14/05/21 - 14:38min Novas pesquisas decifram as transformações cerebrais que acontecem na adolescência, explicam comportamentos típicos e sugerem como lidar com eles
Página inicialSociologiaBreve história da adolescência
Para compreender a adolescência e o adolescente em seus distintos modos de ser, de se portar e de se relacionar com os outros, é necessário olhar por uma perspectiva mais ampla, consideirando não apenas suas transformações biológicas, mas também seu contexto histórico, social, econômico e cultural no qual ele está inserido. Veremos brevemente algumas das transformações históricas da adolescência. Diferente da puberdade, que corresponde a uma maturação biológica ao qual todas as pessoas estão submetidas, a adolescência é um fenômeno que se altera de acordo com o momento histórico e o espaço onde se vivencia a adolescência, relaconando com a cultura, com os saberes, com a arte, com a arquitetura, com o direito, com a medicina, entre outros valores de um tempo e região.
A palavra adolescência vem do latim adolescere, que significa crescer. Porém, este termo só passou a ser utilizado enquanto estágio do desenvolviemnto humano em 1904, pelo psicólogo estadounidense Stanley Hall (1846-1924). Nos séculos XIX e XX, diversos acontecimentos sociais, culturais e políticos possibilitaram o estabelecimento da adolescência como período distinto do desenvolvimento humano. Até o século XVIII, a adolescência era confundida com a infância. A puberdade não era tida como uma característica de entrada na adolescẽncia. Nas escolas jesuítas, os garotos de 13 a 15 anos eram chamados de crianças ou adolescentes. A diferença entre a infância e a adolescência tinha mais relação com a dependência ou independência do indivíduo, do que com a puberdade. Na Grécia Antiga, os jovens eram submetidos a um adestramento, cujo intuito era promover as virtudes cívicas e militares. Com 16 anos, eles podiam falar nas assembleias, e passavam a ser inscritos nos registros públicos da cidade aos 18 anos, marcando a maioridade civil. Neste período, a puberdade era uma fase de preparação para os afazeres da vida adulta, tanto as crianças quanto os jovens praticavam ginástica para o desenvolvimento físico e moral. As moças faziam exercícios esportivos para se tornarem boas mães de família, casando-se entre os 15 ou 16 anos. Os moços eram preparados para atividades como a guerra ou a política, alguns deles se dedicavam à filosofia, em especial aqueles de famílias mais abastadas. No início do Império Romano, a educação dos mais jovens ficavam a cargo dos pais, sendo esta de caráter bastante prático, com o intuito de formar um agricultor, cidadão ou guerreiro. Depois do século II a.C., as famílias mais abastadas passaram a hospedar em suas casas um mestre grego para educar seus filhos, já aqueles que não tinham a mesma possibilidade enviavam seus filhos para as escolas. Aos 12 anos, os meninos romanos da elite deixavam o ensino elementar para estudar autores clássicos e a mitologia, com o objetivo de adornar o espírito. Aos 14 anos, abandonavam as roupas infantis, alguns deles viajavam à Grécia para complementar seus estudos. Aos 16 ou 17 anos podiam escolher pela carreira pública ou entrar para o exército. Na Idade Média, o indivíduo vivia em comunidades feudais, as quais se constituíam como um ambiente bastante familiar, onde todos se conheciam. Os papéis de gênero e de profissão eram transmitidos pela comunidade. As crianças e adolescentes eram considerados adultos em miniatura, necessitando apenas de crescer nos aspectos físicos e mentais. Conforme a criança crescia, passava a aprender as tarefas e crenças dos adultos. Os jovens adquiriam um trabalho por meio das Corporações de Ofício, onde começavam como aprendizes e não recebiam salário, geralmente morando com o mestre. Quando terminavam o período de aprendizagem, passavam a receber um valor por seus trabalhos. Entre os nobres, os mais jovens passavam por um treinamento intenso, durante vários anos, para se tornarem cavaleiros. O casamento costumava acontecer entre 12 a 15 anos, sendo a noiva mais nova que o noivo. A partir do séc. XII, a Igreja Católica passou a exigir o consentimento mútuo dos noivos para a união, embora, na prática, os pais convenciam a filha para seu consentimento. Aos poucos os jovens começaram a ter uma maior decisão em relação à sua própria vida, porém ainda de modo muito precário.
No século XIX, já haviam cidades muito populosas, onde grande parte das pessoas já não se conheciam. Trata-se de um período marcado pelo fortalecimento dos Estados Nacionais, pela redefinição dos papéis sociais de mulheres e crianças, pelo avanço acelerado da industrialização e da técnica e pela organização dos trabalhadores. Foi neste momento que a imagem do adolescente, como hoje entendemos, começa a ser desenhada. Alguns marcos indicam o início e o fim dessa etapa. Iniciando para o menino entre a primeira comunhão e o bacharelado, e para a menina, entre primeira comunhão ao casamento. A adolescência passa a ser reconhecida como um "momento crítico" da existência humana, temida como uma fase de riscos em potencial para o próprio indivíduo e para a sociedade como um todo. O século XX foi um período em que as guerras marcaram mudanças no papel da adolescência. Nos períodos que precederam a I e a II Guerra Mundial, a literatura enfatizava a indolência, indisciplina e preguiça dos adolescentes. As modificações ocorridas no interior das famílias trouxeram novas posições para seus membros, inclusive o adolescente. Alguns historiadores passam a questionar a universalidade da adolescência, passando a entendê-la como uma construção social. Depois da Segunda Guerra Mundial, a juventude foi passando ser vista com maior importânca. Hoje em dia, a juventude é visto como algo que deve ser preservado e prolongando o máximo possível. A juventude se transformou num mercado de consumo de inúmeros produtos e serviços, que são criados especialmente e exclusivamente para os adolescentes. Muitas vezes os meios de comunicação são usados para manipular os adolescentes. Nos Estados Unidos, durante a década de 1950, surge um fenômeno denominado "juventude transviada" ou "rebelde sem causa", representando uma visão desordenada e rebelde do adolescente. Os anos 1960 inauguram um novo estilo de mobilização e contestação social, contribuindo para o entendimento da adolescência como uma nova forma de cultura. Os jovens começaram a negar alguns padrões culturais vigentes da sociedade, transformando a juventude num grupo, com foco na contestação. A contracultura se apresenta como um fenômeno caracterizado esteticamente pelos cabelos compridos, roupas coloridas, misticismo, um tipo de música e drogas, significando uma nova maneira de pensar, viver, agir e se relacionar com o mundo e com as pessoas.
A criança e o adolescente passam a ser considerados sujeitos de direito e em fase especial de desenvolvimento, afirmando a ideia de proteção integral do Estado. Com esse histórico da posição dos adolescentes e da adolescência na sociedade através dos séculos, pode-se considerar esse estágio uma invenção cultural que se desenvolve em apenas específicos grupos sociais. A concepção da adolescência, como hoje entendemos, parece estar relacionada à democratização da educação e ao surgimento de leis trabalhistas. BECKER, Daniel. O que é adolescência. São Paulo: Brasiliense, 1999. BOCK, Ana Mercês Bahia. Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. SCHOEN-FERREIRA, Teresa Helena; AZNAR-FARIAS, Maria and SILVARES, Edwiges Ferreira de Mattos. Adolescência através dos séculos. Psic.: Teor. e Pesq. 2010, vol.26, n.2, pp.227-234. Temas: |