Em que consiste a dúvida metódica de Descartes qual era seu objetivo?

08/06/2020 03:26

A dúvida metódica de Descartes: um caminho provisório e necessário para chegar ao cogito

Com o objetivo de chegar a uma verdade que fosse plenamente inquestionável, genuina, René Descartes estabeleceu seu método denominado de Dúvida Métodica. Para Descartes a dúvida era uma importante ferrramenta, pois ela nos permite movimentar o nosso intelecto na direção da busca pelo conhecimento. A dúvida nos tira das certezas inocentes que já foram alvo de inúmeros erros ao logo da história Humana.

Descartes observa que os sentidos são enganosos e podem nos levar ao erro. Ele exemplifica mostrando que ao ver um galho de árvore na água pode parecer que está torto e, no entanto, ao retirá-lo da água percebe-se que ele é reto e, também outro exemplo, com “torres que à distância parecem redondas, de perto afiguram-se quadradas” (COTTINGHAM, 1995, p. 79). Assim, Descartes afirma que não se deve confiar nos sentidos: “(…) experimentei algumas vezes que esses sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez” (DESCARTES, 1979, p. 86).

Outro aspecto que Descartes coloca em dúvida, apresentando-o como enganoso, é a nossa ideia de realidade, pois ela pode se misturar com as ilusões dos nossos sonhos. Pois, muitas vezes, ele teve sonhos que lhe pareciam bem reais, e que não lhe pareciam ser sonhos de fato, tendo assim a sensação de estar vivendo algo real. Uma pessoa pode estar sonhando que está lendo este artigo. Pode ser que tudo seja fruto da imaginação, ou seja, da capacidade de visualizar na mente, e não dos olhos, um objeto. Porém, assim como uma pintura e/ou uma foto é uma cópia de algo real, o sonho também é uma cópia da realidade. Como escreve Descartes: “(…) é preciso ao menos confessar que as coisas que nos são representadas durante o sono são como quadros e pinturas que não podem ser formados senão à semelhança de algo real e verdadeiro” (DESCARTES, 1979, p. 86). Com isso, não se pode confiar nos sentidos e nem na imaginação.

Descates destaca ainda as imprecisões dos nossos raciocínios:

"E por existirem homens que se enganam ao raciocinar, mesmo no que se refere às mais simples noções de geometria, e cometem paralogismos, rejeitei como falsas, achando que estava sujeito a me enganar como qualquer outro, todas as razões que eu tomara, até então, por demonstrações". Ele se questiona se Deus seria um tipo de um gênio maligno que sente prazer em induzi-lo ao erro, enganando-o inclusive nas certezas matemáticas.

(…) como julgo que algumas vezes os outros se enganam até nas coisas que eles acreditam saber com maior clareza, pode ocorrer que Deus tenha desejado que eu me engane todas as vezes em que faço a adição de dois mais três, ou em que enumero os lados de um quadrado, ou em que julgo alguma coisa ainda mais fácil, se é que pode imaginar algo mais fácil que isto. (DESCARTES, 1979, p. 87)

Com isso, Descartes duvidou dos sentidos, duvidou da ideia de realidade e até mesmo do entendimento da nossa razão, chegando, portanto, a uma dúvida hiperbólica.

Neste ponto, Descartes busca alguma certeza, apoiando-se no ponto de Arquimedes, sobre o qual poder-se-á encontrar uma coisa que seja certa e indubitável e levantará edifícios para outras certezas. Continuando com o mesmo princípio de afastar tudo que for duvidoso de seu caminho, sua primeira atitude é supor que todas as coisas são falsas: “(…) persuadindo-me de que jamais existiu de tudo quanto minha memória repleta de mentiras me apresenta; penso não possuir nenhum sentido; creio que o corpo, a figura, a extensão, o movimento e o lugar são apenas ficções de meu espírito” (DESCARTES, 1979, p. 91). Neste instante, ele observa que todas as coisas não são tão confiáveis, uma vez que pode haver um gênio maligno, como foi apresentado anteriormente, que coloca tais crenças em seus pensamentos. Diante disto, ele chega a uma certeza de que se ele é enganado, então ele existe.

Mas há algum, não sei qual, enganador mui poderoso e mui ardiloso que emprega toda a sua indústria em enganar-me sempre. Não há, pois, dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e, por mais que me engane, não poderá jamais fazer com que eu nada seja, enquanto eu pensar ser alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a conceba em meu espírito. (DESCARTES, 1979, p. 92)

 Logo em seguida, porém, percebi que, ao mesmo tempo que eu queria pensar que tudo era falso, fazia-se necessário que eu, que pensava, fosse alguma coisa. E, ao notar que esta verdade: eu penso, logo existo, era tão sólida e tão correta que as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de lhe causar abalo, julguei que podia considerá-la, sem escrúpulo algum, o primeiro princípio da filosofia que eu procurava

Diante das incertezas dos nossos cinco sentidos, da ideia de realidade e dos raciocínios, Descartes concluiu:

"Logo em seguida, porém, percebi que, ao mesmo tempo que eu queria pensar que tudo era falso, fazia-se necessário que eu, que pensava, fosse alguma coisa. E, ao notar que esta verdade: eu penso, logo existo, era tão sólida e tão correta que as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de lhe causar abalo, julguei que podia considerá-la, sem escrúpulo algum, o primeiro princípio da filosofia que eu procurava".

A importância do Pensamento para a construção do sujeito ético

Se observarmos as ideias de Descartes perceberemos que a nossa existência somente é percebida a partir da nossa capacidade de pensar. Desse modo, a construção daquilo que somos deve ser feita a partir da nossa capacidade autônoma de pensar. Se eu penso, logo, existo, então, não posso ser conduzido por pensamentos alheios a ser algo ou alguém, pois isto me reduziria à condição de um ser não pensante, que como coisa pode ser manipulado.

Referências

COTTINGHAM, John. Dicionário Descartes. Tradução de Helena Martins. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.

DESCARTES, René. Meditações. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979. (Os Pensadores).

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: do humanismo a Descartes. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2004. v. 3.

Responda:

  1. Se queremos chegar à verdade das coisas, o que devemos fazer segundo René Descartes?
  2. Quais são os elementos apontados por Descates como fonte de conhecimento inseguro? Explique-os.
  3. Qual a conclusão de Descartes sobre seus questionamentos obtidos a partir da dúvida.
  4. Explique a frase: “o pensamento autônomo é o ponto de partida para a construção do sujeito ético.

Atividade:

2ºA Atividade dissertativa

2ºB Atividade dissertativa

2ºC Atividade dissertativa

2ºD Atividade dissertativa

Qual é o objetivo da dúvida metódica de Descartes?

Dúvida metódica de Descartes foi utilizada para provar a existência de verdades absolutas que são de conhecimento universal, para o filósofo essa dúvida não possui falhas e sim respostas bastante exatas que não geram possibilidades de dúvida.

Em que consistiu a dúvida metódica de?

A dúvida metódica de Descartes é uma dúvida sem nenhum erro, sem nenhuma falha, ou seja, é uma dúvida com exatidão, sem nenhuma possibilidade de ser contraposta ou algo do tipo. Por exemplo, Descartes atribuía grande valor à matemática como instrumento de compreensão da realidade.

Em que consiste a dúvida metódica de Descartes e como ele chegou ao cogito?

O “cogito” (penso) é uma relação do eu consigo mesmo, um princípio que tem como ponto de partida problematizar qualquer outra realidade e que ao mesmo tempo permite justificá-la. É este o princípio inabalável de Descartes, sobre o qual não se pode duvidar mais.