É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação?

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação residencial e comercial. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1307334, com repercussão geral.

O recurso foi interposto por um fiador contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que confirmou a penhora de seu único imóvel, dado como garantia de um contrato de locação comercial. No STF, ele defendia que o direito constitucional à moradia deve se sobrepor à execução da dívida de aluguel comercial. Também sustentava que a tese fixada pelo STF no julgamento do RE 612360, com repercussão geral (Tema 295), no sentido da constitucionalidade da penhora de bem de família do fiador de contrato de locação, deve ser aplicada apenas aos contratos de locação residencial.

Prevaleceu, no julgamento, o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, pelo desprovimento do recurso. Para o ministro, o direito à moradia, inserido na Constituição Federal entre os direitos sociais, não é absoluto. Ele deve ser sopesado com a livre iniciativa do locatário em estabelecer seu empreendimento, direito fundamental também previsto na Constituição Federal (artigos 1º, inciso IV e 170, caput), e com a autonomia de vontade do fiador, que, de forma livre e espontânea, garantiu o contrato.

Para o relator, a impenhorabilidade do bem de família do fiador de locação comercial causaria grave impacto na liberdade de empreender do locatário, já que, entre as modalidades de garantia que podem ser exigidas, como caução e seguro-fiança, a fiança é a mais usual, menos onerosa e mais aceita pelos locadores. Além disso, deve ser garantido ao indivíduo o direito de escolher se manterá a impenhorabilidade de seu bem de família, conforme a regra geral da Lei 8.009/1990, que dispõe sobre a matéria, ou se será fiador, consentindo expressamente com a constrição de seu bem no caso de inadimplemento do locatário. "A livre iniciativa não deve encontrar limite no direito à moradia quando o próprio detentor desse direito, por sua própria vontade, assume obrigação capaz de limitar seu direito à moradia", afirmou.

Ele destacou, ainda, que, nos aluguéis comerciais, muitas vezes o fiador é o próprio sócio da pessoa jurídica afiançada, especialmente em se tratando de micro e pequena empresa. Assim, o empreendedor pode liberar seu capital financeiro para investi-lo no próprio negócio, enquanto o fiador, também sócio, escolhe seu direito de empreender, ciente de que seu próprio bem de família poderá responderá pela dívida. "Trata-se de decisão sua, em livre exercício de sua autonomia privada", apontou.

Outro ponto observado pelo relator é que a Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991) não faz distinção entre fiadores de locações residenciais e comerciais em relação à possibilidade da penhora do bem de família. Em seu entendimento, criar distinção onde a lei não distinguiu violaria o princípio da isonomia, pois o fiador de locação comercial manteria incólume seu bem de família, enquanto o de locação residencial poderia ter seu imóvel penhorado.

A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, Alexandre de Moraes, que fixou a seguinte tese: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial.”

Esta notícia, veiculada no site do STF, volta a tranquilizar o mercado de locações de imóveis comerciais, garantindo que o uso de garantia na modalidade da fiança é uma alternativa válida em contratos desta natureza.

Marcelo Gustavo Baum - Advogado
Consultor cível e comercial e integrante do Comitê Jurídico da ACI-NH/CB/EV
Baum & Kessler Sociedade de Advogados

Processo: REsp 1.822.040-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salom�o, Segunda Se��o, por unanimidade, julgado em 08/06/2022. (Tema 1091)
Ramo do Direito: Direito Civil, Direito Processual Civil
Tema: Execu��o. Lei n. 8.009/1990. Alega��o de bem de fam�lia. Fiador em contrato de loca��o comercial e residencial. Penhorabilidade do im�vel. Possibilidade. Tema 1091.
Destaque: � v�lida a penhora do bem de fam�lia de fiador apontado em contrato de loca��o de im�vel, seja residencial, seja comercial, nos termos do inciso VII, do art. 3� da Lei n. 8.009/1990.

Informa��es do inteiro teor: O STF, no julgamento do RE 612.360/SP (Rel. Ministra Ellen Gracie, DJe de 3/9/2010), reconhecida a repercuss�o geral (Tema 295), afirmou a seguinte tese: "� constitucional a penhora de bem de fam�lia pertencente a fiador de contrato de loca��o, em virtude da compatibilidade da exce��o prevista no art. 3�, VII, da Lei 8.009/1990 com o direito � moradia consagrado no art. 6� da Constitui��o Federal, com reda��o da EC 26/2000". Importante pontuar que no caso objeto de julgamento se tratava de loca��o comercial.

Logo ap�s, o STJ, na al�ada dos recursos repetitivos, decidiu a tese de que "� leg�tima a penhora de apontado bem de fam�lia pertencente a fiador de contrato de loca��o, ante o que disp�e o art. 3�, inciso VII, da Lei n. 8.009/1990" (REsp 1.363.368/MS, relator Ministro Luis Felipe Salom�o, Segunda Se��o, DJe de 21/11/2014).

Tem�tica que ensejou a edi��o, em 2015, da S�mula 549 pelo STJ, segundo a qual "� v�lida a penhora de bem de fam�lia pertencente a fiador de contrato de loca��o".

Nota-se que os referidos precedentes n�o fizeram distin��o, para fins de constri��o judicial, entre o contrato de fian�a atrelado a loca��o residencial ou n�o residencial, surgindo a d�vida sobre a incid�ncia de tal posicionamento nos locat�cios comerciais.

Nesse passo, em 2018, sobreveio o julgamento, pela Primeira Turma do STF, do RE 605.709/SP que, ao apreciar a alega��o de impenhorabilidade do bem de fam�lia do fiador de contrato de "loca��o comercial", visualizou distinguishing apto a afastar a incid�ncia da solidificada jurisprud�ncia das Cortes Superiores.

Naquela oportunidade, a maioria dos Ministros da Primeira Turma do STF decidiu que o bem de fam�lia do fiador, destinado � sua moradia, n�o poderia ser sacrificado a pretexto de satisfazer o cr�dito de locador de im�vel comercial ou de estimular a livre iniciativa.

Conforme se depreende do voto condutor, a ado��o de exegese contr�ria ofenderia o princ�pio da isonomia, pois o fato de eventual bem de fam�lia do locat�rio/afian�ado (na loca��o comercial) n�o se submeter � penhora configuraria situa��o mais gravosa ao fiador (garante), j� que n�o haveria a justificativa de promo��o do direito fundamental � moradia (do locat�rio).

Destacou-se, ainda, a exist�ncia de instrumentos outros suscet�veis de viabilizar a garantia da satisfa��o do cr�dito do locador de im�vel comercial, a exemplo da cau��o, seguro de fian�a locat�cia e cess�o fiduci�ria de quotas de fundos de investimento (art. 37 da Lei n. 8.245/1991).

Em conclus�o, afirmou-se que "admitir a penhora de bem de fam�lia para satisfazer d�bito decorrente de loca��o comercial, em nome da promo��o da livre iniciativa, redundaria, no limite, em solapar todo o arcabou�o erigido para preservar a dignidade humana em face de d�vidas".

Recentemente, a Suprema Corte julgou o m�rito do Recurso Extraordin�rio, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, definido pela constitucionalidade da penhora do bem de fam�lia do fiador de contrato de loca��o comercial.

Portanto, a Tese definida no Tema 1127 foi a de que "� constitucional a penhora de bem de fam�lia pertencente a fiador de contrato de loca��o, seja residencial, seja comercial".

Nessa perspectiva, a Segunda Se��o do STJ, assim como o fez o STF, deve aprimorar os enunciados definidos no REsp Repetitivo 1.363.368/MS e na S�mula 549 para reconhecer a validade da penhora de bem de fam�lia pertencente a fiador de contrato de loca��o comercial.
Isso porque a lei n�o distinguiu entre os contratos de loca��o para fins de afastamento do bem de fam�lia, (art. 3�, inciso VII, da Lei n. 8.009/1990).

Como bem pontuado pelo Min. Alexandre de Moraes em seu voto condutor, n�o � poss�vel criar distin��o onde a lei n�o distinguiu, pois haveria "flagrante viola��o ao princ�pio da isonomia relacionada ao instituto da fian�a, haja a vista que o fiador de loca��o comercial, embora tamb�m excepcionado pelo artigo 3�, VII, teria inc�lume o seu bem de fam�lia, ao passo que o fiador de loca��o residencial poderia ter seu im�vel penhorado. Ter�amos uma diferencia��o n�o prevista por lei e sem diferencia��o, a meu ver, principiol�gica que a embase".

Ao que parece, se realmente fosse para conferir algum tipo de prote��o com base na igualdade, esta seria o de salvaguardar o fiador que deu o seu im�vel para proteger o direito fundamental � moradia do locador residencial e n�o o de socorrer aquele fiador que espontaneamente afian�ou neg�cio jur�dico voltado a promover o com�rcio.

Ademais, verifica-se que remanesce a premissa dos antigos precedentes que reconheceram a constitucionalidade e a legalidade da penhora do bem de fam�lia do fiador de contrato de loca��o residencial, por haver preval�ncia ao princ�pio da autonomia de vontade e ao direito de propriedade, atraindo, assim, a incid�ncia do velho brocardo latino: ubi eadem ratio , ibi eadem legis dispositio, ou em vern�culo: onde existe a mesma raz�o fundamental, prevalece a mesma regra de Direito.

Deveras, o fiador, no pleno exerc�cio de seu direito de propriedade de usar, gozar e dispor da coisa (CC, art. 1.228), pode afian�ar, por escrito (CC, art. 819), o contrato de loca��o (residencial ou comercial), abrindo m�o da impenhorabilidade do seu bem de fam�lia, por sua livre e espont�nea vontade, no �mbito de sua autonomia privada, de sua autodetermina��o. Ali�s, "admitir o contr�rio se constituiria, a um s� tempo, clara viola��o do princ�pio da boa-f� objetiva" (RE 1.303.711, Rel. Min. Nunes Marques, Dje de 19/3/2021).

N�o se pode olvidar que entender de forma diversa (reconhecendo a impenhorabilidade do im�vel do fiador) acabaria por ensejar grave impacto na liberdade de empreender do locat�rio e no direito de propriedade do fiador, notadamente porque a fian�a � sabidamente a garantia menos custosa e a mais aceita pelos locadores. Afastar a prote��o do bem de fam�lia foi o instrumento jur�dico de pol�ticas p�blicas que o Estado se valeu para enfrentar o problema p�blico da aus�ncia de moradia e de fomento da atividade empresarial decorrente das dificuldades impostas aos contratos de loca��o.

Ademais, por uma an�lise econ�mica do direito, a interpreta��o que afasta a garantia fiduci�ria da loca��o comercial, mais precisamente a possibilidade de penhora do im�vel do fiador, muito provavelmente acabar� retirando a efici�ncia do mercado imobili�rio de loca��es para fins de exerc�cio de atividade econ�mica, influindo nas leis da oferta e da procura, j� que haver� um aumento no custo do contrato, reduzindo o n�mero de poss�veis locat�rios com poder de loca��o, diminuindo a riqueza e o bem-estar, com o aumento do custo social, por reduzir o empreendedorismo, a oferta de empregos e, consequentemente, a renda da popula��o.

Fonte: Informativo de Jurisprud�ncia

É inválida a penhora do imóvel pertencente à fiador de contrato de locação?

STF PERMITE PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE ALUGUEL. Em 9/3/2021, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento sobre a penhorabilidade de bem de família de fiador em contrato de locação, tanto comercial, quanto residencial.

É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação comercial?

​A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.091), estabeleceu a tese de que é válida a penhora do bem de família de fiador dado em garantia em contrato de locação de imóvel – seja residencial ou comercial –, nos termos do artigo 3º, inciso VII, ...

É legítima a penhora de Apontado bem de família pertencente a fiador de contrato de locação?

Súmula 486 do STJ – “É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.” Súmula 549 do STJ – “É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.”

Não é possível a penhora de bem de família do fiador em contexto de locação comercial?

Não é penhorável o bem de família do fiador no caso de contratos de locação comercial. Em outras palavras, não é possível a penhora de bem de família do fiador em contexto de locação comercial. STF.