E lá vamos nós falar mais um pouco de enxaqueca, a principal causa de dor de cabeça no PS. Porém, o foco desse artigo é de um sintoma diferente que acomete alguns pacientes com enxaqueca (afinal, enxaqueca não se resume apenas a cefaleia, como já mencionamos nos nossos artigos sobre cefaleias na emergência e tratamento de crise aguda de enxaqueca). Esse sintoma é a vertigem, e são atribuídos à famosa enxaqueca vestibular.
Alguns pacientes com enxaqueca apresentam episódios de vertigem ou outros sintomas decorrentes de disfunção do sistema vestibular. A enxaqueca vestibular é uma condição comum, que acomete cerca de 1% da população mundial. Bora lá?
Fisiopatologia da vertigem na enxaqueca
A relação entre vertigem e enxaqueca é conhecida há muito tempo. Porém, até hoje a fisiopatologia de vertigem na enxaqueca e seu diagnóstico são debate com muito controvérsia. Nesse artigo tentamos resumir para você os principais pontos dessa condição: quando suspeitar e quando tratar.
Sintomas
Nos adultos, geralmente o início da enxaqueca vestibular acomete pacientes com longa história prévia de enxaqueca. Os principais sinais e sintomas são os seguintes:
- Episódios de vertigem de instalação aguda, durando vários minutos a várias horas, pelo menos moderados, espontâneos, mas que pioram com a movimentação da cabeça (intolerância aos movimentos cefálicos) e com algumas mudanças posicionais.
- Grande parte dos episódios de vertigem estão associados a sintomas de enxaqueca: cefaleia, fotofobia, fonofobia e/ou aura visual. Ou seja, NÃO é necessário que o paciente esteja com cefaleia da crise de enxaqueca para ter o diagnóstico de enxaqueca vestibular à 30% das crises de enxaqueca vestibular NÃO são acompanhadas por cefaleia!
- Um dado da história desses pacientes que pode ajudar é a presença de cinetose, condição mais comum em pessoas com enxaqueca, especialmente do subtipo vestibular.
- Ao exame neurológico, você pode notar a presença de nistagmo. Vários tipos de nistagmo podem estar presentes — ou seja, não é um dado que ajuda no diagnóstico. Mas não se esqueça: você deve fazer um exame neurológico completo para excluir diagnósticos diferenciais à busque esses diagnósticos, pois enxaqueca vestibular é diagnóstico de exclusão!
O critério diagnóstico para enxaqueca vestibular é:
- história atual ou prévia de enxaqueca (com ou sem aura);
- pelo menos 5 episódios preenchendo os seguintes critérios:
- sintomas vestibulares moderados a graves, durante de 5 minutos a 72 horas; e
- pelo menos 50% dos episódios associados a um dos seguintes:
- cefaleia com pelo menos dois dos seguintes: unilateral, pulsátil, moderada a forte intensidade, piora com atividade física rotineira);
- foto e fonofobia;
- aura visual;
- ausência de melhor explicação para os sintomas.
O grande “tendão de Aquiles” desse diagnóstico é o último item — a ausência de melhor explicação. Ora, há diversas causas de vertigem e, caso suspeite de alguma delas, especialmente num primeiro episódio vertiginoso, você deve investigar adequadamente. Os principais diagnósticos diferenciais são vertigem posicional paroxística benigna (VPPB), doença de Meniere (audiometria pode ajudar) e causas vasculares ou estruturais (merecendo então estudo com RM e AngioRM para investigação, especialmente em idosos ou pacientes com fatores de risco cardiovasculares).
Já que um critério imprescindível para o diagnóstico de enxaqueca vestibular é o diagnóstico prévio de enxaqueca, seguem os seus critérios para relembrar:
- pelo menos 5 crises com as seguintes características:
- duração de 4 a 72h (não-tratada ou tratada sem sucesso)
- com 2 das características a seguir:
- unilateral (hemicraniana);
- pulsátil;
- moderada a intensa (limita as atividades rotineiras);
- agravada por esforço físico habitual (como subir escadas);
- pelo menos 1 dos seguintes:
- náuseas E/OU vômito;
- fotofobia E fonofobia;
- ausência de outra melhor explicação para a cefaleia.
Agora que você sabe identificar pacientes com enxaqueca vestibular, vamos discutir sobre manejo desses pacientes. Dividimos as condutas entre tratamento das crises e tratamento preventivo.
Tratamento das crises de enxaqueca vestibular
O foco aqui é aliviar os sintomas vertiginosos. A escolha são os supressores do aparelho vestibular. Há diversas opções, tanto por via oral ou via parenteral. Segue uma tabela com as principais medicações e doses que podem ser utilizados.
Medicamento | Dosagem |
Administrados oralmente: | |
Anti-histamínicos de primeira geração | |
Dimenidrinato | 50–100 mg a cada 4–6 horas |
Difenidramina | 25–50 mg a cada 4–6 horas |
Meclizina | 25–50 mg a cada 6–12 horas |
Benzodiazepínicos | |
Alprazolam | 0,5 mg lançamento imediato a cada 8 horas |
Clonazepam | 0,25–0,5 mg a cada 8–12 horas |
Diazepam | 1 mg a cada 12 horas |
Lorazepam | 1–2 mg a cada 8 horas |
Antieméticos | |
Domperidona | 10 mg a cada 8 horas |
Metoclopramida | 5–10 mg a cada 6 horas |
Ondansetrona | 4 mg a cada 8–12 horas |
Proclorperazina | 5–10 mg a cada 6 horas |
Prometazina | 12,5–25 mg a cada 4–6 horas |
Administrados por via parenteral para uso em enfermaria de emergência aguda: | |
Anti-histamínicos de primeira geração | |
Difenidramina | 10–50 mg IV |
Dimenidrinato | 50 mg IV |
Antieméticos | |
Metoclopramida | 10 mg IV |
Ondansetrona | 4–8 mg IV |
Caso a vertigem seja acompanhada ou preceda (como uma aura) os episódios de cefaleia, o uso de triptanos (sumatriptano, rizatriptano, etc) também é uma opção.
Tratamento preventivo
Este consiste em linhas de tratamento não-farmacológicas e farmacológicas.
Tratamento não-farmacológico:
- Atividade física regular
- Higiene do sono
- Evitar desencadeantes (jejum prolongado, privação de sono, tabagismo, etilismo), se presentes
- Fisioterapia vestibular
Tratamento farmacológico profilático:
- A escolha da medicação deve ser individualizada
- A maioria das medicações utilizadas em enxaqueca vestibular não tem grande evidência de benefício, já que há poucos estudos sobre elas. Sendo assim, as principais terapias farmacológicas são extrapoladas da cefaleia da enxaqueca. Segue uma tabela com os mais utilizados e suas doses:
Classe | Medicamento | Dosagem (oral) |
Betabloqueadores | Metoprolol | 150 mg; 100–200 mg |
Propranolol | 160 mg; 40–160 mg; 40–160 mg | |
Agentes antiepiléticos | Ácido valproico | 600 mg; 600 mg |
Topiramato | 50 mg; 50–100 mg | |
Lamotrigina | 75mg; 100 mg | |
Antidepressivos | Amitriptilina | 100 mg; 10 mg |
Nortriptilina | 25–75 mg | |
Venlafaxina | 37,5–150 mg | |
Bloqueadores do canal de cálcio | Flunarizina | 5 mg; 5–10 mg; 5–10 mg |
Cinarizina | 37,5–75 mg | |
Outros | Magnésio | 400 mg |
Enfim, por hoje é isso!
Espero que tenhamos esclarecido tudo que você precisa saber sobre enxaqueca vestibular, uma condição ainda pouco estudada. Quer saber mais sobre enxaqueca? Clica nos links abaixo.
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