2007c).

Assiste-se, a partir desta inser��o, a radical mudan�a do discurso sobre as possibilidades econ�micas do Semi-�rido, notadamente nos seus vales �midos, construindo-se um novo imagin�rio social sobre estas �reas, consideradas agora com v�rias vantagens comparativas, para as quais se vislumbram amplas oportunidades para o agroneg�cio globalizado, em especial, de frutas tropicais (especialmente mel�o e banana).

O Semi-�rido nordestino passa a ser considerado como fra��o do espa�o do planeta cada vez mais aberta �s determina��es ex�genas e aos novos signos contempor�neos. Isto � ainda mais verdade no relacionado aos mercados, cada vez mais long�nquos e competitivos; aos pre�os, geridos pelas principais bolsas de mercadorias do mundo; � pesquisa agropecu�ria, muitas vezes induzida pelos interesses de multinacionais hegem�nicas, e, sobretudo, no referente aos centros de decis�o e comando, todos localizados fora da regi�o e mesmo fora do pa�s.

Nas �reas onde se expande o agroneg�cio globalizado no Brasil, o meio natural e o meio t�cnico s�o rapidamente substitu�dos pelo meio t�cnico-cient�fico-informacional (Santos, 1985, 1988, 1996, 2000). Isto significa que os espa�os agr�colas tamb�m se mecanizam e passam a compor parte das redes agroindustriais (Elias, 2006a,b) e, onde a atividade agropecu�ria d�-se baseada na utiliza��o intensiva de capital, tecnologia e informa��o, principais for�as produtivas do presente per�odo hist�rico, � vis�vel o incremento da urbaniza��o, do n�mero e do tamanho das cidades.

S�o muitas as evid�ncias de que a din�mica da produ��o agropecu�ria globalizada � um dos vetores da reorganiza��o produtiva do territ�rio brasileiro. Em todas as �reas nas quais se verifica a difus�o do agroneg�cio, processa-se uma reestrutura��o da economia e do espa�o, resultando no incremento da urbaniza��o. Entre nossas principais preocupa��es, neste momento, est� justamente compreender a din�mica dessa urbaniza��o, especialmente a partir das novas rela��es campo-cidade.

� not�rio que os antigos esquemas utilizados para classificar a rede urbana brasileira, as divis�es regionais e as regi�es metropolitanas, at� hoje empregados pelos institutos oficiais de pesquisa do pa�s, encontram-se, em parte, ultrapassados e n�o d�o conta da complexidade da realidade atual. Parece-nos que uma das vias de reconhecimento das mudan�as � a compreens�o de como se processa a produ��o dos espa�os urbanos n�o metropolitanos(Elias, 2006a,b, 2007a), nos quais se realizam, a n�vel local e regional, as condi��es da reprodu��o das redes agroindustriais.

O arcabou�o te�rico e conceitual para a explica��o de tais processos e impactos socioespaciais encontra-se em constru��o, at� porque muitos ainda est�o em curso. Mas, acreditamos ser poss�vel citar alguns caminhos, sempre com o objetivo de avan�ar na an�lise e na s�ntese desses processos.

Como fundamentos de m�todo, imp�em-se a escolha de temas e processos com os quais seja poss�vel reconhecer �a especificidade do novo e sua defini��o estrutural e funcional; as combina��es com os fatores herdados e o seu movimento de conjunto, governada pelos fatores novos, presentes localmente ou n�o e, tamb�m, os ritmos de mudan�as e suas combina��es� (Santos, 1994: 129). Dessa forma, parece-nos importante refletir sobre quest�es associadas �s novas rela��es campo-cidade, as quais, em �ltima inst�ncia, fazem-nos refletir sobre a territorializa��o do capital no espa�o agr�rio e, conseq�entemente, nos pontos e n�s componentes das redes agroindustriais, comandadas pelas grandes corpora��es do sistema alimentar globalizado.

O texto visa apresentar os estudos que estamos realizando sobre a cidade de Mossor� e regi�o, pertencente ao Estado do Rio Grande do Norte, notadamente no que tange ao incremento das novas rela��es campo-cidade inerentes � difus�o da produ��o intensiva de frutas tropicais, visando � exporta��o.

Tal objeto de estudo mostra-se de extrema import�ncia para a an�lise do tema, especialmente a partir de conclus�es e hip�teses resultantes de pesquisa anterior que realizamos por tr�s anos, que privilegiou a difus�o do agroneg�cio e as novas din�micas socioespaciais na Regi�o Nordeste brasileira, especialmente no Baixo Jaguaribe (Estado do Cear�, composta por 10 munic�pios).

Entre nossas constata��es, pudemos observar que a difus�o do agroneg�cio promove a forma��o de novas regi�es produtivas agr�colas, as quais denominamos de arranjos territoriais produtivos agr�colas (Elias, 2006a,b,c). Estes seriam os pontos luminosos (Santos, 1996) do espa�o agr�rio do Semi-�rido nordestino, as �reas mais din�micas quanto � expans�o da moderniza��o da produ��o e do espa�o. Tal realidade acirra a refuncionaliza��o dos espa�os agr�colas e leva � difus�o de especializa��es territoriais produtivas, denotando-se in�meras seletividades, seja da organiza��o da produ��o, seja da din�mica do pr�prio espa�o agr�cola.

A forma��o destas regi�es produtivas agr�colas obedece aos interesses dos agentes hegem�nicos que est�o � frente de tais processos, empresas agr�colas nacionais e multinacionais, e isso significa que n�o seguem necessariamente �s divis�es pol�ticas administrativas estabelecidas, nem mesmo aos interesses locais, regionais ou mesmo nacionais. � importante destacar que tais regi�es cont�m tamb�m espa�os urbanos, especialmente cidades locais, mas tamb�m cidades de porte m�dio.

Entre os mais importantes arranjos territoriais produtivos agr�colas existentes hoje na Regi�o Nordeste,ter�amos o inerente � produ��o de frutas tropicais em alguns vales �midos do Semi-�rido, englobando munic�pios do Rio Grande do Norte e do Cear�. Esta regi�o tem Mossor� em seu �mago, uma cidade de porte m�dio, a segunda mais importante do Estado, sendo superada somente pela capital.

Novas din�micas das rela��es campo-cidade

A reestrutura��o produtiva da agropecu�ria tem promovido profundos impactos socioespaciais no Brasil, quer no campo quer nas cidades. Isto explica em parte a reestrutura��o do territ�rio e a organiza��o de um novo sistema urbano, muito mais complexo, resultado da difus�o do agroneg�cio globalizado, que t�m poder de impor especializa��es produtivas ao territ�rio.

No Brasil, � poss�vel identificar v�rias �reas nas quais a urbaniza��o se deve diretamente � consecu��o do agroneg�cio globalizado. Como � not�rio, a moderniza��o e a expans�o dessas atividades promovem o processo de urbaniza��o e de crescimento das �reas urbanas, cujos v�nculos principais se devem �s inter-rela��es cada vez maiores entre o campo e a cidade. Estas desenvolvem-se atreladas �s atividades agr�colas e agroindustriais circundantes cuja produ��o e consumo d�o-se de forma globalizada. Al�m disso, representam um papel fundamental para a expans�o da urbaniza��o e para o crescimento de cidades m�dias e locais, fortalecendo-as, seja em termos demogr�ficos ou econ�micos.

Os elementos estruturantes das novas rela��es campo-cidade podem ser encontrados, por exemplo, na expans�o do mercado de trabalho agropecu�rio que promove o �xodo rural (migra��o ascendente) e a migra��o descendente (Santos, 1993) de profissionais especializados no agroneg�cio, e na difus�o do consumo produtivo agr�cola (Elias, 2003, 2007b). Ao mesmo tempo, as novas rela��es campo-cidade dinamizam o terci�rio e, conseq�entemente, a economia urbana, e evidenciam que � na cidade que se realizam a regula��o, a gest�o e a normatiza��o das transforma��es verificadas nos pontos luminosos do espa�o agr�cola.

A racionaliza��o desse espa�o imposta pela difus�o do agroneg�cio deriva da forma��o de redes de produ��o agropecu�rias globalizadas (Elias, 2006a,b,c) que associam: empresas agropecu�rias, fornecedores de insumos qu�micos e implementos mec�nicos, laborat�rios de pesquisa biotecnol�gica, prestadores de servi�os agropecu�rios especializados, agroind�strias, cadeias de supermercados, de distribui��o comercial, de pesquisa agropecu�ria, de marketing, de fast food etc.

Como resultado, temos a intensifica��o da divis�o do trabalho, das trocas intersetoriais, da especializa��o da produ��o e a produ��o de diferentes arranjos territoriais produtivos agr�colas, assim como a reestrutura��o das cidades no interior desses arranjos produtivos, a mostrar o aprofundamento da territorializa��o do capital no campo e da monopoliza��o do espa�o agr�cola.

Defendemos (Elias, 2003, 2005a,c,d, 2006b,c) que � poss�vel identificar no Brasil agr�cola moderno v�rios munic�pios cuja urbaniza��o deve-se diretamente � consecu��o e � expans�o do agroneg�cio, e cuja fun��o principal claramente associa-se �s demandas produtivas dos setores relacionados � moderniza��o da agricultura. Nessas cidades, que se caracterizam por serem cidades locais ou que desempenham pap�is de intermedia��o na rede urbana, realiza-se a materializa��o das condi��es gerais de reprodu��o do capital do agroneg�cio.

Paralelamente � intensifica��o do capitalismo no campo com a difus�o do agroneg�cio, processou-se um crescimento de �reas urbanizadas, porquanto, entre outras coisas, a gest�o da agropecu�ria moderna necessita da proximidade e da coopera��o que os ambientes urbanos proporcionam. Tal fato colabora para o Brasil chegar ao s�culo XXI com uma generaliza��o do fen�meno da urbaniza��o da sociedade e do territ�rio.

Ao lado da metropoliza��o, principal caracter�stica da urbaniza��o brasileira nas d�cadas de 1960 e 1970, Milton Santos (1993) adverte para o fato de o Brasil ter passado por verdadeira revolu��o urbana, a partir da d�cada de 1980, com a expans�o do fen�meno o qual classifica de involu��o metropolitana, quando crescem tamb�m as cidades m�dias e locais. Outros preferem usar os termos urbaniza��o difusa, urbaniza��o extensiva, outros, ainda, cidade dispersa. Mas, o importante � destacar que � imposs�vel continuar simplesmente dividindo o Brasil entre urbano e rural. Ainda segundo Santos, uma divis�o entre um Brasil urbano com �reas agr�colas e um Brasil agr�cola com �reas urbanas refletiria melhor a realidade contempor�nea do pa�s.

Uma das conseq��ncias da reestrutura��o produtiva da agropecu�ria no Brasil � o processo acelerado de urbaniza��o e crescimento urbano promovido, pelas novas rela��es entre o campo e a cidade, que, por sua vez, foram desencadeadas pelas novas necessidades do consumo produtivo agr�cola, o qual cresce mais rapidamente do que o consumo consumptivo[6].

Sem d�vida, o impacto de todas essas transforma��es t�cnicas, econ�micas e sociais na din�mica populacional e na estrutura demogr�fica � intenso. Concomitantemente a uma verdadeira revolu��o tecnol�gica da produ��o agropecu�ria e agroindustrial e �s transforma��es nas rela��es de trabalho, ocorreu uma revolu��o demogr�fica e urbana, marcada por grande crescimento populacional, particularmente nas cidades. Dessa forma, o Brasil tem apresentado acelerado processo de urbaniza��o e not�vel crescimento urbano.

O desenvolvimento de uma gama extensa de novas rela��es entre o campo e as cidades deve-se � crescente integra��o do agroneg�cio ao circuito da economia urbana. Tal situa��o d�-se, principalmente, porque o agroneg�cio tem o poder de impor especializa��es territoriais cada vez mais profundas. A produ��o agr�cola e agroindustrial intensiva exige que as cidades pr�ximas ao campo se adaptem para atender �s suas principais demandas, convertendo-as no seu laborat�rio, em virtude de fornecerem a grande maioria dos aportes t�cnicos, financeiros, jur�dicos, de m�o-de-obra e de todos os demais produtos e servi�os necess�rios � sua realiza��o. Quanto mais modernas se tornam essas atividades, mais urbana se torna a sua regula��o.

A cada renova��o das for�as produtivas agr�colas e agroindustriais, a cada renova��o dos sistemas t�cnicos agr�colas e dos sistemas de a��o que lhes d�o suporte, as cidades que coordenam os espa�os agr�colas de produ��o intensiva tornam-se respons�veis pelo atendimento das demandas crescentes de uma s�rie de novos produtos e servi�os, das sementes transg�nicas � m�o-de-obra especializada. Isto faz crescer a urbaniza��o, o tamanho e o n�mero das cidades.

As casas de com�rcio de implementos agr�colas, sementes, gr�os e fertilizantes, os escrit�rios de marketing e de consultoria cont�bil, os centros de pesquisa biotecnol�gica, as empresas de assist�ncia t�cnica e de transportes, os servi�os de especialistas em engenharia gen�tica, veterin�ria, administra��o, meteorologia, agronomia, economia, administra��o p�blica, entre tantas outras profiss�es, difundem-se por todas as partes do Brasil agr�cola moderno que comporia o Brasil agr�cola com �reas urbanas.

Com isso, a reestrutura��o da agropecu�ria n�o apenas ampliou e reorganizou a produ��o material, agr�cola e industrial, como foi determinante para a expans�o quantitativa e qualitativa da terciariza��o das economias pr�ximas �s �reas de realiza��o do agroneg�cio, especialmente os ramos associados ao circuito superior da economia (Santos, 1979).

O resultado � uma grande metamorfose e o crescimento da economia urbana das cidades pr�ximas �s �reas de produ��es agropecu�rias modernas, paralelamente ao desenvolvimento de um novo patamar das rela��es entre campo e cidade, percept�vel nos diferentes circuitos espaciais de produ��o e c�rculos de coopera��o (Santos, 1986a, 1988; Elias, 2003)estabelecidos entre esses dois espa�os.

Com a fluidez poss�vel gra�as � constru��o dos modernos sistemas de engenharia dos transportes e das comunica��es, intensificam-se as trocas de toda natureza, com grandes impactos na vida social e no territ�rio, reformulando o sistema urbano antigo. A expans�o das redes agroindustriais n�o apenas repercutiu na estrutura t�cnica das suas respectivas atividades econ�micas como causou profundos reflexos nas rela��es de trabalho, transformando o conjunto de normas e padr�es que as regulavam. Como resultado, ocorre uma nova divis�o social e territorial do trabalho, com conseq��ncias na estrutura demogr�fica e do emprego, que culminam em acelerado processo de urbaniza��o, o qual se realiza sobre novas bases e gera novas pr�ticas socioespaciais.

Cada vez que o territ�rio brasileiro � reelaborado para atender � produ��o das redes agroindustriais, novos fixos artificiais se sobrep�em � natureza e, desse modo, amplia-se a complexidade dos sistemas t�cnicos do espa�o agr�rio. Diante disso, o territ�rio do agroneg�cio torna-se cada vez mais r�gido, mais rugoso, promovendo uma urbaniza��o corporativa (Santos, 1993; Elias, 2003), empreendida sob o comando dos interesses das holdings hegem�nicas do sistema agroalimentar.

A moderniza��o da atividade agr�cola e agroindustrial redefine o consumo do campo, que deixou de ser apenas consumptivo para se tornar cada vez mais produtivo, e criou demandas at� ent�o inexistentes.

Contudo, n�o � apenas a cidade que tem for�a para receber e emitir numerosos e variados fluxos. Hoje, muitas das atividades realizadas no campo, n�o s�o necessariamente agr�colas. Essas agroind�strias t�m o poder de criar muitas novas rela��es, pr�ximas ou n�o, cujos circuitos espaciais da produ��o e c�rculos de coopera��o buscam nexos distantes. Conseq�entemente, criam uma gama de novas rela��es sobre o territ�rio, transformam radicalmente as tradicionais rela��es campo-cidade e fazem com que esses dois espa�os passem a emitir e a receber larga quantidade de fluxos de mat�ria e de informa��o. O resultado � uma total reorganiza��o do territ�rio brasileiro, urbano e agr�cola, onde se destaca a expans�o do meio t�cnico-cient�fico-informacional n�o s� nas cidades, mas tamb�m no campo.

Tudo isso fez da urbaniza��o um processo bastante complexo, dada a multiplicidade de vari�veis que nela passam a interferir, como, por exemplo: a moderniza��o agropecu�ria associada ao setor industrial, com a conseq�ente especializa��o dessas produ��es; o crescimento da produ��o n�o-material, seja associada ao consumo produtivo agr�cola ou ao consumo consumptivo; o aumento da quantidade e da qualidade de trabalho intelectual; o intenso processo de �xodo rural; a exist�ncia do agr�cola n�o-rural; a migra��o descendente, etc. � insuficiente, assim, considerar apenas as antigas rela��es campo-cidade, pois seja o campo, seja a cidade s�o diferentes do que eram h� trinta anos atr�s. Quanto mais se aprofunda a divis�o do trabalho agr�cola, mais intenso e complexo torna-se o processo de urbaniza��o.

No per�odo t�cnico-cient�fico-informacional (Santos, 1985, 1988, 1993, 1996), as cidades mais importantes dentro de uma regi�o produtiva agr�cola moderna passam a desempenhar muitas novas fun��es. Transformam-se, ent�o, em lugares de todas as formas de coopera��o erigidas pelo agroneg�cioglobalizado eresultam em muitas novas territorialidades.

O consumo produtivo agr�cola gera demandas heterog�neas segundo as necessidades de cada produto (agr�cola ou agroindustrial), assim como durante as diferentes etapas do processo produtivo, diferenciando os equipamentos mercantis. Dessa forma, para compreender a economia urbana das cidadesque possuem destacado consumo produtivo agr�cola, � importante observar as fun��es exercidas por cada uma delas durante as diferentes etapas do processo produtivo, como, por exemplo, na safra e na entressafra.

� no per�odo de safra das principais culturas de cada �rea que podemos distinguir com maior nitidez a especializa��o da cidade. Esse � o momento mais din�mico nas v�rias regi�es do Brasil agr�cola com �reas urbanas, afetando todos os setores econ�micos. Um exemplo marcante � o funcionamento ininterrupto de muitas das agroind�strias cuja manuten��o d�-se apenas durante a entressafra. � tamb�m no per�odo da colheita que aumenta o n�mero de empregos agr�colas tempor�rios, especialmente para a colheita das culturas que ainda n�o t�m na mecaniza��o a forma predominante de realiza��o desta etapa do processo produtivo. Mas o essencial � destacar que crescem exponencialmente o consumo produtivo agr�cola, assim como o consumptivo, os quais geram in�meros fluxos, materiais e de informa��o, de diferentes n�veis de complexidades.

Ressaltamos, ainda, que quanto mais din�mica a reestrutura��o produtiva da agropecu�ria, quanto mais complexa a forma��o das redes de produ��o agropecu�ria e quanto mais globalizados os seus circuitos espaciais produtivos e os seus c�rculos de coopera��o, mais complexas tornam-se as rela��es campo-cidade.

Ensaio sobre um espa�o urbano n�o metropolitano inserido em uma nova regi�o produtiva agr�cola

Neste item, trazemos como exemplo, o noroeste potiguar, regi�o que tem interessado aos capitais hegem�nicos do agroneg�cio de frutas tropicais para exporta��o, em especial mel�o e banana. As vantagens proporcionadas pelos seus vales �midos, �reas privilegiadas do Semi-�rido brasileiro, fazem com que as empresas do agroneg�cio fruticultor tendam a se expandir na regi�o, contribuindo para tanto as pol�ticas p�blicas promovidas pelos governos estadual e federal, as quais t�m alocado recursos em infra-estrutura necess�ria ao incremento da agricultura irrigada, bem como garantindo subs�dios que possam atrair empres�rios do setor.

Isto resultou na vinda de empresas agr�colas, nacionais e multinacionais, promovendo, entre outros impactos, mudan�as na estrutura fundi�ria da regi�o, transforma��es nas rela��es de trabalho e, especialmente, modifica��es nos padr�es de urbaniza��o, passando a se configurar uma rede de cidades onde despontam aquelas associadas ao agroneg�cio, polarizadas pela cidade de Mossor�[7]. Esta apresenta contingentes populacionais e terci�rios diferenciados, uma vez que se encontra em est�gio mais avan�ado de estrutura��o urbana, guardando pontos de complementa��o com as respectivas cidades menores dentro da mesma regi�o produtiva.

Segunda cidade mais importante do Rio Grande do Norte dista cerca de 200 km da capital e encabe�a uma aglomera��o com mais de 600 mil habitantes, composta por cerca de 45 munic�pios, especialmente do Rio Grande do Norte e do Cear�. Configura-se como uma cidade de porte m�dio, que tem sua economia dinamizada a partir da diversidade da atividade econ�mica, ampliando sua import�ncia na regi�o, vindo a se constituir num centro regional com localiza��o entre duas regi�es metropolitanas, Fortaleza (CE) e Natal (RN).

H� o interesse de que a pesquisa que estamos realizando seja a mais ampla poss�vel e que ofere�a elementos consistentes � an�lise deste espa�o urbano n�o metropolitano, verificando em que medida ele estabelece identidades com outras cidades com importante fun��o associada ao agroneg�cio, j� que o movimento de expans�o do capitalismo no campo tende a promover homogeneidades. Por outro lado, sabemos que uma mesma vari�vel tem diferentes impactos conforme o lugar na qual se apresenta, para tanto dependendo o jogo de rela��es entre os mais diferentes pares dial�ticos poss�veis para an�lise do espa�o e da sociedade. Essa constata��o estimula o estudo e an�lise do papel de diferentes atores que alteram de forma diversa, as estrutura��es urbanas e regionais.

Atividades associadas ao agroneg�cio da fruticultura, assim como � extra��o e beneficiamento do sal, � explora��o do petr�leo e do g�s natural, desenvolvidas na regi�o de influ�ncia de Mossor�, t�m contribu�do para o crescimento urbano deste munic�pio. Das tr�s, a extra��o de sal � a mais antiga atividade econ�mica da regi�o, sendo que a extra��o de petr�leo e g�s e o agroneg�cio de frutas tropicais t�m o �mago de seu crescimento a partir do final da d�cada de 1970, sendo a d�cada de 1980 a de consolida��o das atividades. � importante destacar que Mossor� � o primeiro produtor brasileiro de explora��o de petr�leo em terra e o segundo em volume geral (terra e mar, respectivamente).

Uma das dificuldades que sempre se apresenta na maior parte das pesquisas cient�ficas que t�m como objeto o estudo de uma localidade, uma cidade, uma regi�o, � como fazer para conseguir captar, transpor a teoria para o estudo do objeto. Desta forma, parece-nos de fundamental import�ncia a defini��o de quest�es e temas norteadores, ou seja, que v�o direcionar toda a pesquisa, sintetizando o que queremos com a mesma, assim como um conjunto de vari�veis que possa colaborar para a melhor apreens�o do objeto de an�lise.

Assim sendo, considerando o objetivo de abarcar como se processa o incremento da urbaniza��o no Brasil agr�cola que passa por processos de reestrutura��o produtiva da agropecu�ria, parece-nos que dois grandes grupos de vari�veis devam ser considerados: um que d� conta de captar as rela��es campo-cidade que mais de perto possa refletir as novas caracter�sticas do agroneg�cio e um outro que d� conta do incremento da urbaniza��o e da reestrutura��o da cidade em si. Naturalmente, que a realidade � bem mais complexa e tais divis�es s�o somente um recurso metodol�gico. Importante se faz destacar que aqui estamos pensando em espa�os urbanos n�o metropolitanos.

Como tema para abarcar as rela��es campo-cidade difundidos ou incrementados com as redes agroindustriais, poder�amos citar o consumo produtivo agr�cola. Com a fluidez poss�vel a partir da constru��o dos modernos sistemas de objetos, acirra-se a divis�o territorial e social do trabalho agropecu�rio, intensificando as trocas de todas as naturezas, difundindo o com�rcio e os servi�os, com profundos impactos na vida social e no territ�rio. Assim sendo, conhecer a expans�o do consumo, seja produtivo, seja consumptivo, e suas formas, intensidade, qualidade e natureza dos fluxos, de mat�ria e de informa��o, s�o importantes para indicar o leque de novas rela��es entre a cidade e o campo, explicitando formas de organiza��o interna dos espa�os urbanos e as novas rela��es entre os diferentes elos das redes agroindustriais.

O consumo produtivo agr�cola � um elemento estruturante da economia urbana das �reas de expans�o do agroneg�cio (Elias, 2003, 2007b), que cresce com a incorpora��o de ci�ncia, tecnologia e informa��o ao espa�o agr�rio, obrigando as cidades pr�ximas a suprir suas demandas por insumos materiais e intelectuais. Vale lembrar que para a difus�o do consumo produtivo agr�cola devemos considerar os sistemas de objetos, os sistemas de a��o (Santos, 1996) e os fluxos correspondentes.

S�o in�meras as vari�veis associadas ao consumo produtivo agr�cola gerada pelo agroneg�cio: empresas comerciais (m�quinas e implementos agr�colas, sementes selecionadas, produtos veterin�rios, agrot�xicos etc); empresas de servi�os (pesquisa agropecu�ria, an�lise de solos, avia��o agr�cola, consultoria agr�cola, telefonia rural, irriga��o, manuten��o de m�quinas agr�colas, inform�tica, empresas de gest�o de recursos humanos, de transporte de cargas, entre outras); empresas de telefonia rural etc.

� importante tamb�m citar que os escrit�rios das principais empresas agr�colas da regi�o frut�cola em an�lise localizam-se, em sua grande maioria, na cidade de Mossor�. Nesta, a rela��o intr�nseca do terci�rio com o agroneg�cio pode ser observada a partir das vari�veis supracitadas. Dados do Minist�rio do Trabalho e Emprego (Rela��o Anual de Informa��es Sociais - RAIS) indicam que no ano de 2005 existiam, em Mossor�, dois estabelecimentos de com�rcio atacadista de m�quinas, aparelhos e equipamentos para uso agropecu�rio (eram cinco em todo o Rio Grande do Norte); um estabelecimento de aluguel de m�quinas e equipamentos agr�colas (eram dois em todo o Estado); doze estabelecimentos com atividades de servi�os relacionados com a agricultura. Entre estes poder�amos citar o servi�o de pesquisa agropecu�ria, assessoria para fazendas e agroneg�cios e sistema de irriga��o para agricultura.

Trabalhos de campo realizados na cidade durante os meses de janeiro e fevereiro de 2008 revelaram que a atividade de comercializa��o de insumos e implementos (sementes, adubos, corretivos, ra��es e produtos veterin�rios em geral, fertilizantes, material para irriga��o, agrot�xicos, m�quinas e equipamentos etc) destaca-se com cerca de quinze estabelecimentos. V�rias destas lojas, al�m da venda do produto, prestam tamb�m assist�ncia t�cnica, log�stica, de manejo das culturas, o que faz com que alguns dos funcion�rios-vendedores tenham forma��o superior, como em agronomia. Estes profissionais especializados comp�em parte dos fluxos di�rios entre o campo e a cidade na regi�o de Mossor�, quando realizam o que chamam de visitas t�cnicas.

A an�lise dos mercados abrangidos por estes estabelecimentos revela parte dos circuitos espaciais percorridos e a abrang�ncia regional dos mesmos. N�o s�o poucos os estabelecimentos que atendem n�o s� aos produtores do munic�pio, mas de vasta regi�o, que abrange n�o s� o Rio Grande do Norte, mas tamb�m os Estados do Cear� e da Para�ba, principalmente.

As possibilidades de pagamento destas empresas mostram outra entre as caracter�sticas recentemente incorporadas pelos estabelecimentos comerciais associados ao consumo produtivo agr�cola de Mossor�. Al�m das tradicionais formas de pagamento a vista em dinheiro, cheque (a vista e pr�-datado) e boleto banc�rio, algumas lojas adotam o pagamento com cart�o de cr�dito. V�rias foram as que revelaram tamb�m que, al�m das vendas no local, utilizam-se da internet para realiza��o de tal atividade.

Os servi�os de ensino t�cnico e superior, p�blico e privado, s�o tamb�m importantes para observar o peso do consumo produtivo agr�cola na cidade de Mossor�, uma vez que � significativa a import�ncia dos cursos de gradua��o e de p�s-gradua��o voltados para as demandas do agroneg�cio. S�o seis as institui��es de ensino superior, sendo tr�s universidades, duas p�blicas (Ufersa - Universidade Federal Rural do Semi-�rido[8]; UERN � Universidade Estadual do Rio Grande do Norte) e uma privada (UNP), uma unidade do Cefet (Centro Federal de Educa��o Tecnol�gica[9]) e duas faculdades (Facene � Faculdade de Enfermagem Nova Esperan�a e Faculdade M�ster Christer).

Dados dos cursos da Ufersa, a mais antiga e consolidada institui��o de ensino superior da cidade e a mais fortemente ligada ao agroneg�cio, ajudam-nos a evidenciar esta rela��o, uma vez que entre seus dez cursos de gradua��o, quatro se relacionam com as atividades agropecu�rias (agronomia, engenharia agr�cola, medicina veterin�ria e zootecnia). Quando os dados s�o os da p�s-gradua��o strictu sensu (mestrado e doutorado), a rela��o dos cursos com a agropecu�ria fica ainda mais evidente, uma vez que existem cursos de: mestrado em Ci�ncia Animal, em Irriga��o e Drenagem, em Ci�ncia do Solo; e mestrado e doutorado em Fitotecnia. No que tange aos cursos de especializa��o, a rela��o com a agropecu�ria tamb�m se mostra significativa. Do quadro de docentes desta institui��o, chama aten��o o n�mero de professores com doutorado.

Outro exemplo de atividade que cresce em fun��o do incremento do agroneg�cio � o de feiras agropecu�rias. A cidade de Mossor� sedia anualmente a Feira Internacional de Fruticultura Tropical Irrigada (Expofruit), a qual pode ser citada como uma das representativas do setor no pa�s. Assim como nas suas cong�neres no Brasil, a programa��o inclui mini-cursos, palestras, mesas redondas, plantio experimental etc. Entre as atividades mais esperadas, citar�amos as chamadas �rodadas de neg�cios�, durante as quais s�o fechadas muitas vendas da produ��o local, que � determinante para todo o setor n�o s� da cidade, mas de toda a regi�o produtiva agr�cola.

Na edi��o de 2006, a Expofruit foi realizada pelo Comit� Executivo de Fitossanidade do Rio Grande do Norte (COEX), em parceria com o Servi�o Brasileiro de Apoio � Micro e Pequenas Empresas � SEBRAE/RN. Foram 320 estandes de empresas e institui��es p�blicas atuantes em diversos segmentos do agroneg�cio. Entre as empresas destacam-se as produtoras de frutas e as ofertantes de produtos e servi�os para toda a cadeia produtiva frut�cola. A presen�a de empresas estrangeiras dos EUA, da Alemanha, Irlanda, Espanha etc chama a aten��o. Entre as institui��es p�blicas presentes na feira, poder�amos citar as principais institui��es financeiras do pa�s (Banco do Brasil � BB; Banco do Nordeste do Brasil - BNB); a Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), que administra os portos no Estado, respons�vel por parte significativa das exporta��es de frutas produzidas na regi�o; a Empresa de Pesquisa Agropecu�ria do Rio Grande do Norte (Emparn), entre outras.

Vale destacar que, como em outras feiras do g�nero no pa�s, por ocasi�o do evento, a circula��o de dinheiro e capital no munic�pio � um fato a ser mencionado, uma vez que, al�m dos neg�cios do setor frut�cola especificamente, determinante para a produ��o futura, v�rios outros s�o afetados, como o setor de alimenta��o, hospedagem, transporte de passageiros e cargas, aluguel de ve�culos etc. Anualmente a feira injeta milh�es de reais na economia da cidade e na agricultura da regi�o, envolvendo os servi�os necess�rios para a sua realiza��o, al�m de demandar grande n�mero de m�o-de-obra para a pr�pria montagem da infra-estrutura da mesma.

Citemos alguns dados do setor hoteleiro. Mossor� caracteriza-se por apresentar um setor hoteleiro com poucos estabelecimentos, sem nenhum hotel de alto padr�o ou de alguma rede nacional ou internacional, sendo todos os empreendimentos existentes de capital local ou regional. Embora parte dos leitos permane�a sem ocupa��o em uma parte do ano, por ocasi�o da Expofruit todos os hot�is da cidade ficam com a ocupa��o completa com grande anteced�ncia.

O Hotel Thermas, por exemplo, o mais importante e com hospedagem mais cara na cidade[10], que se notabiliza por possuir um parque aqu�tico formado com �guas termais, muito procuradas por suas supostas benesses � sa�de, encontrava-se com 100 % de seus 145 apartamentos ocupados, por ocasi�o da Expofruit de 2007, segundo nos informou seu gerente de hospedagem, sendo que 80% dos h�spedes estavam participando da feira. Destacou, ainda, que parte importante destes h�spedes tinha origem em outros pa�ses[11]. Ainda segundo a mesma fonte, a maior parte dos h�spedes do hotel, em todas as �pocas do ano, � composta por pessoas que est�o em viagem de neg�cios, especialmente ligados ao setor de extra��o de petr�leo e g�s e � fruticultura.

Tal demanda j� provoca reorganiza��o no setor, sendo que, no presente, est�o em constru��o dois novos empreendimentos, constru�dos totalmente baseados nos par�metros internacionais modernos de hospedagem executiva, ou seja, totalmente distintos dos hoje predominantes. O empreendimento mais importante pertence a multinacional do setor Accorhotels, que possui mais de 4 mil hot�is em todo o mundo, e ter� a bandeira IBIS.

A Expofruit movimenta tamb�m o setor informal. Por ocasi�o da edi��o de 2007, al�m da pra�a de alimenta��o existente no local interno � feira, foi poss�vel observar nas imedia��es in�meras barracas, trailers e carrinhos, especialmente para venda de alimentos e bebidas. Da mesma forma, � importante lembrar que a exist�ncia da Expofruit � tamb�m determinante para a reestrutura��o dos equipamentos e infra-estrutura da cidade, considerando a cria��o de espa�os transit�rios para a realiza��o do evento. As duas primeiras edi��es da Expofruit ocorreram nas instala��es do hotel Thermas. Ocorre que, a feira cresce a cada edi��o e as dimens�es do mesmo ficaram insuficientes para comport�-la, passando a mesma a ocorrer na Ufersa, que possui �rea de grandes dimens�es.

� comum nos espa�os urbanos n�o metropolitanos do Brasil agr�cola moderno observar que os ramos industriais associados �s redes agroindustriais (ind�strias de alimentos, de insumos qu�micos, de m�quinas agr�colas, de m�quinas para agroind�strias, de produtos farmac�uticos e veterin�rios, entre outros) s�o predominantes no setor industrial como um todo. Se utilizarmos dados dos estabelecimentos industriais existentes em Mossor� para estudar a associa��o com o setor agropecu�rio, ter�amos outro exemplo importante de atividade econ�mica inerente �s redes agroindustriais. Na cidade que nos serve de objeto, se considerarmos os dez maiores estabelecimentos industriais, segundo n�mero de empregados e faturamento anual, seis est�o intimamente ligadas ao setor agroindustrial (castanha de caju, suco de frutas, �leos vegetais, sal marinho, farinha de milho e derivados).

Embora o consumo produtivo agr�cola tenha um car�ter especial para observarmos as novas rela��es campo-cidade, o consumo consumptivo tamb�m desempenha importante papel para buscarmos compreender como se processa a expans�o da economia e da malha urbanas, al�m de evidenciar muitos tipos de fluxos de pessoas, mercadorias, mat�rias-primas etc, seja do tipo campo-cidade ou interurbanos.

O crescimento do terci�rio � devido ainda ao crescimento populacional e � revolu��o do consumo, erigida sob os ausp�cios do consumo de massa, que imp�e necessidades como se naturais fossem, associadas � exist�ncia individual e das fam�lias. Historicamente, o consumo transformou-se no verdadeiro �pio, substituindo gradativamente o tradicional papel desempenhado pelas religi�es. Enquanto estas se alicer�am na f� para difundir os seus c�digos de conviv�ncia social, o consumo instala sua f� por meio de objetos, que s�o a pr�pria ideologia, quer pela sua presen�a imediata, quer pela promessa ou esperan�a de obt�-los um dia. O poder do consumo � t�o contagiante que passa a representar um papel motor e perverso na sociedade atual, passando pelo pr�prio aprendizado e condicionamento social do consumo. O consumo tem sua pr�pria for�a ideol�gica e material alimentando-se das pr�xis individuais e coletivas experimentadas no processo cotidiano de vida: o trabalho, a casa, o lazer, a educa��o, a sa�de etc (cf. Santos, 1987, p.33-42).

Desta forma, paralelamente ao crescimento do consumo produtivo, aumentou de forma expressiva o consumo consumptivo, de bens e de uma s�rie de outras atividades que se enquadram dentro do terci�rio: sa�de, educa��o, religi�o, transportes de mat�ria e de informa��o, servi�os de seguran�a, administra��o p�blica etc. O dinamismo das tr�s principais atividades econ�micas da regi�o polarizada por Mossor� (agroneg�cio de frutas, extra��o de sal e petr�leo) contribuiu para a eleva��o da m�dia salarial, principalmente dos trabalhadores especializados associados aos respectivos setores, expandido a classe m�dia.�

O crescimento das atividades econ�micas e populacional e a exist�ncia de uma popula��o com poder aquisitivo mais elevado, mesmo que relativamente pequena perante a popula��o total, acabaram por propiciar o surgimento de um n�mero de casas de com�rcio e de estabelecimentos que oferecem servi�os especializados, alguns bastante modernos, antes restritos �s principais capitais do pa�s. Tudo isso multiplicou e tornou mais complexos os fixos e os fluxos na cidade e regi�o, que vem modificando nova configura��o espacial.

Nessas condi��es, em Mossor�, paralelamente ao crescimento do consumo produtivo, vem aumentando o consumo consumptivo de bens e de uma s�rie de outras atividades que se enquadram dentro do terci�rio, o que pode ser observado, por exemplo, atrav�s da implanta��o de ramos de atividades econ�micas representativas da atua��o dos novos agentes econ�micos. Entre estes poder�amos citar a implanta��o de supermercados e hipermercados; de shopping centers; de servi�os de sa�de especializados; de ag�ncias banc�rias; de redes de venda de eletrodom�sticos e eletr�nicos; de empresas do setor imobili�rio; de administra��o p�blica etc.

A expans�o do consumo de produtos modernos e sofisticados, inerentes �s novas formas de produ��o, distribui��o e consumo, evidencia as mudan�as no munic�pio, assim como seu refor�o enquanto munic�pio que polariza um mercado regional, sendo que parte deste, com poder de compra que justifique a instala��o de algumas atividades e equipamentos, propiciando a instala��o dos centros comerciais associados �s formas modernas de distribui��o de mercadorias, cujos signos principais s�o os supermercados e os shopping centers. Para Santos (1987, p. 34) estes seriam os verdadeiros templos modernos do consumo, contru�dos, ali�s, � fei��o das catedrais.

Mossor� teve seu primeiro shopping center inaugurado em meados de 2007, tendo a frente um grupo empresarial italiano. At� ent�o, o centro da cidade concentrava a quase totalidade do com�rcio varejista. Em coletiva � imprensa por ocasi�o do lan�amento do empreendimento[12], o respons�vel pela empresa gerenciadora do projeto justifica a iniciativa pela renda per capita da cidade[13], al�m da localiza��o estrat�gica do munic�pio na regi�o Oeste do Rio Grande do Norte. Prova disto � que o shopping foi constru�do quase � margem de uma rodovia de acesso ao munic�pio, como ocorre em outras cidades de porte m�dio.

A chegada do empreendimento j� vem provocando mudan�as na sociabilidade local e regional. Poder�amos citar, por exemplo, o hor�rio poss�vel de compras, que se estendeu das 18 h, tradicional hor�rio de fechamento do com�rcio de rua, para as 22h, assim como passou a ser poss�vel tamb�m aos s�bados � tarde e aos domingos; o incremento da alimenta��o fora de casa, com a implanta��o da pra�a de alimenta��o, contendo diversas op��es de fast-food. Outro atrativo inerente ao lazer, de grande impacto nos h�bitos culturais, � a instala��o de salas de cinema. Com o shopping center chegam tamb�m algumas importantes lojas de redes nacionais, lojas de departamento, hipermercado e franquias. Poder�amos citar a Marisa, Riachuelo, O Botic�rio, P�lo Play, Camisaria Colombo, Siciliano, Americanas entre outras.

Os valores representados pelo consumo de bens materiais e imateriais, assim como a reestrutura��o da cidade vem se instalando na vida dos indiv�duos e da coletividade mossoroense. No jogo do mercado, as �reas onde a popula��o possui uma renda mais elevada apresentam-se como priorit�rias para o desenvolvimento de certos setores da produ��o n�o material, agravando os desequil�brios intra-urbanos e regionais, atrav�s da expans�o da produ��o terci�ria. Da mesma forma, as �reas de implanta��o dos equipamentos e infra-estruturas modernas passam a ser �reas de incrementando da especula��o imobili�ria e de r�pido crescimento do pre�o da terra, introduzindo pr�ticas inerentes ao mercado imobili�rio at� ent�o pouco comuns na cidade.

No caso da instala��o do shopping center, apesar do pouco tempo de sua implanta��o, ele est� funcionando como um verdadeiro extensor urbano. Instalado em �rea at� ent�o pouco ocupada, com terras com pre�os bastante baixos, desde o in�cio das obras, alguns outros importantes empreendimentos j� se instalaram no �rastro� de sua constru��o. Dentre os mais importantes exemplos, citar�amos a instala��o de uma universidade privada, a UNP (�filial� de unidade existente na capital do Estado), assim como de um condom�nio fechado de casas. Tudo isto vizinho ao shopping center, na mesma avenida, o que tem provocado um intenso processo de especula��o imobili�ria, fazendo com que o pre�o dos lotes se multiplique muitas vezes em pouco tempo.

O depoimento de uma moradora das imedia��es d�-nos id�ia da intensidade da especula��o atual. Ela cita que comprou um terreno em 2001 pelo pre�o de R$ 1.200,00 e hoje, passados sete anos, � poss�vel vender o mesmo pelo pre�o de R$ 40.000,00. Ainda segundo a mesma moradora, uma imobili�ria que est� comercializando lotes no bairro, est� pedindo R$ 50.000,00 pelo lote de 12 m X 30 m, isto para os terrenos mais distantes do shopping, sendo que para os pr�ximos os pre�os est�o ainda mais elevados.

Associado ao consumo produtivo e consumptivo, ter�amos os servi�os inerentes ao novo nexo financeiro e � monetariza��o da vida social e da difus�o do cr�dito (ag�ncias banc�rias, caixas eletr�nicos, escrit�rio da Bolsa de Valores e Mercadorias, corretoras etc). Mossor� conta atualmente com treze ag�ncias banc�rias, distribu�das entre bancos p�blicos (Banco do Brasil, Caixa Econ�mica, Banco do Nordeste) e privados (Bradesco, HSBC, Ita� e Unibanco). Todos os bancos juntos somavam cinq�enta caixas de auto-atendimento, distribu�dos por v�rios pontos da cidade, sejam em supermercados, universidades, institui��es p�blicas, drogarias, no shopping center, al�m das pr�prias ag�ncias. Devemos destacar tamb�m as lot�ricas, os �caixas aqui� e os bancos integrados. As etapas de difus�o da rede banc�ria e a diversifica��o do setor financeiro, segundo n�mero, n�vel e distribui��o s�o tamb�m itens importantes para investiga��o.

Outros temas que propiciam ao mesmo tempo observar rela��es campo-cidade, assim como crescimento da urbaniza��o s�o a din�mica populacional e o mercado de trabalho. O estudo do mercado de trabalho em geral e do agr�cola em particular ajuda-nos a melhor compreender como v�m se dando �s mudan�as nas rela��es sociais de produ��o, j� que a flexibilidade que rege o atual padr�o produtivo reflete de forma inconteste no modo de organizar e gerir o trabalho. Diante desse novo quadro no mundo do trabalho, torna-se imprescind�vel compreender a evolu��o do mercado de trabalho formal no setor da agropecu�ria, pois o surgimento de uma classe de trabalhadores agr�colas assalariados representa a materializa��o do movimento do capital no campo.

Como os regimes de explora��o da terra est�o diretamente associados � forma de sua apropria��o, o acirramento da territorializa��o do capital nos espa�os agr�colas � concomitante � diminui��o da explora��o indireta, com a gradativa diminui��o da cess�o da terra pelo propriet�rio com a obten��o de rendas pr�-capitalistas, como a da divis�o (meia ou ter�a, por exemplo) da produ��o obtida, tornando invi�vel a perman�ncia dos que n�o det�m a propriedade da terra.

Como resultado da expans�o do agroneg�cio da fruticultura, respons�vel pela difus�o de um novo modelo de produ��o agropecu�ria, v�rios espa�os agr�rios da regi�o polarizada por Mossor� transformam-se em pontos ou n�s das redes agroindustriais globalizadas e o comportamento end�geno das rela��es de trabalho � transformado. Desse modo, a mudan�a do padr�o de produ��o acompanha-se de um aumento do mercado de trabalho agr�cola em moldes capitalistas, especialmente a partir dos anos 1990.

No munic�pio em estudo, o �mago da forma��o de um mercado de trabalho agropecu�rio encontra-se nas novas rela��es sociais de produ��o difundidas com o agroneg�cio da fruticultura (especialmente do mel�o), que expropriam os pequenos propriet�rios e expulsam os que n�o det�m a propriedade da terra, promovendo o �xodo rural (migra��o ascendente) e aumentando o contingente de trabalhadores agr�colas n�o rurais, que passam a ser tempor�rios.

Como o agroneg�cio utiliza um contingente de m�o-de-obra especializada, � poss�vel observar o acirramento da divis�o social do trabalho no setor. O mercado de trabalho agr�cola j� se mostra hierarquizado e apresenta em uma de suas pontas o trabalhador especializado. Este � um profissional de origem e viv�ncia urbanas, que passa a ser o assalariado permanente (engenheiro geneticista, t�cnico agr�cola, veterin�rio, administrador agr�cola, agr�nomo, piloto de avi�o agr�cola, administrador etc.) dos setores associados ao agroneg�cio, com elevada composi��o org�nica do capital.

A intensa difus�o de capital, tecnologia e informa��o na atividade agropecu�ria vem aumentando a divis�o das tarefas e fun��es produtivas e administrativas. Paralelamente, processou-se uma altera��o qualitativa e quantitativa de antigas fun��es, com importantes transforma��es no mercado de trabalho agr�cola. Entre as conseq��ncias dessas mudan�as, apresentam-se novas din�micas populacionais, como a da migra��o descendente (da cidade maior para a cidade menor) de profissionais especializados no agroneg�cio, de origem e viv�ncia urbanas. Estes profissionais est�o entre os que diariamente realizam o fluxo campo-cidade.

Entre as vari�veis e indicadores associados a estes temas e seus respectivos processos, consideramos fundamental mencionar a evolu��o da popula��o total, urbana e rural e da taxa de urbaniza��o.� Os dados relativos � popula��o total do munic�pio nos d�o um contingente de 97.245 habitantes em 1970 e de 213.841 habitantes em 2000, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE � Sidra). O crescimento da popula��o foi, assim, de 116.596 habitantes num per�odo de trinta anos, equivalendo a um percentual de cerca de 120 %. De acordo com a mesma fonte, em igual intervalo de tempo, sua popula��o residente urbana passou de 79.302 para 199.081 habitantes, perfazendo um crescimento de 119.779 pessoas vivendo na �rea urbana de Mossor�, o que nos d� um crescimento de 151 % em termos relativos. Dessa forma, nesses trinta anos, a popula��o urbana cresceu cerca de 2,5 vezes, evidenciando que o crescimento urbano � mais acelerado em rela��o ao da popula��o total. No que tange � taxa de urbaniza��o, se j� era alta no primeiro ano considerado para an�lise (81,5 %), atinge os 93 % no ano 2000.

Entre as caracter�sticas do mercado de trabalho em pa�ses como o Brasil, um destaque � a informalidade, como j� demonstrou Milton Santos ainda na d�cada de 1970 (Santos, 1979). Tal realidade � ainda mais exacerbada nas regi�es mais pobres do pa�s, muito recentemente inseridas aos circuitos produtivos globalizados, nas quais as atividades representativas da atua��o dos novos agentes econ�micos j� se implantam a partir de regras da produ��o flex�vel.

A terceiriza��o � uma das principais marcas do trabalho hoje no Brasil e traz grandes preju�zos aos trabalhadores. Tal realidade foi incrementada a partir do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), que privatizou parte importante das empresas estatais brasileiras, promovendo o que alguns pesquisadores consideram um verdadeiro �desmonte do Estado�, abrindo ainda mais as portas para o capital internacional e para a reestrutura��o produtiva. Muitas estatais que n�o chegaram a ser privatizadas passaram por processos significativos de reestrutura��o, como ocorreu com a Petr�leo Brasileiro S/A (Petrobr�s), que det�m o monop�lio da explora��o de petr�leo no pa�s, que hoje terceiriza parte significativa de suas atividades. O papel da Petrobr�s enquanto vetor de crescimento econ�mico em Mossor� � muito significativo, seja pelo pagamento de royaltes ao munic�pio, seja pela quantidade de empregos diretos e indiretos oferecidos.

Em entrevista realizada junto ao presidente do Sindicato dos Metal�rgicos de Mossor�[14], foi poss�vel constatar que o pr�prio sindicato foi fundado (em 1990) com o objetivo de atingir os trabalhadores das empresas terceirizadas da Petrobr�s, que comp�em, at� hoje, a maior parte dos associados do sindicato[15].

Parece importante citar que a extra��o de sal na regi�o, historicamente importante, sofreu forte reestrutura��o na d�cada de 1970, respons�vel pelo desemprego em massa dos trabalhadores do setor, uma vez que as mudan�as inclu�ram a total mecaniza��o da extra��o. Desta forma, embora o setor seja bastante importante, j� tendo sido respons�vel por parte significativa dos empregos na regi�o, hoje apesar de sua import�ncia econ�mica, o n�mero de empregos n�o tem a mesma rela��o. Basta citar que uma das mais importantes empresas da regi�o, que produz cerca de 45 % de todo o sal marinho do pa�s, emprega 240 trabalhadores.

Em contraponto � terceiriza��o, os dados do mercado de trabalho formal s�o um bom indicador para podermos observar caracter�sticas importantes da estrutura, evolu��o e dinamismo de economias regionais ou municipais. Vejamos como tal realidade se processa no munic�pio em an�lise. Para tanto, vamos nos utilizar de dados do Minist�rio do Trabalho e Emprego (Rela��o Anual de Informa��es Sociais - RAIS e do Cadastro de Empregados e Desempregados � CAGED), que desde 1985 oferece dados oficiais com regularidade.

A an�lise da fonte supracitada para Mossor� mostra que o estoque de empregos formais do munic�pio cresceu 188,5% entre 1985 e 2005, passando de 12.817 para 36.984 empregos. A distribui��o do total destes empregos segundo os principais setores de atividades tamb�m revela algumas caracter�sticas importantes do mercado de trabalho formal, sendo o crescimento uma realidade quase irrestrita. Algumas caracter�sticas acompanham a realidade nacional, de urbaniza��o recente inerente � difus�o do terci�rio e, assim sendo, nos tr�s anos considerados para an�lise (1985, 1995 e 2005), h� predomin�ncia do setor no total de pessoas empregadas formalmente, atingindo cerca de 57% em todos eles. Os servi�os s�o predominantes, com mais de 30% nos tr�s anos.

Se ao inv�s da participa��o percentual de cada setor no total do mercado de trabalho formal considerarmos o crescimento individual de cada um, outras caracter�sticas se revelam. Uma delas � o significativo crescimento percentual dos empregados no setor de constru��o civil, que foi de 618% nos vinte anos considerados para an�lise, muito embora em termos absolutos o crescimento pudesse passar despercebido (2.095 pessoas). De qualquer forma, o crescimento do setor demonstra a expans�o das infra-estruturas, que muitos novos fixos artificiais est�o sendo constru�dos em espa�os antes menos rugosos, diminuindo o meio natural e aumentando o percentual do meio t�cnico e mesmo do meio t�cnico-cient�fico-informacional.

E � do setor da constru��o civil que poder�amos citar outro exemplo das novas sociabilidades e novas demandas do mercado de trabalho local at� muito recentemente inexistentes em uma cidade como Mossor�. Trata-se do processo da verticaliza��o que j� come�a a ocorrer, mesmo com tantos espa�os para a cidade poder se expandir horizontalmente. Tal realidade fez com que muitos dos oper�rios da constru��o civil hoje atuantes na cidade sejam migrantes de cidades maiores, como de Fortaleza (capital do Estado do Cear�), uma vez que os trabalhadores locais da constru��o civil n�o apresentam experi�ncia com constru��es verticais, mas somente t�rreas.

Considerando ainda os crescimentos segundo setores de atividades, citar�amos o setor de com�rcio. Em 1985, eram 2.808 pessoas ocupadas no com�rcio, contra as 9.284 pessoas em 2005. O per�odo de crescimento mais intenso foi o de 1995 a 2005, quando o n�mero de empregados cresceu 145%. Os servi�os por sua vez passaram dos 4.548 para as 11.803 pessoas empregadas com carteira assinada, significando um crescimento de 159,5% nos vinte anos. A ind�stria tamb�m apresentou significativo crescimento para uma cidade como Mossor�, passando dos 3.360 para os 8.638 empregos formais entre 1985 e 2005.

Cuadro 1
Mossoró - Estoque de empregos por setores de atividades, 1985, 1995, 2005

Setores

1985

1995

2005

Ind�stria

3.360

6.935

8.638

Constru��o civil

339

1.121

2.434

Com�rcio

2.808

3.779

9.284

Servi�os

4.548

8.810

11.803

Agropecu�ria

1.762

7.702

4.825

Total

12.817

28.347

36.984

�Fonte: RAIS � Minist�rio do Trabalho

Cuadro 2
Mossor�: Variação do estoque de empregos formais por setores de atividades, 1985 a 2005

Setores

1985 � 1995

1995 � 2005

1985 � 2005

 

Absoluta

%

absoluta

%

absoluta

%

Ind�stria

3.575

106,4%

1.703

24,6%

5.278

157,1%

Constru��o civil

782

230,7%

1.313

117,1%

2.095

618,0%

Com�rcio

971

34,6%

5.505

145,7%

6.476

230,6%

Servi�os

4.262

93,7%

2.993

34,0%

7.255

159,5%

Agropecu�ria

5.940

337,1%

-2.877

-37,4%

3.063

173,8%

Total

15.530

121,2%

8.637

30,5%

24.167

188,6%

Fonte: Elabora��o pr�pria.

O trabalho agr�cola em toda a regi�o polarizada por Mossor� sofre profundas metamorfoses com a abertura � competitividade do per�odo atual, caracterizada pela intensifica��o das pr�ticas neoliberais em um ambiente de reestrutura��o produtiva. Nossos estudos t�m mostrado que algumas caracter�sticas predominantes na Regi�o Concentrada (Santos, 1986, 2001), onde as metamorfoses do trabalho agr�cola mostram-se de forma mais complexa, tamb�m est�o presentes nestes novos espa�os da produ��o agr�cola globalizada.

A difus�o do agroneg�cio da fruticultura na regi�o considerada para an�lise, voltada para exporta��o, notadamente para os mercados europeu e americano, � o ponto-chave para entendermos o novo padr�o produtivo que se processa e, conseq�entemente, da forma��o do mercado de trabalho agr�cola, que se difunde e passa a hierarquizar o quadro de contrata��es formais no setor. A difus�o da racionaliza��o do processo de trabalho e o aumento da demanda por m�o-de-obra qualificada, ampliando a divis�o social e territorial do trabalho, resultam na crescente oferta de emprego para profissionais qualificados, que passam a compor os trabalhadores assalariados permanentes; no crescimento da terceiriza��o nas empresas agr�colas; no crescimento do mercado de trabalho formal etc.

Os dados da RAIS evidenciam algumas destas novas caracter�sticas do trabalho agr�cola em Mossor�, que registrou um crescimento de 173% no n�mero de empregos formais entre 1985 e 2005, saltando dos 1.762 para 4.825 empregos formais. Pode parecer pouco para quem utilizar exclusivamente par�metros predominantes no Brasil agr�cola moderno, mas extremamente significativos para �reas do Semi-�rido nordestino recentemente inseridas aos circuitos produtivos globalizados.

Naturalmente, que esta difus�o do mercado de trabalho agr�cola formal se d� a custas de muita explora��o dos que n�o mais det�m a propriedade da terra, como tamb�m dos pequenos propriet�rios ou assentados que, impossibilitados de garantir a sobreviv�ncia da fam�lia unicamente pelo produto do trabalho no seu lote de terra, s�o obrigados a se assalariar em determinados per�odos do ano.

O mercado de trabalho agr�cola formal tem tamb�m como caracter�stica a sazonalidade, que acompanha, muitas vezes, o calend�rio das culturas, o que acaba por gerar trabalho tempor�rio ou o trabalhador safrista, como � conhecido na regi�o que nos serve de objeto. Nesta, o pico da produ��o vai de agosto a janeiro. Dessa forma, entre os trabalhadores agr�colas assalariados tempor�rios, deve-se distinguir aquele que s� det�m a sua pr�pria for�a de trabalho, o �b�ia-fria�, residente na cidade, que se desloca diariamente para o campo, sobretudo nas �pocas de safra, e formam a categoria dos agr�colas n�o rurais, daqueles que possuem uma pequena propriedade de terra, antiga ou fruto de pol�ticas de assentamentos, na qual residem com a fam�lia e, como n�o conseguem auferir a subsist�ncia, vendem sua for�a de trabalho durante algumas �pocas do ano, especialmente para as empresas agr�colas.

No per�odo da entressafra, os safristas demitidos que possuem alguma terra voltam aos seus munic�pios de origem, sendo que muitos sobrevivem do seguro desemprego somado � agricultura de subsist�ncia. Os j� totalmente expropriados da terra, muitas vezes residem nas periferias das cidades da regi�o e aumentam o contingente dos desempregados ou subempregados. Vale destacar que as principais empresas agr�colas mant�m um cadastro que classifica os trabalhadores conforme o desempenho dos mesmos durante a safra, o qual � utilizado por ocasi�o da nova safra, aumentando a seletividade do recrutamento de m�o-de-obra.

Uma parte importante dos fluxos campo-cidade di�rios registrados em �reas de difus�o do agroneg�cio � exatamente destes trabalhadores agr�colas que moram na cidade, mas trabalham no campo. Isto pode ser observado seja entre os trabalhadores agr�colas sem qualifica��o, como entre os mais qualificados.

Por outro lado, amplia-se o processo de subordina��o de alguns pequenos produtores agr�colas que, ao inv�s de expropriados pelo processo de territorializa��o do espa�o agr�rio, subordinam-se diretamente �s empresas agr�colas, e acabam por transferir parte da renda da terra que lhes caberia. Esta subordina��o se d� atrav�s de mecanismos financeiros e de controle t�cnico da produ��o, assim como pela contrata��o da compra da produ��o, desenvolvendo-se empresas semi-integradas.

N�o � raro encontrar em Mossor� e regi�o, empresas agr�colas que v�m estreitando os la�os com pequenos produtores ou empresas agr�colas de menor dimens�o seja atrav�s do oferecimento de assist�ncia t�cnica, seja com o incentivo ao uso de novas tecnologias, responsabilizando-se pela venda da produ��o de seus parceiros. Desta forma, al�m das empresas diminu�rem os custos da produ��o, pois n�o t�m que adquirir terras, contratar trabalhadores, comprar insumos etc, podem ter um menor montante de capital de giro, sendo que ainda se fortalecem no setor da comercializa��o da fruta e no de fornecimento de insumos industriais para a agricultura (defensivos, adubos, material de irriga��o etc), atrav�s da venda de tais produtos para os que classifica como parceiros. � comum que tais insumos sejam pagos pelos parceiros � empresa por ocasi�o da venda da produ��o, assim como que as mais importantes empresas agr�colas presentes na regi�o e que adotam o regime de parceria, possuam loja pr�pria nas quais os parceiros podem adquirir tais produtos, remontando a pr�ticas de subordina��o historicamente existentes no pa�s e, infelizmente, ainda t�o presentes.

Considera��es finais

Esse artigo reflete um caminho que vem sendo trilhado e, ao mesmo tempo, mostra que h� muito trabalho a ser feito para que possamos, de fato, conhecer melhor as mudan�as que v�m se processando nos pap�is desempenhados pelos espa�os urbanos n�o metropolitanos associados � difus�o do agroneg�cio, � medida que se amplia o movimento de ocupa��o do territ�rio brasileiro, por ondas de inser��o dos lugares de reserva que o integram de forma mais articulada � economia internacional.

Comp�e, dessa forma, um dos caminhos poss�veis de interpreta��o da produ��o do espa�o de v�rias cidades brasileiras que t�m, em seu �mago, a difus�o do agroneg�cio globalizado, que se constitui a partir da dial�tica entre a ordem global e a ordem local, resultando no acirramento da divis�o social e territorial do trabalho no setor, transformando as tradicionais rela��es cidade-campo, promovendo o crescimento da urbaniza��o e das cidades.

[2]� Coordenada pela professora Maria Encarna��o Sposito, da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Presidente Prudente.

[3] A pesquisa � desenvolvida com o aux�lio do Minist�rio da Ci�ncia e Tecnologia (MCT)/ Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (CNPq), sob a coordena��o de Denise Elias (UECE) e Maria Encarna��o Sposito (UNESP/PP).

[4] Neste particular, o Programa de P�s-Gradua��o em Geografia da UNESP de Presidente Prudente, em especial a professora Maria Encarna��o Sposito, tem se notabilizado pelos estudos sobre as cidades m�dias brasileiras, tendo j� realizado, coordenado e orientado v�rias pesquisas sobre o tema nos �ltimos anos.

[5] O Semi-�rido brasileiro engloba vasta �rea da Regi�o Nordeste, no qual est�o inseridas partes dos Estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Para�ba, Rio Grande do Norte, Cear�, Piau� e uma parte do sudeste do Maranh�o, al�m do norte dos Estados de Minas Gerais e Esp�rito Santo. Caracteriza-se por ser uma regi�o populosa e economicamente pobre. Ideologicamente, associa-se esta pobreza as suas caracter�sticas naturais, marcadamente de baixa umidade e pouco volume pluviom�trico.

[6] O consumo produtivo � o consumo associado � produ��o, que desenvolve atividades terci�rias que precedem � produ��o material e sem as quais ela n�o pode se realizar. No Brasil agr�cola moderno criam-se novas formas de consumo associadas � produ��o agropecu�ria. O consumo produtivo agr�cola � o consumo que se d� nas cidades, inerente �s atividades agr�colas modernas, expandindo o terci�rio (com�rcio e servi�os) associado ao setor. Por sua vez, o consumo consumptivo � o consumo de bens e servi�os que se esgota em si pr�prio, inerente �s demandas das pessoas.

[10] O apartamento mais barato sa�a ao pre�o de R$ 300,00 a di�ria e o mais caro sa�a a R$ 763,00 (dados a partir do acesso ao site do hotel, no dia 27 de mar�o de 2008).

[11] Entrevista realizada por ocasi�o de trabalho de campo do qual participam membros do Laborat�rio de Estudos Agr�rios (LEA), da Universidade Estadual do Cear� (UECE), por ocasi�o da Expofruit 2007.

Qual a relação entre a modernização do campo e a urbanização?

Resposta verificada por especialistas. A modernização do campo intensificou o processo de urbanização, já que os agricultores não tinham tantas atividades para desempenhar de modo manual e só restava a procura por atividades que pudessem ser desenvolvidas nos centros urbanos.

Qual é a relação entre o espaço urbano e rural?

O conceito de espaço urbano designa a área de elevado adensamento populacional com formação de habitações justapostas entre si, o que chamamos de cidade. Já o conceito de espaço rural refere-se ao conjunto de atividades primárias praticadas em áreas não ocupadas por cidades ou grandes adensamentos populacionais.

Qual é a relação que se estabelece entre o campo e a cidade?

Enquanto cidade e campo são formas concretas, materialização de um modo de vida, urbano e rural são representações sociais. Historicamente a relação entre cidade e campo é vista por meio da divisão do trabalho em: intelectual e manual, de modo que na cidade é beneficiado o produto oriundo do campo.

Qual é a relação entre a industrialização e a modernização do campo?

Com a industrialização, as cidades modernizam-se e passam a subordinar o campo, que se torna dependente do meio urbano para o recebimento de máquinas, aparatos tecnológicos, mão de obra qualificada, conhecimentos científicos aplicados à produção, entre outros elementos.

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