Os efeitos das atividades humanas no meio ambiente pdf

ARTIGO

Impactos das atividades humanas sobre a dinâmica do fósforo no meio ambiente e seus reflexos na saúde pública

The impact of human activities on the dynamics of phosphorus in the environment and its effect on public health

Claudia Maria Gomes de Quevedo; Wanderley da Silva Paganini

Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Avenida Doutor Arnaldo 715. 01255-000 São Paulo SP.

RESUMO

O fósforo é um nutriente com fontes finitas e não renováveis, cuja velocidade de exploração é atualmente muito superior às suas taxas de retorno ao seu ciclo natural, sendo que já existem previsões a respeito de um provável colapso nas suas fontes disponíveis e conhecidas, com impactos econômicos, sociais e ambientais graves e irreversíveis. Diante desse cenário, o presente trabalho busca apresentar informações sobre a dinâmica do fósforo no meio ambiente, avaliando os impactos causados pelas atividades humanas e verificando as ações que podem auxiliar na preservação do ciclo do nutriente. Visando contribuir para uma melhor visualização do assunto, foi analisada a evolução dos dados relativos à concentração populacional, número de industriais e extensão das áreas cultivadas em uma bacia hidrográfica, em relação às concentrações de fósforo nos compartimentos água e sedimento, ao longo de 22 anos. Para tanto, utilizou-se o rio Tietê como estudo de caso. Os resultados obtidos indicam que o controle das fontes domésticas, principalmente da quantidade de tripolifosfato de sódio (STPP) utilizada nos detergentes, é de grande importância para a melhoria da qualidade das águas, proteção ao meio ambiente e garantia da saúde pública.

Palavras-chave Fósforo, Urbanização, Detergentes, Qualidade das águas, Saúde pública

ABSTRACT

Phosphorus is a nutrient with finite and non-renewable sources, the speed of exploitation of which is currently far higher than the rates of return to its natural cycle. It is already being predicted that available and known sources will soon be exhausted, with serious and irreversible economic, social and environmental impacts. In this context, this study sets out to present information about the dynamics of phosphorus in the environment, assessing the impacts caused by human activities and establishing what actions might contribute to preservation of the nutrient cycle. To contribute to enhanced understanding of the topic, the evolution of data on population density, the number of industries and the extension of cultivated areas in a river basin, was studied over 22 years in relation to concentrations of phosphorus in water and sediment. The Tietê River was used for the case study. The results revealed that the control of domestic effluent, especially the amount of sodium tripolyphosphate (STPP) used in detergents and soap products, is of major importance for improving water quality, ensuring environmental protection and safeguarding public health.

Key words Phosphorus, Urbanization, Detergents, Water quality, Public health

Introdução

Como parte importante dos ácidos nucleicos e dos conjuntos de transferência de energia, o fósforo torna-se um elemento vital para o funcionamento dos sistemas biológicos de todos os organismos vivos. O fósforo é, também, matéria-prima de diversos produtos industrializados utilizados em larga escala pelo homem, como é o caso dos fertilizantes e dos detergentes em pó.

A ação predadora do homem sobre os animais marinhos, aliada à crescente exploração das fontes de fósforo pela mineração, pela ocupação desordenada do solo, pelo desmatamento e, principalmente, pelo incremento das atividades industrial e agrícola, tem ocasionado a alteração da dinâmica desse nutriente no meio ambiente.

Assim, estima-se que as taxas de retorno do fósforo ao seu ciclo biogeoquímico estejam cada vez mais reduzidas em comparação com as suas perdas, com impactos na disponibilidade de suas fontes naturais e na qualidade das águas, em decorrência dos processos de eutrofização. Calcula-se que de 2 milhões de toneladas de fósforo que são produzidas atualmente, somente cerca de 60 mil retornam ao meio de origem1-3.

Preocupados com essas questões, diversos países passaram a discutir as formas de controle, através da aplicação de medidas preventivas, partindo inicialmente para a redução da quantidade de tripolifosfato de sódio (STPP) presente nos detergentes. Nesse sentido, diversas localidades, como Suíça, Alemanha, Holanda e Japão, deixaram de comercializar os detergentes fosfatados desde a década de 1980. Passou-se a discutir também, de forma mais intensa, a necessidade de serem adotadas outras medidas de gerenciamento e controle, envolvendo o monitoramento do lançamento de esgotos, bem como a melhoria gradativa e planejada na eficiência dos sistemas de tratamento, a fiscalização dos despejos industriais e a adoção de processos de produção agrícola mais controlados e sustentáveis, levando-se em conta as alternativas mais adequadas para a reciclagem do nutriente.

O conjunto dessas ações tem sido considerado fundamental para a melhoria da qualidade das águas, para a preservação do ciclo natural do fósforo e para a garantia da saúde pública, uma vez que se trata de um nutriente indispensável à produção biológica, e que não pode ser substituído por qualquer outro elemento naturalmente disponível ou sintetizado pelo homem.

As Atividades Humanas e o Ciclo do Fósforo

Ao contrário do nitrogênio, cujo reservatório é o ar, a fonte de fósforo na natureza é a litosfera. Sua liberação natural ocorre principalmente por meio das erosões do solo, num processo lento em que parte do fosfato é transportada para a hidrosfera, meio onde pode sedimentar-se ou ser utilizado pelos seres vivos. O retorno do fósforo sedimentado nos mares ocorre também muito lentamente, principalmente através dos peixes e aves marinhas1,2,4.

O transporte através das águas é parte fundamental do ciclo do fósforo, correspondendo à forma predominante com que o fosfato se move através do meio ambiente; seu comportamento em rios e reservatórios relaciona-se diretamente com o nível e intensidade das contribuições, se-jam elas naturais ou artificiais.

As fontes naturais estão relacionadas principalmente com as cargas difusas, devido aos processos erosivos da bacia de contribuição, à decomposição dos organismos aquáticos e dos vegetais que compõem as matas ciliares, ao assoreamento do corpo d'água, ao intemperismo das rochas e à intensidade das trocas ocorridas entre o sedimento e a coluna d'água.

Em bacias mais desenvolvidas economicamente e com grande concentração populacional, o aporte de fósforo nas águas está mais relacionado com as fontes denominadas artificiais ou antrópicas, que são decorrentes da ação do homem. Nesses locais, apesar de ocorrer a contribuição dos processos naturais, estima-se que as fontes artificiais sejam sensivelmente mais importantes e, dentre elas, destacam-se o escoamento superficial de áreas cultivadas, os efluentes industriais e, principalmente, o lançamento de esgotos domésticos4-7.

Presença de Fósforo nos Esgotos Domésticos

Nos esgotos domésticos, o fósforo aparece na forma de compostos orgânicos, como por exemplo, as proteínas, e em compostos minerais, principalmente polifosfatos e ortofosfatos, que tem origem em produtos sintetizados. Os polifosfatos representam, principalmente, os despejos com detergentes sintéticos.

Os esgotos domésticos possuem concentração de fósforo da ordem de 4 a 50 mg/L, a partir de uma produção diária de 1 a 3 g por pessoa. No Brasil, a contribuição per capita diária de fósforo nos esgotos domésticos é de 0,7 a 2,5 g e a concentração típica desse nutriente situa-se na faixa de 4 a 15 mg/L. Desse total, a fração inorgânica, que pode representada basicamente pela utilização de detergentes, fica compreendida entre 3 a 9 mg/L3,5-8.

Nos detergentes, o fósforo tem a função de builder, ou agente sequestrante, formando complexos estáveis e solúveis com os cátions causadores da dureza na água, como o cálcio e o magnésio. Proporcionam alcalinidade à solução, facilitando a ação do agente tensoativo, auxiliando na limpeza e na formação de espumas. Um detergente em pó de uso comercial típico que utiliza fosfato como builder, contém, em média, 50% do peso do produto em tripolifosfato de sódio (STPP), sendo o restante composto por surfactantes, carga, sais inorgânicos, perfume, branqueador óptico, agentes antideposição e enzimas. De forma geral, nos locais onde há utilização doméstica de detergentes compostos por STPP, considera-se que 50% a 80% do fósforo presente nos esgotos tem essa origem9-11.

As discussões acerca da relação entre o comprometimento da qualidade das águas superficiais, o lançamento de esgotos domésticos e a utilização de detergentes fosfatados tiveram início na década de 1960 e, a partir da década de 1970, diversas localidades da Europa e dos Estados Unidos passaram a restringir o uso de STPP nesses produtos. Posteriormente, já na década de 1990, esses países passaram a adotar critérios para remoção de fósforo em sistemas de tratamento de esgotos, estabelecendo prioridades para direcionamento dos investimentos11.

A Comunidade Europeia, por exemplo, através da Council Directive nº 271, de 21 de maio de 1991, estabeleceu um critério de prazos para adequação ou implantação de sistemas de tratamento dos esgotos sanitários, considerando o porte do município e sua localização em relação às áreas consideradas sensíveis ou suscetíveis à eutrofização. Quando não justificada a instalação de um sistema tratamento mais avançado, através dos denominados processos terciários, seja pela inexistência de motivação ambiental ou pelos altos custos, a Diretiva permite a implantação de sistemas de tratamento em nível secundário. Para municípios de pequeno porte, com menos de 20 mil habitantes, é possível viabilizar sistemas de disposição dos esgotos no solo, garantindo o aumento das taxas de retorno do nutriente ao ciclo, processo denominado por closing the loop12-15.

No Brasil, a questão da limitação da carga de fósforo nos detergentes, data do ano de 1978, quando foi implementada a Resolução Normativa nº 01, do Ministério da Saúde, que estabeleceu o limite de 15% em peso de P2O5 por formulação de detergente. Tal legislação foi revisada em 2005, quando foi editada a Resolução nº 359, de 29/04/2005, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que define a redução progressiva de P2O5, em peso, por formulação, atingindo o limite de 10,99% a partir do ano de 200816,17.

No que se refere à presença de fósforo nos esgotos, a Resolução Conama nº 357, de 29/04/ 2005, prevê limites de concentração de fósforo para o corpo d'água de acordo com a sua classe de enquadramento, sendo que não há legislação específica em relação à concentração desse nutriente nos efluentes domésticos e industriais18.

No entanto, percebe-se, no país, uma tendência de que as discussões evoluam no sentido de que sejam adotados padrões lineares para lançamento de nutrientes nos esgotos. Nesse senti-do, não são levadas em conta as diversidades regionais e os diferentes aspectos ambientais, econômicos e sociais envolvidos, como o potencial de eutrofização do corpo d'água, os seus usos previstos e requeridos, a factibilidade de disponibilização e aplicação dos recursos financeiros necessários e as metas para universalização dos serviços de saneamento.

O alinhamento entre as questões ambientais e de saúde pública da população, item preconizado na Lei 11.445, de 05/01/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, é considerado um fator fundamental, uma vez que o acesso aos serviços de saneamento e a universalização dos níveis de atendimento são considerados itens materiais mínimos necessários à promoção da saúde e à qualidade de vida19,20.

Dinâmica do Fósforo e Saúde Pública

O fósforo não é um elemento tóxico à saúde dos seres vivos, sendo, ao contrário, essencial à manutenção da vida. A presença deletéria do fósforo no meio ambiente está relacionada com o aporte excessivo nas águas. Neste caso, o nutriente pode desencadear processos de eutrofização, ou fertilização, ocasionando, por exemplo, proliferação de algas e de outras plantas aquáticas superiores, as macrófitas. Tal situação pode inviabilizar diversos usos, comprometendo, inclusive, sua utilização para abastecimento público.

De acordo com Tundisi21, o aumento nos níveis de eutrofização pode acarretar a diminuição da quantidade e da qualidade da água e a perda da capacidade de sustentabilidade do sistema, com consequente aumento do nível de toxicidade e deterioração da saúde humana.

Em um ambiente eutrofizado, a floração de cianobactérias é especialmente perigosa, pois diversas espécies liberam toxinas, causando sérios prejuízos às águas utilizadas para abastecimento público. Foi a presença delas que provocou a morte de 40 pacientes de uma clínica de hemodiálise de Caruaru, em Pernambuco, no ano de 199622.

Atualmente, o aumento no ritmo de exploração das fontes de fósforo para utilização em produtos industrializados, além de agravar a situação de eutrofização das águas, tem provocado discussões quanto à escassez do nutriente. Ao longo das últimas décadas, diversas previsões vêm sendo efetuadas a respeito do possível esgotamento das fontes de naturais de fósforo no meio ambiente, num curto a médio espaço de tempo, com reflexos graves à saúde pública, uma vez que o fósforo não pode ser substituído por nenhum outro elemento químico disponível na natureza ou sintetizado pelo homem.

De acordo com Cordell15, no ritmo atual de exploração e a partir do crescimento populacional previsto, calcula-se que as reservas de rocha fosfática conhecidas e exploráveis estejam extintas no período de 50 a 100 anos.

As preocupações quanto à provável escassez das reservas de fósforo no meio ambiente e a inexistência de qualquer outro elemento que o substitua nos processos biológicos e na produção vegetal são abordadas por Malavolta23, da seguinte forma:

O limite de crescimento da humanidade não será ditado pelo esgotamento dos minerais estratégicos ou pelo das reservas de combustíveis fósseis como pretende ou pretendia o Clube de Roma, pois para esses há alternativas técnicas e econômicas.

A humanidade poderá crescer enquanto houver no solo fósforo para ser aproveitado e enquanto o homem puder transferir esse elemento da litosfera para a biosfera servindo como comida insubstituível para as plantas e para os animais, pois o fósforo é vida e sem ele teríamos um planeta silencioso.

Assim, tomam corpo as discussões inerentes ao paradoxo existente entre a essencialidade do nutriente e a sua disponibilidade limitada na natureza. Intensificam-se as discussões relativas aos impactos das atividades do homem sobre o seu ciclo, buscando-se alternativas para melhoria da qualidade das águas e garantia da saúde pública, promovendo-se a sua reciclagem e preservação ambiental, de forma sustentável.

Metodologia

Para desenvolvimento do trabalho, foram inicialmente levantadas informações sobre o elemento químico fósforo, seu ciclo biogeoquímico, comportamento no solo e nas águas, bem como, sobre as atividades antrópicas que contribuem para o seu aporte em rios e reservatórios.

Visando avaliar o impacto dessas atividades sobre a ciclagem do nutriente, oferecendo hipóteses quanto às suas principais fontes nas águas, foi efetuada uma análise da evolução dos dados relativos à concentração populacional, número de industrias e extensão das áreas cultivadas em uma bacia hidrográfica, comparando-os com informações relativas às concentrações de fósforo nos compartimentos água e sedimento.

Para realização dessa análise, efetuou-se um estudo de caso sobre o rio Tietê. Justifica-se a escolha deste devido a alguns fatores que lhe conferem características particulares, como a diversidade de formas de uso e ocupação da bacia, decorrentes da elevada extensão territorial, e os intensos contrastes relacionados com a qualidade das águas. Justifica-se ainda, pela existência de uma sequência de grandes represas ao longo do seu curso, característica que lhe altera o regime hídrico, contribuindo para a redução da velocidade das águas e favorecendo a precipitação do nutriente.

Para tanto, foram levantadas informações sobre as atividades urbana e agrícola desenvolvidas no decorrer de 22 anos, entre 1986 e 2007, nas 6 Unidades de Gerenciamento dos Recursos Hídricos (UGRHI) pertencentes ao rio Tietê: Alto Tietê, Piracicaba/Capivari/Jundiaí, Tietê/Sorocaba, Tietê/Jacaré, Tietê/Batalha e Baixo Tietê.

Em relação à atividade urbana, foram compilados dados sobre a população total e a urbana, por município, disponibilizados pela Fundação Sistema Nacional de Análise de Dados (Seade), através do Sistema de Informações dos Municípios Paulistas (IMP), e informações sobre o número de indústrias, fornecidas pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), a partir do Sistema de Informações sobre Fontes de Poluição (Sipol)24,25.

Para verificação da atividade agrícola, foram utilizadas informações sobre a extensão das áreas cultivadas, obtidas junto à Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), através do Levantamento das Unidades de Produção Agropecuária (Lupa)26,27.

As informações relativas à concentração de fósforo na coluna d'água e sedimento foram fundamentadas a partir de dados secundários oriundos da Rede de Monitoramento da Qualidade das Águas Interiores do Estado de São Paulo, operacionalizada pela Cetesb, registrados e disponibilizados anualmente nos Relatórios de Qualidade das Águas Interiores. Foram analisados 26 pontos de monitoramento localizados no caudal do rio Tietê, ao longo das diferentes UGRHIs, sendo 22 pontos relativos à coluna d'água e 4 ao compartimento sedimento.

No que se refere ao compartimento água, o período de dados estudado é de 22 anos, compreendido entre 1986 e 2007 e, em relação ao sedimento, o estudo é efetuado para os anos de 2004 e 2005, uma vez que a análise do parâmetro fósforo total no sedimento foi efetuada e disponibilizada pela Cetesb somente para esse período28.

Resultados e Discussão

A bacia do rio Tietê possui atualmente mais de 28,7 milhões de habitantes, o que corresponde a 70,6% da população total do Estado de São Paulo. No período de 1986 a 2007, o número de habitantes da bacia foi ampliado em cerca de 8,7 milhões de habitantes, dos quais, mais de 5,3 milhões localizam-se UGRHI Alto Tietê. Em termos percentuais, no entanto, a maior taxa de crescimento médio anual ocorreu nas UGRHIs Piracicaba/Capivari/Jundiaí e Tietê/Sorocaba, com 2,73% e 3,07% ao ano, respectivamente.

No que se refere ao número de indústrias, a bacia do Tietê apresentou um crescimento de 214% entre 1995 e 2008, destacando-se os segmentos produtos de metal, máquinas de escritório e informática, material médico-hospitalar, máquinas e equipamentos, montadora de autos e material eletrônico. O maior crescimento percentual, com uma expansão de 795%, se dá no Tietê/Jacaré, UGRHI classificada na categoria "em industrialização" através da Lei 9.034/94.

Não obstante, no que se refere a valores absolutos, a UGRHI Alto Tietê concentrou a instalação de 34 mil novas unidades no período de 13 anos, o que corresponde a cerca de 56% do crescimento verificado em toda a bacia. Apesar de serem apresentados os dados numéricos, a influência qualitativa da atividade industrial sobre o comportamento do fósforo não foi abordada neste trabalho, uma vez que não se dispõe das vazões e das características dos efluentes, ou seja, das respectivas cargas.

Em relação às áreas agricultáveis, a bacia do Tietê apresentou um crescimento de cerca de 24% no período de 1998 e 2008. No Baixo Tietê, onde se encontra a maior extensão de área cultivada da bacia do Tietê, de mais de 1,5 milhões de ha, podese estimar que quase 92% do território da UGRHI é atualmente ocupado pela atividade agrícola.

Na Figura 1 pode-se observar o comparativo percentual da população total, número de indústrias e extensão das áreas agricultáveis das UGRHIs do Tietê no ano de 2008, comparativamente à somatória total da bacia do Tietê.

Quanto à presença de fósforo na coluna d'água, os pontos de monitoramento localizados na UGRHI Alto Tietê apresentaram uma tendência de aumento nas concentrações do nutriente durante o período de 22 anos, situação que se repete nos pontos situados nas UGRHIs Piracicaba/Capivari/Jundiaí e Tietê/Sorocaba. Na porção média e inferior do Reservatório de Barra Bonita, apesar do comportamento geral de aumento nas concentrações de fósforo, percebese que os valores são mais reduzidos, comparativamente aos pontos situados a montante.

A partir das UGRHIs Tietê/Jacaré e Tietê/Batalha, verifica-se uma tendência de estabilização relativa das concentrações médias do nutriente, com redução na UGRHI Baixo Tietê. A Figura 2, a seguir, apresenta as concentrações de fósforo observadas nas bacias do Tietê através das médias quinquenais relativas ao período compreendido entre os anos de 1986 a 2007.

No que se refere ao compartimento sedimento, apesar da disponibilidade de dados somente para os anos de 2004 e 2005, é possível verificar que o ponto de monitoramento TIPI 04850, localizado na UGRHI Tietê/Sorocaba, na porção inferior do Reservatório de Barra Bonita, tende a apresentar concentrações de fósforo mais elevadas.

Avaliando-se os dados graficamente, é possível verificar que a partir do ponto em que as concentrações de fósforo na UGRHI Tietê/Sorocaba encontram-se mais baixas na coluna d'água, ao longo do percurso do rio, a concentração do nutriente do sedimento está mais elevada. Tal situação, aliada aos dados sobre as concentrações de fósforo na coluna d'água, permite inferir que esse resultado pode ser decorrente das taxas de precipitação do nutriente que é lançado no corpo d'água em elevadas quantidades nos pontos a montante, principalmente na UGRHI Alto Tietê, aliada a alguns fatores como aumento das vazões, diminuição da velocidade das águas e aumento do tempo de detenção. O comportamento da média de fósforo nos anos 2004 e 2005, na coluna d'água e no sedimento, pode ser verificado na Figura 3.

Comparando-se as variáveis população urbana, número de indústrias, e extensão das áreas agricultáveis com os dados relativos à concentração de fósforo na coluna d'água, é possível verificar que os níveis de fósforo tendem a ser mais elevados nas UGRHIs com maior concentração populacional. Tal comparação pode ser visualizada na Figura 4.

Pelos dados apresentados é possível identificar que a concentração média de fósforo nas águas tende a ser maior nas UGRHIs Alto Tietê, Piracicaba/Capivari/Jundiaí e Tietê/Sorocaba, onde houve uma ampliação de 11,3 milhões de habitantes no período de 22 anos. Nesses locais, a concentração média de fósforo nas águas foi alterada de 0,399 mg/L em 1986 para 0,945 mg/L em 2007. Nas UGRHIs Tietê/Jacaré, Tietê/Batalha e Baixo Tietê, que concentram atualmente 71% das áreas cultivadas da bacia, a concentração média de fósforo foi alterada de 0,046 mg/L em 1986 para 0,065 mg/L em 2007. No Baixo Tietê, inclusive, que possui atualmente mais de 1,5 milhões de ha de áreas agricultáveis, a concentração média de fósforo apresentou uma redução de 0,050 mg/ L em 1986 para 0,046 mg/L em 2007.

Efetuando-se uma estimativa das cargas potenciais de fósforo na bacia decorrentes da atividade urbana, a partir dos dados relativos à população urbana, considerando-se uma contribuição per capita de 2,5 g/P/dia, é possível identificar que a contribuição a partir dos esgotos domésticos pode ser estimada atualmente em 68,3 t/dia.

Em relação à atividade agrícola, considerando-se que cada hectare cultivado no Estado de São Paulo, o potencial de perdas de terra seja da ordem de 7,852 t/ha/ano, com concentrações de fósforo de 0,002614%, a carga potencial de fósforo pode ser estimada atualmente em 3 t/dia.

Ainda, considerando-se que da quantidade de fósforo presente nos esgotos domésticos, cerca de 50% (quantidade mínima) a 80% (quantidade máxima) é decorrente da utilização de detergentes em pó que contém STPP, é possível estimar que essa fonte seja responsável pelo aporte de 34,1 a 54,6 t/dia de fósforo nas águas do Tietê. Desse total, de 23,0 a 36,9 t/dia tem origem na UGRHI Alto Tietê, ou seja, cerca de 33,8% a 54,0% do fósforo presente nas águas do Tietê tem origem pela utilização de detergentes fosfatados na UGRHI Alto Tietê.

Caso a totalidade das formulações dos detergentes em pó para uso doméstico comercializados no Brasil esteja obedecendo os limites de STPP propostos pela Resolução Conama nº 359/ 05, atendendo plenamente as expectativas estabelecidas, a redução no aporte de fósforo nas águas do rio Tietê desde o ano de 2008 seria da ordem de 10,2 a 16,4 t/dia, o que é ainda considerada uma redução muito conservadora, uma vez que a quantidade de fósforo lançada nas suas águas através dos esgotos domésticos em decorrência do uso de detergentes poderia ser estimada atualmente, ainda, em 23,9 a 38,2 t/dia.

Na Tabela 1, a seguir, pode-se visualizar um comparativo entre a contribuição potencial total de fósforo na bacia do Tietê, bem como as contribuições estimadas de STPP antes e após a aplicação da Resolução Conama nº 359/05.

Conclusão

A partir dos dados levantados no decorrer do presente trabalho, considerando-se as informações avaliadas no levantamento bibliográfico, bem como os dados obtidos a partir do estudo de caso, pode-se verificar que o impacto da atividade urbana para o aumento da concentração de fósforo nas águas é bastante elevado, comparativamente à atividade agrícola. Pode-se verificar também, a magnitude e a inquestionável contribuição dos detergentes para configuração desse cenário.

O controle do aporte de fósforo nas águas a partir da atuação nas fontes oriundas da atividade urbana, principalmente pela limitação da presença de tripolifosfato de sódio (STPP) nos detergentes, demonstra ser de grande importância para a melhoria da qualidade das águas e para a preservação do ciclo do nutriente. Isto porque, além de auxiliar na redução do aporte do principal nutriente limitante do crescimento biológico em um ambiente aquático, a redução da presença de fósforo nesses produtos pode auxiliar na diminuição das suas taxas de exploração no meio ambiente, contribuindo para sua conservação.

A evolução nas ferramentas de controle do aporte de fósforo nas águas é relevante, também, para a garantia da saúde pública, uma vez que pode contribuir para a redução dos níveis de eutrofização das águas. Nesse sentido, o controle das fontes de fósforo em áreas urbanas demonstra ser uma alternativa mais simples do que a implantação generalizada dos sistemas mais avançados de tratamento dos esgotos domésticos, os denominados sistemas terciários.

O estabelecimento de padrões de qualidade para os corpos receptores é uma ferramenta imprescindível para a manutenção da qualidade dos corpos d'água. Já o estabelecimento de limites de lançamento, de forma linear, considerando-se somente a obrigatoriedade e a abrangência nacional da legislação, pode trazer consequências indesejáveis e onerosas, pois os sistemas terciários de tratamento de esgotos possuem elevados custos de implantação, operação e manutenção, os quais são, muitas vezes, desnecessários para o momento, se consideradas as condições de diluição e uso dos corpos d'água receptores.

Além disso, o estabelecimento de metas graduais e progressivas para melhoria da qualidade das águas, a serem atendidas ao longo do tempo, torna-se fundamental para a viabilização de melhorias nos sistemas de saneamento. Permitese, assim, promover a racionalização na aplicação dos recursos financeiros, de acordo com a realidade sócio-econômica brasileira, alinhando as questões ambientais à necessidade de melhoria das condições da saúde pública da população. Tal prerrogativa, inclusive, encontra-se preconizada na Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico.

Ou seja, a exemplo de outros países, necessita-se de uma evolução nas ferramentas para controle das fontes urbanas de fósforo, fiscalização e acompanhamento das medidas implementadas, a ponto de banir a presença de STPP nos detergentes, para depois serem sugeridas metodologias para implantação de sistemas mais avançados de tratamento de esgotos, de forma gradual e criteriosa.

Em relação à atividade agrícola, não obstante sua contribuição para o aporte de fósforo nas águas seja mais reduzido, comparativamente à atividade urbana, merecem ser planejadas e adotadas ações voltadas para redução dos seus impactos sobre a dinâmica do fósforo no meio ambiente, principalmente no que se refere ao gerenciamento do uso de fertilizantes.

Assim, a questão da dinâmica do fósforo no meio ambiente deve ser entendida e estudada de forma integrada e sistêmica, levando-se em conta não somente as alternativas técnicas para a redução do seu aporte nos rios e reservatórios, como forma de buscar controlar os processos de eutrofização e melhorar a qualidade das águas, mas também as metodologias que busquem a conservação e proteção do meio ambiente e a garantia da saúde pública.

Trata-se, portanto, da efetiva gestão ambiental em prol da qualidade de vida das futuras gerações, visando a preservação de um nutriente que não pode ser substituído nos processos biológicos por nenhum outro elemento naturalmente disponível ou sintetizado pelo homem, e cujas fontes, finitas e não renováveis, encontram-se alarmantemente próximas da exaustão.

Colaboradores

CMG Quevedo e WS Paganini participaram igualmente de todas as etapas de elaboração do artigo.

Referências

1. Branco SM, Rocha AA. Elementos de ciência do ambiente. 2ª ed. São Paulo: Cetesb/ASCetesb; 1987.

2. Derísio JC. Introdução ao controle da poluição ambiental. 2ª ed. São Paulo: Signus Editora; 2000.

3. Braga B, Hespanhol I, Conejo JGL, Barros MTL, Spencer M, Porto M, Nucci N, Juliano N, Eiger S. Introdução à engenharia ambiental. São Paulo: Prentice Hall; 2002.

4. Esteves FA. Fundamentos de limnologia. Rio de Janeiro: FINEP; 1988.

5. Chave PA. Legal and regulatory instruments. In: Helmer R, Hespanhol I, organizadores. Water pollution control: a guide to the use of water quality management principles. London: WHO/UNEP; 1997.

6. Von Sperling M. Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos. 3ª ed. Belo Horizonte: DESA/UFMG; 2005. 1 v.

7. Pivelli RP, Kato MT. Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos. São Paulo: ABES; 2005.

8. Metcalf L, Eddy H P. Wastewater engineering: treatment and reuse. 4th ed. Singapore: McGraw-Hill Inc.; 2003.

9. Devey D G, Harkness N. The significance of man-made sources of phosphorus: detergents and sewage. In: Jenkins SH, Ives K J, organizadores. Phosphorus in fresh water and the marine environment. 2th ed. London: Pergamon Press Officers; 1975. 2 v.

10. Chorus I, Bartran J, organizadores. Toxic cyanobacteria in water: a guide to their public health consequences, monitoring and management. London: WHO/UNEP; 1999.

11. Glennie EB, Littlejohn C, Gendebien A, Hayes A, Palfrey R, Sivil D, Wright K. Phosphates and alternative detergent builders: final report. Wiltshire: EU Environment Directorate; 2002.

12. European Community. Council Directive nº 271, of 21 May 1991. Concerning urban waste water treatment [diretiva na internet]. [acessado 2009 fev 20]. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu.

13. Centre Européen d'Estudes des Polyphosphates (CEEP). [homepage na internet]. Bruxelas; 2009. [acessado 2008 dez 15]. Disponível em: http://http:/ /www.ceep-phosphates.org

14. Lloyd J. The nutrient cycle: closing the loop [documento na internet]. Reino Unido: Green Alliance; 2007. [acessado 2008 dez 15]. Disponível em: http://www.green-alliance.org.uk

15. Cordell D. The story of phosphorous: missing global governance of a critical resource [documento na internet]. Suécia: Global Phosphorus Research Initiative; 2008 [acessado 2008 dez 15]. Disponível em: http://phosphorusfutures.net

16. Brasil. Ministério da Saúde. Instrução Normativa nº 01, de 29 de novembro de 1978. Aprova as nor-mas a serem obedecidas pelos detergentes e seus congêneres [documento na internet]. [acessado 2009 jan 10]. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/ legis/resol/01_78.htm>

17. Brasil. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Ministério do Meio Ambiente. Resolução nº 359, de 29 de abril de 2005. Dispõe sobre a regulamentação do teor de fósforo em detergentes em pó para uso em todo o território nacional e dá outras providências [resolução na internet]. [acessado 2009 jan 10]. Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/ res/res05/res35905.pdf

18. Brasil. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Ministério do Meio Ambiente Resolução nº 357, de 17 de março de 2005. Dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências [documento na internet]. [acessado 2009 jan 10]. Disponível em: http://www.mma. gov.br/port/conama/res /res05/ res35705.pdf>

19. Brasil. Lei nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico e dá outras providências [lei na internet]. [acessado 2008 set 14]. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/ l11445.htm

20. Minayo MCS, Hartz ZMA, Buss PM. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Cienc Saude Colet 2000; 5(1):7-18.

21. Tundisi JG. Água no século XXI: enfrentando a escassez. São Carlos: RiMa/IIE; 2003.

22. Osorio VKL, Oliveira, W. Polifosfatos em detergentes em pó comerciais. Revista eletrônica Química Nova [periódico na internet]. 2001 [acessado 2008 set 8]; 24(5):700-708. Disponível em: http:// scielo.br/pdf/qn/v24n5/a19v24n5.pdf

23. Malavolta E. O fósforo na planta e interações com outros elementos. In: Yamada T, Abdalla SRS, organizadores. Fósforo na agricultura brasileira. Piracicaba: Potafos; 2004.

24. Fundação SEADE. Informações dos Municípios Paulistas [base de dados na internet]. São Paulo: Secretaria de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo. [acessado 2008 dez 8]. Disponível em: http://www.seade.gov.br/ produtos/imp/

25. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). Sistema de Informações sobre Fontes de Poluição. São Paulo; 2009.

26. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI). Levantamento Censitário das Unidades de Produção Agropecuária -Ano 1998. Campinas; 1999.

27. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI). Levantamento Censitário das Unidades de Produção Agropecuária -Ano 2008. Campinas; 2009.

28. Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb). Relatório de Qualidade de Águas Interiores do Estado de São Paulo: relatório técnico. São Paulo; 1986 a 2007. 22 v.

29. Paganini WS. A identidade de um rio de contrastes: o tietê e seus múltiplos usos. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; 2007.

Artigo apresentado em 24/11/2009

Aprovado em 18/12/2009

Versão final apresentada em 06/01/2010

Quais são os efeitos da atividade humana sobre o meio ambiente?

Dentre os principais impactos ambientais negativos causados pelo homem, podemos citar a diminuição dos mananciais, extinção de espécies, inundações, erosões, poluição, mudanças climáticas, destruição da camada de ozônio, chuva ácida, agravamento do efeito estufa e destruição de habitats.

Quais são as principais atividades humanas que causam impactos negativos ao meio ambiente?

Principais tipos de impactos ambientais causados pelo homem.
Atividade industrial. ... .
Descarte irregular de resíduos. ... .
Exploração de recursos naturais. ... .
Urbanização mal planejada. ... .
Atividade mineradora..

Quais são os 3 tipos de causas de impacto ambiental?

Quais são os tipos de impacto ambiental?.
Positivo: quando a ação resulta na melhoria da qualidade de um fator ou parâmetro ambiental;.
Negativo: quando a ação resulta em danos à qualidade de um fator ou parâmetro ambiental;.
Direto: quando resulta de uma simples relação de causa e efeito;.

Como a atividade humana pode interferir positivamente no meio ambiente?

Inúmeras são as consequências advindas da ação do homem, sejam elas no campo da ciência, tecnologia, urbanismo ou na natureza. Ondas de calor intensa, chuvas carregadas, ar seco e chuvas volumosas, podem ser exemplos resultantes da intervenção humana na natureza.