Qual a importância da história na formação do professor?

Este artigo tem como objetivo investigar a profissão do educador de História, através de sua identidade narrativa. Nesta pesquisa, buscamos relacionar a formação inicial do educador com a percepção que tem da docência. Para isto, entrevistamos professores da disciplina de História das escolas públicas da cidade de Santa Maria, RS, tendo como metodologia a história oral de vida. A pesquisa mostrou que a formação inicial tem um papel central na constituição de posturas teóricas, práticas pedagógicas e na identidade profissional. A principal crítica apontada nas narrativas sobre a formação inicial relaciona-se à dicotomia entre teoria e prática. Entretanto, a percepção do educador acerca da sua profissão não fica restrita aos processos de formação formal, sendo influenciada pelas trajetórias pessoal e profissional, tendo sua gênese na história de vida dos entrevistados: na escolha da profissão e na imagem que se tem, a priori, da docência. A partir dessas reflexões, apontamos a necessidade de rever paradigmas que norteiam as práticas de formação de professores de história.

Ensino de História; formação de professores; história oral; narrativas


This article aims at investigating the History educator profession through their narrative. In this research we tried to relate the educator initial formation with his/her perception of teaching. In this way, we interviewed History teachers from public schools in the city of Santa Maria, RS, using as methodology their oral life stories. The research showed that the initial formation plays a central role in building their theoretical positions, teaching practices and professional identity. The main criticism revealed by the narratives about their initial education was related to the dichotomy between theory and practice. However, the educator's perception about his/her profession is not restricted to formal education processes, being influenced by personal and professional experiences and, it is originated at the life history of the respondents: in choosing the profession and in the image one has, a priori, of teaching. Based on these considerations we point out the need to revise paradigms which guide the practices of History teachers' education.

History teaching; teachers' education; oral stories; narratives


DOSSIÊ: HISTÓRIA, EPISTEMOLOGIA E ENSINO: DESAFIOS DE UM DIÁLOGO EM TEMPOS DE INCERTEZAS

Ensino de História e formação de professores: narrativas de educadores

History Teaching and teachers' education: educators' narratives

Jorge Luiz da CunhaI; Lisliane dos Santos CardôzoII

IDoutor em História, Professor titular da Universidade Federal de Santa Maria, e-mail; [email protected]

IIMestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria, Bacharel e Licenciada em História pela mesma instituição, Pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Memória e Educação - CLIO/CNPQ, e-mail: [email protected]

RESUMO

Este artigo tem como objetivo investigar a profissão do educador de História, através de sua identidade narrativa. Nesta pesquisa, buscamos relacionar a formação inicial do educador com a percepção que tem da docência. Para isto, entrevistamos professores da disciplina de História das escolas públicas da cidade de Santa Maria, RS, tendo como metodologia a história oral de vida. A pesquisa mostrou que a formação inicial tem um papel central na constituição de posturas teóricas, práticas pedagógicas e na identidade profissional. A principal crítica apontada nas narrativas sobre a formação inicial relaciona-se à dicotomia entre teoria e prática. Entretanto, a percepção do educador acerca da sua profissão não fica restrita aos processos de formação formal, sendo influenciada pelas trajetórias pessoal e profissional, tendo sua gênese na história de vida dos entrevistados: na escolha da profissão e na imagem que se tem, a priori, da docência. A partir dessas reflexões, apontamos a necessidade de rever paradigmas que norteiam as práticas de formação de professores de história.

Palavras-chave: Ensino de História; formação de professores; história oral; narrativas.

ABSTRACT

This article aims at investigating the History educator profession through their narrative. In this research we tried to relate the educator initial formation with his/her perception of teaching. In this way, we interviewed History teachers from public schools in the city of Santa Maria, RS, using as methodology their oral life stories. The research showed that the initial formation plays a central role in building their theoretical positions, teaching practices and professional identity. The main criticism revealed by the narratives about their initial education was related to the dichotomy between theory and practice. However, the educator's perception about his/her profession is not restricted to formal education processes, being influenced by personal and professional experiences and, it is originated at the life history of the respondents: in choosing the profession and in the image one has, a priori, of teaching. Based on these considerations we point out the need to revise paradigms which guide the practices of History teachers' education.

Keywords: History teaching; teachers' education; oral stories; narratives.

Memória e narrativa historiográfica

O tempo não para, não podemos revivê-lo, nem congelá-lo, nem detê-lo. Podemos lembrá-lo, apenas. O tempo só se converte em tempo humano quando se organiza, encontra sentido, ressignifica-se em uma narração. A narrativa, por sua vez, é a forma da memória e a memória, a presença do passado.

O tratamento que a memória recebeu de alguns autores foi de que é oposta à história (HALBWACHS, 1990). Outros, afirmaram que a memória e a história são sinônimas, ou que são fundidas uma na outra, especialmente no desenvolvimento de uma memória nacional (NORRA, 1993). Rejeitamos a concepção de que história e memória são a mesma coisa e também nos distanciamos daqueles que as percebem como opostas. Concebemos, com base em estudos de Paul Ricoeur, a relação da história e da memória numa perspectiva dialógica.

Ricoeur ocupou-se com a memória tardiamente: a questão aparece na obra A memória, a história e o esquecimento, publicada em francês em 2000. Antes, contribuiu no campo historiográfico com Tempo e narrativa, publicada em francês, em três volumes, em 1984, 1985 e 1988, trabalho no qual analisou a natureza do ato narrativo em relação à percepção e representação da temporalidade.

Segundo Ricoeur, na medida em que a referência última da narrativa é percebida como a própria estrutura do tempo, a ficção e a história passam a se implicar mutuamente, embora sem anular suas particularidades. A tessitura de uma intriga e a chamada referência metafórica as aproximam; a ambição veritativa, no âmbito da epistemologia, estabelece a diferenciação. A tese é que:

[...] el vínculo de la historia con el relato no puede romperse sin que la historia pierda su especificidad entre las ciencias humanas. Diré, em primer lugar, que el error fundamental de aquellos que oponen historia y relato se debe al desconocimiento del carácter inteligible que la trama confiere al relato, algo que Aristóteles había sido el primero en subrayar. Una noción ingenua del relato, como sucesión deshilvanada de acontecimientos, se encuentra siempre en el trasfondo de la crítica al carácter narrativo de la historia. Dicha crítica sólo aprecia el carácter episódico y olvida el carácter configurado, que constituye la base de su inteligibilidad. Al mismo tiempo, se ignora la distancia que establece el relato entre él y la experiencia viva. Entre vivir y narrar existe siempre una separación, por pequeña que sea. La vida se vive, la historia se cuenta (RICOEUR, 2000, p. 192).

Existe uma clivagem entre viver e narrar, entre o passado e a história. É através da narrativa que o tempo e os acontecimentos são ordenados, que a escrita da história se torna inteligível. A narrativa permite que acontecimentos reais, interdependentes dos que os antecedem e dos que os sucedem, sejam representados com sentido e estética próprios. Já a ficção lida com acontecimentos irreais, como se fossem reais por meio da voz narrativa. Isso as une, as intriga, ou seja, a representação faz parte da tessitura tanto do texto histórico como do literário. No entanto, a epistemologia as separa. Concluímos que toda a produção da historiografia está marcada pelo signo da narratividade, bem como a literatura ou mesmo um relato oral. Ou seja, busca-se a constituição de um sentido que transcende o evento em si, recorrendo-se inevitavelmente à imaginação e à interpretação do mundo.

Esta pesquisa é fruto, assim como tantas outras, do deslocamento que houve na historiografia, que passou a considerar outras estruturas narrativas para escrever história, antes ignoradas, como é o caso da narrativa oral, oriunda da memória. Retornamos aqui ao argumento inicial, da memória e da história, lacuna deixada por Ricoeur em Tempo e narrativa, mas estudada em A memória, a história e o esquecimento. O autor percebeu justamente que essa brecha, o nível intermediário da experiência temporal humana e a operação narrativa, era a memória. A memória que pode ser vista como fonte histórica ou como fenômeno histórico (BURKE, 2000).

Para o estudo da memória precisamos considerar também o esquecimento, pois, para Ricouer, "ver uma coisa é não ver outra. Narrar um drama é esquecer outro" (2007, p. 459). Quando narramos, através da memória, fazemos uma construção psíquica que é seletiva, ou seja, representamos o passado também através de esquecimentos. Além disso, é preciso considerar o indivíduo dentro de contextos que são também responsáveis pela constituição de uma identidade narrativa. Le Goff acrescenta que "A memória, como propriedade de conservar certas informações, remetenos em primeiro lugar a um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa como passadas" (1994, p. 419).

Tomar a narrativa oral como fonte da história é possível graças às mudanças na relação entre a história e a memória, articuladas a uma série de modificações nas concepções epistemológicas, constituindo, de tal modo, um novo cenário de possibilidades no âmbito historiográfico, onde a mais expressiva alteração talvez seja relativa à pretensão de objetivismos e generalismos na produção do conhecimento histórico. A historiografia passa a evidenciar o caráter hermenêutico da história, a valorizar questões de âmbito subjetivo e reflexivo relativas ao sujeito histórico, que fora esquecido, muitas vezes, da memória pública. Portanto, a memória não é só um objeto da história, deve ser analisada como um fenômeno social.

Feitas estas primeiras considerações, nossa proposta é de pensar a profissão do educador de história através da sua identidade narrativa, tendo a memória como fonte de pesquisa. Procurando, através de narrativas orais e da bibliografia, relacionar a formação do educador, no contexto em que ela ocorre, com a percepção que este tem da docência. Buscamos, portanto, pensar múltiplos trajetos, escolhas, práticas pedagógicas, em contextos históricos diversos, porém, num espaço comum, as escolas públicas da cidade de Santa Maria, RS. Analisamos as narrativas estabelecendo diálogo entre o Ensino de História, que remete à construção da disciplina, as políticas públicas a ele aplicadas e sua função político-social, e a História Ensinada, dimensão micro que valoriza o educador, visto que nos remete à prática do ato de ensinar história. Observamos que essa distinção é indicada por Fonseca (1993).

Filiamo-nos aos movimentos que procuram colocar os professores como sujeitos da pesquisa e nos vinculamos à área de pesquisa do ensino de história que é definida como:

[...] um campo de pesquisa em processo de constituição, que se legitima e se afirma tanto nos espaços institucionais de produção do conhecimento na área de Educação quanto na área de História. No Brasil, tal campo situa-se, fundamentalmente, na área de Educação, como um espaço inter-disciplinar construído na inter-relação da História e dos saberes pedagógicos para a busca da compreensão dos processos de ensino-aprendizagem da disciplina. Além disso, existe a preocupação de se compreenderem as implicações sociais, políticas e culturais presentes no Ensino de História (MONTEIRO; GASPARELLO; MAGALHÃES, 2007, p. 7).

Na educação, é na década de 1980 que começam a aparecer estudos que têm como foco o professor enquanto sujeito de análise. Posteriormente, os trabalhos com esse foco investigativo cresceram significativamente, mas demoraram a chegar ao Brasil. Atualmente, estudos dedicados à vida do educador, aos trajetos docentes, biografias e o uso da história oral de vida ganham destaque na área da educação, especialmente, no âmbito da história da educação que

[...] passou por um verdadeiro processo de renovação. No Brasil, especificamente nos últimos vinte anos, esse campo de estudos aproximou-se de uma nova forma de escrever a história [...] os estudos passaram a ser mais localizados e contextualizados, lidando com períodos de tempo mais curtos. [...] passou a se preocupar com a organização e o funcionamento interno das escolas, com a expressão e/ou construção cultural no cotidiano escolar, como estabelecimento do conhecimento, do currículo, das disciplinas escolares. Além das fontes oficiais, que têm recebido um novo olhar e um novo tratamento, outras fontes passaram a ser utilizadas, tais como a fotografia, a literatura, os manuais escolares, os jornais e revistas, a "história" oral etc. (GALVÃO; SOUZA JÚNIOR; 2005, p. 397) [grifo nosso]

A história oral foi introduzida no Brasil nos anos 1970, mas foi apenas na década de 1990 que se expandiu, quer como metodologia, quer como técnica ou fonte. Na educação, a modalidade de história oral de vida, buscando as experiências e trajetórias de professores, tem sido bastante empregada. Esta modalidade

[...] dirige seu foco especialmente para a experiência pessoal do entrevistado, enfatizando sobremaneira seus processos subjetivos e sua(s) identidade(s). [...] Este depoimento oral, ao mesmo tempo em que reconstrói uma história pessoal, promove, também, um profundo processo de revisão, reconstrução e ressignificação do passado e do presente, resultando numa narrativa estruturada da própria história do entrevistado, agora apresentada com objetivos públicos. A História Oral de Vida, como narrativa, representa uma das formas como o sujeito se compreende, como interpreta sua autoimagem e como deseja ser conhecido pelos outros. Nessas entrevistas, o narrador está livre para construir a sua própria versão, na qual poderá ocultar, revelar e recriar sua experiência pessoal (ATAIDE, 2006, p. 318).

Nesta pesquisa, o uso da história oral é uma possibilidade de vislumbrar uma aparente obviedade: que o professor de história faz história, que é uma pessoa que faz escolhas e tem uma trajetória pessoal que se articula à sua trajetória docente. Abrahão e Souza trabalham com o ato narrar e nos dizem que:

[...] o ato narrativo se estriba na memória do narrador e que a significação que o narrador deu ao fato no momento de seu acontecimento é ressignificada no momento de enunciação desse fato, em virtude de que a memória é reconstrutiva, além de ser seletiva, mercê não só do tempo transcorrido e das diferentes ressignificações que o sujeito da narração imprime aos fatos ao longo do tempo, mas também pelas ressignificações que ocorrem na relação que se estabelece entre narrador e pesquisador no momento da narração (ABRAHÃO; SOUZA, 2006, p. 151).

Na narrativa, o passado estabelece uma relação com o presente e com o futuro. Deste modo, o estudo da memória deve admitir que o sujeito busque sentido em experiências passadas, mas com a visão acerca do que ocorreu no momento em que é elaborada a narração, isto é, atrelada a ideias, opções e imagens do presente. De forma que identificar a percepção do depoente sobre a sua profissão é entrar em contato com as dimensões passadas, presentes e futuras para constituir a imagem que este inventa de si. Entendemos que, no que se reporta à identidade profissional dos educadores de história, a história oral pode abrir caminhos ainda pouco explorados.

Trajetórias do ensino de história e da formação de professores

Os paradigmas que permeiam as discussões atuais em torno da formação de professores não são preocupações novas. Estão anunciados em diversas políticas públicas ao longo da história da formação de professores no Brasil. Isso é um indicativo da pertinência de pensarmos a formação de professores e, no caso, a formação específica para o ensino de história; e, ao mesmo tempo, buscar a gênese de problemáticas persistentes, historicamente identificadas e proclamadas no cenário educacional brasileiro.

Para refletirmos acerca da formação de professores, entendemos ser necessário voltar para a história dessa formação e ouvir os professores. Pesquisas têm demonstrado que os estudos de histórias de vida de educadores são muito importantes para pensar a formação de professores. Remond (1987, p. 312) afirma que "as circunstâncias da existência têm um papel determinante na formação de um historiador, assim como de todos os homens. As circunstâncias são, em primeiro lugar, a profissão, e a profissão para os historiadores, é geralmente o ensino: na nossa sociedade, raros são os verdadeiros historiadores que não sejam professores".

No Brasil, a realidade é que a área de atuação profissional para os historiadores é a educação. Assim, cabe-nos perguntar: como os professores narram e produzem sentido acerca da formação para docência que têm recebido?

Tornou-se lugar-comum a noção de que a formação permanente do educador de história se faz ao longo de toda sua vida. O processo de formação permanente do professor, sempre inacabado, construído ao longo da trajetória pessoal e profissional, é multifacetado, dialógico e complexo. Nele se pretende encontrar respostas para os desafios do trabalho docente. Ainda assim, a formação inicial tem um papel mobilizador e problematizador, onde acontece a transmissão de saberes e a constituição de posturas teóricas. É espaço de construção de identidade docente. Portanto, "compreender como cada pessoa se formou é encontrar as relações entre as pluralidades que atravessam a vida. Ninguém se forma no vazio. [...] Ter acesso ao modo como cada pessoa se forma é ter em conta a singularidade da sua história" (MOITA, 1995, p. 114-115).

A trajetória profissional resulta de experiências vividas na formação inicial, relativas às teorias, práticas pedagógicas, saberes docentes, influência de professores, lembranças de escolas, compondo, de tal maneira, o modo único de cada educador ser e estar na profissão. Em A aventura de formar professores, Veiga fomenta um debate crítico frente à formação de professores, para ela:

[...] a formação de professores é uma ação contínua e progressiva que envolve várias instâncias, e atribui uma valorização significativa para a prática pedagógica, para a experiência, como componente constitutivo da formação. Ao valorizar a prática como componente formador, em nenhum momento assume-se a visão dicotômica da relação teoria-prática. A prática profissional da docência exige uma fundamentação teórica explícita. A teoria também é ação e a prática não é receptáculo da teoria. Esta não é um conjunto de regras. É formulada e trabalhada com base no conhecimento da realidade concreta. A prática é o ponto de partida e de chegada do processo de formação (2009, p. 27).

A autora destaca a articulação que deve existir entre a teoria e a prática, vendo-as não como coisas estanques e separadas, mas como partes de um todo. Paradoxalmente, entre as principais dificuldades enfrentadas ao longo da formação inicial, encontradas nas narrativas, podemos mencionar a dicotomia percebida pelos professores entre teoria e prática um dos maiores desafios dos cursos de licenciatura.

Nóvoa expõe que aos educadores foi, por longo tempo, imposta uma separação entre o eu pessoal e o eu profissional, que negligenciava o papel do professor. Ele investiga qual foi o tratamento dispensado à categoria profissional dos educadores, mencionando estudos de Ball e Goodson (1989) e Woods (1991), quando estes se referem

[...] aos anos 60 como um período onde os professores foram "ignorados", parecendo não terem existência própria enquanto factor determinante da dinâmica educativa; aos anos 70 como uma fase em que os professores foram "esmagados", sob o peso da acusação de contribuírem para a reprodução das desigualdades sociais; aos anos 80 como uma década na qual se multiplicaram as instâncias de controlo dos professores, em paralelo com o desenvolvimento de práticas institucionais de avaliação (NÓVOA, 1994, p. 15).

Entre serem "ignorados" e "esmagados", as atribuições sociais dos professores foram crescendo significativamente, em resposta às demandas da sociedade e às imposições políticas. Isso acarretou uma progressiva perda de autonomia, desvalorização da sua imagem e desqualificação social de seu trabalho.

No Brasil, esse processo de proletarização (ENGUITA, 1991) foi agravado por políticas públicas, muitas vezes, alheias às necessidades da educação, por exemplo, o modelo de formação "3 + 1". Fortemente criticado, o modelo prevaleceu oficialmente até a década de 1960. Havia uma separação entre conhecimentos específicos, para os quais ficavam destinados três anos, e os pedagógicos, mais um ano. Ainda que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDBEN, de 1961 tenha extinguido esse modelo, a formação de professores prosseguiu fragmentada. Isso acarretou, na prática profissional, profunda separação entre a universidade e as problemáticas da escola.

A reforma universitária propôs, em 1968, um novo modelo para o ensino superior. Ainda assim, não atendeu à expectativa dos cursos de licenciatura. Segundo Fonseca,

De um lado, a reforma universitária aparece como instrumento de desenvolvimento e progresso social, supostamente atendendo às demandas sociais por cursos superiores em nível de graduação e pós-graduação. Por outro lado, tinha um objetivo desmobilizador, pois atacava duramente a organização do movimento estudantil, a autonomia universitária e a possibilidade de contestação e crítica no interior das Instituições de Ensino Superior. Medidas como a departamentalização, matrícula por disciplina, unificação dos vestibulares, que passam a ser classificatórios, fragmentação dos cursos, o controle ideológico e administrativo dos professores e o modelo administrativo empresarial implantado nas faculdades representam o "ajustamento" da Universidade brasileira à ordem política e econômica que se impunha, aprofundando linhas já existentes (1993, p. 21).

Esses, em grande medida, persistem até hoje na universidade. Essa lógica, que permeou a formação de professores durante as últimas três décadas do século XX, teve como base o modelo de licenciaturas curtas e plenas. A formação pautada pela separação entre teoria e prática, pesquisa e ensino, conhecimento pedagógico e conhecimento disciplinar, aumentou a distância entre a formação acadêmica e a escola.

No que tange às políticas públicas do ensino de História, precisamos considerar que este foi alvo de uma série de mudanças, a partir especialmente de 1968, em um processo contínuo de desqualificação dos professores de história. Como o professor tem um papel central na constituição de qualquer projeto educacional, este foi diretamente atacado pelas diretrizes políticas do Estado. Fonseca afirma que:

[...] o Ensino de História constitui-se alvo de especial atenção dos reformadores. Constatamos, neste período estudado, sobretudo após 1968, uma série de mudanças no Ensino de História. Num primeiro momento, elas se processaram em estreita consonância com as diretrizes políticas do poder do Estado. No segundo momento, constatamos o poder das forças sociais emergentes no processo de democratização, intervindo diretamente nas mudanças afetas ao ensino e à produção da História (1993, p. 25).

A LDBEN de 1971, em um dos momentos mais críticos da história do Brasil, propõe uma "formação para o trabalho e para o exercício consciente da cidadania". Alterou-se a nomenclatura dos graus de ensino: o primeiro grau, equivalente ao ensino primário e ao ginasial, e o segundo grau, equivalente ao colegial. Quanto ao currículo, previu-se Estudos Sociais no lugar de História e Geografia, "no sentido de controlar e reprimir as opiniões e os pensamentos dos cidadãos, de forma a eliminar toda e qualquer possibilidade de resistência ao regime autoritário" (FONSECA, 1993, p. 25).

Para que esse projeto fosse implementado, foram assegurados cursos para a formação de professores:

Nestes cursos, começa a ser formada a nova geração de professores polivalentes, e neles o principal objetivo é a descaracterização das Ciências Humanas como campo de saberes autônomos, pois são transfiguradas e transmitidas como um mosaico de conhecimentos gerais e superficiais da realidade social. Esta concepção de curso de formação de professores segue o modelo norte-americano, que dá prioridade a uma formação ampla e também voltada para métodos e técnicas de ensino com pouca ênfase no conteúdo específico no qual o aluno pretende se formar. A especialização em História ou Geografia dá-se nos cursos de pós-graduação em nível de Mestrado e Doutorado (FONSECA, 1993, p. 27).

Veiga nos diz que "o processo de formação é contextualizado histórica e socialmente e, sem dúvida, constitui um ato político. O processo de formação deve ser compatível com o contexto social, político e econômico" (2009, p. 27). De nossos sete entrevistados3 3 Os nomes de nossos entrevistados são fictícios. 4 Formada no curso de Estudos Sociais, em 1986, na Faculdade Imaculada Conceição, e, posteriormente, em 1987, na Universidade Federal de Santa Maria, em História. 5 Formada em 1988 no curso de História pela Faculdade de Filosofia de Palmas, no Paraná. 6 Formado em História em 1992 na Faculdade Imaculada Conceição. 7 Formada em 1986 no curso de História da Universidade Federal de Santa Maria. 8 Formada em Estudos Sociais, e, posteriormente, fez o curso de História na Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS), formando-se em 1984. 9 Formada em História pela Universidade Federal de Santa Maria em 1998.

Qual a importância da História da educação para a formação de professores?

O estudo da História da Educação é importante devido o seu potencial formativo, autor reflexivo e cognitivo. Ou seja, o estudo da história da educação tem a capacidade de fazer com que os alunos raciocinem de forma a compreender o porquê de se estudar determinada matérias e temas.

Qual a importância da História na formação?

A História como disciplina escolar surgiu na Europa, nos fins do século XIX e através dos tempos teve, e continua tendo, papel relevante na formação e preparação dos sujeitos para a vida social, através de suas experiências didáticas, o ensino de História auxilia na construção da democracia e da cidadania.

Qual a importância do professor de História?

O professor de história é um auxiliador no processo de aprendizagem do aluno, transmitindo o conteúdo de maneira adequada, considerando a idade, capacidades e limitações dos alunos, além disso, o professor deve considerar fatores externos que envolvem a aprendizagem da disciplina de história como a cultura, localidade, ...

Que papel pode a História da pedagogia e da educação desempenhar na formação docente?

A História da Educação pode possibilitar ao educador uma visão mais ampla e mais crítica do fenômeno educacional, pois permite que os problemas educativos sejam abordados de modo a tornar mais transparente a distância entre o desenvolvimento da sociedade e o desenvolvimento da classe social dominante.