Da Redação | 25/09/2019, 13h10
A Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) discutiu nesta quarta-feira (25) a universalização do saneamento básico no Brasil. Durante audiência pública, os expositores alertaram para o fato de que 48% da população brasileira ainda não têm coleta de esgoto. Eles pediram a atenção do Senado e do governo para mudar essa realidade.
O presidente executivo do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, afirmou que todos os objetivos de desenvolvimento sustentável são conectados ao saneamento. O instituto é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) que atua no Brasil desde 2007, formado por empresas com interesse nos avanços do saneamento básico e na proteção dos recursos hídricos do país.
— O Brasil exporta tecnologia agrícola e não consegue ainda entregar esgoto tratado — lamentou.
— Hoje estamos falando de incêndio nas florestas, de agrotóxicos, de vários impactos ambientais. Não há nenhum impacto ambiental hoje maior do que o lançamento de esgoto. E é um assunto que a gente ainda não consegue dar velocidade necessária para solucionar — disse.
— Como vamos construir um país realmente desenvolvido numa situação dessa? — questionou.
— Essa ineficiência brasileira na distribuição de água é fatal para que a gente não consiga avançar nos serviços de saneamento. São vazamentos, gatos, roubos, fraudes de hidrômetros, hidrômetros que não medem nada — citou Édison.
Por fim, ele apresentou um estudo da Fundação Getúlio Vargas, entregue ao ex-presidente Michel Temer e ao presidente Jair Bolsonaro, mostrando que o Brasil ganharia R$ 1,1 trilhão nos próximos 20 anos se universalizasse o saneamento básico, a um custo de R$ 470 bilhões. Ele disse ainda que deverá chegar à Câmara e ao Senado um projeto de lei sobre o assunto e pediu o compromisso dos senadores para apoiar a proposta.
— Talvez não há maior e melhor investimento que esse país possa fazer do que a universalização do saneamento básico. É a infraestrutura que mais traz benefícios a um ser humano. É a infraestrutura mais relevante que um país pode ter — afirmou.
O senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) perguntou por que não se dá prioridade às obras de saneamento. Édison Carlos respondeu que, na década de 1970, houve um intenso movimento para obras de saneamento básico, mas que se priorizou a entrega da água potável. A coleta e o tratamento de esgoto ficaram para outro momento.
— Isso mostra que a empresa ser pública não significa que ela seja ruim. Queremos que haja uma maior participação conjunta — disse.
Norte | 10,24% |
Nordeste | 26,87% |
Sudeste | 78,54% |
Sul | 43,93% |
Centro-Oeste | 53,88% |
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
O saneamento básico constitui-se como o conjunto de infraestruturas e medidas adotadas pelo governo a fim de gerar melhores condições de vida para a população. No Brasil, esse conceito está estabelecido pela lei nº 11.445/07, compreendendo o conjunto de serviços estruturais de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e limpeza e drenagem de lixo e águas pluviais urbanos.
Em linhas gerais, podemos dizer que nos últimos 20 anos a difusão dos serviços de saneamento básico no Brasil conheceu profundos avanços. Porém, ainda existem muitos problemas, principalmente relacionados com as desigualdades regionais quanto à disponibilidade de infraestruturas, um reflexo do desenvolvimento desigual do território brasileiro.
Dados do Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE) afirmam que 98% da população brasileira possui acesso à água potável, mas cerca de 17% do total de domicílios não possui o fornecimento hídrico encanado, tendo acesso a esse recurso por meio de cisternas, rios e açudes. Em uma divisão entre cidade e campo, constata-se a diferença: 99% da população urbana tem acesso à água potável, enquanto, no meio rural, esse índice cai para 84%.
Já a população com acesso à rede sanitária ou fossa séptica é menor, cerca de 79% em 2010, o que revela o grande número de domicílios situados em localidades com esgoto a céu aberto. Além disso, cerca de 14% dos habitantes do país não são contemplados pelo serviço de coleta de lixo e 2,5% não contam com o fornecimento de eletricidade.
As desigualdades regionais nesses quesitos são marcantes. Enquanto as cidades mais desenvolvidas do país, como São Paulo e Rio de Janeiro, apresentam índices de tratamento de esgoto de 93%, outras capitais, como Belém (7,7%) e Macapá (5,5%), não gozam do mesmo privilégio.
Além disso, há também uma desigualdade intraurbana (ou seja, dentro das cidades), com ausência de serviços de água, esgoto e até eletricidade em periferias e favelas. De acordo com as premissas internacionais dos Direitos Humanos, privar grupos de pessoas de serviços básicos como esses pelo simples fato de não serem proprietários legais de suas terras constitui-se como um crime e uma agressão à humanidade.
Não obstante, o peso das taxas e impostos cobrados pelo Estado para a manutenção desses serviços não segue uma proporção devidamente estabelecida. Isso significa dizer que os valores cobrados pesam mais no bolso das populações mais pobres do que na população mais rica. Para a Organização das Nações Unidas, o ideal seria que essas cobranças não ultrapassassem 5% do orçamento familiar, o que não ocorre na maioria dos casos atualmente.
O Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab)
Com o escopo de mudar a situação do saneamento básico no Brasil, o governo brasileiro instituiu o Plansab (Plano Nacional de Saneamento Básico), que consiste em um conjunto de metas e objetivos para transformar a realidade desse setor no país. Entre essas metas, encontram-se alguns dos Objetivos do Milênio, implantados pela ONU, que são: a) reduzir pela metade, até 2015, a proporção de habitantes sem acesso à água e ao saneamento básico; b) melhorar significativamente as condições de vida de 100 milhões de pessoas que vivem em bairros degradados até o ano de 2020.
Além disso, outra meta estipulada é a de atingir a universalização das estruturas de saneamento básico em todo o país até o ano de 2033. Contudo, esse esforço, segundo estimativas de órgãos como o Instituto Trata Brasil, demanda um investimento de pelo menos R$15 bilhões por ano, enquanto o Estado vem investindo, em média, R$9 bilhões.
Por outro lado, as previsões estabelecidas pelo Plansab revelam uma estimativa de R$508,4 bilhões de reais entre os anos de 2014 e 2033. Há a expectativa de que esses valores atendam às necessidades estruturais até o término desse prazo.
O mais importante sobre essa questão, a partir de agora, além da intensificação dos investimentos públicos em nível federal, estadual e municipal, é a pressão popular pela democratização dos serviços sanitários. Um relatório da ONU de 2013 revelou que apenas uma em cada quatro pessoas sem saneamento básico reclama por seus direitos, o que revela a necessidade de uma maior mobilização pelo atendimento desse tipo de demanda.
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¹ Créditos da Imagem: Valter Campanato/ABr e Wikimedia Commons
Por Rodolfo Alves Pena
Graduado em Geografia