Identifique a revolução copernicana operada por kant em sua crítica da razão pura

Até hoje admitia-se que nosso conhecimento se devia regular pelos objetos; porém, todas as tentativas para descobrir, mediante conceitos, algo que ampliasse nosso conhecimento malogravam-se com esse pressuposto. Tentemos, pois, uma vez, experimentar se não se resolverão melhor as tarefas da metafísica, admitindo que os objetos se deveriam regular pelo nosso conhecimento.

KANT, I. Crítica da razão pura. Lisboa: Calouste-Guibenkian, 1994 (adaptado).

No livro Crítica da Razão Pura, o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), faz uma crítica à real natureza do conhecimento. Acreditava que em uma primazia das ideias sobre os objetos para a produção do conhecimento, como é demonstrado no texto.

A Revolução Copernicana na filosofia de Kant: breves considerações a partir do prefácio da segunda edição da Crítica da Razão Pura


Resumo

A obra de Kant é considerada um marco, ou divisor de águas, para a filosofia moderna. No prefácio da segunda edição da Crítica da Razão Pura, Kant busca, nos moldes da revolução proposta por Copérnico na astronomia, estabelecer uma revolução completa no pensamento filosófico, de modo a encontrar um caminho seguro para a metafísica, fazendo com que, em seus termos, ela não mais fique no mero tateio. O termo Revolução Copernicana diz respeito a uma analogia que Kant faz com a proposta de Copérnico, na passagem do antropocentrismo para o heliocentrismo, em que o mesmo poderia ser aplicado na metafísica, deslocando o sujeito da periferia do conhecimento para colocá-lo no centro. Trata-se, portanto, de uma proposta de inversão da metodologia predominante até o período a qual Kant está inserido, em que não mais o sujeito se regulará pela natureza do objeto, mas este que irá regular-se pela natureza do sujeito do conhecimento. O presente trabalho tem por finalidade apresentar, ainda que minimamente, uma breve introdução à essa inversão metodológica proposta por Kant, mesmo sem qualquer pretensão de aprofundamento ou esgotamento da discussão.


Palavras-chave

Kant; Revolução Copernicana; inversão metodológica; metafísica.


Referências


ALLISON, Henry E. Kant’s transcendental idealism: and interpretation and defense. – Rev. and enl. ed. p. cm. – New Haven and London: Yale University Press, 2004.

BIRD, Graham. The revolutionary Kant: a commentary on the Critique of pure reason. 1. ed. p. cm. – Chicago and La Salle, Illinois: Open Court, 2006.

DELEUZE, Gilles. A filosofia crítica de Kant. Tradução de Germiniano Franco. – Lisboa: Edições 70, 2000.

GUYER, Paul. Kant. p. cm. (Routledge philosophers). 1. ed. – New York: Routledge, 2006.

HOFFE, Otfried. Immanuel Kant. Tradução de Christian Viktor Hamm, Valerio Rohden. – São Paulo: Martins Fontes, 2005.

KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Tradução de Manuela Pinto Dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. Introdução e notas de Alexandre Fradique Morujão. 5ª ed. Coimbra: Fundação Calouste, 2001.

PASCAL, Georges. O pensamento de Kant. Introdução e tradução de Raimundo Vier. 8ª edição. – Petrópolis: Editora Vozes, 2003.


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Identifique a revolução copernicana operada por kant em sua crítica da razão pura

  • Kant - teoria do conhecimento

Na Crítica da Razão Pura, o filósofo alemão

Immanuel Kant

(1724-1804) tinha um problema a resolver, que dizia respeito à seguinte questão: como posso obter um conhecimento seguro e verdadeiro sobre as coisas do mundo? A resposta de Kant iria mudar o rumo da Filosofia Ocidental.

Duas escolas filosóficas, tradicionalmente, respondiam de formas diversas ao problema do conhecimento. Para os filósofos racionalistas (

Platão

,

Descartes

, Leibniz e

Espinosa

), todo conhecimento provém da razão, enquanto que, para os empiristas (

Aristóteles

,

Hobbes

,

Locke

, Berkeley e

Hume

), ao contrário, somente os dados da experiência sensível forneceriam as bases para o conhecimento humano.

Tanto em um como em outro caso, surgem obstáculos. A razão especulativa, na medida em que deixa de validar suas investigações em testes práticos, torna-se dogmática. Já o empirismo encontra oposição no ceticismo, que argumenta que a Natureza é o reino do contingente e, por esta razão, não pode ser fonte de conhecimento universal.

O filósofo inglês David Hume (1711-1776), cuja obra Kant afirma tê-lo acordado do "sono dogmático", colocou sob suspeita o princípio de causalidade, que determina que, dado uma causa x, tem-se um efeito y. Por exemplo, tenho uma pedra em minha mão e a solto de certa altura (causa), tendo como consequência sua queda no chão (efeito).

Segundo Hume, não existe nada na causa (solto a pedra da mão) que contenha a relação objetiva de seu efeito (a queda no solo). Por mais vezes que eu repita a experiência, nada no mundo me dará a certeza de que a pedra cairá e não levitará, por exemplo. Portanto, conclui o filósofo inglês, a causalidade não está no mundo, mas é produto de nossos hábitos, ou seja, de tantas vezes ver a pedra cair ao ser solta, acreditamos que haja uma relação causal nos objetos, quando não passa de uma espécie de condicionamento psicológico.

A priori, a posteriori, juízo analítico e juízo sintético

Kant também vai se voltar para o sujeito em sua réplica ao ceticismo humeano, mas revestido de um caráter lógico e transcendental (e não psicológico, como em Hume). Antes de analisar a resposta de Kant, vamos ver como ele a formula a questão nos conceitos de a priori, a posteriori, analítico e sintético.

Um conhecimento que seja totalmente independente dos sentidos é chamado a priori. São, por exemplo, equações matemáticas, que posso fazer mentalmente sem me apoiar em qualquer evidência material. Um conhecimento que possui sua fonte na experiência é dado a posteriori, como as leis da física clássica, que necessitam de testes práticos para serem comprovadas.

Quando emito um juízo em que o predicado está contido no sujeito, ele é chamado juízo analítico. Por exemplo, quando digo "Azul é uma cor", o predicado "cor" já é uma qualidade do sujeito "azul" e a informação, por isso, é redundante. Mas quando faço um juízo em que um predicado é acrescentado ao sujeito, ele é chamado sintético. Por exemplo, na frase "A cadeira de minha sala é azul", acrescento ao sujeito "cadeira de minha sala" o predicado "azul" (afinal, ela poderia ser verde, vermelha, etc.). É uma informação nova, pois você poderia imaginar que a cadeira fosse de qualquer outra cor.

Todos os juízos da experiência são sintéticos, uma vez que, para obter um juízo analítico, não é preciso sair do próprio conceito, isto é, recorrer à experiência (não preciso sair de "azul" para saber que é uma cor, mas preciso ver a "cadeira" para saber de que cor ela é).

Agora podemos entender a questão central da Crítica da Razão Pura, que é "Como são possíveis os juízos sintéticos a priori?". Ou seja, como podemos ter um conhecimento a priori de questões de fato, de coisas do mundo? Em outros termos, como posso, observando um fato A, dizer algo a respeito de um fato B, uma vez que somente tenho a experiência deste fato A? Para voltar ao exemplo de Hume, como, tendo uma pedra em minha mão (fato A), antes mesmo de soltá-la sei que, ao soltá-la, ela irá cair no solo (fato B)? (Lembrando que, para Hume, não há na Natureza nada que demonstre a relação causal entre A e B.)

Formulado ainda de outra maneira: como posso, ao observar fatos particulares (uma pedra que cai), tirar daí uma regra de caráter universal (a lei da gravidade), que seja aplicada a todos outros fatos da mesma natureza?

Sujeito transcendental

Kant chamou de "revolução copernicana" sua resposta ao problema do conhecimento. O astrônomo

Nicolau Copérnico

(1473-1543) formulou a teoria heliocêntrica - a teoria de que os planetas giravam em torno do Sol - para substituir o modelo antigo, de Aristóteles e Ptolomeu, em que a Terra ocupava o centro do universo, o que era mais coerente com os dogmas da Igreja Católica.

Como pode ser constatado pela observação direta, o Sol se "levanta" e se "põe" todos os dias, o que tornava óbvio, aos antigos, que a Terra estava fixa e que os astros giravam em torno dela. Copérnico demonstrou que este movimento é ilusório, porque, na verdade, a Terra é que gira em torno do Sol.

Kant propôs inversão semelhante em filosofia. Até então, as teorias consistiam em adequar a razão humana aos objetos, que eram, por assim dizer, o "centro de gravidade" do conhecimento. Kant propôs o contrário: os objetos, a partir daí, teriam que se regular pelo sujeito, que seria o depositário das formas do conhecimento. As leis não estariam nas coisas do mundo, mas no próprio homem; seriam faculdades espontâneas de sua natureza transcendental. Como Kant afirma no prefácio da segunda edição da Crítica da Razão Pura:

"Até agora se supôs que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos; porém todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os mesmos, através do que ampliaria o nosso conhecimento, fracassaram sob esta pressuposição. Por isso tente-se ver uma vez se não progredimos melhor nas tarefas da Metafísica admitindo que os objetos têm que se regular pelo nosso conhecimento, o que concorda melhor com a requerida possibilidade de um conhecimento a priori dos objetos que deve estabelecer algo sobre os mesmos antes de nos serem dados."

O que Kant quer dizer é que o sujeito possui as condições de possibilidade de conhecer qualquer coisa. Ele possui as regras pela quais os objetos podem ser reconhecidos. Não adianta buscar essas regras no mundo exterior, pois se cairia no problema de Hume. O mundo não tem sentido a não ser que o homem dê algum sentido a ele. O que conhecemos, então, é profundamente marcado pela maneira - humana - pela qual conhecemos.

O computador no qual escrevo, a janela do escritório que me permite ver todas as coisas do mundo, tudo isso é matéria de conhecimento não porque exista um Deus que me faculte entender as leis dos objetos por meio da razão (como no caso de filósofos racionalistas) ou porque estes objetos sejam imprimidos em minha mente pela percepção (empirismo), mas porque eles são capturados por formas lógicas no sujeito.

Coisa-em-si

Mas ao voltar o foco para o sujeito que conhece, que "constrói" o mundo, é bloqueado todo pretenso acesso à essência dos objetos do mundo. Só temos acesso às coisas enquanto fenômenos para uma consciência. O que a realidade é, em si mesma, o que Kant chama de coisa-em-si, não é matéria de conhecimento humano, sendo, portanto, incognoscível (aquilo que não pode ser conhecido).

A coisa-em-si não pode ser conhecida mas pode ser pensada, desde que seja contraditório (conhecer, em Kant, diz respeito ao que é possível de ser objeto da experiência).

Três objetos de estudo da metafísica podem ser pensados mas não conhecidos: Deus, a imortalidade da alma e a liberdade. Deus e a alma não podem ser conhecidos porque não aparecem como fenômenos no espaço e no tempo. A liberdade, porque contraria o princípio de causalidade: liberdade é aquilo que não tem causa, e o que é absolutamente livre não pode ser matéria de conhecimento. São, no entanto, postulados para a ética de Kant, da qual não trataremos neste artigo.

A filosofia crítica de Kant consiste, desta forma, em impor à razão os limites da experiência possível. O filósofo alemão pretende, com isso, fornecer rigor metodológico à metafísica, livrando-a de seu caráter dogmático e trazendo-a para o rumo seguro da ciência. Este método que analisa as possibilidades do conhecimento a priori do sujeito, dentro dos limites da experiência, é chamado de transcendental.

Sugestões de leitura

A Crítica da Razão Pura foi traduzida para o português e publicada pela Editora Abril, na coleção "Os Pensadores", e pela editora portuguesa Calouste Gulbenkian. Ambas são recomendadas. É de grande ajuda, para o domínio do vocabulário kantiano, o Dicionário Kant (Jorge Zahar Editor), de Howard Caygill. Também da Jorge Zahar, o livro Kant & A Crítica da Razão Pura, de Vinicius Figueiredo, propõe introduzir o leitor nessa obra densa e de difícil leitura.

Qual foi a Revolução Copernicana operada por Kant?

A revolução copernicana de Kant significa que os objetos do conhecimento não aparecem por si mesmos, eles devem ser trazidos à luz pelo sujeito (transcendental). Por isso eles não podem mais ser considerados como coisas que existem em si, mas como fenômenos.

Como Kant fez uso da Revolução Copernicana?

O termo Revolução Copernicana diz respeito a uma analogia que Kant faz com a proposta de Copérnico, na passagem do antropocentrismo para o heliocentrismo, em que o mesmo poderia ser aplicado na metafísica, deslocando o sujeito da periferia do conhecimento para colocá-lo no centro.

Por que Kant é tido como um pensador que fez uma Revolução Copernicana na teoria do conhecimento?

A entrada como professor catedrático também impulsionou os trabalhos filosóficos de Kant, que se ocupou de suas principais obras, as quais promoveriam o que ele chamou de “revolução copernicana da Filosofia”, devido à sua inclinação para o criticismo, que resolveria os impasses de filósofos e correntes filosóficas ...

O que Kant apresenta enquanto revolução filosófica?

Kant propôs inversão semelhante em filosofia. Até então, as teorias consistiam em adequar a razão humana aos objetos, que eram, por assim dizer, o "centro de gravidade" do conhecimento.