O exame físico completo de todos os sistemas é essencial para detectar efeitos periféricos e sistêmicos de enfermidades cardíacas e evidenciar doenças não cardíacas que podem afetar o coração. O exame físico compreende os seguintes aspectos:
Avaliação dos sinais vitais
Palpação e ausculta dos pulsos
Observação das veias
Inspeção e palpação do tórax
Exame pulmonar, incluindo percussão, palpação e ausculta
Exame do abdome e dos membros
O exame também inclui a coleta de outros dados sobre o paciente.
Sinais vitais incluem
Pressão arterial
Frequência e ritmo cardíacos
Frequência respiratória
Temperatura
Dados adicionais frequentemente obtidos juntamente com os sinais vitais incluem peso e saturação periférica de oxigênio (SpO2) do paciente.
Pressão arterial é medida em todos os membros superiores e inferiores naqueles em que se presume a existência de cardiopatia congênita ou doenças vasculares periféricas. O manguito de uma braçadeira de tamanho apropriado envolve 80% da circunferência do membro e sua largura abrange 40% dessa circunferência. O primeiro som cardíaco auscultado, à medida que cai a coluna de Hg, é a pressão sistólica, e o desaparecimento do som é a pressão diastólica (som da 5ª fase de Korotkoff). A diferença de pressão de até 15 mmHg entre os membros superiores direito e esquerdo é normal, uma vez que um diferencial superior sugere alteração vascular (p. ex., dissecção da aorta torácica) ou doença vascular periférica. A pressão arterial do membro inferior é habitualmente 20 mmHg mais elevada que a do membro superior. Para obter uma aferição precisa da pressão arterial, o paciente deve
Sentado em uma cadeira (não na mesa de exame) por > 5 minutos, pés no chão, apoiado nas costas
Apoiar o membro superior no nível do coração sem roupas cobrindo a área de colocação do manguito
Não fazer exercícios, consumir cafeína ou fumar durante pelo menos 30 minutos antes da aferição da pressão
A temperatura pode ser elevada por
febre reumática
Febre reumática A febre reumática é uma complicação inflamatória aguda, não supurativa da infecção faríngea por estreptococos do grupo A, causando combinaçõ... leia mais
Obtém-se a saturação de oxigênio no sangue arterial (SpO2). A oximetria de pulso mede a saturação de oxigênio pela hemoglobina no
sangue arterial (SpO2), sendo utilizada como uma estimativa rápida e não invasiva da oxigenação tecidual. Obtém-se a oximetria de pulso utilizando uma sonda ligada a um dígito ou lóbulo da orelha. O consenso geralmente é de que uma SpO2 ≥ 95% é normal, enquanto valores < 95% sugerem hipoxemia. Uma exceção notável a esse valor de corte é em pacientes com
doença pulmonar obstrutiva crônica
Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) A doença pulmonar obstrutiva crônica é a limitação do fluxo de ar provocada por resposta inflamatória a toxinas inalatórias, frequentemente fumaça de cigarro. Deficiência de alfa-1 antitripsina... leia mais
O índice tornozelo-braquial é a relação entre pressão arterial sistólica no tornozelo com aquela no membro superior. Com o paciente recostado, aferir a pressão arterial do tornozelo tanto na arterial dorsal do pé como na artéria tibial posterior, e a pressão arterial nos membros superiores na artéria braquial. O índice é calculado para cada membro inferior dividindo-se a maior pressão sistólica da artéria dorsal do pé ou da artéria tibial desse membro pela maior das 2 pressões sistólicas das artérias braquiais. Essa relação é normalmente > 1. Se os pulsos pediosos não forem facilmente palpáveis, é possível usar sonda com Doppler para avaliar a pressão arterial do tornozelo.
Um valor baixo (≤ 0,90) do índice tornozelo-braquial sugere doença arterial periférica
Doença arterial periférica Doença arterial periférica é a aterosclerose dos membros inferiores que acarreta isquemia. A DAP leve pode ser assintomática ou causar claudicação intermitente; a DAP grave pode desencadear... leia mais
Avaliam-se a pressão arterial e a frequência cardíaca com o paciente em posição supina, sentado e em pé, a intervalos de 1 minuto entre cada mudança de posição. A diferença de ≤ 10 mmHg da pressão arterial e uma alteração da frequência cardíaca de ≤ 20 batimentos por minuto é normal; a diferença entre as pressões arteriais tende a ser um pouco maior nos idosos por causa da perda da elasticidade vascular.
Normalmente, durante a inspiração, a pressão arterial sistólica pode diminuir até 10 mmHg e a frequência cardíaca aumenta para efetuar a compensação. O exagero dessa resposta normal com maior diminuição da pressão arterial sistólica ou a atenuação do pulso durante a inspiração é denominado pulso paradoxal. O pulso paradoxal ocorre em
A pressão arterial diminui durante a inspiração porque a pressão intratorácica negativa aumenta o retorno venoso e, consequentemente, o enchimento do ventrículo direito (VD); como resultado, o septo interventricular abaúla-se levemente em direção à via de saída do ventrículo esquerdo (VE), diminuindo o débito cardíaco e, assim, a pressão arterial. Esse mecanismo (e a queda da pressão arterial sistólica) é exacerbado nas enfermidades que provocam pressão intratorácica muito negativa (p. ex., asma) ou que restringem o enchimento do ventrículo direito (p. ex., tamponamento cardíaco ou miocardiopatia) ou a via de saída (p. ex., embolia pulmonar).
Quantifica-se o pulso paradoxal por insuflação do manguito do esfigmomanômetro um pouco acima da pressão arterial sistólica, desinflando-o lentamente (p. ex., ≤ 2 mmHg/batimento cardíaco). Observa-se a pressão quando se ouve pela primeira vez os sons de Korotkoff (inicialmente, apenas durante a expiração) e quando esses sons sãa orelhas continuamente. A diferença entre as pressões constitui a “magnitude” do pulso paradoxal.
Palpam-se os pulsos periféricos principais em braços e pernas para avaliar simetria e volume (intensidade). Observar a elasticidade da parede arterial. A ausência de pulsos pode sugerir doença arterial (p. ex.,
aterosclerose
Aterosclerose A aterosclerose caracteriza-se por placas intimais irregulares (ateromas) que avançam no lúmem das artérias de médio e grosso calibre. As placas contêm lipídeos, células inflamatórias, células... leia mais Observação, palpação e ausculta dos dois pulsos carotídeos podem sugerir doença específica (ver tabela Amplitude do pulso carotídeo e doenças associadas
Amplitude do pulso carotídeo e doenças associadas A ausculta das artérias carótidas pode distinguir sopros de ruídos. Os sopros são oriundos do coração ou dos grandes vasos e, habitualmente, são mais intensos sobre a parte superior do precórdio e diminuem em direção ao pescoço. Os ruídos possuem tonalidade mais elevada e são auscultados apenas sobre as
artérias e parecem mais superficiais. O ruído arterial deve ser distinguido do ruído venoso. Diferentemente do ruído arterial, o ruído venoso é habitualmente contínuo, mais bem auscultado com o paciente sentado ou em pé, sendo eliminado pela compressão da veia jugular interna ipsolateral.
A amplitude é proporcional à pressão atrial direita e a configuração reflete os eventos do ciclo cardíaco. Ambas são mais bem observadas na veia jugular interna. Habitualmente, examinam-se as veias jugulares com o paciente reclinado a 45°.
Nessa situação, o topo da coluna venosa normalmente está um pouco acima das clavículas (limite superior normal: 4 cm acima da incisura esternal no plano vertical). A coluna venosa está elevada em
insuficiência cardíaca
Insuficiência cardíaca (IC) A insuficiência cardíaca é uma síndrome de disfunção ventricular. A insuficiência ventricular esquerda provoca falta de ar e fadiga; a insuficiência ventricular direita desencadeia acúmulo de... leia mais
Normalmente, a
coluna venosa cai levemente durante a inspiração, à medida que a pressão intratorácica mais baixa extrai sangue da periferia para a veia cava. Uma elevação na coluna venosa durante a inspiração (sinal de Kussmaul) tipicamente ocorre na
pericardite constritiva crônica
Pericardite Pericardite é a inflamação do pericárdio, geralmente com acúmulo de líquido. Pode ser causada por muitos distúrbios (p. ex., infecção, infarto do miocárdio, trauma, tumores e distúrbios metabólicos)... leia mais
A onda a é
causada por contração atrial direita (sístole) e seguida pela descendente x, que é causada por relaxamento atrial. A onda c, uma interrupção da descendente x, é causada pelo pulso carotídeo transmitido e abaulamento da valva tricúspide no átrio direito quando se fecha; raramente é distinguida clinicamente. A onda v é causada por enchimento atrial direito durante sístole ventricular (a valva tricúspide está fechada). A descendente y é causada pelo enchimento
rápido do ventrículo direito durante diástole ventricular antes da contração atrial. As ondas a estão aumentadas na hipertensão pulmonar e na estenose da valva tricúspide. As ondas a gigantes (ondas em canhão) são observadas na dissociação atrioventricular, quando o átrio se contrai no momento em que a valva tricúspide estiver fechada. As ondas a desaparecem na fibrilação atrial e são exacerbadas quando a complacência do ventrículo direito for baixa (p.
ex., hipertensão pulmonar ou estenose pulmonar). As ondas v são muito proeminentes na regurgitação tricúspide. A descendente x é íngreme no tamponamento cardíaco. Quando a complacência do ventrículo direito for baixa, a descendente y é muito abrupta, pois a coluna elevada de sangue venoso desce para o ventrículo direito no momento em que se abre a valva tricúspide, interrompendo-se abruptamente apenas pela parede enrijecida do ventrículo direito (na miopatia restritiva) ou
pelo pericárdio (na pericardite constritiva).Ondas venosas jugulares normais
Inspecionam-se o contorno do tórax e qualquer impulso cardíaco visível. Palpa-se precórdio para identificação de pulsações (para determinação do impulso apical e, dessa forma, do situs cardíaco) e frêmitos.
Deformidades da parede do tórax podem ocorrer em várias doenças.
O tórax em escudo e o pectus carinatum (esterno proeminente semelhante aos dos pássaros) podem estar associadas à síndrome de
Marfan Síndrome de Marfan A síndrome de Marfan consiste em anomalias do tecido conetivo que provocam anormalidades oculares, esqueléticas e cardiovasculares (p. ex., dilatação da aorta ascendente, o que pode levar à... leia mais
O paciente permanece deitado em um ângulo de aproximadamente 30 a 45 graus. Aproximando-se do paciente a partir do lado direito, o médico palpa sistematicamente o precórdio.
O impulso apical nas pessoas saudáveis deve ser palpável entre o 4º e o 5º espaço intercostal, medial à linha hemiclavicular e ocupar uma área com diâmetro de 2 a 3 cm.
O impulso precordial central, o qual pode ser visualizado e palpado como sensação de propulsão sob o esterno e parede torácica anterior, à esquerda do esterno; sugere hipertrofia ventrículo direito grave. Ocasionalmente, em doenças congênitas que acarretam hipertrofia ventrículo direito grave, o precórdio abaúla-se assimetricamente à esquerda do esterno.
O impulso sustentado no ápice (facilmente diferenciado do impulso precordial menos focal, quase difuso, da hipertrofia ventrículo direito) sugere hipertrofia VE.
Examinam-se nos pulmões sinais de derrame pleural
Derrame pleural Os derrames pleurais são acúmulos de líquido dentro do espaço pleural. Eles têm múltiplas causas e normalmente, são classificados como transudatos ou exsudatos. São detectados por exame físico... leia mais
A percussão é a principal manobra física utilizada para detectar a existência e o nível de derrame pleural. Os achados na percussão de áreas de macicez significam a existência de líquido subjacente ou, menos comumente, de consolidação.
A palpação inclui o frêmito tátil (sensação de vibração da parede torácica enquanto o paciente fala); o frêmito é reduzido no derrame pleural e no pneumotórax e aumentado na consolidação pulmonar (p. ex., nas pneumonias lobares).
A natureza e o volume dos sons respiratórios são úteis na diferenciação entre doenças cardíacas e pulmonares. Os ruídos adventícios constituem sons anormais, envolvendo estertores, sibilos e estridor. Crepitações (anteriormente chamados estertores) e sibilos são sons pulmonares anormais que podem ocorrer na insuficiência cardíaca, bem como em doenças não cardíacas.
Examinam-se o abdome e as extremidades para procurar sinais de acúmulo de líquido, o que pode ocorrer na insuficiência cardíaca, bem como em doenças não cardíacas (p. ex., renal, hepática e linfática).
Nos membros (principalmente nas pernas), o acúmulo de líquido manifesta-se por edema
Edema Edema é o intumescimento de tecidos moles decorrente do aumento de líquido intersticial. O líquido predominante é água, mas pode haver acúmulo de líquido rico em células e proteínas, se houver... leia mais
O aumento da sensibilidade, eritema ou ambos, especialmente quando unilateral, sugere causa inflamatória (p. ex., celulite ou tromboflebite). O edema não depressível é mais sugestivo de obstrução linfática ou vascular que de sobrecarga líquida.
Disfunção sistólica do ventrículo esquerdo (com anormalidade no movimento regional ou global da parede)
Anormalidade no movimento regional da parede do ventrículo esquerdo (com função sistólica reduzida ou normal)
Pressões elevadas de enchimento do coração esquerdo (aumento do átrio esquerdo)
Estrutura e função valvar
Edema pulmonar (linhas B verticais nos campos pulmonares)
Derrame pleural
Congestão venosa sistêmica (dilatação da veia cava inferior)
Derrame pericárdico e tamponamento cardíaco
1. Kimura BJ: Point-of-care cardiac ultrasound techniques in the physical examination: better at the bedside. Heart 103:987–994, 2017. doi: 10.1136/heartjnl-2016-309915
2. Spencer KT, Kimura BJ, Korcarz CE, et al: Focused Cardiac Ultrasound: Recommendations from the American Society of Echocardiography. J Am Soc Echocardiogr 26:567–581, 2013. doi: 10.1016/j.echo.2013.04.001
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