A ciencia gera conhecimento que por sua vez

Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

Eu fico com a pureza da resposta das crianças. É a vida, é bonita. E é bonita…

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Emprestando este verso da canção de Gonzaguinha, sintetizo tudo que penso sobre como a ciência é importante para um país… mas o que penso é só o que penso e, no meu pensamento, a poesia se mistura com argumentos, e a emoção com a esperança, pois são esses complexos sentimentos que batem à porta de quem passou a vida toda “nesta luta do rochedo contra o mar…”  atrás das migalhas jogadas àqueles que constroem o pensamento científico deste país.  Uma coisa, porém, é certa. A vida é injusta por natureza. A gestão econômica e suas consequências especiais não oferecem a igualdade nas condições de negociação, pois esse princípio de igualdade metafísico não existe na realidade. Portanto, os argumentos dos pretensos cientistas, de que, perdas a curto prazo inexoravelmente se transformam em perdas a longo prazo não têm convencido nossos gestores quando o assunto é política científica.

Então, caríssimos, o ponto não é a ciência… pois sendo só a ciência, a resposta é óbvia. A perturbação do sistema é, na verdade, a política científica e, por conta disso, modifico a pergunta cuja resposta não cabe no poema. Qual a importância da política cientifica para um país? No Brasil, em setembro de 2018, essa pergunta ainda é equivalente à que fez Max Weber dois séculos atrás: “quais são as perspectivas de alguém que, tendo concluído seus estudos superiores, decida dedicar-se profissionalmente à ciência, no âmbito da vida universitária?” Ora, responder esta pergunta significa aceitar alguns pressupostos.

O primeiro é que enquanto conjunto de equipamentos, laboratórios, prédios, agências de fomento e o sistema burocrático, a política científica não se dá a conhecer como tal; ela só se aproxima de sua autêntica ideia à medida que o espírito da gestão proativa se fortalece por meio do diálogo permanente em busca de uma visão coesa das necessidades do país, visão que continuadamente deve ser revista em face das reiteradas descobertas científicas. Um outro pressuposto é que a política científica se delineia como tal na interação que se estabelece entre dois interlocutores privilegiados dessa busca da totalidade, a ciência e a sociedade.

Aquela, ciosa de seu encargo, receptiva às demandas desta, porém criteriosa em sua busca por soluções, cuidando para que elas não venham marcadas por confessionalismos; a outra, sempre animada pelas necessidades do dia a dia, que corresponde às exigências de sua natureza já que é formada por humanos.   Esses dois pressupostos, apesar de inocentes, interessam para se estabelecer uma resposta à questão da importância da política científica para um país. Meu argumento é que esses pressupostos são importantes para que as experiências escondidas nas instituições de ciência do país sejam descobertas. As grandes instituições costumam ser a expressão de grandes experiências, de experiências que estão como que vazadas nessas mesmas instituições e, consequentemente, por estarem um tanto escondidas nelas.  Por sua vez, os gestores da política científica do país não lançam mão dessa experiência mesmo, não só porque estão escondidas e não podem ser apanhadas facilmente, e, claro, porque também não estão conscientes de que essas experiências realmente existam.
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O ponto não é a ciência… pois sendo só a ciência, a resposta é óbvia. A perturbação do sistema é na verdade a política científica e, por conta disso, modifico a pergunta cuja resposta não cabe no poema. Qual a importância da política cientifica para um país?

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Parte das experiências de alguns centros de pesquisa do país estão escondidas em volumosas bases de dados de empresas estrangeiras, algumas criaram até índices de performance para se tornarem competitivas no mercado brasileiro, índices estes que têm sido usados inclusive como métrica para avaliar cientistas. Ora, o gestor que se reporta à sociedade usa tal experiência para formular suas ações de políticas científicas? Não!  A experiência existe e está mal utilizada. Tanto que não me recordo de nada que relacione geração de emprego para quem quer seguir a vida acadêmica nas universidades ou em pesquisa e inovação em empresas, com o conhecimento acumulado em banco de dados de empresas estrangeiras (como a canadense Thomson Reuters, detentora do índice JCR).  Mas esse é só um aspecto perverso da relação. Existem outros.

A importância da política científica para um país está, a meu ver, relacionada com o desenvolvimento econômico de forma mais que direta. Vejam bem, no passado o desenvolvimento econômico e a redução da pobreza dependiam de fatores domésticos, como por exemplo, da propensão dos habitantes de uma certa região a economizar. Mas isso mudou e os nossos gestores da política científica parecem não entender que a economia mundial depende fortemente do conhecimento e este, por sua vez, move-se para além das fronteiras espaciais ficando à mercê inclusive de influências externas.  E, nesse ponto, não gerar emprego para cientistas implica na geração de pobreza. E o futuro da pobreza, meus queridos, não poderá ser compreendida até que os gestores da política científica deste país levem em conta as implicações desse fato.

Olhem para o que aconteceu na Coreia do Sul.  Lá, a política científica exigiu investimentos de curto prazo que geraram uma reação em cadeia que, a longo prazo (falo de 20 anos apenas), ajudou a população a ultrapassar a linha da pobreza.  Os gestores do espaço do lado de lá vislumbraram um sistema de riqueza baseado em conhecimento. Essa visão evoca a imagem de uma política científica onipresente em todas as necessidades sociais de interesse público e (principalmente) privado capaz de gerar mudanças necessárias para um crescimento econômico real.

É por isso que no Brasil o agro não é pop. Nem a indústria é pop nem a produção científica é pop. Hoje, perguntei para a faxineira que limpa meu laboratório (LAFAC) se ela podia me dizer o que entende de o “agro é pop” e a sua resposta foi algo que me fez perceber o quanto é nojenta nossa realidade científica. Mulheres negras faxineiras ganhando salário mínimo limpando laboratórios com alta tecnologia, laboratórios estes incapazes de melhorar a vida da comunidade local, mas publicando em revistas com alto “JCR” canadense.  Claro, comecei dizendo que nós cientistas somos tratados com migalhas e acabo este texto dizendo que tal fato implica em sobrar também apenas migalhas para a população.

A resposta: “Um menino caminha e caminhando chega no muro e ali logo em frente, a esperar pela gente, o futuro está…” Obrigado pelo verso Toquinho e Vinicius…

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Pesquisa em comunicação

Essa aula apresenta características do tipo de conhecimento que é gerado por um processo de pesquisa: o conhecimento científico.

Publicado em: 26 de fev. de 2015
Atualizado em: 23 de nov. de 2021

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A necessidade ou a sede por conhecimento é uma realidade que parece inerente à espécie humana. Desde há muito tempo os seres humanos buscam entender e explicar os fenômenos que experimentam e isso tem sido feito de modo diferente ao longo do tempo.

Em um primeiro momento a humanidade recorreu aos mitos, de modo pouco sistematizado, para responder suas grandes questões. Sem entender como o mundo ou a vida surgiram, nasceram explicações que se baseavam na vontade dos deuses ou outras entidades naturais ou místicas.

Com o tempo outros modos mais organizados e sistematizados de se explicar a realidade surgiram. Com isso passamos a conviver com diversos tipos diferentes de saberes(ou modos de se explicar a realidade).

Entre eles se destacam esses quatro tipos de conhecimento:

  • Popular
  • Filosófico
  • Religioso
  • Científico

Como são conhecimentos de natureza diferentes, esses tipos de conhecimento são capazes de conviver e conseguimos lidar com todos eles.

Por sua vez, essas formas de conhecimento podem coexistir na mesma pessoa: um cientista voltado, por exemplo, ao estudo da física, pode ser crente praticante de uma determinada religião, estar filiado a um sistema filosófico e, em muitos aspectos de sua vida cotidiana, agir segundo conhecimentos provenientes do senso comum. (MARCONI; LAKATOS, 2004, p.21)

A pesquisa e seus métodos existem para gerar especificamente um desses tipos de conhecimento: o científico.

Portanto, para se compreender bem o papel da pesquisa, mesmo aquela aplicada a questões mercadológicas e ao comportamento do consumidor, é importante compreender bem o que é conhecimento científico, como ele é gerado e quais suas características.

Para isso vamos estudar e comparar os quatro tipos apontados acima.

Também chamado de "senso comum", o conhecimento popular é aquele que utilizamos para resolver a maior parte dos nossos problemas no dia a dia.

O senso comum é um conjunto de informações não-sistematizadas que aprendemos por processos formais, informais e, às vezes, inconscientes, e que inclui um conjunto de valorações. Essas informações são, no mais das vezes, fragmentárias e podem incluir fatos históricos verdadeiros, doutrinas religiosas, lendas ou parte delas, princípios ideológicos às vezes conflitantes, informações cientíricas popularizadas pelos meios de comunicação de massa, bem como a experiência pessoal acumulada. (MATALLO Jr., 1995, p.16)

Muitos autores consideram o senso comum ou conhecimento popular como a origem ou o combustível para o conhecimento científico. Isso significa que muitas vezes as pesquies científicas são feitas para explicar ou para esclarecer dúvidas acerca do senso comum.

As principais características do senso comum são:

  • É valorativo, pois seu peso e importância varia conforma as emoções envolvidas.
  • É reflexivo, porém de modo limitado, pois se fundamentam no senso comum.
  • É assistemático, não obedecendo qualquer metodologia.
  • É verificável pois tem ligação empírica com os eventos do cotidiano.
  • É falível e inexato pois se refere a percepções pouco fundamentadas.

Também chamado de conhecimento teológico. Alguns filósofos da ciência não considerem os saberes religiosos como conhecimento, pois sua origem, muitas vezes, foge da razão humana e tem base em experiências místicas.

Porém esses saberes também são utilizados por nós para resolver nossos problemas e inquietações do dia a dia.

As principais características do conhecimento religioso são:

  • É valorativo, pois seu peso e importância variam de acordo com sua relação com o sagrado.
  • Não é racional, mas sim inspiracional, pois tem origem sobrenatural.
  • É sistemático pois é estruturado como justificação da realidade e muita vezes expresso em livros ou sistemas indexados.
  • É não verificável, ou seja, crer nele é uma atitude de fé.
  • É infalível e exata, pois não é possível questionar sua origem, que normalmente é por revelação divina.

Se o fundamento do conhecimento científico consiste na evidência dos fatos observados (...), na evidência lógica (...), no caso do conhecimento teológico o fiel não se detém nelas à procura de evidência, mas da causa primeira, ou seja, da revelação divina. (MARCONI; LAKATOS, 2004, p.20)

A filosofia se caracteriza por reflexões sobre nosso modo de pensar. Podemos dizer que o conhecimento filosófico é um conhecimento sobre os outros tipos de conhecimento.

Suas principais características são:

  • É valorativo, pois seu peso e importância varia conforme a experiência de quem os formula.
  • É racional, pois é formulado conforme uma lógica racional conhecida.
  • É sistemático pois trata-se de representações lógicas da realidade.
  • É não verificável, pois é impossível realizar qualquer teste empírico que o comprove.
  • É infalível e exato, pois não é possível questionar a lógica racional pela qual for formulado.

Portanto, o conhecimento filosófico é caracterizado pelo esforço da razão pura para questionar os problemas humanos e poder discernir entre o certo e o errado, unicamente recorrendo às luzes da própria razão humana. Assim, se o conhecimento científico abrange fatos concretos, positivos, e fenômenos perceptíveis pelos sentidos (...), o objeto de análise da filosofia são ideias, relações conceptuais, exigências lógicas que não são redutíveis a realidades materiais e, por essa razão, não são passíveis de observação sensorial direta ou indireta. (MARCONI; LAKATOS, 2004, p.19)

É o tipo de conhecimento gerado pelo método científico. A ciência procura responder perguntas a respeito da realidade com o objetivo de compreender como ela funciona e como podemos melhorar nossa vida a partir dessa compreensão.

Kant dizia que a ciência obriga a natureza a dar respostas para suas questões. A ciência seria como um juiz que obriga sua testemunha (a natureza) a responder às perguntas que ele mesmo formulou.

Para isso ela lança hipóteses que serão testadas por meio de experimentos ou da observação da natureza. Esses testes nos darão as melhores respostas possíveis nesse momento para as perguntas que foram feitas.

Usualmente chamamos de hipóteses às perguntas que os cientistas propõem à natureza. A experimentação é a tortura a que submetemos a natureza para obrigá-la a manifestar-se sobre a pergunta. (ALVES, 1981, p.70)

As principais características do conhecimento científico são:

  • Não é valorativo, mas sim contingente, ou seja, seu valor está na capacidade de ser verificado.
  • É factual e sempre tem base no real.
  • É sistemático, pois obedece a uma metodologia.
  • É verificável e essa é sua natureza.
  • É falível pois nenhum conhecimento científico é definitivo e podem sempre ser questionados, principalmente a partir de novos conhecimentos.
  • É apenas aproximadamente exato, pois sempre pode ser aprimorado.

Como nesse curso estamos falando de pesquisa científica, essa é a principal distinção que precisamos fazer: o que diferencia o conhecimento científico do conhecimento popular?

Enquanto o conhecimento popular é gerado a partir de experiências individuais, sem qualquer rigor ou método, o conhecimento científico é produzido sistematicamente a partir de metodologias e protocolos, com o objetivo de que ele possa ser testado, questionado, reproduzido e generalizado.

Não faz sentido questionar um conhecimento popular, afinal e pessoa que o detém o experimentou diretamente em sua vida e, naquela situação, aquele conhecimento é útil e verdadeiro.

Já o conhecimento científico é feito para ser questionado. Quanto mais o questionamos, mais ele é testado e mais exato ele se torna e mais se aproxima da realidade.

O vídeo ao lado ou abaixo é um recorte do documentário O universo de Stephen Hawking. Ele mostra esse processo de aperfeiçoamento do conhecimento científico a partir de questionamentos, dúvida e novos testes.

A partir das características de cada tipo de conhecimento, podemos estabelecer o seguinte quadro:

CIENTÍFICO

POPULAR

FILOSÓFICO

RELIGIOSO

Contingente

Valorativo (emoções)

Valorativo (experiência)

Valorativo (sagrado)

Factual (real)

Reflexivo

Racional

Inspiracional

Sistemático

Assistemático

Sistemático

Sistemático

Verificável
(no fato)

Verificável
(no cotidiano)

Não verificável
(porém lógico)

Não verificável
(ato de fé)

Falível

Falível

Infalível
(em sua lógica)

Infalível (deus)

Aproximadamente exato

Inexato

Exato (lógico)

Exato (deus)

Leia o texto abaixo para compreender como é gerado o conhecimento científico.

A Coisa funciona mais ou menos assim: primeiro nos deparamos com um fenômeno que desejamos compreender. Pode ser qualquer coisa. Um exemplo simples: como acontece a chuva? Diante do enigma, parte-se para formular uma hipótese. Podemos, por exemplo, imaginar que a chuva está ligada à temperatura da água. Se aquecida, ela vira vapor e sobe. Se resfriada, ela cai de volta no chão. Certo, temos nossa hipótese. E agora? A ciência dita que precisamos colocar essa ideia à prova. Testá-la com experimentos e observações.

Podemos esquentar a água com fogo e notar que, a partir de um determinado momento, ela começa a subir para o ar, na forma de fumaça. E se aprisionarmos esse vapor ascendente num recipiente notaremos que, ao entrar em contato com a superfície mais fria, ele volta a virar líquido. E percebemos que isso acontece também no mundo lá fora, embora em ritmo bem mais lento. Uma poça d’água desaparece sob a ação da luz do Sol e volta a se formar quando água cai do céu em forma de chuva. Grosso modo, a confirmação de nossa hipótese a converte em teoria. Ela não é mais só um exercício racional de adivinhação. Ela é uma explicação concreta que nos permite compreender e até mesmo prever fenômenos.

Essa nossa teoria simples da chuva explica toda a história? Claro que não. Sobre ela outros cientistas teriam de formular outras hipóteses, que explicam como a água pode evaporar mesmo que a poça inteira nunca atinja a temperatura necessária, ou como a água se aglutina em nuvens e o que acontece na atmosfera para fazê-la se liquefazer e, enfim, chover de volta ao chão. Essas hipóteses serão postas à prova e gerarão novas teorias, que tornarão nossa compreensão do fenômeno ainda mais refinada. Mas note que novas teorias não substituem as antigas. Elas aprofundam o entendimento, sem anular as conclusões obtidas antes.

É a tal história do Isaac Newton, que ao formular as bases da física moderna se disse “sobre os ombros de gigantes”. Ele construiu sua obra sobre alicerces sólidos. A ciência é um muro de tijolos. Novos tijolos são constantemente colocados no muro. Mas os antigos raras vezes são substituídos. No mais das vezes, eles continuam formando a parede, que fica cada vez mais alta, permitindo que enxerguemos cada vez mais longe.

Por isso é de uma desonestidade intelectual profunda acusar a evolução pela seleção natural de ser “apenas uma teoria”. Em ciência, uma teoria é o máximo que uma ideia pode chegar a ser. E ela atinge esse ponto só depois que foi corroborada por observações e experimentos. Só depois que ela se mostra a melhor explicação possível para um certo conjunto de dados.

NOGUEIRA, Salvador. Cinco provas da evolução das espécies. 26 de mai. 2014. Disponível em: <//mensageirosideral.blogfolha.uol.com.br/2014/05/26/cinco-provas-da-evolucao-das-especies/>. Acesso em: 26 mai. 2014

ALVES. Rubem. Filosofia da ciência: introdução ao jogo e suas regras. São Paulo: Brasiliense, 1981.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1991.

MARCONI, Marina de A.; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004.

MATALLO, Jr. Heitor. A problemática do conhecimento. In: CARVALHO, Maria Cecília M. de (org.). Construindo o saber: metodologia científica, fundamentos e técnicas. Campinas: Papirus, 1995.

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