O que o relatório do IPCC é a ONU alertam em relação ao clima da Terra?

O novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), lançado no início desta semana, foi divulgado como um alerta para a humanidade. Com o empenho de centenas de cientistas de todo o mundo, a publicação adverte que a abertura para cumprir as metas do Acordo de Paris está se fechando rapidamente e, com ela, a chance de se evitar uma catástrofe climática.

O Mudança climática 2022: mitigação da mudança climática é o terceiro de três relatórios publicados durante os últimos oito meses. O primeiro analisou a ciência que fundamenta a mudança climática; o segundo examinou os impactos da mudança climática e o relatório desta semana teve como foco a mitigação — ou o que a humanidade pode fazer para deter a mudança climática.

Conversamos com Niklas Hagelberg, especialista em mudanças climáticas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, sobre o relatório, o que este significa para o planeta e a possibilidade de o mundo formar a força política necessária para enfrentar a crise climática.  

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA): Houve alguma coisa que o surpreendeu neste relatório? 

Niklas Hagelberg (NH): Receio que não. Os sinais já estão claros há algum tempo. Não estamos nem perto da tomada de medidas suficientes para limitar o aquecimento às metas do Acordo de Paris. A boa notícia é que ainda é possível fechar a lacuna para produzir resultados tanto em relação às mudanças climáticas quanto aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

PNUMA: Este relatório foi divulgado como um "momento de agora ou nunca" em termos de prevenção contra um desastre climático. Isso é uma avaliação justa? 

NH: De certa forma, sim. Mas eu gostaria de dar uma nuance à expressão "agora ou nunca". A ciência física sobre a mudança climática é nítida e o impacto do aquecimento global já está sendo percebido em todo o mundo. Nossa resposta atual é inadequada se quisermos [limitar o aumento da temperatura global a] 1,5°C e provavelmente até mesmo a 2°C. Mas no caso das mudanças climáticas, cada décimo de grau importa; 1,5°C é melhor do que 1,6°C e 1,6°C é melhor do que 1,7°C. Esta batalha não termina quando - ou se - ultrapassamos 1,5°C. Devemos continuar a descarbonização e remoção de carbono até atingirmos zero emissões líquidas.

PNUMA: Que aspectos positivos podemos extrair deste relatório? 

NH: A ciência é clara. Sabemos o que tem que ser feito e temos opções em todos os setores para reduzir as emissões pelo menos pela metade até 2030. Essas soluções são rentáveis e irão satisfazer a maior parte dos ODS. Ações precoces e em larga escala são extremamente positivas para o desenvolvimento e o bem-estar humano.

O que o relatório do IPCC é a ONU alertam em relação ao clima da Terra?
O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática constata que a porta para evitar o aquecimento potencialmente catastrófico está se fechando. Foto: Imago Images/blickwinkel via Reuters Connect

PNUMA: Esta é a primeira vez que há um capítulo sobre como as mudanças nos hábitos de consumo e escolhas de estilo de vida das pessoas podem combater as mudanças climáticas. Qual é a importância da chamada "mitigação por parte da demanda"? 

NH: Fico satisfeito em ver isso como um foco do relatório. Gosto de acreditar que essa inclusão tem algo a ver com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e nossos esforços para chamar a atenção para os estilos de vida e a distribuição desigual das emissões entre as classes privilegiadas.

Para fechar a lacuna de emissões, precisamos aplicar todas as soluções possíveis, incluindo tanto o consumo quanto a produção sustentável. As pessoas, o setor privado e os governos são todos dependentes uns dos outros. Por exemplo, uma pessoa precisa ter opções de baixo carbono disponíveis a preços justos a fim de optar pelo produto ou serviço mais inteligente do ponto de vista climático. O setor privado precisa da demanda dos consumidores, das políticas e da justa concorrência para oferecer produtos e soluções inteligentes em relação ao clima. E as autoridades formuladoras de políticas e os governos precisam de indicações dos eleitores e do setor privado de que as políticas de descarbonização são desejadas. Precisamos da ajuda de todos e todas.

PNUMA: O relatório menciona que, especialmente no mundo em desenvolvimento, há uma escassez de financiamento destinado a iniciativas relacionadas ao clima.  O que precisa ser feito para fechar essa lacuna de investimento?

NH: O investimento em soluções climáticas não difere de qualquer outro, pois tanto o risco quanto a recompensa serão elementos críticos de qualquer decisão de investimento. É importante que combinemos o financiamento público e multilateral do clima com o investimento privado para garantir que [reduzamos os riscos de investimento]. Isso é particularmente importante nos países em desenvolvimento. Também é importante considerar as fontes de financiamento nacionais, incluindo os orçamentos nacionais e o setor privado, já que o financiamento climático tende a ser investido no país de origem. Para apoiar a ação climática nos países em desenvolvimento, é importante apoiar as pequenas e médias empresas, assim como catalisar o financiamento climático para a infraestrutura em larga escala.

PNUMA: Há um perigo de que talvez seja necessária uma maior dependência de soluções tecnológicas, como para a remoção do dióxido de carbono, em vez somente a redução drástica de emissões? 

NH: Vamos precisar de todas as soluções que vão desde o uso em larga escala de tecnologias novas e já existentes até a ação do consumidor pelo lado da demanda, tais como migrar para a energia elétrica renovável ou ir de bicicleta para o trabalho. A remoção do dióxido de carbono é importante em todos os cenários do IPCC para atingir emissões líquidas zero, e os cientistas acreditam que serão necessárias soluções de remoção — tais como a restauração de ecossistemas e a captura direta do ar — para atingirmos a meta de 1,5 °C.

PNUMA: O relatório destaca os passos que setores como o de energia, agricultura e transporte podem dar para reduzir as emissões. Quais são os setores que mais progrediram a seu ver?  

NH: A média anual de emissões de 2010–2019 cresceu em todos os setores, mas o ritmo de crescimento diminuiu um pouco, particularmente no setor energético, de 2,3% para 1% ao ano, e no setor industrial, de 3,4% para 1,4% ao ano. Esses dois setores contribuem com 58% do total das emissões globais. A rápida redução dos custos de tecnologias de energia renovável e os ganhos em eficiência energética começaram a fazer uma diferença [nas emissões], embora ainda longe do necessário. Todos os setores precisam melhorar drasticamente seus esforços de descarbonização.

PNUMA: Quão importante é a vontade política nisso?

NH: Há alguns exemplos em nossa história nos quais a vontade política foi desenvolvida rapidamente, por exemplo, no início da pandemia da COVID-19 e durante guerras. O número crescente de desastres relacionados ao clima — incêndios, enchentes, tempestades, secas — pode, eventualmente, estimular a vontade política.

Espero que as oportunidades socioeconômicas e as realidades geopolíticas da mudança na participação dos mercados possam ser outro elemento que agilize o processo. Ninguém quer ser deixado para trás quando se trata da criação dos produtos e serviços que resolverão as mudanças climáticas, e a vontade política pode ser desenvolvida rapidamente em torno dessas oportunidades econômicas.

O PNUMA lidera o cumprimento do objetivo do Acordo de Paris de manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2 °C, dando preferência, por segurança, a um limite de 1,5 °C, em comparação aos níveis pré-industriais. Para isso, o PNUMA desenvolveu uma Solução de Seis Setores: um roteiro para reduzir as emissões em todos os setores, em conformidade com os compromissos do Acordo de Paris e na busca pela estabilidade climática. Os seis setores identificados são: energia; indústria; agricultura e alimentos; florestas e uso da terra; transporte; e edifícios e cidades.

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas foi estabelecido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e pela Organização Meteorológica Mundial em 1988 para fornecer ao mundo uma revisão científica clara do estado atual do conhecimento sobre as mudanças climáticas. Seus relatórios têm moldado os debates sobre o tema por mais de três décadas e fornecido a ciência que os governos utilizam para formular suas próprias políticas climáticas.

O que significa o alarmante relatório da ONU sobre o clima?

O documento, que tem foco na mitigação das mudanças climáticas, indica que as emissões nocivas de carbono de 2010-2019 foram as mais altas na história da humanidade. Para o secretário-geral da ONU, António Guterres, esta é prova de que o mundo está em um “caminho rápido” para o desastre.

O que significa IPCC e ONU?

Essas quatro letras, IPCC, correspondem às iniciais de Intergovernmental Panel on Climate Change, que quer dizer Painel Intergovernamental para a Mudança de Clima. Esse é o nome de uma entidade criada em 1988, pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).

O que a ONU diz sobre as mudanças climáticas?

2022). A pesquisa patrocinada pela ONU (Organização das Nações Unidas) aponta que as mudanças climáticas colocam quase metade da população mundial em risco. Leia a íntegra do relatório aqui. O documento fala que as mudanças climáticas são mais rápidas do que a adaptação humana.

O que o novo relatório global IPCC apontou sobre o clima do planeta?

O levantamento de mais de 18 mil publicações científicas concluiu que, com as políticas climáticas firmadas até 2020 pelos governos, o planeta atingiria um aquecimento de 3,2ºC, mais que o dobro do limite acordado de 1,5ºC até o final do século, para evitar uma catástrofe irreversível.